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Processo n.º 749/05
1.ª Secção
Relatora: Conselheira Maria Helena Brito
Acordam, em conferência, na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
1. Por decisão sumária de fls. 243 e seguintes, não se tomou
conhecimento do objecto do recurso interposto para este Tribunal por A., SA.,
pelos seguintes fundamentos:
“[…]
Tendo o presente recurso sido interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do
artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, constitui seu pressuposto
processual, entre outros, a invocação pelo recorrente durante o processo da
questão de inconstitucionalidade que pretende ver apreciada pelo Tribunal
Constitucional (cfr. também o artigo 72º, n.º 2, da mesma Lei).
Da leitura do requerimento de interposição do presente recurso (supra, 5.)
resulta que a recorrente pretende a apreciação de quatro interpretações
normativas, que explicita.
Ora, independentemente da questão de saber se tais interpretações normativas o
são verdadeiramente – ou se configurarão, antes, a aplicação do direito ao caso
concreto e, portanto, a própria decisão recorrida, o que desde logo
impossibilitaria o conhecimento do presente recurso, atendendo a que o Tribunal
Constitucional não tem competência para apreciar a conformidade constitucional
de decisões judiciais (cfr. as várias alíneas do n.º 1 do artigo 70º da Lei do
Tribunal Constitucional) –, a verdade é que, durante o processo a recorrente se
limitou a suscitar (supra, 3.):
– A inconstitucionalidade do artigo 209° do CPPT, na interpretação segundo a
qual «a recorrente não podia deduzir oposição quanto à pretensão de cobrança de
impostos liquidados anteriormente à entrada em vigor do procedimento de
assistência mútua, por tal caso não estar previsto no âmbito dessa disposição»,
por violação do princípio da tutela jurisdicional efectiva consagrado no artigo
20° da Constituição (cfr. o n.º 21 das conclusões das alegações produzidas
perante o tribunal recorrido);
– A inconstitucionalidade de certas normas (que, aliás, não chegou a identificar
claramente, pois que se reportou às «normas em análise»: cfr. o n.º 24 dessas
conclusões);
– A inconstitucionalidade do «procedimento de cobrança» (cfr. o n.º 46 de tais
conclusões).
Assim sendo, em relação à primeira, à terceira e à quarta interpretação
normativa que a recorrente pretende ver apreciada por este Tribunal (supra, 5.),
não foi suscitada, durante o processo, a correspondente questão de
inconstitucionalidade.
Não tendo a recorrente suscitado, durante o processo, a questão da
inconstitucionalidade de qualquer dessas interpretações normativas, conclui-se
que, quanto a elas, não se encontra preenchido um dos pressupostos processuais
do presente recurso, pelo que não pode conhecer-se do respectivo objecto.
Só em relação à segunda interpretação normativa que pretende ver apreciada por
este Tribunal suscitou a recorrente, durante o processo, uma questão de
inconstitucionalidade.
Mas só o fez, acrescente-se, quanto à segunda parte dessa interpretação (quanto
à primeira parte valendo, portanto, as considerações acabadas de expender): na
verdade, apenas no que diz respeito à impossibilidade de dedução de oposição
quanto à pretensão de cobrança de impostos liquidados anteriormente à entrada em
vigor do procedimento de assistência mútua, por falta de previsão legal para o
efeito, foi suscitada uma questão de inconstitucionalidade durante o processo.
Todavia, também a segunda parte dessa interpretação não pode ser apreciada por
este Tribunal, por falta de utilidade nessa apreciação (outro dos pressupostos
processuais do presente recurso de constitucionalidade).
É que, mesmo que tal (segunda parte dessa) interpretação fosse julgada
inconstitucional pelo Tribunal Constitucional, outro motivo haveria para que o
tribunal recorrido julgasse improcedente o fundamento de oposição em causa e,
assim, mantivesse a sua decisão. Com efeito, lê-se o seguinte na decisão
recorrida (supra, 4.):
«[…]
Mais alega o opoente que o procedimento de assistência mútua entre os Estados
membros da Comunidade Europeia em matéria de cobrança de créditos, previsto no
dec. lei 296/2003, de 21/11, não pode ser aplicado retroactivamente a impostos
liquidados antes da sua entrada em vigor.
