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Processo nº 721/05
2ª Secção
Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues
Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
A – Relatório
1 – A. recorre para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto na
alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, na sua
actual versão (LTC), do acórdão proferido pelo Pleno do Supremo Tribunal
Administrativo, de 24 de Maio de 2005, que negou provimento ao recurso
interposto do acórdão da Secção de Contencioso Administrativo do mesmo Supremo
Tribunal.
2 – O ora recorrente demandou, em acção declarativa, no Tribunal
Administrativo de Círculo de Coimbra, o Secretário de Estado da Segurança Social
e o Presidente do Conselho Directivo do Centro Nacional de Pensões, pedindo que
lhe fosse reconhecido o direito a uma pensão calculada em função dos períodos
contributivos feitos para a Caixa de Previdência do Pessoal do Caminho de Ferro
de Benguela (CPPCFB), tendo em conta os dez melhores anos de salários reais dos
quinze de desconto, revalorizados pelos coeficientes fixados pela Portaria n.º
183/94, de 31 de Março; que essa pensão fosse cumulada com a pensão
correspondente à que foi fixada pela Segurança Social Portuguesa e relativa ao
trabalho prestado em Portugal e, finalmente, que lhe fosse efectuado o pagamento
das diferenças entre os montantes da pensão a fixar de acordo com as regras
anteriores e as já pagas desde aquela data até ao presente.
3 – Por sentença, este tribunal de 1ª instância administrativa julgou o
Secretário de Estado da Segurança Social parte ilegítima e improcedente o pedido
formulado contra o Centro Nacional de Pensões.
Inconformado, apenas, com o decidido quanto ao mérito da causa, o autor
recorreu para a Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal
Administrativo, mas sem êxito, pois que este Tribunal negou provimento ao
recurso.
Alegando a existência de oposição de julgados, no seio do mesmo Supremo
Tribunal, o autor recorreu para o Pleno, mas, uma vez mais, sem lograr que este
revogasse o julgado, pois foi negado provimento ao recurso.
4 – É do acórdão proferido por este Pleno que vem interposto o presente
recurso de constitucionalidade, pretendendo o recorrente “ver apreciada a
inconstitucionalidade das normas dos artigos 1º, 2º, 7º, n.º 3, e 8º do
Decreto-Lei nº 335/90, de 29 de Outubro (com as sucessivas alterações
introduzidas pelo Decreto-Lei nº 45/93, de 20 de Fevereiro, e Decreto-Lei nº
465/99, de 5 de Novembro), artigos 1º, 2º e 3º do Decreto-Lei nº 401/93, de 3 de
Dezembro, artigo 55º do Decreto-Lei nº 329/93, de 25 de Setembro, e ponto VIII
do Despacho nº 16-I/SESS/94, de 24 de Fevereiro”, com a interpretação segundo a
qual “resulta(r) negado o direito do recorrente ou beneficiário de tais normas a
uma pensão autónoma calculada com base nos períodos contributivos verificados
para a CPP/CFB e a cumular com outra com base nos períodos contributivos
verificados para o sistema de segurança social português”, por violação do
princípio da igualdade de tratamento e o princípio da excepcionalidade das
mesmas normas, “ambos decorrentes do artigo 13º da Constituição da República
Portuguesa”.
5 – Alegando no Tribunal Constitucional, o recorrente concluiu o seu discurso
argumentativo do seguinte jeito:
«1. As normas dos Decretos-Leis nºs 335/90, de 29 de Outubro, 45/93, de
8 de Setembro, 401/93, de 3 de Dezembro, 465/99, de 5 de Novembro, Despacho nº
16-I/SESS/94, de 24 de Fevereiro, estabelecem o direito ao reconhecimento por
parte dos beneficiários dos sistemas de previdência das ex-colónias no âmbito do
sistema de segurança social português;
2. O reconhecimento dos períodos contributivos para um sistema de
previdência obrigatório nas ex-colónias deve ser autónomo da carreira
contributiva verificada em Portugal, gerando por si mesmo o direito a uma
pensão, a qual não pode ser confundida ou unificada no regime geral da segurança
social com a emergente das contribuições verificadas em Portugal;
3. A pensão resultante da carreira contributiva nos sistemas de
contribuição obrigatória das ex-colónias deve poder ser acumulada com a que
resultar da carreira contributiva verificada em Portugal;
4. As normas referidas em 1 são excepcionais e concretas, porque
dirigidas a um universo específico de beneficiários
5. E não podem ser interpretadas com o critério da lei geral – artigo
13º da CRP.;
6. O Centro Nacional de Pensões tem a obrigação de tratar situações
idênticas de modo a obter idênticos resultados, por respeito ao princípio da
igualdade fixado no artigo 13º da CRP;
7. O cumprimento do princípio da igualdade verifica-se por referência
ao mesmo universo de pessoas e situações fácticas ou fáctico-jurídicas.
8. Sendo que esse universo de pessoas e situações é o constituído por
beneficiários dos sistemas de previdência obrigatórias das ex-colónias;
9. Terá de ser concedido o mesmo tratamento a iguais períodos
contributivos e iguais remunerações, concedendo-se iguais pensões;
10. O procedimento do Centro Nacional de Pensões tem-se traduzido em
atribuir pensões de valor superior a quem nunca trabalhou e descontou em
Portugal em comparação com as que atribui a quem trabalhou e descontou nas
ex-colónias e em Portugal, como é o caso do recorrente;
11. É inconstitucional – e como tal deverá ser declarado –, por
violação dos princípios da igualdade e da excepcionalidade das normas,
consagrado no artigo 13º da CRP, o entendimento fixado pelo acórdão de fixação
de jurisprudência proferido pelo Pleno da Secção do STA no sentido de que as
normas referidas em 1. não conferem aos beneficiários delas o direito a uma
pensão calculada autonomamente com base nos seus períodos contributivos para a
CPP/CFB e a cumular tal pensão, assim calculada, com a que resultar dos seus
períodos contributivos verificados em Portugal;
12. A decisão do STA violou as normas dos Decretos-Leis nºs 335/90, de
29 de Outubro, 45/93, de 8 de Setembro, 401/93, de 3 de Dezembro, 465/99, de 5
de Novembro, Despacho n.º 16-I/SESS/94, de 24 de Fevereiro, a constante do
artigo 55º do Decreto-Lei n.º 329/93, de 25 de Setembro, bem como o artigo 13º
da CRP.».
