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Processo n.º 133/06
3ª Secção
Relatora: Conselheira Maria dos Prazeres Pizarro Beleza
Acordam, em conferência, na 3ª Secção
do Tribunal Constitucional:
1. A fls. 224 foi proferida a seguinte decisão sumária :
«1. A. interpôs, no Tribunal Central Administrativo, recurso
contencioso de anulação do despacho de 16 de Agosto de 2001 do Secretário de
Estado da Administração Interna, que, ao abrigo do disposto no artigo 94º, n.º
2, da Lei Orgânica da Guarda Nacional Republicana, aprovada pelo Decreto-Lei n.º
231/93, de 26 de Junho (LOGNR), e do artigo 75º, n.º 1, alíneas, a) e b), do
Estatuto dos Militares da Guarda Nacional Republicana, aprovado pelo Decreto-Lei
n.º 265/93, de 31 de Julho (EMGNR), e tendo por base a condenação do recorrente
na pena de 12 anos de prisão, pela prática do crime de homicídio simples,
previsto e punido pelo artigo 131º do Código Penal, na pessoa de sua mulher,
ordenou a sua dispensa de serviço da Guarda Nacional Republicana e a passagem à
situação prevista no n.º 4 do artigo 75º do referido EMGNR.
Por acórdão Tribunal Central Administrativo Sul de 18 de Novembro de
2004, de fls. 112 e seguintes, foi negado provimento ao recurso.
Inconformado, A. recorreu para o Supremo Tribunal Administrativo,
Tribunal que, por acórdão de 30 de Novembro de 2005, de fls. 166 e seguintes,
negou provimento ao recurso e confirmou o acórdão recorrido, para cujos
fundamentos remeteu, ao abrigo do disposto no artigo 713º, n.º 4, do Código de
Processo Civil.
2. Finalmente, A. recorreu deste acórdão do Supremo Tribunal
Administrativo para o Tribunal Constitucional, “ao abrigo do disposto no artigo
70º, n.º 1, alínea b) e seguintes da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro”,
afirmando o seguinte:
“1º
O referido acórdão é inconstitucional porque viola o disposto nos artºs 105º e
al. a) e c) da 1ª parte do n.º 1 do art. 125º do CPA e 1º, n.º 1, al. d) do DL
n.º 256-A/77 de 17 de Junho, pois o Sr. Secretário da Administração Interna
limitou-se a fundamentar a sua decisão por reenvio para a proposta do Sr.
Comandante Geral. Violou, também, o Ac. do Tribunal Pleno de 26/02/91 e os Acs.
Do STA de 10/01/80, 25/02/93 e 16/02/94 in Acórdãos Doutrinais, respectivamente
n.º 360, pág. 1385, n.º 222, pág. 706, n.º 384, pág. 1221 e n.º 391, pág. 782.
2º
Os dispositivos legais, ao abrigo dos quais foi declarada a medida de Dispensa
de Serviço estão feridos de inconstitucionalidade orgânica, em virtude de o
Governo ter legislado com competência legislativa ordinária e não ter sido
autorizado a fazê-lo pela assembleia da República, em matéria da sua reserva
relativa de competência legislativa (al. b), d) e v) do art. 168º da CRP).
3º
O acto recorrido, ao ter fundamentado a ‘Dispensa de Serviço’, aplicada ao
recorrente nos termos do art. 75º do EMGNR e 94º, n.º 1, 2 e 4 da LOGNR,
fundamentou-se em normas formal e organicamente inconstitucionais, dado que as
mesmas respeitam a direitos e garantias, ao regime geral da punição de
infracções disciplinares e bases do regime e âmbito da função pública, matérias
de reserva relativa da Assembleia da República (al. b), d) e v) do art. 168º da
CRP), o que inquina o acto recorrido de violação da lei.
Pelo que,
4º
Se requer que os Venerandos Juízes do Tribunal Constitucional se pronunciem
sobre a inconstitucionalidade das normas insertas nos artigos 75º do EMGNR e
94º, n.ºs 1,2 e 4 da LOGNR.
5º
O acto recorrido viola, também, o princípio da igualdade e da proporcionalidade
porque o processo da dispensa de serviço resulta manifestamente excepcional e a
sanção desigual e desproporcionada em relação às aplicadas noutros casos.
6º
A aplicação da medida nas referidas condições, ou seja, sem se requerer a prova
da prática de uma infracção disciplinar muito grave, não cumpre a exigência de
que toda a restrição se deve limitar ‘ao necessário para salvaguardar outros
direitos ou interesses constitucionalmente protegidos’ (cfr. art. 18º, n.º 2, da
CRP).”
3. Como se viu, são três as questões de constitucionalidade
suscitadas neste recurso.
Em primeiro lugar, o recorrente afirma que o acórdão recorrido é
“inconstitucional porque viola o disposto nos artigos 105º e al. a) e c) da 1ª
parte do n.º 1 do art. 125º do CPA e 1º,n.º 1, al. d) do DL n.º 256-A/77 de 17
de Junho, pois o Sr. Secretário da Administração Interna limitou-se a
fundamentar a sua decisão por reenvio para a proposta do Sr. Comandante Geral”.
Em segundo lugar, o recorrente pretende que as normas dos artigos 75º do EMGNR e
94º, n.º 1, 2 e 4 da LOGNR são formal e organicamente inconstitucionais, “dado
que as mesmas respeitam a direitos e garantias, ao regime geral da punição de
infracções disciplinares e bases do regime e âmbito da função pública, matérias
de reserva relativa da Assembleia da República (al. b), d) e v) do art. 168º
CRP)”.
Em terceiro e último lugar, o recorrente sustenta que o “acto recorrido viola,
também, o princípio da igualdade e da proporcionalidade porque o processo da
dispensa de serviço resulta manifestamente excepcional e a sanção desigual e
desproporcionada em relação às aplicadas noutros casos”.
