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Processo n.º 48/06
3ª Secção
Relatora: Conselheiro Maria dos Prazeres Pizarro Beleza
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
1. A flls. 91 foi proferida a seguinte decisão sumária :
«1. Por acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 14 de Julho de
2005, de fls. 65 e seguintes, foi negado provimento aos recursos interpostos por
A., Lda., do despacho do 1º Juízo do Tribunal Tributário de 1ª Instância do
Porto de 9 de Julho de 2003, de fls. 18, que indeferiu a produção de prova
testemunhal, e da sentença do mesmo Tribunal de 27 de Fevereiro de 2004, de fls.
30 e seguintes, que julgou improcedente a oposição à execução contra si movida
pela Fazenda Nacional por dívidas de contribuições ao Instituto de Gestão
Financeira da Segurança Social, Delegação de Coimbra, referente ao ano de 2000,
no montante de € 2.306,21.
Quanto ao referido despacho, o acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte,
na parte que agora releva, afirmou o seguinte:
“Finalmente, no que tange à violação do artigo 20º da C. R. P. (que estabelece o
princípio geral do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efectiva), não
demonstra a recorrente, nas suas alegações de recurso, como terá o despacho
recorrido, nos termos em que foi proferido, violado tal preceito constitucional,
o que impede o Tribunal de sobre ele se pronunciar, atento a que «o recorrente,
no momento processual em que questiona a conformidade constitucional de uma dada
norma, tem de fornecer a mínima justificação para a inconstitucionalidade que
invoca» - cfr. Ac. do T.C. de 22/5/96 in BMJ 457º-95.
De qualquer forma refira-se que esse preceito constitucional não fica
prejudicado pelo facto de a lei ordinária impor determinadas restrições ou
limites aos meios de prova admissíveis em certos casos, pois que essa
inconstitucionalidade só sucederia se fossem proibidos todos os meios de prova
ou se fosse proibido determinado meio de prova quando mais nenhuma, pela
natureza da situação, pudesse ser usado, o que não acontece no caso vertente,
pois que a oponente podia e devia ter utilizado a prova documental para
demonstração do alegado pagamento.”
E em relação à sentença da 1ª instância pronunciou-se nestes termos:
“E apesar de a recorrente invocar na conclusão 9ª a violação dos «artigos 20º,
22º, 52º, 209º, 212º, 266º, 267º, 268º e 271º da Constituição da república
Portuguesa», o certo é que omite por completo a substanciação dessa
inconstitucionalidade no corpo das respectivas alegações de recurso,
limitando-se a indicar os princípios que foram violados, mas não aduzindo as
razões de facto e de direito que, no seu ponto de vista, suportam a invocada
inconstitucionalidade, o que evidentemente impede este Tribunal de conhecer da
invocada inconstitucionalidade.”
2. A., Lda. veio, então, interpor recurso do acórdão do Tribunal Central
Administrativo Norte para o Tribunal Constitucional, “nos termos dos artºs 69º,
70º, n.º 1, alínea b), e 72º, n.º 2, da Lei do Tribunal Constitucional, por
entender que se está a cometer uma inconstitucionalidade / ilegalidade suscitada
no processo nas alegações proferidas para o Tribunal Central Administrativo
Norte”.
Nos termos do requerimento de interposição do recurso, tal
“inconstitucionalidade / ilegalidade” consistiria
“na não aplicação de todos os preceitos legais de direito processual constante
do Código de Processo Civil, aplicável à relação jurídica tributária por força
do Código de Procedimento e de Processo Tributário, que conduzem à audição das
testemunhas oportunamente arroladas.
A sua proibição ofende as tarefas fundamentais do Estado impressas no artº 9º da
Constituição, o princípio da igualdade do seu artº 13º, o regime do artº 17º, a
proibição do artº 19º, o n.º 1 do artº 20º e o princípio do contraditório na
justiça e ainda os artºs 203º e 204º, todos do Diploma Fundamental.”
O recurso foi admitido, por decisão que não vincula este Tribunal (nº 3 do
artigo 76º da Lei nº 28/82).
3. O Tribunal Constitucional não pode, no entanto, conhecer do presente recurso,
uma vez que a recorrente não lhe coloca qualquer questão de constitucionalidade
normativa susceptível de ser apreciada no âmbito do recurso que interpôs.
Diferentemente, a recorrente limita-se a censurar a decisão recorrida, por
entender que não aplicou “todos os preceitos legais de direito processual
constante do Código de Processo Civil, aplicável à relação jurídica tributária
por força do Código de Procedimento e de Processo Tributário, que conduzem à
audição das testemunhas oportunamente arroladas”, o que, seu modo de ver,
conduziria à violação das normas da Constituição que indica.
Note-se, aliás, que o mesmo se verificou nas alegações que apresentou no recurso
interposto das decisões da primeira instância, nas quais afirmou que “a atitude
tomada pelo despacho recorrido representa uma ilegalidade e uma
inconstitucionalidade por ofensa directa ao artigo 20º da Constituição” (cfr.
fls. 24), ou ainda que “à Administração, incluindo o Instituto de Gestão
Financeira, compete actuar dentro dos princípios dos artigos 3º e seguintes do
Código de Procedimento administrativo e dos artigos 20º, 22º, 52º, 209º, 212º,
266º, 267º, 268º e 271º da Constituição da República Portuguesa” (cfr. fls. 44
verso), sem, de resto, fundamentar minimamente tais alegadas violações.
Nunca teria, assim, cumprido o ónus de suscitar a inconstitucionalidade 'durante
o processo', como exige a alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei nº 28/82.
Ora, o recurso de fiscalização concreta da constitucionalidade destina-se a que
este Tribunal aprecie a conformidade constitucional de normas, ou de
interpretações normativas, que foram efectivamente aplicadas na decisão
recorrida e não das próprias decisões que as apliquem. Assim resulta da
Constituição e da lei, e assim tem sido repetidamente afirmado pelo Tribunal
(cfr., a título de exemplo, os acórdãos n.ºs 612/94, 634/94 e 20/96, publicados
no Diário da República, II Série, de 11 de Janeiro de 1995, 31 de Janeiro de
1995 e 16 de Maio de 1996, respectivamente).
4. Estão, portanto, reunidas as condições para que se proceda à emissão da
decisão sumária prevista no nº 1 do artigo 78º-A da Lei nº 28/82, de 15 de
Novembro.
Nestes termos, decide-se não conhecer do objecto do recurso.
Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 8 ucs. ».
2. Inconformada, a recorrente reclamou para a conferência, ao abrigo do disposto
no nº 3 do artigo 78º-A da Lei nº 28/82, 'a fim de ser proferido acórdão no
sentido de se saber se são e foram cumpridos os passos determinados no artº 78-A
da Lei do Tribunal Constitucional', já que entende 'que não deve aplicar-se o
n.º 1 deste preceito legal, devendo a conferência decidir e ordenar o
prosseguimento dos autos'.
Notificada para o efeito, a recorrida não se pronunciou.
3. A reclamante não expõe nenhum argumento para apoiar a reclamação que
apresentou.
Assim, nada mais há a fazer senão reiterar o julgamento de não conhecimento do
recurso, pelos motivos constantes da decisão reclamada.
4. Nestes termos, indefere-se a reclamação, confirmando-se a decisão de não
conhecimento do objecto do recurso.
Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 ucs.
Lisboa, 23 de Março de 2006
Maria dos Prazeres Pizarro Beleza
Vítor Gomes
Artur Maurício