6 – Contra-alegou o recorrido, concluindo do seguinte modo:
«1. O Recorrente interpôs esta acção pretendendo que lhe fosse
reconhecido uma pensão autónoma a liquidar pela Segurança Social de acordo com o
período contributivo que efectuou para a Caixa de Benguela até 11/11/75, e
calculada de acordo com o DL 329/93.
2. Que aquela pensão fosse acumulada com a pensão que já tem do
regime geral da Segurança Social portuguesa, tal como determina o art. 55º do DL
329/93.
3. Todavia, tal pretensão não é possível por violar a letra e o
espírito da Lei.
4. Despacho 16-I/SESS/94 apenas estabeleceu um conjunto de
orientações, permitindo, em 1994, o reconhecimento dos períodos contributivos
dos pensionistas de invalidez e velhice da CCF de Benguela, nos termos do DL
335/90, de 29/10, com a redacção do DL 45/93, de 20/2.
5. 2. O reconhecimento dos períodos contributivos pelo sistema de
Segurança Social português, não se destina à atribuição duma pensão autónoma,
mas sim ao preenchimento ou alteração da carreira contributiva do beneficiário
no regime geral, relevante para a atribuição futura de pensões (art. 2º do DL
335/90) ou melhoria das pensões já atribuídas (mesmo artigo conjugado com o DL
45/93).
6. Com a publicação do Desp. Conj. A – 74/97 – XIII, de 28/4, ficaram
dissipadas quaisquer dúvidas que pudessem existir.
7. Deste diploma retira-se claramente, qual a intenção do legislador.
8. Em abono desta tese, o Acórdão do STA, proferido no proc. nº 47
479 – da 1ª Secção/1 Subsecção, corrobora este princípio.
Pela sua acuidade transcreve-se a seguinte parte, pág. n.º 15:
'... Independentemente da questão da determinação do seu valor normativo – não
tendo sido publicados na forma legalmente exigida, são meras instruções aos
serviços, no uso dos poderes de superintendência, sem valor regulamentar
externo, logo insusceptíveis de fundar directamente direitos e obrigações
judicialmente exigíveis'.
9. Esta a questão fundamental. O Despacho 16-I/SESS/94 não tem valor
externo, logo é insusceptível de reconhecer direitos e obrigações judicialmente
exigíveis.
10. Por outro lado, aceitar-se como correcta a interpretação do Recorrente
este regulamento, Despacho n.º 16-I/SESS/94, criou norma legislativa – violando,
obviamente, o princípio constitucional da tipicidade das leis – vide art. 115º,
nº 1 da CRP e, Parecer nº 34/84, de 20 de Junho de 1984, da Procuradoria – Geral
da República.
Ora,
11. De acordo com este princípio constitucional pretende-se proibir a
interpretação (ou integração autêntica das leis através de actos normativos não
legislativos, seja de natureza administrativa (regulamentos), seja de natureza
jurisdicional (sentenças) - vide Ac. Trib. Constitucional n.º 810 de 7/2/93 (P.
474/88).
12. Não havendo consequentemente qualquer violação de princípio da
igualdade ou excepcionalidade».
7 – Na parte útil ao conhecimento da questão de constitucionalidade, o
acórdão recorrido discorreu assim:
«2. O problema que se nos coloca surgiu porque o legislador se deu conta que, na
sequência da descolonização, as pessoas que haviam trabalhado nas ex-colónias e
que aí haviam feito as suas contribuições para as respectivas instituições de
previdência tinham ficado numa situação de injustiça no seu regresso a Portugal,
uma vez que, apesar daqueles contributos, poderia acontecer não só não terem
direito ao pagamento de qualquer pensão de invalidez, velhice e sobrevivência
como também não serem reembolsados dos quantitativos que, a esse título, haviam
pago naqueles territórios.
E, daí, a publicação do DL 335/90, de 29/10 [dentro da mesma linha se postando
os Decretos-Leis n.º 45/93, de 8 de Setembro, n.º 401/93, de 3 de Dezembro
465/99, de 5 de Novembro e Despacho n.º 16-I/SESS/94, de 24 de Fevereiro] que,
pretendendo reparar aquela situação, veio reconhecer, no âmbito do sistema de
Segurança Social português, 'os períodos de contribuições verificados nas caixas
de previdência de inscrição obrigatória dos territórios das ex-colónias
portuguesas até à independência desses territórios às pessoas que preenchessem
cumulativamente os seguintes requisitos:
a) tenham exercido nos territórios das ex-colónias portuguesas
actividade profissional por conta de outrem ou por conta própria;
b) não recebam dos novos Estados de expressão oficial portuguesa a
protecção social correspondente aos períodos contributivos verificados;
c) residam em Portugal;
d) não sejam pensionistas de qualquer regime de protecção social de
inscrição obrigatória.' - Vd. nº 1 do seu art. 1º,
Sendo que, nos termos do seu art. 2º, o reconhecimento desses contributos podia
ter em vista (al. a) 'o preenchimento dos prazos de garantia necessários para
concessão de pensões de invalidez, velhice e sobrevivência', ou (al. b) o
'registo de contribuições na carreira do beneficiário, por forma a completá-la,
no sentido da melhoria quantitativa das prestações que, de futuro, lhe viessem a
ser atribuídas no âmbito do sistema de segurança social português'.
