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Processo nº 1003‑A/98
2ª Secção
Relatora: Conselheira Maria Fernanda Palma
Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional
I
Relatório
1. Nos presentes autos foi, por via do Acórdão nº 58/2000, tirado traslado.
É do seguinte teor o referido Acórdão:
1. Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade vindos
do Supremo Tribunal Administrativo, em que figura como recorrente A. e como
recorrido o Presidente do Tribunal Central Administrativo, o Tribunal
Constitucional proferiu o Acórdão nº 475/99, de 14 de Julho, não tomando
conhecimento de parte do objecto do recurso e negando provimento na parte em que
conheceu.
O recorrente arguiu a nulidade do Acórdão nº 475/99, deduzindo,
concomitantemente, um pedido de apoio judiciário.
O pedido de apoio judiciário foi indeferido por despacho da relatora de 18 de
Outubro de 1999, do qual o recorrente reclamou para a Conferência.
O Tribunal Constitucional, por Acórdão de 10 de Novembro de 1999 (Acórdão nº
619/99), indeferiu a arguição de nulidade, confirmando o Acórdão nº 475/99. O
Tribunal, no Acórdão nº 658/99, de 7 de Dezembro, confirmou o despacho que
indeferiu o pedido de apoio judiciário.
2. O recorrente arguiu, de novo, a nulidade do Acórdão nº 475/99, tendo
arguido, também, a nulidade do Acórdão nº 658/99.
Antes de se proceder à apreciação dos requerimentos de fls. 200 e ss. E de fls,
186 e ss., cumpre submeter os autos à Conferência, nos termos dos artigos 720º
do Código de Processo Civil, e 84º, nº 8, da Lei do Tribunal Constitucional, em
virtude de se verificar que o recorrente, com os sucessivos requerimentos
apresentados, repetindo pedidos anteriormente deduzidos e decididos, visa obstar
ao trânsito em julgado da decisão do presente recurso, bem como à baixa do
processo e ao cumprimento da decisão proferida.
3. Assim, decide-se tirar traslado com as seguintes peças:
- Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de fls. 81 e ss.;
- Requerimento de fls. 100;
- Alegações de fls. 105 e ss.;
- Acórdão nº 475/99 (fls. 126 e ss.);
- Requerimento de fls. 148 e ss. (e documentos juntos);
- Visto do Ministério Público de fls.168 v.;
- Resposta de fls. 170 e 171;
- Despacho de fls. 173;
- Requerimento de fls. 176 e ss.;
- Acórdão nº 619/99 (fls. 181 e ss.);
- Requerimento de fls. 186 e ss.;
- Acórdão nº 658/99 (fls. 194 e ss.);
- Requerimento de fls. 200 e ss.;
- Presente Acórdão.
De seguida, sigam os autos os seus termos, ao abrigo dos artigos 720º do Código
de Processo Civil, e 84º, nº 8, da Lei do Tribunal Constitucional.
O requerimento de fls. 186 e ss. referido no aresto tem o seguinte teor:
A., juiz do Tribunal Central Administrativo, residente na Rua …, nº .., …,
….Lisboa, recorrente no processo referenciado,
vem arguir a nulidade resultante da omissão de pronúncia, para o que invoca o
seguinte:
Introdução
1. Foi o recorrente notificado do Acórdão nº 619/99, de 10.11.99, pelo qual se
decidiu que “uma vez que a opinião do recorrente já constava dos autos, de modo
claro e preciso, afigurou-se manifestamente desnecessário (artigo 3º, nº 3, do
Código de Processo Civil) ouvi-lo de novo sobre a verificação, no caso concreto,
dos pressupostos processuais de recurso de constitucionalidade”.
2. Escreve o legislador no preâmbulo do Decreto-Lei nº 329-A/95, de 12 de
Dezembro, diploma reformador do processo civil, que se prescreve, “como
dimensão do princípio do contraditório, que ele envolve a proibição da prolação
de decisões surpresa, não sendo lícito aos tribunais decidir questões de facto
ou de direito, mesmo do conhecimento oficioso, sem que previamente haja sido
facultada às partes a possibilidade de sobre elas se pronunciarem”.
3. Por outro lado, só nos casos excepcionais previstos na lei se podem tomar
providências contra determinada pessoa sem que esta seja previamente ouvida –
art. 3º, nº 2, do CPC, ex vi o artº 69º da LTC.
4. Acresce que é a dimensão equitativa do processo - garantida pelo art. 20º, nº
5, da Constituição, acompanhando a jurisprudência do Tribunal Europeu dos
Direitos do Homem relativa ao artº 6º da CEDH (assim, Acórdão do Tribunal
Constitucional nº 345/99) - que o Tribunal Constitucional agora vem negar, como
que responsabilizando o recorrente por ter suscitado uma questão prévia “à qual
deu de imediato resposta”.
5. Afigura-se absurdo pretender que o recorrente tenha “como que suscitado uma
questão prévia à qual deu de imediato resposta”, na medida em que se está a
afirmar que o recorrente litiga contra si próprio, à maneira de um Dr JehkiIl/Mr
Hide.
6. Não obstante considerar-se a opinião do recorrente - sobre um entendimento do
Tribunal Constitucional que obsta a uma decisão de mérito - inútil!!!, sempre se
dirá que o juiz tem um dever específico de se esclarecer, já que a lei lhe
faculta interpelar as partes, convidando-os a fornecer esclarecimentos sobre a
matéria de direito que se afigurem pertinentes – art. 266º, nº 2, do CPC - ou a
aperfeiçoar as conclusões da alegações apresentadas - artºs 690º, nº 4, e 701º,
nº 1, do CPC.
7. E, é um facto que o Acórdão nº 475/99, de 14.7.99, se encontra eivado de
juízos de falta de clareza sobre a forma como o recorrente apresentou a questão,
e de não apreensão da argumentação:
“[...] O recorrente, nos presentes autos, só invocou a inconstitucionalidade das
normas referidas (e mesmo aí, de modo pouco claro) no requerimento de
interposição do recurso de constitucionalidade.
[...] por um lado, não se apreende, das alegações do recorrente, qual é a norma
ou dimensão normativa impugnada.
[...]
Da sua conjugação e do confronto das mesmas com a decisão recorrida e com as
alegações apresentadas não resulta qualquer dimensão normativa precisa
imediatamente apreensível cuja conformidade à Constituição cumpra apreciar, e
que não devesse ter sido explicitamente formulada pelo recorrente para que o
Tribunal Constitucional dela possa tomar conhecimento.
[...]
Ora, mais uma vez, das alegações de recurso apresentadas não se apreende qual é
a dimensão normativa resultante da conjugação dos referidos preceitos que o
recorrente considera inconstitucional.
[...]
O recorrente (de modo, aliás, pouco claro) impugna, assim, a norma que permite a
realização das eleições no décimo quinto dia a contar da data de início de
funcionamento do tribunal. [...]” - sublinhados nossos.
8. Não deixa de ser irónico que o recorrente nas alegações, seja,
simultaneamente, tão pouco claro na explanação da inconstitucionalidade, e que
dê resposta “de modo claro e preciso” à como que questão prévia.
Omissão de pronúncia I
9. Refere o Acórdão nº 475/99:
“5º O recorrente pretende que o Tribunal Constitucional aprecie a conformidade à
Constituição das normas contidas nos artigos 123º, nº 2, alínea d), 124º, nº 1,
alíneas a), b) e c) e 125º, nºs 1 e 2, do Código do Procedimento Administrativo.
A questão de constitucionalidade relativa a estes preceitos prende-se com a
alegada falta de fundamentação do despacho de 1 de Outubro de 1997. O recorrente
sustenta que foi violado o artigo 268º, nº 3, da Constituição.
[...]
O recorrente, nos presentes autos, só invocou a inconstitucionalidade das normas
referidas (e mesmo aí, de modo pouco claro) no requerimento de interposição do
recurso de constitucionalidade. Com efeito, e como aliás é reconhecido pelo
próprio nas alegações do recurso de constitucionalidade, antes só imputou o
vício de inconstitucionalidade à própria decisão, e nunca a uma dada norma
jurídica.
[...]
