Imprimir acórdão
Processo n.º 730/04
2.ª Secção Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues
Acordam, em conferência, no Tribunal Constitucional:
A – Relatório
1 – A. e mulher reclamam para a conferência, ao abrigo do disposto no art.º 78º-B, n.º 2, da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual versão
(LTC), do despacho proferido pelo relator no Tribunal Constitucional, o qual decidiu indeferir a reclamação por eles deduzida contra a liquidação pela secretaria da multa a que se refere o art.º 145º, n.ºs 5 e 6, do Código de Processo Civil.
2 – Fundamentando a reclamação alegam o seguinte:
«1. «Antes de mais, olhemos para a data do registo da carta onde a secretaria notifica o signatário deste último despacho de Vossa Excelência - 04.10.13.
2. Olhando para o calendário, vemos que o terceiro da dilação legal recai a 16, que é um sábado.
3. Apliquemos, agora, a regra do art. 254°-2 do CPC, a estabelecer que a notificação postal (aos mandatários) presume-se feita no terceiro dia posterior ao do registo, ou no primeiro dia útil seguinte a esse, quando o não seja.
4. Não podemos deixar de concluir que o despacho prolatado em
04.10.12, apenas nos foi notificado no dia 18 do corrente mês e ano, por ser esse o primeiro dia útil seguinte ao termo final da dilação prevista neste normativo.
5. Ora, a termos de contar o prazo como se fez na secretaria, isto é, se efectivamente, devêssemos considerar o signatário notificado do douto despacho que antecede em 16, o primeiro dia da contagem do prazo para do mesmo reclamarmos iniciar-se-ia logo em 18.
6. E, manifestamente, NÃO É ISSO QUE VEM PRESCRITO no citado normativo. Esse prazo inicia-se apenas, em 19, porque o dia 18 é, repetimos, o da data da sua notificação ao advogado, de outra forma, em mais de trinta anos que levamos de exercício forense, não faríamos outra coisa senão passar a vida a reclamar. E esta é, Exmo Conselheiro-Relator, a primeira vez que nos confrontamos com uma situação deste género que, dizemo-lo com respeito, viola a lei e, ex vi do art. 205°-1, a própria CRP
7. Na verdade, aplicando-se, agora, ao caso subjudice o disposto no citado art. 254°-2 do CPC, torna-se sem dúvida mais clara a prescrição do art.143°-1 do CPC, no sentido de que, efectivamente, não se praticam actos processuais nos dias em que os tribunais estiverem encerrados, nem durante o período de férias judiciais.
8. Assim, é irrecusável que, da conjugação do disposto no art. 279°- e) do Código Civil com as normas dos arts 143°- 1 e 144°-2 do CPC, resulta a conclusão de que a notificação em mérito só se considera regularmente feita na pessoa do advogado signatário no dia 15 de Setembro, primeiro dia útil seguinte ao termo final das férias judiciais.».
3 – Os reclamados não responderam.
4 – O despacho reclamado tem o seguinte teor:
«1- Os recorrentes A. e mulher requerem que se dê sem efeito a liquidação da multa a que se refere o n.º 5 do art.º 145º do Código de Processo Civil (CPC) praticado pela secção de processos, correspondente à prática do acto no primeiro dia útil após o termo do prazo, sob fundamento de que o acto de notificação da decisão sumária efectuado em 15 de Julho de 2004 constitui um acto não abrangido pela excepção do n.º 2 do art.º 143º do CPC, na medida em que não se insere na categoria de actos destinados a evitar dano irreparável, e que, sendo assim, a notificação só se pode ter por feita em 15 de Setembro de 2004, nos termos das disposições combinadas dos art.ºs 279º, alínea e) do Código Civil e 144º, n.º 2 do CPC.
2 – O pedido não pode, porém, ser deferido. Com efeito a notificação de uma decisão judicial está abrangida na hipótese ou previsão do n.º 2 do art.º 143º do CPC, precisamente sob o conceito e o termo verbal de “notificações”, categoria esta diferente daquela outra que o legislador agrupa sob os termos “e os actos que se destinem a evitar dano irreparável”.
3 – Deste modo o primeiro dia do prazo para praticar o acto processual da reclamação da decisão sumária foi o dia 15 de Setembro de 2004 e o prazo terminou no dia 24 do mesmo mês. Assim, porque os dias 25 e 26 recaíram, respectivamente, em sábado e domingo, o primeiro dia útil após o termo do prazo foi o dia 27 do mesmo mês, dia esse em que o acto foi praticado. Assim sendo, é devida a multa liquidada, não obstando ao seu pagamento o facto de os recorrentes litigarem com o benefício do apoio judiciário, já que provém de acto cujo efeito “sancionatório processual” poderiam ter evitado.
Notifique.».
B – Fundamentação
6 – A reclamação não abala minimamente a fundamentação do despacho reclamado que aqui se reitera.
A argumentação do reclamante desconsidera totalmente o disposto no n.º 2 do art.º 143º do CPC, fazendo erradamente equivaler os dias não úteis que o art.º 254º, n.º 2, do CPC manda desconsiderar para efeitos de presumir efectuada a notificação no caso em que o terceiro dia posterior ao do registo recaia neles aos dias úteis ocorridos durante as férias judiciais cuja relevância para efeitos de poder ser efectuada a notificação (da decisão sumária) é ressalvada no n.º 2 do art.º 143º do CPC.
Não implicando a recepção da carta registada enviada ao mandatário judicial para notificação de qualquer decisão judicial não sujeita a tramitação urgente a prática pelo mesmo mandatário de actos processuais (apresentação de articulados ou outros requerimentos) não urgentes, antes correspondendo a uma simples tarefa administrativa do seu estabelecimento (escritório) que pode ser levada a cabo por qualquer pessoa do mesmo, não se vê qualquer razão para que, em paralelo com o que se passa com os demais estabelecimentos cuja actividade não respeite à prestação de serviços de procuradoria forense que podem receber notificações e citações em férias judiciais, de acordo com o disposto no n.º 2 do art.º 143º do CPC, e com os próprios tribunais em que os funcionários e magistrados continuam a trabalhar garantindo, no mínimo, o serviço urgente, não deva o escritório do advogado receber as notificações efectuadas em dias úteis das férias judiciais. Como estabelecimento que é deve assegurar o seu funcionamento nos dias úteis. Coisa absolutamente diferente é a dispensa (não exigência legal) de prática de actos processuais pelos mandatários judiciais em férias judiciais, em cuja categoria não se inclui o recebimento de uma notificação de decisão judicial enviada em cumprimento da lei pelos funcionários judiciais, exigência aquela que, perspectivada para poder garantir aos mandatários judiciais o gozo de férias, já não justifica o não recebimento das notificações. É que, como em qualquer outro estabelecimento, o seu funcionamento, nesta concreta dimensão, pode ser assegurado por diferentes funcionários e pessoas durante o período de férias, organizando-se as férias destes durante o ano tendo em conta tal realidade económico-jurídica (cfr., neste exacto sentido, entre outros, os acórdãos do STA, de 2/5/2001, proc. n.º
025869, em www.dgsi/pt/jsta, e do STJ, de 23/01/2003, proc. n.º 02B4291, disponível em www.dgsi/pt/jstj).
C – Decisão
7 – Destarte, atento tudo o exposto, o Tribunal Constitucional decide indeferir a reclamação.
Custas pelos reclamantes com taxa de justiça que se fixa em 20 UC.
Lisboa, 21 de Dezembro de 2004
Benjamim Rodrigues Maria Fernanda Palma Rui Manuel Moura Ramos