Verifica-se, assim, que as preocupações que orientaram o legislador foram, por
um lado, de justiça e, por outro, de natureza social; de justiça, porque se quis
que os residentes das ex-colónias, no regresso a Portugal, não vissem
desvalorizadas as contribuições que haviam feito naqueles territórios para as
instituições de previdência ali existentes e, por isso, não sentissem que tais
contribuições tinham sido em vão; de natureza social, porque se quis que os
mesmos, à semelhança dos restantes cidadãos nacionais, também beneficiassem um
sistema de protecção social.
Mas daí não decorre – como pretende o Recorrente – que a concretização dessas
preocupações tivesse de ser feita, exclusivamente, à conta do Estado Português,
através da transferência para a Segurança Social Portuguesa dos encargos
assumidos pelas instituições de previdência das ex-colónias, pois que o que tais
normas evidenciam é que o legislador, apenas, quis que os contributos para as
citadas instituições fossem reconhecidos e valorados como se tivessem sido
prestados no âmbito do sistema de segurança social português e,
consequentemente, que não houvesse discriminação ou desigualdade no seu
tratamento.
Ou seja, e dito de outro modo, o «reconhecimento dos períodos contributivos»
verificados nas ex-colónias queria unicamente significar que esse tempo e esses
descontos deveriam ser considerados como se tivessem acontecido no Portugal
europeu.
E, se assim era, e se, em nenhum momento, o legislador quis pôr a cargo da
Segurança Social portuguesa a responsabilidade pelo pagamento das pensões
devidas pelas instituições de previdência dos novos países de língua oficial
portuguesa e se, além disso, essas prestações tinham de ser valoradas em
conjunto e em plano de igualdade com as contribuições referentes ao trabalho
prestado em Portugal, deve concluir-se que o montante da pensão devida pelas
instituições das ex-colónias deveria ser integrado na pensão que, pela
globalidade daqueles dois períodos, ficasse a cargo da segurança social
portuguesa. Nesta matéria os cidadãos regressados das ex-colónias não deviam ser
descriminados, positiva ou negativamente, em relação aos cidadãos que tivessem
feito as suas contribuições unicamente no Portugal europeu.
[…]
3. O Recorrente sustenta ainda que a sua pretensão tem, também apoio no Despacho
do Sr. Secretário de Estado da Segurança Social, de 24/2/94 – Despacho nº
16-I/SESS/94 – e que, por isso, se impõe revogar o decidido e julgar a acção
procedente.
Mas, também aqui, sem razão.
Na verdade, e desde logo, a primeira observação a fazer é a de que se a citada
legislação não confere ao Recorrente o direito que este reclama não poderia ser
o dito Despacho a, fazendo uma interpretação revogatória das suas disposições,
conferir-lho. Tanto mais quanto é certo que as suas preocupações foram de
natureza operativa e procedimental tendo em vista a actuação uniforme das
instituições de Segurança Social portuguesas no reconhecimento dos períodos
contributivos e na atribuição das pensões devidas.
E, por isso, como se demonstrou no Acórdão de 5/6/02 (rec. 267/02) que, pela sua
clareza e desenvolvimento, iremos aqui seguir, aquele Despacho não pode ter as
virtualidades e as consequências pretendidas pelo Recorrente.
Escreveu-se naquele Aresto:
'Através deste despacho, o Secretário de Estado da Segurança Social pretendeu
«definir algumas regras e procedimentos» que, na linha do determinado nos
Decretos-Leis nºs 335/90, de 29/10, 45/93, de 20/2, e 401/93, de 3/12, levassem
as instituições de segurança social a actuarem uniformemente «no reconhecimento
dos períodos contributivos e na atribuição de pensões» aos «pensionistas de
invalidez e de velhice da CPPCFB». Aparentemente, o autor do despacho supôs que
o regime decorrente daqueles diplomas legais enfermava de quaisquer
obscuridades, ao menos na sua aplicação particular aos pensionistas da CPPCFB; e
o despacho destinar-se-ia a eliminá-las, buscando uma tradução unívoca e precisa
do que o mencionado regime impunha – pois é óbvio que o despacho não poderia
contrariar a lei, que fielmente deveria servir. Ora, esta tentativa de
esclarecimento, que o mencionado despacho incorporou, aproxima-se de uma
explicação do «ignotum per ignotius», pois parece ter adensado as dúvidas sobre
uma solução legal que, como acima vimos, não as comportava. Realmente, ao dispor
que «as normas reguladoras da acumulação de pensões» seriam «aplicáveis às
pensões atribuídas por força do reconhecimento dos períodos contributivos» (nº
VIII), o Despacho nº 16-I/SESS/94 sugeriu vagamente – mais do que afirmou – que
os pensionistas na situação do ora recorrido poderiam vir a acumular duas
pensões, ambas da responsabilidade do CNP: a que lhes fosse devida pelo regime
geral português, reportada ao período contributivo verificado em Portugal, e a
que correspondesse à pensão que a CPPCFB deixara de prestar.