Nessa medida, e uma vez que o recorrente invoca desde o início do processo a
falta de fundamentação do despacho de 1 de Outubro de 1997 (pelo que o sentido
da decisão recorrida não se afigura objectivamente imprevisível), há que
concluir que não foi suscitada durante o processo a questão de
constitucionalidade relativa às referidas normas do Código do Procedimento
Administrativo, pelo que não se tomará conhecimento do objecto do recurso nessa
parte.”
10. Disse o recorrente nas alegações de recurso para o Pleno da 1ª Secção do
STA, artº 83 e ss:
“O Despacho de 1.10.97 do Sr Presidente em exercício do Tribunal Central
Administrativo, que recaíu sobre o requerimento (direito de petição) do
recorrente de 30.9.97, assenta em erro nos pressupostos de direito, já que estão
em causa direitos fundamentais de acesso electivo a cargo público e de
co-participação na gestão da coisa pública, mostrando-se ainda carecido de
fundamentação, pelo que violador do disposto nos artº 268º, nº 3, da
Constituição da República Portuguesa, artº 123º, nº 2, alínea d), artº 124º, nº
1, alíneas a), b), e c), e artº 125º, nºs 1 e 2, todos do CPA.
Na verdade, o Despacho de 1.10.97 do Sr Presidente nega direitos do recorrente,
decide reclamação apresentada pelo recorrente, e decide em contrário de
pretensão formulado pelo recorrente, pelo que constitucionalmente carece de
fundamentação nos termos do art. 268º, nº 3, da Constituição.
Na verdade, considerar unicamente “porque só estão em causa juízos de
oportunidade e conveniência, que não a violação de qualquer norma e, porque em
meu entender não são atendíveis indefiro o pedido”, e não explicar que juízos de
oportunidade e conveniência são esses, como se verificam, e porque não são de
atender, é o mesmo que nada dizer - sendo certo que o Sr Dr B. é interessado no
resultado da eleição, que preordenou e que o veio a eleger.
A não ser assim, de que forma pode o recorrente solicitar a tutela jurisdicional
efectiva contra aquele acto violador dos seus direitos: como poderá o
recorrente invocar o desvio de poder, por exemplo, já que o Sr Presidente
remeteu o acto para o exercício dos poderes discricionários?
Por isso não colhe a argumentação do Acórdão recorrido de que o contencioso
eleitoral é de plena jurisdição (artº 61º da LPTA). sendo “indiferente saber
qual o fundamento ou fundamento por que tal data não foi adiada por decisão do
presidente do colégio em causa, contrariando pretensão do mesmo recorrente”.”
11. Nas alegações produzidas no Tribunal Constitucional, disse, nos artºs 68º e
ss:
“Violação do art. 268º, nº 3, da Constituição
Invocando o disposto nos artºs 124º, alínea c), e 125º, nºs 1 e 2 (a menção do
nº 3 traduz lapso manifesto face ao contexto), do CPA com referência ao artº
268º, nº 3, da Constituição, o acórdão recorrido, considera, nomeadamente:
“Assim, pelo que respeita à rejeição da argumentação desenvolvida pelo
recorrente no requerimento respectivo para marcação de nova data em momento
posterior, que surge referenciada a juízo que teve em consideração a existência
de um largo consenso entre os eleitores quanto à razoabilidade da designação
feita da data das eleições e o quadro normativo que a rege. Não ficaram, pois,
por determinar as razões que conduziram a entidade recorrida a tomar aquela
decisão, que está, portanto. fundamentada.”
Verifica-se que o tribunal recorrido reconduz a exigência de “fundamentação
expressa [de actos que] afectem direitos ou interesses legalmente protegidos dos
cidadãos” constante do artº 268º, nº 3, da Constituição (versão de 1989), a uma
mera indicação de razões, sejam elas quais forem, que levaram o autor do acto a
tomar a decisão impugnada, sem que transcenda os respectivos dizeres.
Limitou-se, pois, o acórdão recorrido a sancionar o entendimento expresso pelo
acórdão de 21.10.97 da secção, expresso em considerar “indiferente saber qual o
fundamento ou fundamento por que tal data não foi adiada por decisão do
presidente do colégio em causa, contrariando pretensão do mesmo recorrente”
(sublinhado e destaque nossos).
Como se refere no voto de vencido levado ao acórdão recorrido, “o dever de
fundamentação [justifica-se], por um lado, pela necessidade de assegurar maior
ponderação do órgão ao qual compete decidir e, por outro, pela de dar a conhecer
ao administrados os motivos que conduziram à decisão tomada e não a outra de
índole diversa”.
Desta orientação, continua a referida declaração de voto, “decorre a exigência
também sempre afirmada de que a fundamentação seja suficiente, clara e
congruente. Suficiente, no sentido de abrangência total da vertente dispositiva
do acto. Clara, como apta a ser entendida por um destinatário normal, colocado
na posição do efectivo destinatário do acto. Congruente, no sentido de ausência
de contradição na motivação entre si e desta com o decidido, de modo a reflectir
de forma corrente o processo lógico que conduziu à posição assumida”
É que “só revestida destas características a fundamentação cumpre o seu duplo
objectivo de instrumento pedagógico e disciplinador da Administração, à qual
impõe coerência no raciocínio e lucidez na opção, e de meio de informação do
administrado da linha de raciocínio seguida, com vista a habilitá-lo à
compreensão do acto em todo o seu alcance e, deste modo, a sua consciente
aceitação ou impugnação.”
Ainda na economia do voto de vencido, refere-se criticamente ao despacho de
1.10.97 do recorrido particular Dr B. enquanto órgão ad hoc de administração
eleitoral, e candidato natural às eleições em causa, que ali se invoca “a
opinião da quase totalidade de juízes sem especificar em que é que ela se apoia
e o facto de estarem em causa juízos de oportunidade e de conveniência, que não
a violação de qualquer norma. Mas a oportunidade e conveniência da data
designada para o acto eleitoral era exactamente o que o recorrente punha em
causa na sua petição. Sustentava este que se impunha um prazo mais dilatado,
para que o quadro de juízes estivesse completo, estes tivessem oportunidade de
se candidatar, bem como de se fazer conhecer, de modo a plenamente intervir e
eleger com liberdade de escolha. São todas estas razões de ponderar, tanto mais,
que a partir do início do seu funcionamento, o tribunal dispunha de 120 dias
para eleger o presidente e os vice-presidentes. Impunha‑se assim justificar por
que motivo se abreviou de tal modo o acto eleitoral. Ora, nada disso foi feito e
foi total o silêncio sobre as razões invocadas pelo recorrente e o motivo da sua
rejeição”.
Ou seja, a garantia constitucional de fundamentação contempla um sentido de
clareza de fundamentação, isto é, que as razões que levaram a tomar a decisão em
concreto dêem a conhecer perfeitamente o respectivo processo lógico e jurídico,
com repúdio de mera fraseologia; um sentido de suficiência, que explique
concretamente o processo decisório a culminar em determinada decisão, com
afastamento das simples formulação de conclusões: um sentido de congruência,
traduzida na harmonização adequada entre o fim prosseguido pela norma e a
decisão.
No caso sub judice, o recorrente, em cumprimento, aliás, do dever de colaboração
com a administração eleitoral, imposto pelo artº 116º, nº 4, da Constituição,
dirigiu ao órgão ad hoc de administração eleitoral um pedido de designação de
outra data (posterior) para as eleições, de forma a estas serem livres na
candidatura e livres na escolha, precisamente a razão de ser para a existência
de um órgão ad hoc de administração eleitoral.
Se o órgão ad hoc de administração eleitoral, o recorrido particular Dr B.,
estava obrigado a organizar o procedimento eleitoral de forma a garantir
eleições com liberdade de candidatura e de escolha, mais obrigada estava ainda
por via do seu interesse nas mesmas eleições como candidato “natural”, sendo
certo que veio a ser o “escolhido”.
Assim sendo, no exercício das suas funções de órgão ad hoc de administração
eleitoral, não está este obrigado a explicar e justificar as decisões que tome,
sobretudo se indeferem direitos invocados, e esta dimensão da explicação e
justificação não está contida no segmento do artº 268º, nº 3, da Constituição?
Não é outra a lição de Gomes Canotilho e Vital Moreira. Constituição anotada, 3ª
edição, págs 935 e 936.
