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Processo n.º 377/06
3ª Secção
Relator: Conselheiro Gil Galvão
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
I – Relatório.
1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação de Évora, foi o arguido
A., ora reclamante, condenado, em primeira instância, como autor material de um
crime de tráfico de substâncias estupefacientes e de um crime de condução sem
habilitação legal, em cúmulo jurídico, na pena única de seis anos e um mês de
prisão. Inconformado, recorreu, tendo o Tribunal da Relação de Évora, por
acórdão de 5 de Julho de 2005, julgado o recurso parcialmente procedente, no que
à medida da pena respeita, operando o cúmulo na pena única de cinco anos e um
mês de prisão. Ainda inconformado, o ora reclamante interpôs recurso para o
Supremo Tribunal de Justiça, o qual, por acórdão de 7 de Dezembro de 2005, lhe
deu parcial provimento, fixando a pena única em 5 anos de prisão.
2. Notificado, veio o ora reclamante, em 28 de Dezembro de 2005, “interpor
recurso para o VENERANDO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL nos termos do disposto na
alínea b) e g) do artigo 70º da Lei 28/82 de 15/11, por não se conformar com o
douto acórdão proferido pelo Venerando Tribunal da Relação”, afirmando ter
“legitimidade e est[ar] em tempo”.
3. Tal recurso, não foi, todavia, admitido, com os seguintes fundamentos:
“[...] Como se vê da motivação do recurso o arguido recorre para o Tribunal
Constitucional do acórdão proferido por esta Relação no âmbito destes autos,
acórdão que foi revogado pelo acórdão do S.T.J de fls. 2256 a 2288.
Aquela decisão admitia recurso ordinário (e dela foi interposto recurso para o
S.T.J.) pelo que, consequentemente, não admite recurso para o Tribunal
Constitucional (art.º 70 nºs 1 al. b) e 2 da Lei 28/82, de 15 de Novembro) do
Acórdão proferido por esta Relação.
Assim, nos termos expostos, e atento o disposto no art.º 76, n.º1 e 2 da Lei
28/82 de 15 de Novembro, não admito o recurso supra mencionado.”
4. É desta decisão que vem interposta “nos termos do disposto no n.º 4 do artigo
76° da Lei 28/82 de 15 de Novembro”, a presente reclamação, através do seguinte
requerimento:
“[...] por não se conformar com o douto despacho, proferida nestes autos em
21.3.2006, e que decidiu não admitir o seu recurso interposto para o Tribunal
Constitucional, vem do mesmo RECLAMAR PARA O TRIBUNAL CONSTITUCIONAL nos termos
do n.º 4 do art.º 76 da Lei 28/82 de 15 de Novembro e n.º 2 do artigo 688° do
C.P.C., pelos seguintes fundamentos :
Recurso interposto do Tribunal da Relação de Évora
Com efeito, entendeu a douta decisão agora censurada, que não pode conhecer do
recurso constitucional interposto do douto acórdão desta relação, por se ter
seguido um recurso ordinário para o S.T.J. e, este ter revogado o acórdão
proferido pela relação de Évora.
Salvo o devido respeito, entendemos que bem andou o recorrente ao interpor,
naquele caso, recurso para o Tribunal Constitucional.
Em circunstâncias idênticas, o recurso para o Tribunal Constitucional do
coarguido B., já tinha sido admitido a fls. 2338.
Prescreve o nº1 do art. 76° da LTC o seguinte :
Compete ao tribunal que tiver proferido a decisão recorrida apreciar a admissão
do respectivo recurso.
Houve recurso para o S.T.J., mas como se nota do douto acórdão aí proferido,
este apenas alterou a medida da pena, reduzindo-a.
Foi após esta decisão do STJ, que o arguido veio a interpor recurso para o TC.
Assim, o recorrente entregou o seu requerimento de recurso junto do Supremo
Tribunal de Justiça, que o remeteu (fls. 2342) para o Tribunal da Relação de
Évora.
Deveria pois o recurso interposto do Acórdão da Relação de Évora, salvo o devido
respeito por diversa opinião, ter sido admitido para este Tribunal
Constitucional. [...]”
5. Já neste Tribunal foram os autos com vista ao Ministério Público, que se
pronunciou nos seguintes termos:
“Como dá nota a decisão reclamada, o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação
de Évora, em 5/7/05, foi “consumido” pelo acórdão ulteriormente proferido nos
autos pelo STJ, na sequência do recurso ordinário interposto pelo próprio
arguido-reclamante, não constituindo deste modo, uma “decisão definitiva”,
susceptível de autónoma impugnação perante este Tribunal Constitucional.