Contudo, esta simples sugestão não poderia fundar o direito que a acção dos
autos tendia a fazer reconhecer, já que a lei não admitia tal direito, como
«supra» constatámos, e não é admissível interpretar tal despacho de um modo
discrepante em relação ao regime legal aplicável. Diga-se ainda que o facto de o
Despacho nº 16-I/SESS/94 aludir à concessão, aos pensionistas da CPPCFB, de um
«subsídio extraordinário de apoio social de montante idêntico ao da pensão» a
que eles tinham direito por parte dessa Caixa (nº VI), não implicava que a
pensão a atribuir por via do «reconhecimento dos períodos de contribuições
pagas» para a CPPCFB tivesse de ser igual ao «quantum» do subsídio – e,
similarmente, ao da pensão em dívida por aquela Caixa. A concessão do subsídio
por aquele valor destinava-se a manter temporariamente os pensionistas nos
níveis de protecção existentes no momento em que a CPPCFB cessara os seus
pagamentos, sem que isso significasse qualquer decisão antecipada do Secretário
de Estado acerca de uma igualdade quantitativa entre os montantes das pensões
que a segurança social portuguesa haveria de atribuir e os valores em dívida por
aquela instituição estrangeira.
Para além disso, o despacho em causa nunca foi publicado no Diário da República,
pelo que nem sequer lhe pode ser reconhecida uma qualquer eficácia que proviesse
da sua força regulamentar (cfr. o art. 119º, nºs 1, al. h), e 2, da
Constituição), assumindo-se, pura e simplesmente, como uma orientação aos
serviços, apenas operante nas relações inter-orgânicas. Ademais, esse despacho
foi seguido pelo nº 65-I/SESS/94, de 19/12, do mesmo Secretário de Estado e
também não publicado, e depois, pelo Despacho Conjunto nº A-74/79-XIII, dos
Ministros das Finanças e da Solidariedade e Segurança Social, publicado na II
Série do DR de 28/4/97; e, em tais despachos, também não se tergiversou em
relação ao que a lei determinara.
[…]
4. O Recorrente afirma, ainda, que a solução consagrada no douto Acórdão
recorrido viola o principio da igualdade estabelecido no art. 13º da CRP, pois
que a atribuição de uma única pensão resultante da contabilização conjunta dos
períodos contributivos ocorridos em Angola e em Portugal consentia que um
pensionista da CPPCFB sem qualquer período contributivo em Portugal pudesse ter
uma pensão superior a outro pensionista que, em igualdade de circunstâncias no
que toca ao tempo e ao «quantum» das contribuições feitas em Angola, tivesse
feito contribuições em Portugal pelo trabalho prestado depois do seu regresso.
É uma objecção séria e impressiva, pelo que, a inexistir razão justificativa
para essa discriminação, teríamos de concluir, como o Recorrente, pela violação
do mencionado princípio constitucional, pois seria inadmissível que, de dois
pensionistas da CPPCFB em igualdade de circunstâncias em relação a essa
instituição, receba uma pensão inferior o que apresenta um acréscimo de
contribuições para a segurança social portuguesa.
Mas essa razão justificativa existe, como veremos.
Com efeito, a pensão atribuída ao Recorrente pela Segurança Social portuguesa
foi calculada de acordo com o que se estipula no nº 1 do art. 33º DL 329/93, de
25/9, isto é, tendo em conta 'o total das remunerações dos 10 anos civis a que
correspondam remunerações mais elevadas, compreendidas nos últimos 15 anos' e,
portanto, e havendo-as, nelas foram incluídas as recebidas em Portugal. O que
significa que a pensão que lhe concedida atendeu a todas as contribuições por
ele feitas, quer as realizadas em Angola quer as realizadas em Portugal. E,
porque assim, e porque as remunerações auferidas em Portugal poderiam ser
inferiores às auferidas em Angola não será surpreendente que dessa forma pudesse
resultar que a pensão atribuída ao Recorrente fosse inferior àquela que
decorreria se o período contributivo considerado fosse apenas o ocorrido para a
CPPCFB e, portanto, inferior à pensão atribuída a outros pensionistas da CPPCFB
que, embora em igualdade de circunstâncias consigo em relação àquela Caixa,
nunca trabalharam e descontaram em Portugal.
Isto é, se a lei manda que o cálculo da pensão seja feito com base nos dez
melhores salários dos últimos quinze anos é natural que os beneficiários com
melhores salários nos primeiros anos da suas carreiras possam ser prejudicados
pelo facto de a sua pensão não ser calculada com base nesses salários mas com
base nos salários dos últimos 15 anos. E, porque assim, não é anómalo que quem
viu o seu nível salarial descer nos últimos anos da sua carreira contributiva
recebe uma pensão proporcionalmente diminuída em relação às expectativas que
porventura acalentava quando auferia remunerações mais altas.
Mas esta é a solução que surge directamente do sistema de determinação de
pensões estabelecido no citado DL 329/93 e que se aplica a todos os
contribuintes do regime geral da segurança social portuguesa.
Nesta conformidade, estando matéria em causa exaustivamente regulada na lei a
Administração, ao agir neste domínio, exerce poderes estritamente vinculados.
O que significa que não podia deixar de calcular a pensão do Recorrente doutra
forma que não segundo as regras aqui aplicadas, pois que se assim não fizesse
estaria a instaurar uma flagrante diferença de tratamento entre a generalidade
dos cidadãos e um grupo especial de beneficiários da CPPCFB, em que se incluiria
o Recorrente, e, portanto, e aqui sim, a violar o princípio da igualdade.
E, porque assim, e porque, deste modo, o Recorrente foi tratado de um modo igual
a todos os demais beneficiários do sistema e porque a Administração não agiu num
espaço de liberdade relativa onde pudesse exercer um poder discricionário, não
se poderá falar na violação do principio da igualdade.
5. Finalmente o Recorrente sustenta que a interpretação que foi dada ao DL
335/90 e diplomas complementares viola o principio da excepcionalidade, uma vez
que esta legislação destinou-se a contemplar um grupo específico de pessoas com
problemas especiais e, por isso, não faria sentido confundir esta
excepcionalidade com o sistema geral e tratar as situações excepcionais como se
elas fossem gerais.
Mas não tem razão.