Assim, o acórdão recorrido, ao aplicar os artºs 124º, alínea c), e 125º, nºs 1 e
2, do CPA desvalorizando o momento justificativo, contido artº 268º, nº 3, da
Constituição (fundamentação expressa e acessível), vem a fazer interpretação
daquele complexo normativo em desconformidade com o âmbito de protecção da
norma, o que gera o vício de inconstitucionalidade material.”
12. Anota-se que vem impugnada a interpretação que o Pleno da 1ª Secção do STA
fez dos artºs 124º, alínea c), e 125º, nºs 1 e 2, do CPA, aplicando-a na decisão
do litígio eleitoral.
13. Só depois do Pleno ter afirmado claramente a interpretação que fez dos artºs
124º, alínea c), e 125º, nºs 1 e 2, do CPA, é que o recorrente pode invocar que
tal interpretação viola a Constituição.
Omissão de pronúncia II
14. Refere o Acórdão nº 475/99:
“6. O recorrente pretende, por outro lado, que o Tribunal Constitucional aprecie
a conformidade à Constituição das normas contidas nos 16º, 18º, 37º, 38º, 99º,
nº 1, alínea g) e 116º, nº 1, do Decreto-Lei nº 129/84, de 27 de Abril,
sustentando que tais normas, interpretadas no sentido de não encerrarem “uma
dimensão do direito de qualquer dos juízes do Tribunal Central Administrativo
de acesso aos cargos de presidente e de vice-presidente, e de co-participação na
gestão da magistratura administrativa”, violam o disposto nos artigos 48º, nº 1,
267º, nº 1, e 214º, nº 2, da Constituição.
Ora, por um lado, não se apreende, das alegações do recorrente, qual é a norma
ou dimensão normativa impugnada.
[...]Da sua conjugação e do confronto das mesmas com a decisão recorrida e com
as alegações apresentadas não resulta qualquer dimensão normativa precisa
imediatamente apreensível cuja conformidade à Constituição cumpra apreciar, e
que não devesse ter sido explicitamente formulada pelo recorrente para que o
Tribunal Constitucional dela possa tomar conhecimento.
Por outro lado, tal questão, com a configuração constante do requerimento do
recurso de constitucionalidade, nunca foi suscitada antes da prolação da decisão
recorrida. Na verdade, o recorrente, durante o processo, apenas se referiu aos
actos preparatórios das eleições impugnadas, nunca suscitando a
inconstitucionalidade de uma dada norma ou dimensão normativa resultante da
interpretação conjugado dos preceitos mencionados.
[...]”
15. Disse o recorrente nas conclusões XLI e ss do recurso para o Pleno da 1ª
Secção do STA:
“Os actos preparatórios do acto eleitoral em causa, violam os direitos
fundamentais do recorrente (1) de acesso electivo a cargo público, consagrado
nas disposições conjuntas dos artº 50º, nºs 1 e 2, artº 214º, nº 2, ambos da
CRP, e artº 16º, artº 18º. artº 37º, artº 38º, e artº 116, nº 1 todos do
Decreto-Lei nº 129/84, de 27 de Abril, e (2) de co‑participação na gestão da
magistratura da jurisdição administrativa, consagrado nas disposições conjuntas
dos artº 48º, nº 1, artº 267º, nº 1,21º, nº 2, todos da CRP, e art. 99º, nº 1,
alínea d), do Decreto-Lei nº 129/84, de 27 de Abril;
Os actos preparatórios do acto eleitoral em causa violam o conjunto dos
princípios do direito eleitoral português, consagrado nas disposições conjuntas
dos artº 50º, nºs 1 e 2, 116º, nºs 1 e 3, ambos da CRP, e artº 16º, artº 18º,
artº 37º, artº 38º, e artº 116, nº 1, todos do Decreto-Lei nº 129/84, de 27 de
Abril;
Caso assim se não entenda, então tal interpretação dos artº 16º, artº 38º, e
artº 116, nº l, todos do DecretoLei nº 129/84, de 27 de Abril, viola o disposto
nos artº 50º, nºS 1 e 2, 116º, nºs 1 e 3, ambos da CRP;”
16. E, explanou nas alegações para o Tribunal Constitucional, nos artºs 81º e
ss:
“Violação dos art. 48º, nº 1, art. 267º, nº 1, 214º, nº 2, da Constituição
Quanto à invocada pelo recorrente violação pelo actos preparatórios do acto
eleitoral em causa, dos direitos fundamentais do recorrente (1) de acesso
electivo a cargo público, consagrado nas disposições conjuntas dos artº 50º, nº
s 1 e 2, artº 214º, nº 2, ambos da Constituição, e art. 16º, artº 18º, artº 37º,
artº 38º, e artº 116, nº 1, todos do Decreto-Lei nº 129/84, de 27 de Abril, e
(2) de co-participação na gestão da magistratura da jurisdição administrativa,
consagrado nas disposições conjuntas dos artº 48º, nº 1, artº 267º, nº 1, 214º,
nº 2, todos da Constituição, e artº 99º, nº 1, alínea d), do Decreto-Lei nº
129/84, de 27 de Abril, o acórdão recorrido considerou que os factos provados
nada de relevante apresentam no sentido de comprovar a apontada violação.
Na medida em que dos factos provados resulta que as eleições forma convocadas
por oficio datado de 23.9.97 e se realizaram sete dias depois, em 1.10.97,
verifica-se que o acórdão recorrido perfilha a doutrina afirmada pelo acórdão da
secção de 21.10. 97, em que se considera que houve da parte dos colégio
eleitoral oportunidade de todos os juízes do Tribunal Central Administrativo de
se candidatarem aos cargos em causa, uma vez que, “como resulta das actas
referentes aos actos eleitorais em causa, nestes encontravam-se presentes a
totalidade dos juízes que constituíam o universo dos eleitores e ilegíveis em
causa. O que significa que qualquer deles podia ser escolhido pelos seus pares
para um dos cargos em questão, a começar pelo próprio recorrente”, e que as
“eleições referidas, que são eleições internas no seio de um órgão colegial, não
integram qualquer período de esclarecimento do eleitorado, como acontece em
geral nas eleições para cargos políticos”.
[...]
Sobretudo, se a Constituição impõe o acesso electivo a esses cargos - artº 214º,
nº 2 “O Presidente do Supremo Tribunal Administrativo é eleito de entre e pelos
respectivos juízes”, sendo certo que o acesso ao cargo de presidente do Supremo
Tribunal Administrativo é a matriz para o acesso aos cargos de presidente e de
vice-presidente do Tribunal Central Administrativo.
Por outro lado, também a matriz constitucional do órgão de gestão da
magistratura, impõe o acesso a vogal do Conselho Superior da Magistratura em
juiz eleito pelos seus pares - artº 220º, nº 1, alínea c), sendo certo que por
inerência o presidente do Tribunal Central Administrativo é vogal do CSTAF.
Assim sendo, é óbvio que num período de 120 dias para realização de acto
eleitoral, convocá-lo para o 15º dia, com uma antecedência de 7 dias, é
simultaneamente apoucar os princípios eleitorais e negar os direitos do
recorrente de acesso electivo a cargo público e de co-participação na gestão,
vedando-lhe toda e qualquer possibilidade de confronto transparente e livre com
outros candidatos.
Não é por acaso que o Estatuto dos Magistrados Judiciais - Lei nº 21/85, de 30
de Julho - determina com princípio eleitoral dos vogais do Conselho Superior da
Magistratura eleitos pelos juízes, que a eleição é anunciada com a antecedência
mínima de 45 dias - artº 140º, nº 4 - sendo certo que esta Lei nº 21/85, de 30
de Julho. se aplica aos juízes da jurisdição administrativa - artº 77º do
Decreto-Lei nº 129/84, de 27 de Abril.
Não considerando que as disposições legais do Decreto-Lei nº 129/84, de 27 de
Abril, que suportaram as eleições impugnadas - artº 16º, artº 18º, art. 37º.
artº 38º, artº 116, nº 1, e artº 99º, nº 1, alínea g) encerram uma dimensão de
direito de qualquer dos juízes do Tribunal Central Administrativo de acesso aos
cargos de presidente (e por inerência vogal do CSTAF) e de vice-presidente, e de
co-participação na gestão da magistratura administrativa, é fazer aplicação de
tal complexo normativo em desconformidade com o disposto nos artº 48º, nº 1,
art. 267º, nº 1, 214º, nº 2, da Constituição, o que gera a sua
inconstitucionalidade.”