4. Como se sabe, o recurso de fiscalização concreta da constitucionalidade de
normas interposto ao abrigo do disposto na alínea b) do nº 1 do artigo 70º da
Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, como é o caso, destina-se a que este Tribunal
aprecie a conformidade constitucional de normas, ou de interpretações
normativas, que foram efectivamente aplicadas na decisão recorrida, não obstante
ter sido suscitada a sua inconstitucionalidade “durante o processo” (al. b)
citada), e não das próprias decisões judiciais ou dos actos administrativos que
as apliquem.
Assim resulta da Constituição e da lei, e assim tem sido repetidamente afirmado
pelo Tribunal (cfr. a título de exemplo, os acórdãos nºs 612/94, 634/94 e 20/96,
publicados no Diário da República, II Série, respectivamente, de 11 de Janeiro
de 1995, 31 de Janeiro de 1995 e 16 de Maio de 1996).
Isto significa, desde logo, que não cabe no âmbito do recurso interposto a
apreciação, nem da primeira, nem da terceira das questões indicadas.
Não pode, pois, o Tribunal Constitucional conhecer, nessa parte do
objecto do recurso.
5. Resta, pois, a questão da invocada inconstitucionalidade
atribuída aos artigos 75º do EMGNR e 94º, n.º 1, 2 e 4 da LOGNR por violação do
disposto no artigo 168º, n.º 1, alíneas b), d) e v), da Constituição
(correspondentes às alíneas b), d) e t) do n.º 1 do actual artigo 165º da
Constituição).
Em rigor, apenas estão em causa o n.º 1, alíneas a) e b) e o n.º 4
do artigo 75º do EMGNR e os n.ºs 1, excluindo o segmento referente à dispensa de
serviço a pedido do militar, 2 e 4 da LOGNR, por ser nestes preceitos que se
contêm as normas efectivamente aplicadas no acórdão recorrido.
Ora, como de resto se observa na decisão recorrida e no Acórdão do Tribunal
Central Administrativo Sul, o Tribunal Constitucional já teve a oportunidade de,
em Plenário, se pronunciar sobre as questões de constitucionalidade que são
colocadas no âmbito do presente recurso.
Com efeito, no seu acórdão n.º 481/2001 (rectificado pelo acórdão n.º 491/01 e
publicados, ambos, no Diário da República, II Série, de 25 de Janeiro de 2002 e
5 de Fevereiro de 2002, respectivamente), aprovado em Plenário, o Tribunal
Constitucional decidiu 'Não julgar inconstitucionais as normas constantes dos
artigos 94º da Lei Orgânica da Guarda Nacional Republicana, aprovada pelo
Decreto-Lei nº. 231/93, de 26 de Junho (com excepção do seu nº. 3 e do segmento
do nº. 1 referente à dispensa de serviço a pedido do militar, que não constituem
objecto do recurso) e 75º do Estatuto dos Militares da Guarda Nacional
Republicana, aprovado pelo Decreto-Lei nº. 265/93, de 31 de Julho (com excepção
das alíneas b) e c) do seu nº. 1, que também não constituem objecto do
recurso)'.
É este julgamento de não inconstitucionalidade que, para as normas
que constituem o objecto do presente recurso, aqui se reitera, remetendo para os
respectivos termos e fundamentos.
6. Estão, pois, reunidas as condições para que se proceda à emissão
da decisão sumária prevista no n.º 1 do artigo 78º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de
Novembro.
Assim, decide-se:
a) Não julgar inconstitucionais as normas constantes dos n.ºs 1, 2 e 4 do
artigo 94º da Lei Orgânica da Guarda Nacional Republicana, aprovada pelo
Decreto-Lei nº. 231/93, de 26 de Junho (com excepção do segmento do nº. 1
referente à dispensa de serviço a pedido do militar, que não constitui objecto
do recurso) e dos n.ºs 1, alíneas a) e b) e do n.º 4 do artigo 75º do Estatuto
dos Militares da Guarda Nacional Republicana, aprovado pelo Decreto-Lei nº.
265/93, de 31 de Julho;
b) Não conhecer das restantes questões suscitadas;
c) Consequentemente, negar provimento ao recurso, confirmando a decisão
recorrida no que respeita à questão de constitucionalidade.
Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 8 ucs.»
2. Inconformado, o recorrente reclamou para a conferência, ao abrigo do disposto
no nº 3 do artigo 78º-A da Lei nº 28/82, pretendendo a revogação da decisão
sumária, a continuação do recurso e a respectiva procedência, a final.
Na reclamação, de fls. 234, o ora reclamante não apresenta, todavia, nenhum
argumento que não tenha sido considerado na decisão reclamada. Isso mesmo
afirma, aliás, a autoridade recorrida, na resposta de fls. 240.
3. Resta, assim, indeferir a reclamação, confirmando a decisão de não julgar
inconstitucionais as normas constantes dos n.ºs 1, 2 e 4 do artigo 94º da Lei
Orgânica da Guarda Nacional Republicana, aprovada pelo Decreto-Lei nº. 231/93,
de 26 de Junho (com excepção do segmento do nº. 1 referente à dispensa de
serviço a pedido do militar, que não constitui objecto do recurso) e dos n.ºs 1,
alíneas a) e b) e do n.º 4 do artigo 75º do Estatuto dos Militares da Guarda
Nacional Republicana, aprovado pelo Decreto-Lei nº. 265/93, de 31 de Julho, e de
não conhecer das restantes questões suscitadas.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 ucs.
Lisboa, 7 de Abril de 2006
Maria dos Prazeres Pizarro Beleza
Vítor Gomes
Artur Maurício