Com efeito, e ainda que seja certo que, como acima se referiu, a finalidade
daquela legislação fosse a de resolver os problemas de um grupo específico de
pessoas com problemas próprios, também é certo que a finalidade que motivou o
legislador foi a de colocar essa pessoas num plano de igualdade com os demais
cidadãos.
Todavia, a situação especial em que se encontravam essas pessoas não consente
que se pretenda que essa excepcional idade seja tratada de modo a que dela
resulte um injustificado benefício em relação aos restantes membros da
comunidade e, portanto, que redunde num prejuízo para estes.
E, porque assim, não existe pois qualquer violação de lei nesta matéria».
B – Fundamentação
8 – Antes de mais, cumpre acentuar que não cabe ao Tribunal Constitucional
apreciar a correcção, no plano do direito infraconstitucional, da interpretação
a que chegou o acórdão recorrido sobre o sentido dos referidos preceitos legais.
Não importa, assim, saber se o resultado interpretativo das disposições legais a
que o acórdão recorrido chegou, com base em cuja aplicação decidiu a causa,
corresponde ao melhor direito. O Tribunal Constitucional apenas poderá aferir se
o direito, tal como foi determinado pelo tribunal a quo, é não direito, por
violar disposições ou princípios constitucionais.
Nesta perspectiva, não há que apurar se a melhor interpretação das normas
constantes dos artigos 1º, 2º, 7º, n.º 3, e 8º do Decreto-Lei nº 335/90, de 29
de Outubro (com as sucessivas alterações introduzidas pelo Decreto-Lei nº 45/93,
de 20 de Fevereiro, e Decreto-Lei nº 465/99, de 5 de Novembro), artigos 1º, 2º e
3º do Decreto-Lei nº 401/93, de 3 de Dezembro, artigo 55º do Decreto-Lei nº
329/93, de 25 de Setembro, e do ponto VIII do Despacho nº 16-I/SESS/94, de 24 de
Fevereiro é aquela que postule “o reconhecimento dos períodos contributivos para
um sistema de previdência obrigatório nas ex-colónias (deve ser) autónomo ao da
carreira contributiva verificada em Portugal, gerando por si mesmo o direito a
uma pensão, a qual não pode ser confundida ou unificada no regime geral da
segurança social com a emergente das contribuições verificadas em Portugal”, mas
antes acumulada com esta.
Deste modo, têm-se por improcedentes, por insusceptíveis de fundar qualquer
juízo de constitucionalidade, todas as conclusões em que o recorrente sintetizou
o anteriormente alegado no recurso de constitucionalidade, constantes dos nºs 1
a 5 e 12, acima reproduzidas.
Por outro lado – e conquanto referidas directamente ao procedimento do Centro
Nacional de Pensões, invocado como causa de pedir na acção – apenas se atenderá,
pelas mesmas razões, ao alegado nos nºs 6 a 10 das mesmas conclusões, na medida
em que as considerações aí tecidas sejam passíveis de reportar-se à questão de
constitucionalidade, recortada no requerimento de interposição de recurso e
novamente reproduzida no n.º 11 das conclusões.
9 – A questão de constitucionalidade cinge-se, pois, em saber se a
interpretação feita pelo acórdão recorrido dos artigos 1º, 2º, 7º, n.º 3, e 8º
do Decreto-Lei nº 335/90, de 29 de Outubro (com as sucessivas alterações
introduzidas pelo Decreto-Lei nº 45/93, de 20 de Fevereiro, e Decreto-Lei nº
465/99, de 5 de Novembro), artigos 1º, 2º e 3º do Decreto-Lei nº 401/93, de 3 de
Dezembro, artigo 55º do Decreto-Lei nº 329/93, de 25 de Setembro, e do ponto
VIII do Despacho nº 16-I/SESS/94, de 24 de Fevereiro – no sentido de que eles
não atribuem, ao respectivo beneficiário, o direito a uma pensão de reforma
calculada autonomamente sobre os períodos contributivos verificados para a
CPPCFB, a cumular com uma pensão calculada sobre os períodos contributivos
ocorridos em Portugal, mas apenas o direito a que esses períodos contributivos
verificados para a CPPCFB contem para o preenchimento dos prazos de garantia
necessários para a concessão de pensões de invalidez, velhice e sobrevivência, e
para o cálculo de pensão segundo o regime geral das contribuições verificadas em
Portugal – ofende o princípio da igualdade e o “princípio da excepcionalidade”.
E porque está em causa o confronto com a Constituição do sentido normativo,
inferido segundo uma interpretação conjugada de tais preceitos,
“independentemente da determinação do valor normativo por não ter sido publicado
na forma legalmente exigida” do Despacho nº 16-I/SESS/94, de 24 de Fevereiro –
de acordo com as próprias palavras da decisão recorrida –, não há que curar,
aqui, da eventual inconstitucionalidade de tal Despacho, com base em uma
pretensa ofensa do disposto nos artigos 112º, nº 6, e 119º, nº 2, da
Constituição da República Portuguesa.
9.1. O princípio da igualdade tem sido objecto de um largo tratamento
doutrinal e jurisprudencial, maxime por parte deste Tribunal.
Entre a sua jurisprudência é de salientar, pela longa recensão efectuada,
nesses domínios, do estado questão, o Acórdão nº 232/2003, publicado no Diário
da República I Série-A, de 17 de Junho.
Escreveu-se, então, aí, o seguinte:
«Não é necessário recordar em todas as suas dimensões a abundante
jurisprudência constitucional nesta matéria (uma resenha dessa jurisprudência
pode encontrar-se in Martim de Albuquerque, Da igualdade. Introdução à
jurisprudência, Coimbra, 1993, pp. 167 e ss).