17. Perante o exposto, não se afigura válida a constatação de que “não se
apreende, das alegações do recorrente, qual é a norma ou dimensão normativa
impugnada”.
18. Com efeito, mais explanado do que o foi e mais explicitamente é impossível.
Omissão de pronúncia III
19. Refere o Acórdão nº 475/99:
“8. O recorrente, por outro lado, submete à apreciação do Tribunal
Constitucional as normas contidas nos artigos 16º, 38º, e 116º, nº 1, do
Decreto-Lei nº 129/84, de 27 de Abril, sustentando que as mesmas são
inconstitucionais, por violação do disposto nos artigos 50º, nºs 1 e 2, e 116º,
nºs 1 e 3, da Constituição.
Ora, mais uma vez, das alegações de recurso apresentadas não se apreende qual é
a dimensão normativa resultante da conjugação dos referidos preceitos que o
recorrente considera inconstitucional. Na verdade, o recorrente somente impugna
a realização das eleições 15 dias após a instalação do Tribunal Central
Administrativo, não questionando a regulamentação do respectivo processo
eleitoral. Nessa medida, a única norma impugnada, na perspectiva da sua
constitucionalidade, foi a contida no artigo 116º, nº 1, do Decreto-Lei 0º
129/84, de 27 de Abril na redacção dada pelo Decreto-Lei nº 229/96, de 29 de
Novembro (norma que consagra o prazo de 120 dias a contar da data do início do
funcionamento do Tribunal Central Administrativo para a realização da eleição do
presidente e dos vice-presidentes) e não as contidas nos artigos 16º e 38º do
mesmo diploma (que estabelecem o respectivo modo de eleição).”
20. Ora, mais claro do que o recorrente o foi nas alegações de recurso para o
Tribunal Constitucional é inviáve1 – disse‑se aí no artº 89:
“Violação dos art. 50º, nºs 1 e 2, 116º, nºs 1 e 3, da Constituição
O apoucar dos princípios eleitorais efectuado pelo acórdão recorrido, vem a
implicar que as disposições legais do Decreto-Lei nº 129/84, de 27 de Abril que
suportaram as eleições impugnadas - artº 16º, artº 38º, e artº 116, nº 1, todos
do Decreto-Lei nº 129/84, de 27 de Abril - não encerrem um direito de acesso
electivo a cargo público, pelo que se fez aplicação do invocado complexo
normativo em desconformidade com o conjunto dos princípios do direito eleitoral
português, consagrado nas disposições conjuntas dos artº 50º, nºs 1 e 2, 116º,
nºs 1 e 3, da Constituição, o que gera a sua inconstitucionalidade.”
Consequências
21. Nos termos do artº 660º, nº 2, do CPC, o tribunal deve resolver todas as
questões que as partes tenham submetido à sua apreciação (cfr Miguel Teixeira de
Sousa, Estudos sobre o novo processo civil, 2ª edição, Lex, Lisboa, 1997, pág
220); se deixa de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar, então
estaremos perante um vicio substancial da sentença, a implicar a sua nulidade -
artº 668º, nº 1, alínea d), I parte, do CPC.
22. O Professor Teixeira de Sousa, Ibidem, pág 221, considera que se verifica
uma omissão de pronúncia se na sentença o tribunal se abstiver de apreciar a
procedência da acção com fundamento numa das causas de pedir invocadas pelo
autor.
23. Afigura-se ao recorrente ser esta a situação do Acórdão em relação às causas
de pedir supra mencionadas.
Termos em que requer:
1. seja declarada a nulidade de sentença resultante de omissão de pronúncia;
2. seja a nulidade referida suprida pela declaração de inconstitucionalidade das
normas invocadas;
3. seja ordenada a baixa dos autos, a fim de ser reformado o Acórdão do Supremo
Tribunal Administrativo recorrido.
Por seu turno, o requerimento de fls. 200 e ss. é o seguinte:
A., juiz do Tribunal Central Administrativo, residente na Rua …, nº ..,.. , …..
Lisboa, recorrente no processo referenciado,
vem arguir nulidade de sentença, para o que invoca o seguinte:
Introdução
Por requerimento entrado em 24.9.99, o recorrente solicitou a concessão do apoio
judiciário, invocando entre outros, os seguintes argumentos, nunca aliás postos
em causa pelo tribunal:
“28. Por via do exercício do direito fundamental de acesso ao juiz e ao
tribunal, tem sido o recorrente condenado pelo Tribunal Constitucional a pagar a
taxa de justiça global de Esc. 700.00$00 (50 ucs x 14.00$00), nos seguintes
processos:
-Processo n° 614/98, 2ª Secção - o Acórdão de 12.5.99 fixou a taxa de justiça em
10 ucs, sendo negado o apoio judiciário, pois os rendimentos do recorrente
suportam o valor presumível das custas numa litigância “normal”, que não
envolva abuso manifesto dos meios processuais;
-Processo n° 600/98, 1ª Secção - o Acórdão de 16.12.98 indeferiu a reclamação
para a conferência ao abrigo do art° 78°-A, n° 3, da LTC, e fixou a taxa de
justiça em 15 Ucs; o Acórdão de 15.6.99 indeferiu a reclamação para a
conferência do despacho do relator indeferindo liminarmente o pedido de apoio
judiciário, considerando que a pretensão do recorrente constitui um mau exemplo
[sic], gera incomodidade [sic] e evidencia despropósito [sic], e fixou a taxa de
justiça em 10 ucs;
-No presente processo - o Acórdão de 14.7.99 fixou a taxa de justiça em 15 ucs.
29. Parece ao recorrente que o montante das custas que já são devidas atingem um
montante incomportável que põem em causa o equilíbrio do seu agregado familiar.
Alguma coisa tem de ficar por pagar - o sustento ou a Justiça!
30. O critério para a fixação da taxa de justiça tem em atenção (1) a
complexidade e a natureza do processo, (2) a relevância dos interesses em causa
e a (3) actividade contumaz do vencido - art° 9°, na 1, do Decreto-Lei nº
303/98, de 7 de Outubro.”
2. Por despacho da Sr.a Relatora de 18.10.99 foi indeferido o pedido de apoio
judiciário, invocando, sem referência a qualquer lei, que
“[...] a situação económica retratada pelo recorrente não ilustra a alegada
falta de meios económicos para custear as despesas normais de uma acção
judicial. Com efeito, as despesas invocadas não justificam, manifestamente,
dado o nível de vencimento auferido, a não cobertura pelo meios económicos do
recorrente das despesas de uma litigância 'normal', ou seja, de uma utilização
dos mecanismos processuais na prossecução dos objectivos que os mesmos visam
legalmente alcançar, quando não existam factores extraordinários que tornem
excessivamente oneroso para o recorrente a utilização dos meios judiciais”,
3. e na sequência de pronúncia do Ministério Público de que:
“Dado o montante da remuneração líquida do recorrente, o nível dos encargos por
ele suportados [...] e o montante previsível das custas que correspondem a uma
litigância normal (que inclui o acatamento das decisões finais proferidas pelos
Tribunais situados no topo da hierarquia judiciária) entendemos que se não
justifica manifestamente o deferimento do pretendido apoio judiciário” -
sublinhado e destaque nosso.
4. Estando o recorrente condenado em custas, pelo TC, no montante de 700.00$00,
dizer-se que “a situação económica retratada pelo recorrente não ilustra a
alegada falta de meios económicos para custear as despesas normais de uma acção
judicial”, sabendo-se que o único rendimento mensal daquele é de cerca de
700.00$00 afigura-se do mais puro conceptualismo, sem qualquer ligação com a
realidade litigiosa que se deveria dirimir, com Justiça.
5. A menos que se queira insinuar a aberração das situações litigiosas que, no
entender do Governo, urge travar a todo o custo - é o próprio Governo, emissor
do Decreto-Lei n° 303/98, de 7 de Outubro, a confessar que os escalões da taxa
de justiça que substitui são graduados “pela intervenção do tribunal motivada
por uma contumácia crescente que importa desincentivar”, não hesitando, num
nítido processo de intenções típico doutros tempos, em afirmar a falta de
seriedade com que o TC vem sendo procurado pelos cidadãos para protelar o
trânsito em julgado das decisões.