Igualmente se deve considerar manifestamente improcedente o presente fundamento
da oposição, por um lado e mais uma vez, visto que não faz parte dos fundamentos
definidos na lei para a oposição do executado constantes do citado art.º 204,
n.° 1, do C.P.P. Tributário, preceito que consagra uma enumeração legal
taxativa, conforme mencionado acima. Por outro, atento o disposto no artº. 38º,
do aludido dec. lei 296/2003, de 21/11, o qual prevê a entrada em vigor do mesmo
diploma para o dia seguinte ao da sua publicação, ocorrida em 21/11/2003, não
fazendo o legislador qualquer restrição ao seu âmbito de aplicação.
[…].» (sublinhado acrescentado).
Não pode, assim, tomar-se conhecimento do objecto do recurso, quanto à segunda
parte da segunda interpretação normativa explicitada pela recorrente no
requerimento de interposição do presente recurso, por ser inútil essa apreciação
pelo Tribunal Constitucional, atendendo a que a decisão recorrida sempre se
manteria fosse qual fosse o resultado dessa apreciação.
[…].”.
2. A., SA., notificada desta decisão, veio apresentar reclamação para a
conferência, ao abrigo do disposto no n.º 3 do art. 78º-A da Lei do Tribunal
Constitucional, através do requerimento de fls. 259 e seguintes (264 e
seguintes), em que afirma:
“[...]
1. O recurso objecto destes autos foi interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1
do artigo 70º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na redacção que lhe foi dada
pela Lei n.º 85/89, de 7 de Setembro, com fundamento na aplicação de normas
feridas de inconstitucionalidade, no entendimento que lhes foi dado pelo
Tribunal Central Administrativo Sul.
2. As razões de inconstitucionalidade foram levantadas nas alegações do recurso
interposto para o Tribunal Central Administrativo Sul da decisão da 1ª
instância.
3. As normas jurídicas cuja inconstitucionalidade se pretendia ver apreciada são
as dos artigos 204º e 209º/CPPT e as normas do Decreto-Lei n.º 296/2003, com a
interpretação que lhes foi dada e com que foram aplicadas na decisão recorrida:
[…]
4. Alegou-se ainda que as normas e os princípios constitucionais que com a
decisão recorrida foram violados são:
[…]
5. No aliás douto despacho reclamado, não obstante o acima referido, decidiu-se
no sentido de que a recorrente não teria suscitado, durante o processo, a
questão da inconstitucionalidade quanto às interpretações normativas acima
referidas ou que a sua apreciação seria inútil, porque não afectaria a decisão
recorrida.
6. Esta decisão, com que – com o devido respeito, que é muito – a recorrente se
não conforma, traz prejuízo à sua posição processual, pelo que dela vem reclamar
para a Conferência.
Nestes termos se requer a V. Exa. se digne considerar interposta e admitir a
presente reclamação, nos termos do n.º 3 do artigo 78º-A/LTC, seguindo-se os
demais termos legais.
[…].”.
3. Notificada para se pronunciar sobre a reclamação apresentada, a
recorrida Fazenda Pública não respondeu (cota de fls. 268).
Cumpre apreciar e decidir.
4. Na reclamação agora apresentada, a reclamante limita-se a dizer que
“esta decisão, com que […] a recorrente se não conforma, traz prejuízo à sua
posição processual, pelo que dela vem reclamar para a Conferência […] nos termos
do n.º 3 do artigo 78º-A/LTC” (supra, 2.).
Não sendo invocada qualquer razão susceptível de pôr em causa a
decisão sumária reclamada, nada mais resta do que confirmar o decidido.
5. Nestes termos, e pelos fundamentos expostos, indefere-se a presente
reclamação, mantendo-se a decisão sumária de não conhecimento do objecto do
recurso.
Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte)
unidades de conta.
Lisboa, 11 de Janeiro de 2006
Maria Helena Brito
Carlos Pamplona de Oliveira
Rui Manuel Moura Ramos