O Acórdão n.º 319/00 (in AcTC, 47º vol., pp. 497e ss), apoiando-se no Acórdão
n.º 563/96 (in AcTC, 33º vol., pp. 47 e ss), procedeu a uma síntese da
jurisprudência constitucional relativa ao princípio da igualdade. Assim:
“[O] Tribunal Constitucional teve já a oportunidade de se pronunciar diversas
vezes sobre as exigências do princípio constitucional da igualdade que, no
fundo, se reconduz à proibição do arbítrio, proibição essa que, naturalmente,
não anula a liberdade de conformação do legislador onde ele a não infrinja.
Assim por exemplo no acórdão n.º 563/96 [...] publicado em Acórdãos do Tribunal
Constitucional, 33º, pág. 47 e segs., foram assim descritas:
– O princípio da igualdade do cidadão perante a lei é acolhido pelo artigo 13.º
da Constituição da República que no seu n.º 1 dispõe, genericamente, terem todos
os cidadãos a mesma dignidade social, sendo iguais perante a lei, especificando
o n.º 2, por sua vez, que ‘ninguém pode ser privilegiado beneficiado prejudicado
privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência,
sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou
ideológicas instrução situação económica ou condição social’.
Princípio estruturante do Estado de Direito democrático e do sistema
constitucional global (cfr., neste sentido, Gomes Canotilho e Vital Moreira,
Constituição da República Portuguesa Anotada, 3ª ed., Coimbra, 1993, pág. 125),
o princípio da igualdade vincula directamente os poderes públicos, tenham eles
competência legislativa, administrativa ou jurisdicional (cfr. ob. cit. pág.
129), o que resulta, por um lado, da sua consagração como direito fundamental
dos cidadãos e, por outro lado, da ‘atribuição aos preceitos constitucionais
respeitantes aos direitos, liberdades e garantias de uma força jurídica própria
traduzida na sua aplicabilidade directa, sem necessidade de qualquer lei
regulamentadora, e da sua vinculatividade imediata para todas as entidades
públicas, tenham elas competência legislativa administrativa ou jurisdicional
(artigo 18º n.º 1 da Constituição)”(cfr. acórdão do Tribunal Constitucional n.º
186/90, publicado no Diário da República, II Série, de 12 de Setembro de 1990).
Muito trabalhado, jurisprudencial e doutrinariamente, o princípio postula que se
dê tratamento igual a situações de facto essencialmente iguais e tratamento
desigual para as situações de facto desiguais (proibindo, inversamente, o
tratamento desigual de situações iguais e o tratamento igual das situações
desiguais) – cfr. entre tantos outros e além do já citado Acórdão n.º 186/90 os
Acórdãos nºs 39/88, 187/90, 188/90, 330/93, 381/93, 516/93 e 335/94, publicados
no referido jornal oficial, I Série, de 3 de Março de 1988, e II Série, de 12 de
Setembro de 1990, 30 de Julho de 1993, 6 de Outubro do mesmo ano e 19 de Janeiro
e 30 de Agosto de 1994, respectivamente.
– O princípio não impede que tendo em conta a liberdade de conformação do
legislador se possam (se devam) estabelecer diferenciações de tratamento
‘razoável racional e objectivamente fundadas’, sob pena de, assim não sucedendo,
‘estar o legislador a incorrer em arbítrio por preterição do acatamento de
soluções objectivamente justificadas por valores constitucionalmente
relevantes’, no ponderar do citado Acórdão n.º 335/94. Ponto é que haja
fundamento material suficiente que neutralize o arbítrio e afaste a
discriminação infundada (o que importa é que não se discrimine para discriminar,
diz-nos J.C. Vieira de Andrade, in Os Direitos Fundamentais na Constituição
Portuguesa de 1976, Coimbra, 1987, pág. 299).
Perfila-se, deste modo, o princípio da igualdade como “princípio negativo de
controlo” ao limite externo de conformação da iniciativa do legislador – cf.
Gomes Canotilho e Vital Moreira ob. cit. pág. 127 e, por exemplo, os Acórdãos
nºs 157/88, publicado no Diário da República I Série, de 26 de Julho de 1988, e
os já citados nºs 330/93 e 335/94 – sem que lhe retire, no entanto, a
plasticidade necessária para, em confronto com dois (ou mais) grupos de
destinatários da norma, avalizar diferenças justificativas de tratamento
jurídico diverso, na comparação das concretas situações fácticas e jurídicas
postadas face a um determinado referencial (tertium comparationis). A diferença
pode, na verdade, justificar o tratamento desigual, eliminando o arbítrio (cfr.
a este propósito Gomes Canotilho, in Revista de Legislação e de Jurisprudência,
ano 124, pág. 327; Alves Correia O Plano Urbanístico e o Princípio da Igualdade,
Coimbra, 1989 pág. 425 e o Acórdão n.º 330/93).
Ora, o princípio da igualdade não funciona apenas na vertente formal e
redutora da igualdade perante a lei; implica, do mesmo passo, a aplicação igual
de direito igual (cfr. Gomes Canotilho, Constituição Dirigente e Vinculação do
Legislador, Coimbra, 1982, pág. 381 e Alves Correia, ob. cit., pág. 402), o que
pressupõe averiguação e valoração casuísticas da ‘diferença’, de modo a que
recebam tratamento semelhante os que se encontrem em situações semelhantes e
diferenciado os que se achem em situações legitimadoras da diferenciação.