6. Perante a manifesta ilegalidade e injustiça do despacho da Sra Relatora, e
considerando ser cidadão europeu, beneficiando de um dos princípios da
cidadania europeia, qual seja o que assenta no acesso à justiça não impedido
por impossibilidade da fazer face, total ou parcialmente, às despesas do
processo, o recorrente, em reclamação para a conferência, suscitou a questão
prejudicial de apreciação da compatibilidade da interpretação do artº 7º, nº 1,
do Decreto-Lei nº 387-B/87, de 29 de Dezembro, pressuposta naquele despacho com
o disposto no o artº 76º, nº 1, § 1º, do Regulamento de Processo do Tribunal de
Justiça das Comunidades Europeias de 19 de Junho de 1991.
7. Assim, na dita reclamação para a conferência, o recorrente formulou as
seguintes conclusões, que, como se sabe, delimitam o conhecimento jurisdicional:
“Afigura-se ao recorrente que o despacho reclamado pressupõe uma interpretação
do artº 7º, nº 1, do Decreto-Lei nº 387-B/87, de 29 de Dezembro.
O despacho reclamado invoca a pronúncia do Ministério Público, e nessa medida, o
conceito de litigância “normal”, que fundamenta o indeferimento do pedido de
apoio judiciário do recorrente, consiste em acatar as decisões finais
proferidas por Tribunais do topo da hierarquia judiciária.
O apoio judiciário requerido pelo recorrente foi indeferido pelas seguintes
razões:
os proventos do recorrente cobrem as despesas com uma litigância traduzida no
acatamento das decisões finais proferidas pelo STA e pelo TC, tribunais do topo;
apoio judiciário já não cobre toda a litigância que se traduza em não acatar as
decisões finais proferidas pelo STA e pelo TC, tribunais do topo, não cobrindo
portanto as arguições de nulidade e as reclamações para a conferência.
Decisão final, nos termos do artº 677º do CPC; é aquela que transitou em
julgado, e se mostra insusceptível de qualquer tipo de impugnação.
Não pode ser denegado ao recorrente o apoio judiciário com o pretexto de que o
mesmo tem capacidade económica para suportar as despesas judiciárias geradas
pelo acatamento das decisões “finais”, e de que o apoio judiciário não abrange
as despesas judiciárias geradas pela litigância relacionada com o suprimento dos
vícios das mesmas decisões “finais”, uma vez que a lei não contempla tal
distinção - o artº 20º, nº 1, da Constituição, garante que a justiça não pode
ser denegada por insuficiência de meios económicos, e o artº 7º, nº 1, do
Decreto-Lei nº 387-B/87, de 29 de Dezembro, não comporta interpretação no
sentido daquela distinção, sob pena de violar o disposto no citado artº 20º, nº
1.
Não cabe aos tribunais escolher qual é a 'litigância' que dá lugar ao direito ao
apoio judiciário, e qual é a que não dá, uma vez que a escolha do mecanismo
processual a empregar é da exclusiva competência do cidadão necessitado de
recorrer à Justiça, ao Direito, e ao Tribunal, devendo os tribunais limitar-se a
deferir ou indeferir a pretensão apresentada.
Na medida em que os tribunais se arrogam a qualificação da litigância para
efeitos de avaliação sobre o uso dos diversos mecanismos processuais, excedem
manifestamente a sua competência de dirimição de litígios, para se configurarem
como interessados no uso só de determinados meios processuais, quebrando assim a
neutralidade que constitucionalmente lhes está imposta.
O Despacho Reclamado viola o direito fundamental do recorrente de acesso ao
direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente
protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios
económicos, direito à não denegação por insuficiência de meios económicos
garantido pelo artº 20º, nº 1, da Constituição.
A europeização do direito nacional, isto é, a modelação do direito nacional pelo
Direito Comunitário, tem-se vindo a revelar em sede de direitos fundamentais.
A aplicação do Direito Comunitário constitui logo um dever dos Estados membros,
e portanto, dos seus tribunais - artº 10º do Tratado CE.
Por outro lado, o juiz nacional é configurado como juiz comunitário.
O artº 76º, nº 1, § 1º, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça das
Comunidades Europeias de 19 de Junho de 1991 (cfr artº 245º, § 3º, do Tratado
CE), determina que “se uma parte se encontrar na impossibilidade da fazer face,
total ou parcialmente, às despesas do processo, pode, a todo o tempo, pedir o
beneficio da assistência judiciária”.
O Direito Comunitário estabelece como critério da concessão do beneficio da
assistência judiciária apenas a impossibilidade de fazer face, total ou
parcialmente, às despesas do processo - e não também o uso de determinados
mecanismos processuais.
Em causa estão as despesas do processo e não as despesas relacionadas unicamente
com a litigância normal”.”
8. Sobre o despacho da Senhora Relatora reclamado, debruça-se o Acórdão n°
658/99, de 7.12.99, agora invocado de nulo.
O Acórdão n° 658/99
9. No texto do Acórdão, que indeferiu o pedido de reenvio e confirmou o despacho
reclamado, escreve-se que o
“recorrente reclama agora para a Conferência, sustentando em síntese que não
cabe aos tribunais escolher qual é a litigância que dá lugar ao direito ao apoio
judiciário. O reclamante sustenta também a violação do direito de acesso aos
tribunais, consagrado no artigo 20º, nº 1, da Constituição, e do artigo 76º, nº
1, § 10, do Regulamento do Processo do Tribunal de Justiça das Comunidades
Europeias, que determina a possibilidade de assistência judiciária a todo o
tempo, em caso de necessidade. Por último, o reclamante requer o reenvio do
processo a titulo prejudicial para o Tribunal de Justiça das Comunidades
Europeias, para apreciação da compatibilidade da interpretação do artigo 7º, n°
1, do Decreto-Lei n° 387-B/87, de 29 de Dezembro, pressuposta no despacho
reclamado, com o disposto no artigo 76º, n° 1, § 1°, do Regulamento do Processo
do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, nos termos do artigo 234°,
alínea b), do Tratado que institui a Comunidade Europeia”.
“O reclamante pretende ver apreciada a validade da interpretação do artigo 7º,
n° 1, do Decreto-Lei nº 387B/87, de 29 de Dezembro, em face do artigo 76°, n°
1, § 1°, do Regulamento do Processo do Tribunal de Justiça das Comunidades
Europeias.
Em primeiro lugar, sublinhe-se que o Regulamento do Processo do Tribunal de
Justiça das Comunidades Europeias tem apenas por objecto a tramitação
processual no referido tribunal. Os presentes autos encontram-se a correr termos
no Tribunal Constitucional, não tendo, consequentemente, aplicação a lei que
regula o processo no Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias.
Desse modo, não se coloca no recurso em apreciação qualquer questão relativa à
interpretação do artigo 76º, n° 1, do Regulamento do Processo do Tribunal de
Justiça das Comunidades Europeias, que consagra os termos do apoio judiciário no
respectivo processo, pelo que não teria qualquer cabimento proceder ao reenvio
previsto no artigo 234° do mencionado Tratado.”
“Por outro lado, sempre se dirá que a pretensão do reclamante, tal como surge
delineada nos presentes autos, não encontra fundamento na disposição do Tratado
que institui a Comunidade Europeia invocada. Com efeito, tal disposição consagra
o reenvio a título prejudicial no caso de se colocar uma questão sobre a
validade ou sobre a interpretação dos actos adoptados pelas Instituições
Comunitárias ou pelo Banco Central Europeu. Não constando a norma questionada
(artigo 7º, n° 1, do Decreto-Lei n° 387-B/87, de 29 de Dezembro) de qualquer
acto adoptado pelas Instituições da Comunidade ou pelo Banco Central Europeu,
mas sim de um diploma legal (Decreto‑Lei) interno a questão suscitada não é
configurável como um problema interpretativo de actos adoptados pelas
Instituições da Comunidade ou pelo Banco Central Europeu, em ordem a,
subsequentemente, avaliar a compatibilidade com aqueles actos de tal norma.”
“O reclamante sustenta, concomitantemente, que o tribunal não pode decidir qual
é a litigância que confere o direito ao apoio judiciário.