A circunstância de o arguido ter limitado a impugnação que deduziu perante o
Supremo à questão da medida concreta da pena que lhe foi aplicada – podendo
obviamente ter incluído outras matérias ou questões no âmbito de tal recurso
ordinário, optando por as “abandonar” – não lhe aproveita – não sendo,
nomeadamente, a situação dos autos enquadrável no nº 4 do art.º 70º da Lei nº
28/82 : o que seria lícito ao arguido, face a tal preceito legal, era ter
renunciado ou, por qualquer outra forma, operado a preclusão do recurso
ordinário para o Supremo, interpondo logo recurso de fiscalização concreta do
acórdão da Relação, no prazo de 10 dias subsequentes à respectiva consolidação,
decorrente da irremediável preclusão do recurso ordinário para o STJ. Mas, pelo
contrário, já lhe não era possível optar pela parcial impugnação, perante o
Supremo, do acórdão da Relação para, proferida decisão definitiva no âmbito da
ordem dos tribunais judiciais, vir impugnar perante o TC uma parcela das
questões dirimidas pela Relação, e que o arguido havia “abandonado” no âmbito do
recurso que interpôs perante o STJ.
A mesma razão leva a concluir pela intempestividade do recurso fundado na alínea
g) do n.º 1 do artº 70º da Lei n.º 28/82, não sujeito ao ónus de esgotamento dos
recursos ordinários possíveis: era lícito ao recorrente ter impugnado perante
este Tribunal Constitucional a aplicação normativa, feita pela Relação, que
considerasse colidente com jurisprudência anterior do TC; teria, porém, de o
fazer no prazo de 10 dias subsequente à notificação de tal decisão, não se
aplicando aqui o regime de “prorrogação” previsto no nº 2 do art. 75º da Lei nº
28/82, já que obviamente o recurso ordinário, endereçado ao Supremo, foi
admitido e apreciado quanto ao seu mérito (e sendo imputável à estratégia
processual do recorrente o “abandono” das questões atinentes à legalidade das
escutas telefónicas, privando-o consequentemente da possibilidade contida no nº
6 do art. 70º da Lei nº 28/82)
Acresce que:
- quanto ao recurso fundado na alínea b) do nº 1 do art. 70º da Lei nº 28/82,
não se mostra suscitada, em termos processualmente adequados, uma questão de
inconstitucionalidade normativa, face ao teor das conclusões da motivação do
recorrente, transcritas a fls. 22/24 dos autos, pugnando o arguido/recorrente
pela “nulidade” e “inconstitucionalidade” das próprias escutas e prova delas
resultantes, sem delinear, como lhe cumpria, uma precisa dimensão normativa dos
preceitos legais questionados;
- quanto ao recurso fundado na alínea g) de tal preceito legal, não se verifica
a indispensável coincidência ou sobreposição normativa entre o
acórdão-fundamento invocado e o critério normativo acolhido na decisão recorrida
(cfr. fls 63 dos autos), versando ainda o acórdão nº 528/03 sobre a norma
constante do art. 188º, nº 1, do CPP “ na redacção anterior à que foi dada pelo
DL 320-C/2000, de 15 de Dezembro”.
Termos em que, pelas razões apontadas, deverá ser julgada improcedente a
presente reclamação.”
Dispensados os vistos, cumpre decidir.
II. Fundamentação.
6. O recurso de constitucionalidade em causa, com fundamento no disposto no
artigo 70º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, cabe apenas,
nos termos do respectivo n.º 2, de decisões relativamente às quais estão
esgotados todos os recursos ordinários.
No presente caso, o interessado interpôs recurso ordinário para o Supremo
Tribunal de Justiça da decisão do Tribunal da Relação de Évora que lhe fora
desfavorável.
Ora, deste modo, só com o acórdão daquele Supremo Tribunal, que apreciou tal
recurso - e, no caso concreto, reduziu a pena aplicada - é que ficaram esgotados
os recursos ordinários. E, sendo assim, era exclusivamente desse preciso acórdão
do Supremo Tribunal de Justiça que cabia recurso de fiscalização concreta de
constitucionalidade, e não já da decisão do Tribunal da Relação de Évora por
aquele consumida, não podendo o recorrente, que abandonou, motu proprio, em tal
recurso, as questões agora em causa, vir fazê-las renascer após a decisão
daquele recurso.
Pelo exposto, improcedem os argumentos aduzidos na reclamação, nada mais
restando do que confirmar a decisão reclamada de não admissão do recurso.
7. Por seu turno, o recurso interposto ao abrigo da alínea g) do n.º 1 do
referido artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional é, como refere o
representante do Ministério Público, intempestivo, uma vez que, tendo o acórdão
do Tribunal da Relação de Évora a sido proferido em 5 de Julho de 2005, o
recurso só foi interposto em 28 de Dezembro de 2005.
Nestas circunstâncias, e sem necessidade de maiores considerações, inteiramente
inúteis no presente contexto, torna-se evidente que o recurso não deveria ter
sido admitido, como efectivamente não foi, por manifesta falta dos respectivos
pressupostos legais de admissibilidade.
III. Decisão.
Nestes termos, decide-se indeferir a presente reclamação, confirmando-se a
decisão reclamada de não admissão do recurso para este Tribunal.
Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de
conta.
Lisboa, 4 de Maio de 2006
Gil Galvão
Bravo Serra
Artur Maurício