O n.º 2 do artigo 13.º da Constituição da República enumera uma série de
factores que não justificam tratamento discriminatório e assim actuam como que
presuntivamente – presunção de diferenciação normativa envolvendo violação do
princípio da igualdade –, mas que são enunciados a título meramente
exemplificativo: cfr., v.g., os Acórdãos nºs 203/86 e 191/88, publicados no
Diário da República II Série, de 26 de Agosto de 1986 e I Série, de 6 de Outubro
de 1988, respectivamente, na esteira do parecer n.º 1/86 da Comissão
Constitucional, in Pareceres da Comissão Constitucional, vol. 1.º, pág. 5 e
segs., maxime a pág. 11. A intenção discriminatória (...) não opera, porém,
automaticamente, tornando-se necessário integrar a aferição
jurídico-constitucional da diferença nos parâmetros finalístico, de
razoabilidade e de adequação pressupostos pelo princípio da igualdade’».
Por outro lado – e na perspectiva da solução do caso concreto – importa,
também, acentuar que “na comparação de igualdade, o termo a quo é sempre
relacionado com o termo ad quem através do um “tertium comparationis” (cf.
Fernando Alves Correia, O Plano Urbanístico e o Princípio da Igualdade, Coimbra,
1989, pp. 397/398).
9.2. Para o recorrente a interpretação acolhida pelo acórdão recorrido
ofenderia o princípio da igualdade, porque conduziria a “diferenças de
resultado” entre os beneficiários dos sistemas de previdência das ex-colónias,
levando a que: “beneficiários que apenas descontaram para um sistema de
segurança social das ex-colónias [tenham] têm direito a receber pensão de
invalidez ou velhice de valor muito superior à daqueles beneficiários que além
de terem descontado para um sistema de previdência de um país africano de
expressão de língua oficial portuguesa também descontaram para a segurança
social portuguesa”; “carreiras contributivas de cerca de dez anos [impliquem]
implicariam o direito a uma pensão muito superior à da de que [advém] adviria de
carreiras contributivas de quarenta e mais anos, com a diferença de que estas
assentariam em descontos para a segurança social [de Portugal continental] e
para sistemas de previdência das ex-colónias”.
Segundo o recorrente, “o princípio da igualdade impõe que os mesmos anos de
carreira contributiva com iguais remunerações produzam iguais pensões”.
A tal tese, o acórdão recorrido respondeu que o tempo de contribuições
efectuado para a CPPCFB, em Angola, entretanto tornado país independente, foi
relevado pelo legislador de tais preceitos como tendo sido efectuado em Portugal
para o efeito, quer do preenchimento dos prazos de garantia necessários para a
concessão das pensões de invalidez, velhice e sobrevivência, quer do cômputo da
pensão de reforma, fazendo-o equivaler, em tudo, mas sem prejuízo da
contabilização dos seus custos financeiros, tendo em vista o apuramento da
responsabilidade financeira das instituições dos países de língua oficial
portuguesa” (DL. n.º 401/93), às contribuições por serviço prestado em Portugal
continental, e que não haveria qualquer desigualdade de tratamento, porque, na
sua determinação da pensão de reforma, se seguiu exactamente o mesmo critério
legal para todos os contribuintes, fossem as contribuições feitas em Angola,
fossem realizadas em Portugal, critério esse, no caso, constante do art. 33º do
Decreto-Lei n.º 329/93, de 25 de Setembro.
Resulta do que vem de ser exposto que o legislador relevou, perante o regime
geral de segurança social de Portugal, por razões de justiça e de natureza
social, o tempo de contribuições e respectivo valor, feitos para as instituições
de previdência social dos países africanos de língua oficial portuguesa,
tornados, entretanto, independentes. E relevou-o, quer para efeitos do
preenchimento dos prazos de garantia necessários para a concessão das pensões de
invalidez, velhice e sobrevivência, quer para os efeitos da determinação do
direito à pensão e ao seu cômputo, mesmo que através de revisão para melhoria
das mesmas.
Trata-se, como é evidente, de um direito concedido a título excepcional, pois
que significou a atribuição de responsabilidade financeira a instituições que
não tinham sido beneficiárias do respectivo financiamento, corporizado no
recebimento das respectivas contribuições.
A subordinação do direito dos beneficiários de instituições de previdência
social dos países africanos de língua oficial portuguesa, como os abrangidos
pela CPPCFB, por parte do legislador do Decreto-Lei n.º 335/90 e dos sucessivos
diplomas que o alteraram, à regra constante do art. 55º do Decreto-Lei n.º
329/93, de 25 de Setembro, relativa à definição das situações em que se
considera permitida a acumulação de pensões, não é, por qualquer jeito,
susceptível de ofender o princípio da igualdade.
Dispõe esta norma o seguinte:
“É permitida a acumulação de pensões de invalidez e de velhice do regime
geral com pensões de outros regimes de protecção social de enquadramento
obrigatório, nos termos previstos em diploma próprio”.
Ora, o valor jurídico atribuído pelo legislador nacional às contribuições
pagas e ao período de descontos efectuados para as instituições de previdência
de países africanos de língua oficial portuguesa assentou não na consideração
dessas contribuições dizerem ou deverem ser tidas como dizendo respeito a outros
regimes nacionais diferentes do regime geral, de protecção social de
enquadramento obrigatório, mas antes na circunstância de, pelas razões de
justiça e de natureza social, tais contribuições deverem ser tratadas como tendo
sido efectuadas perante o sistema nacional de segurança social obrigatória.
A regra de valoração adoptada pelo legislador nacional foi, pura e
simplesmente, a de fazer equivaler as contribuições feitas em país africano de
língua oficial àquelas que haviam sido realizadas em Portugal ou seja, o
legislador seguiu um princípio de não permissão de qualquer discriminação
positiva ou negativa, seja em relação a quem havia descontado para aquelas
instituições de previdência de países africanos, seja em relação a quem
descontara para o sistema nacional.
Dentro de uma tal conformação normativa do direito à pensão de reforma, fica
afastada a possibilidade da existência de uma qualquer discriminação ou
desigualdade em relação a qualquer das duas categorias de beneficiários.
Daí que nunca possa ocorrer uma situação de desigualdade.