Ora, no despacho reclamado considerou-se que a situação económica do reclamante
não ilustra a falta de meios económicos para custear as despesas normais de uma
acção judicial. Foi, no essencial, este o fundamento da decisão de indeferimento
do pedido de apoio judiciário deduzido.
Assim, entendeu-se que, embora o apoio judiciário não se encontre absolutamente
interdito a cidadãos com rendimentos elevados (como é o caso do reclamante),
deverá, porém, ser então concedido apenas quando existam factores
extraordinários que tornem excessivamente onerosa a utilização dos meios
judiciais. Tratou-se, nessa medida, de uma consideração que, não integrando o
núcleo essencial do fundamento da decisão reclamada, pretendeu realçar, como
mero obiter dictum, que o apoio judiciário também pode contemplar em
determinadas circunstâncias (que não são manifestamente as dos autos) cidadãos
com um elevado nível de rendimentos. Não se verifica, pois, qualquer
interpretação do n° 1 do artigo r do Decreto-Lei n. 387-B/87, de 29 de
Dezembro, violadora do artigo 20°, n° 1, da Constituição. Na verdade, no
despacho reclamado apenas se considerou que um cidadão que aufere um rendimento
mensal de 657.742$00 mais 50.00$00 tem capacidade económica para fazer face às
despesas do presente processo, não se justificando a concessão do beneficio de
apoio judiciário, que visa apenas as situações de verdadeira e efectiva
necessidade.
Assim, indeferir-se-á a presente reclamação.”
Falta de comunicação
10. Como se pode constatar das conclusões formuladas pelo recorrente, nunca este
invocou a violação do “artigo 76°, n° 1, § 10, do Regulamento do Processo do
Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, que determina a possibilidade de
assistência judiciária a todo o tempo, em caso de necessidade”.
11. Por outro lado, nunca o recorrente afirmou que “se coloca no recurso em
apreciação [...] questão relativa à interpretação do artigo 76°, n° 1, do
Regulamento do Processo do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias”.
12. O que o recorrente disse, na reclamação para a conferência, foi:
“26. O artº 76º, nº 1, § 1º, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça
das Comunidades Europeias de 19 de Junho de 1991 (cfr artº 245º, § 3º, do
Tratado CE), determina que “se uma parte se encontrar na impossibilidade da
fazer face, total ou parcialmente, às despesas do processo, pode, a todo o
tempo, pedir o beneficio da assistência judiciária”.
27. Como se vê, um dos princípios da cidadania europeia (cfr Preâmbulo do
Tratado CE) assenta no acesso à justiça, que não é impedido se uma parte se
encontrar impossibilidade da fazer face, total ou parcialmente, às despesas do
processo, já que tem direito ao beneficio da assistência judiciária.
28. O Direito Comunitário estabelece como critério da concessão do benefício da
assistência judiciária apenas a impossibilidade de fazer face, total ou
parcialmente, às despesas do processo - e não também o uso de determinados
mecanismos processuais.”
13. Ou seja, de uma regulamentação específica, o recorrente retira um princípio.
Nada mais.
Omissão de pronúncia
14. Uma vez que no presente processo o recorrente, até ao momento, já foi
condenado em custas num total de 685.00$00 (Ac do Supremo Tribunal
Administrativo (1ª, 2ª) de 21.10.97 – 90.00$00; Ac do Supremo Tribunal
Administrativo (Pleno) de 25.7. 98 – 105.00$00; Ac do TC n° 475/99 – 210.00$00 -
14 ucs; Ac do TC n° 519/99 – 140.00$00 - 10 ucs; Ac do TC n° 658/99 – 140.00$00
- 10 ucs), a afirmação do Acórdão de que
“um cidadão que aufere um rendimento mensal de 657.742$00 mais 50.00$00 tem
capacidade económica para fazer face às despesas do presente processo, não se
justificando a concessão do benefício de apoio judiciário, que visa apenas as
situações de verdadeira e efectiva necessidade”
15. assenta em manifesto erro, não dizendo respeito ao presente processo,
traduzindo apenas um mero raciocínio abstracto, dado por uma certa visão do
mundo e das coisas que releva restritamente em termos pessoais, nunca podendo
ser normativamente vinculante para o cidadão que recorre à Justiça
Constitucional, in casu, o recorrente.
16. Nessa medida incorre o Acórdão em omissão de pronúncia, já que deveria ter
ponderado e explicitado se o rendimento mensal do recorrente permite fazer face
às despesas do presente processo e que o TC vem aumentando em tranches
sucessivas de 210.00$00 e 140.00$00, fazendo aplicação do Decreto-Lei n°
303/98, de 7 de Outubro, e da sua intenção desincentivadora no recurso à
justiça constitucional mediante agravamento e ameaça de agravamento da situação
económica do recorrente.
17. Com efeito, nos presentes autos não vem questionada se “a situação económica
do reclamante” ilustra “a falta de meios económicos para custear as despesas
normais de uma acção judicial.” (sublinhado nosso), sendo certo que foi a
apreciação e a decisão desta questão que “no essencia1”, foi “o fundamento da
decisão de indeferimento do pedido de apoio judiciário deduzido”.
18. O que vem questionada é se a situação económica do reclamante ilustra a
falta de meios económicos para custear as despesas do presente processo,
despesas que vêm progressivamente aumentando em tranches de 210.00$00 e
140.00$00.
19. Sobre esta questão, nada o TC disse. Daí que, omitindo decisão sobre questão
suscitada pelo recorrente, e com interesse para a boa decisão da causa,
mostra-se violado o disposto no art. 668°, nº 1, d), do CPC, o que constitui
motivo de nulidade de sentença.
Europa
20. Do preâmbulo do TUE (cfr VERSÃO COMPILADA DO TRATADO DA UNIÃO EUROPEIA
publicada com a Resolução da Assembleia da República nº 7/99, no Diário da
República n° 42/99, SÉRIE I-A, de 19 de Fevereiro de 1999) transcrevem-se alguns
dos considerandos que moveram os representantes dos diversos países europeus,
entre os quais Portugal, a instituir uma União Europeia:
“[...]
Recordando a importância histórica do fim da divisão do continente europeu e a
necessidade da criação de bases só1idas para a construção da futura Europa;
Confirmando o seu apego aos princípios da liberdade, da democracia, do respeito
pelos direitos do homem e liberdades fundamentais e do Estado de direito;
[...]
Resolvidos a instituir uma cidadania comum aos nacionais dos seus países;
[...]”.
21. Entre as disposições do TUE, destacam-se:
“Artigo 2º (ex-artigo B)
A União atribui-se os seguintes objectivos:
[...]
o reforço da defesa dos direitos e dos interesses dos nacionais dos seus Estados
membros, mediante a instituição de uma cidadania da União;
a manutenção e o desenvolvimento da União enquanto espaço de liberdade, de
segurança e de justiça [...]”
“Artigo 6º (ex-artigo F)
1 - A União assenta nos princípios da liberdade, da democracia, do respeito
pelos direitos do homem e pelas liberdades fundamentais, bem como do Estado de
direito, princípios que são comuns aos Estados membros.
- A União respeitará os direitos fundamentais tal como os garante a Convenção
Europeia de Salvaguarda dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais,
assinada em Roma em 4 de Novembro de 1950, e tal como resultam das tradições
constitucionais comuns aos Estados membros, enquanto princípios gerais do
direito comunitário.
- A União respeitará as identidades nacionais dos Estados membros.
4 - A União dotar-se-á dos meios necessários para atingir os seus objectivos e
realizar com êxito as suas políticas.”
22. Entre as disposições do TCE (cfr VERSÃO COMPILADA DO TRATADO QUE INSTITUI A
COMUNIDADE EUROPEIA, publicada com a Resolução da Assembleia da República nº
7/99, no Diário da República n° 42/99, SÉRIE I-A, de 19 de Fevereiro de 1999),
destacam-se:
“Artigo 17º (ex-artigo 8º)
1 - É instituída a cidadania da União. É cidadão da União qualquer pessoa que
tenha a nacionalidade de um Estado membro. A cidadania da União é complementar
da cidadania nacional e não a substitui.
- Os cidadãos da União gozam dos direitos e estão sujeitos aos deveres previstos
no presente Tratado.”
“Artigo 220º (ex-artigo 164º)
O Tribunal de Justiça garante o respeito do direito na interpretação e aplicação
do presente Tratado.”