Em rectas contas, o que o recorrente defende é que o legislador nacional
devesse atribuir uma outra relevância às contribuições pagas para as
instituições de previdência de países africanos de língua oficial portuguesa,
diferente da que é atribuída no sistema de segurança social obrigatória
portuguesa aos beneficiários que sempre descontaram para esse sistema,
tratando-as como havendo sido feitas para “outros regimes de protecção social de
enquadramento obrigatório”, segundo o sistema português. Tal corresponderia,
todavia, ao reconhecimento da criação normativa de um outro benefício acrescido:
o de ter o legislador criado, dentro do sistema no sistema de segurança social
português, e em termos diferentes daqueles que a ele estavam originariamente
sujeitos, um regime próprio e específico, susceptível de fundar uma acumulação
de pensões, tendo em vista beneficiar apenas quem havia descontado para a
CPPCFB.
É claro que essa poderia ter correspondido a uma outra opção
normativo-constitutiva, acrescida, do legislador nacional, fundada nas razões
excepcionais que o levaram a legislar. Mas essa é uma outra questão que
extravasa o objecto do recurso, porque referida ao plano de jure constituendo,
que não tem de ser aqui analisada. O que seguramente não ofende o princípio da
igualdade é a subordinação ao mesmo regime de segurança social existente ao
tempo, nomeadamente às suas regras de acumulação de pensões, de quem nem sequer
estava incluído nele e só o foi por razões de justiça material e de natureza
social, como é o caso dos beneficiários da CPPCFB.
E sendo as regras as mesmas para todos os beneficiários da CPPCFB não poderá
ocorrer desigualdade de tratamento.
A excepcionalidade das razões que motivaram o legislador a prever a
atribuição de uma pensão aos beneficiários da CPPCFB nos mesmos termos que
acontecem com os beneficiários do regime geral de segurança social português de
enquadramento obrigatório, quando aqueles não podiam, sequer, aspirar a ela, de
acordo com o regime de previdência a que estavam sujeitos, não postula
necessariamente que houvesse de ser reconhecido também aos mesmos um direito que
aos beneficiários deste não estava reconhecido na legislação ao tempo da
equiparação das contribuições e cuja existência, para aqueles, só poderia ser
afirmada se o legislador houvesse igualmente erigido o regime jurídico da CPPCFB
à natureza de “um outro regime de protecção social de enquadramento obrigatório”
do sistema português.
Não é possível afirmar, aqui, a existência de uma razão material que obrigue
a tratar de forma diferente dos beneficiários do regime geral de segurança
social de enquadramento obrigatório aqueles beneficiários que estavam até
excluídos do sistema de segurança social português, como eram aqueles que
estavam abrangidos pela CPPCFB.
Pretexta, o recorrente que a solução adoptada pelo legislador pode determinar
que “beneficiários que apenas descontaram para um sistema de segurança social
das ex-colónias [tenham] têm direito a receber pensão de invalidez ou velhice de
valor muito superior à daqueles beneficiários que além de terem descontado para
um sistema de previdência de um país africano de expressão de língua oficial
portuguesa também descontaram para a segurança social portuguesa”; “carreiras
contributivas de cerca de dez anos [impliquem] implicariam o direito a uma
pensão muito superior à da de que [advém] adviria de carreiras contributivas de
quarenta e mais anos, com a diferença de que estas assentariam em descontos para
a segurança social [de Portugal continental] e para sistemas de previdência das
ex-colónias”.
Antes de mais importa anotar que esta alegação do recorrente nunca poderia
fundar uma inconstitucionalidade dos preceitos em causa enquanto interpretados
no sentido de que eles não atribuem, ao respectivo beneficiário, o direito a uma
pensão de reforma calculada autonomamente sobre os períodos contributivos
verificados para a CPPCFB, a cumular com uma pensão calculada sobre os períodos
contributivos ocorridos em Portugal ou seja, a inconstitucionalidade de uma
solução que não admita a existência de pensões cumuladas.
A inconstitucionalidade residiria, aqui, na circunstância de os beneficiários
da CPPCFB poderem, com iguais condições de descontos para tal Caixa, vir a obter
pensões de reforma diferentes e até de montante inferior. Trata-se de uma outra
dimensão normativa de tais preceitos, quando interpretados, agora,
conjugadamente com a norma do artigo 33º do referido Decreto-Lei n.º 329/93,
norma esta que define a remuneração de referência para efeitos de cálculo das
pensões de invalidez e de velhice, mas que não constitui objecto do recurso de
constitucionalidade (Dispõe essa norma que “1 – A remuneração de referência para
efeitos de cálculo das pensões de invalidez e de velhice é definida pela fórmula
R/140 em que R representa o total das remunerações dos 10 anos civis a que
correspondam remunerações mais elevadas, compreendidos nos últimos 15 anos com
registo de remunerações”).
De qualquer modo, sempre se dirá que o discurso da decisão recorrida a este
propósito seria inteiramente de acompanhar. Independentemente de saber-se se, em
concreto, tal resultado poderá ocorrer, a sua admissibilidade, em abstracto, só
será concebível a partir do vício de isolar do todo, na aplicação do critério
geral definido para o cálculo das pensões de reforma de todos os beneficiários
(seja dos beneficiários da CPPCFB entre si, seja entre estes e os do sistema
geral de segurança social português), certo segmento do tempo contributivo: no
caso, o verificado para a CPPCFB.
C – Decisão
10 – Destarte, atento tudo o exposto, o Tribunal Constitucional decide negar
provimento ao recurso.
Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 20 UCs.
Lisboa, 8 de Março de 2006
Benjamim Rodrigues
Mário José de Araújo Torres
Maria Fernanda Palma
Paulo Mota Pinto
Rui Manuel Moura Ramos