“Artigo 234º (ex-artigo 177º)
O Tribunal de Justiça é competente para decidir, a título prejudicial:
a) Sobre a interpretação do presente Tratado;
b) Sobre a validade e a interpretação dos actos adoptados pelas instituições da
Comunidade e pelo BCE;
c) Sobre a interpretação dos estatutos dos organismos criados por acto do
Conselho, desde que estes estatutos o prevejam.
[...]
Sempre que uma questão desta natureza seja suscitada em processo pendente
perante um órgão jurisdicional nacional cujas decisões não sejam susceptíveis de
recurso judicial previsto no direito interno, esse órgão é obrigado a submeter a
questão ao Tribunal de Justiça.”
Direitos do cidadão europeu
23. O cidadão da Europa, norteada pelos princípios da liberdade, da democracia,
do respeito pelos direitos do homem e liberdades fundamentais e do Estado de
direito, e explicitamente sujeita a respeitar os direitos fundamentais tal como
os garante a Convenção Europeia de Salvaguarda dos Direitos do Homem e das
Liberdades Fundamentais, assinada em Roma em 4 de Novembro de 1950, e tal como
resultam das tradições constitucionais comuns aos Estados membros, enquanto
princípios gerais do direito comunitário (art. 6°, nº 2, do TUE), goza dos
direitos e está sujeito aos deveres previstos no Tratado que institui a
Comunidade Europeia (art. 17°, n° 2, do TCE), sendo certo que o Tribunal de
Justiça garante o respeito do direito na interpretação e aplicação do mesmo
Tratado (art° 220° do TUE).
Direitos do recorrente enquanto cidadão europeu
24. Na medida em que o recorrente é cidadão europeu tem o direito de acesso à
justiça, direito que não lhe pode ser negado ou dificultado por impossibilidade
da fazer face, total ou parcialmente, às despesas do processo, constituindo um
dos princípios da cidadania europeia o acesso à justiça, que não é impedido por
impossibilidade da fazer face, total ou parcialmente, às despesas do processo,
já que de acordo com o Direito Comunitário estabelece como critério da concessão
do beneficio da assistência judiciária apenas a impossibilidade de fazer face,
total ou parcialmente, às despesas do processo.
25. Por outro lado, o princípio comunitário de acesso à justiça, nos termos
descritos, mostra-se explicitado no artº 76º, nº 1, § 1º, do Regulamento de
Processo do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias de 19 de Junho de
1991, e contrariado pela interpretação do n° 1 do artigo 7° do Decreto-Lei n°
387-B/87, de 29 de Dezembro, implicitamente contida no indeferimento
questionado.
26. Por isso é que o recorrente, enquanto cidadão europeu, e perante a denegação
daquele direito de acesso à justiça, tem direito a que o Tribunal de Justiça
decida sobre a validade e a interpretação do artº 76º, nº 1, § 1º, do
Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias de 19
de Junho de 1991, enquanto explicitação do princípio comunitário de acesso à
justiça, que não pode ser impedido por impossibilidade da fazer face, total ou
parcialmente, às despesas do processo, nos termos do artº 234°, I parte, b), do
TCE.
27. Por constituir expedidente de exercício de direito de cidadão europeu é que
existe a obrigatoriedade para o TC de submeter a questão prejudicial em causa
ao Tribunal de Justiça, nos termos do artº 234°, III parte, do TCE.
Omissão de pronúncia
28. Ora, sobre o direito fundamental comunitário de acesso à Justiça invocado
pelo recorrente nada o TC disse, limitando-se as vagas considerações sobre a
inaplicabilidade do Regulamento do Processo do Tribunal de Justiça das
Comunidades Europeias ao caso concreto, questão obviamente descabida no
presente caso jurídico.
29. Daí que, omitindo decisão sobre questão suscitada pelo recorrente, e com
interesse para a boa decisão da causa, mostra-se violado o disposto no art°
668°, nº 1, d), do CPC, o que constitui motivo de nulidade de sentença.
Excesso de pronúncia
30. Por outro lado, as considerações sobre a inaplicabilidade do Regulamento do
Processo do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias ao caso concreto, e
que sem mais pretendem justificar a falta de cabimento no reenvio pretendido
pelo recorrente, assim o indeferindo, não só violam lei expressa - art° 234°,
III parte, do TCE - como pretendem afirmar a existência da faculdade de
indeferimento liminar, faculdade que manifestamente foi afastada pelo Tratado em
causa.
31. Por isso, ao conhecer de questão que lhe estava vedado - indeferimento
liminar de reenvio obrigatório - incorre-se em excesso de pronúncia, com
violação do disposto no artº 668°, n° 1, d), do CPC, o que constitui motivo de
nulidade de sentença.
Falta de fundamentação
32. O Acórdão do TC n° 658/99, de 7.12.99, ao indeferir a pretensão do
recorrente, faz uso das expressões que sublinhamos e destacamos:
“Ora, no despacho reclamado considerou-se que a situação económica do reclamante
não ilustra a falta de meios económicos para custear as despesas normais de uma
acção judicial. Foi, no essencial, este o fundamento da decisão de indeferimento
do pedido de apoio judiciário deduzido. Assim, entendeu-se que, embora o apoio
judiciário não se encontre absolutamente interdito a cidadãos com rendimentos
elevados (como é o caso do reclamante), deverá, porém, ser então concedido
apenas quando existam factores extraordinários que tomem excessivamente onerosa
a utilização dos meios judiciais. Tratou-se, nessa medida, de uma consideração
que, não integrando o núcleo essencial do fundamento da decisão reclamada,
pretendeu realçar, como mero obiter dictum, que o apoio judiciário também pode
contemplar em determinadas circunstâncias (que não são manifestamente as dos
autos) cidadãos com um elevado nível de rendimentos. Não se verifica, pois,
qualquer interpretação do n° 1 do artigo 7º do Decreto-Lei n° 387-B/87, de 29
de Dezembro, violadora do artigo 20°, n° 1, da Constituição. Na verdade, no
despacho reclamado apenas se considerou que um cidadão que aufere um rendimento
mensal de 657.742$00 mais 50.00$00 tem capacidade económica para fazer face às
despesas do presente processo, não se justificando a concessão do beneficio de
apoio judiciário, que visa apenas as situações de verdadeira e efectiva
necessidade.”
33. Não houve a preocupação de explicitar em que consistem as realidades
jurídicos - partimos do princípio que tais expressões pretendem traduzir uma
argumentação jurídica - dadas por tais expressões.
34. O que são despesas normais de uma acção judicial? e despesas anormais da
mesma acção?
35. Quais são e em que consistem os factores extraordinários que tornem
excessivamente onerosa a utilização dos meios judiciais?
36. Quais são as determinadas circunstâncias (que não são manifestamente as dos
autos) que permitem a concessão de apoio judiciário?
37. Quais são os cidadãos com um elevado nível de rendimentos? Os juízes
desembargadores como o rercorrente? Então os cidadãos Belmiro de Azevedo,
Champalimaud, e todos os juízes conselheiros, como se qualificam?
38. O que são situações de verdadeira e efectiva necessidade?
39. Repetimos, o tribunal não o explica, mostrando-se violado o disposto no
conjunto normativo dado pelos artºs 205°, n° 1, da Constituição, e 158°, nº 1, e
668°, n° 1, b), ambos do CPC, o que constitui motivo de nulidade.
*****
Termos em que requer:
1. seja declarada a nulidade de sentença resultante do acima exposto;
2. seja solicitada ao Tribunal de Justiça da Comunidade Europeia a sua
pronúncia, a título prejudicial, sobre a compatibilidade da interpretação do
artº 7º, nº 1, do Decreto-Lei nº 387‑B/87, de 29 de Dezembro, pressuposta no
Despacho Reclamado, com o disposto no artº 76º, nº 1, § 1º, do Regulamento de
Processo do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias de 19 de Junho de
1991, enquanto explicitação do princípio comunitário de acesso à justiça, não
impedido por impossibilidade da fazer face, total ou parcialmente, às despesas
do processo, atento o disposto no artº 234º, § 1º, al b), e § 3º, do TCE; obtida
a pronúncia,
3. dando por reproduzido o alegado no pedido de apoio judiciário entrado em
24.9.99, seja concedido ao recorrente o apoio judiciário pretendido, fazendo
aplicação do critério estabelecido pelo artº 76º, nº 1, § 1º, do Regulamento de
Processo do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias de 19 de Junho de
1991.
Depois da prolação do Acórdão nº 58/2000, o recorrente requereu o seguinte:
A., residente na Rua …, nº .., …, ….. Lisboa, recorrente no processo
referenciado, notificado do Acórdão nº 58/2000, de 9.2.2000
vem arguir nulidades para o que invoca o seguinte:
1. O Acórdão nº 58/2000, na parte que agora importa, é do seguinte teor:
“Antes de se proceder à apreciação dos requerimentos de fls. 200 e ss. e de fls.
186 e ss., cumpre submeter os autos à Conferência, nos termos dos artigos 720°
do Código de Processo Civil, e 84°, nº 8, da Lei do Tribunal Constitucional, em
virtude de se verificar que o recorrente, com os sucessivos requerimentos
apresentados, repetindo pedidos anteriormente deduzidos e decididos, visa
obstar ao trânsito em julgado da decisão do presente recurso, bem como à baixa
do processo e ao cumprimento da decisão proferida.”
Falta de fundamentação
2. Resulta inexplicável a intenção imputada ao recorrente de “visar obstar ao
trânsito em julgado da decisão do presente recurso, bem como à baixa do processo
e ao cumprimento da decisão proferida.”
3. Não se pode imputar intenções gratuitamente!
4. Quem tenha estudado o presente processo verifica que o pedido de impugnação
das eleições em causa foi sempre indeferido, pelo que o “eleito” lá está no seu
cargo de Presidente do Tribunal Central Administrativo, a exercer as funções
para que foi “eleito”.
5. O que é que há então para cumprir?
6. Nos termos do artigo 205º, nº 1, da Constituição, “as decisões dos tribunais
que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei”.
7. Por outro lado, e por força do da remissão operada pelo artº 1º do
Decreto-Lei nº 267/85, de 16 de Julho, o artº 659º, nº 2, do CPC, determina que
na sentença deve o “juiz discriminar os factos que considera provados”, sendo
certo que as decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido são sempre
fundamentadas - artº 158º, nº 1, do CPC.
8. Tal como resulta das disposições constitucional e legais citadas, o dever de
fundamentação imposto ao juiz, no que toca a matéria de facto, desdobra-se no
dever de emissão de juízo jurisdicional sobre a verificação dos factos, e no
dever de os discriminar.
9. Aplicando as considerações feitas ao caso dos autos, verifica-se que o
Tribunal Constitucional não cumpriu um dever que lhe é imposto pelo ordenamento
jurídico, desde logo, pela Constituição, ou seja, não emitiu qualquer juízo
sobre a ocorrência de factos que lhe permitam concluir que o recorrente tem a
intenção de “obstar ao trânsito em julgado da decisão do presente recurso, bem
como à baixa do processo e ao cumprimento da decisão proferida.”
Violação do direito ao processo equitativo
10. O recorrente pretende o direito a que o Tribunal Constitucional se refere,
no Acórdão nº 86/88 (BMJ-376,237), como o direito a uma solução jurídica de
actos e relações jurídicas controvertidas, a que se deve chegar em prazo
razoável e com garantias de imparcialidade e independência, possibilitando-se um
correcto funcionamento das regras do contraditório, em termos de cada uma das
partes poder deduzir as suas razões (de facto e de direito), oferecer as suas
provas, controlar as provas do adversário e discretear sobre o valor e
resultado da causa.
11. Face a esta consagração, invoca o recorrente que o Acórdão nº 58/2000 viola
o seu direito de acesso à Justiça, na medida em que impõe uma tramitação
processual especialissíma, sem lhe possibilitar a dedução das suas razões,
preterindo o disposto no artº 20º, nº 4, da Constituição, no artº 6º, nº 1, da
Convenção Europeia dos Direitos do Homem, no artº 10º da Declaração Universal
dos Direitos do Homem, no artº 14º, nº 1, do Pacto Internacional de Direitos
Civis e Políticos, e no artº 3º, nº 3, do CPC.
12. Na verdade, mais uma vez, o Tribunal Constitucional violou o princípio do
contraditório, ao decidir contra o recorrente, sem lhe dar a possibilidade
prévia de se defender.
Termos em que requer que seja o Acórdão nº 58/2000 declarado nulo, nos termos
das disposições combinadas dos artºs 205º, nº 1, da Constituição, 659º, nº 2,
158º, nº 1, e 668º, nº 1, alínea b), do CPC, bem nos termos do disposto no artº
20º, nº 4, da Constituição, no artº 6º, nº 1, da Convenção Europeia dos Direitos
do Homem, no artº 10º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, no artº
14º, nº 1, do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, e no artº 3º,
nº 3, do CPC.
A entidade recorrida foi notificada dos requerimentos apresentados, não tendo
apresentado qualquer resposta.
Cumpre apreciar.
2. O recorrente, no requerimento de fls. 186 e ss. (numeração dos autos
principais, agora fls. 89 e ss. – transcrito supra) arguiu a nulidade do Acórdão
nº 619/99 que indeferiu a arguição de nulidade do Acórdão nº 475/99, invocando
omissão de pronúncia.
Ora, o Acórdão nº 619/99 apreciou todas as questões que cumpria ao Tribunal
Constitucional tomar conhecimento. Com efeito, apreciou a questão da nulidade
por alegadamente não ter sido dada a possibilidade de contraditar (tendo então o
Tribunal Constitucional explicitado que o recorrente teve a possibilidade de se
pronunciar sobre a questão do não conhecimento do objecto do recurso).
É pois manifestamente improcedente a arguição de nulidade, já que o Tribunal
Constitucional se pronunciou fundamentadamente sobre todas as questões que lhe
cabia conhecer.
Improcede, pois, o requerido pelo recorrente.
3. O recorrente, no requerimento de fls. 200 e ss. (na numeração inicial, agora
fls. 99 e ss. – transcrito supra), arguiu a nulidade do Acórdão nº 658/99, que
indeferiu a reclamação para a Conferência do Despacho que lhe indeferiu o pedido
de assistência judiciária.
O recorrente invoca omissão de pronúncia. No entanto, reconhece que o Tribunal
Constitucional apreciou a questão que suscitou. Afirma que as considerações
então tecidas são “vagas”. Contudo, a apreciação do recorrente das considerações
constantes do Acórdão nº 658/99 não infirma a evidência de o Tribunal
Constitucional ter apreciado todas as questões que lhe cabia conhecer,
nomeadamente o requerido reenvio prejudicial para o Tribunal de Justiça das
Comunidades Europeias.
Quanto ao alegado excesso de pronúncia, verifica‑se uma patente contradição na
argumentação do recorrente. Na verdade, as considerações constantes do Acórdão
nº 658/99 sobre o Regulamento de Processo no Tribunal de Justiça das Comunidades
Europeias decorre da alegação do próprio recorrente, alegação que o Tribunal
Constitucional tinha de analisar.
O recorrente entende que o Tribunal Constitucional tinha de lhe conceder razão.
Não foi, porém, esse o entendimento do Tribunal Constitucional. A discordância
do recorrente não origina, em face do Direito, a nulidade do Acórdão proferido.
O recorrente reitera o pedido de “pronúncia, a título prejudicial” do Tribunal
de Justiça das Comunidades Europeias (tal pedido já havia sido deduzido no
requerimento em apreciação). Uma vez que não se verifica a omissão de pronúncia
invocada, remete‑se agora, quanto à intervenção do Tribunal de Justiça das
Comunidades Europeias, para os fundamentos do Acórdão nº 658/99.
O recorrente reitera, igualmente, o pedido de apoio judiciário anteriormente
formulado. Quanto a tal pedido remete‑se, também, para a fundamentação do
Acórdão nº 658/99.
Improcede, portanto, o requerido.
4. O recorrente arguiu ainda a nulidade do Acórdão nº 58/2000 transcrito supra.
Ora, o Acórdão impugnado encontra‑se devidamente fundamentado, evidenciando o
elenco das vicissitudes processuais que o recorrente originou, de modo manifesto
e objectivo, as razões que levaram o Tribunal Constitucional a tirar traslado.
Com efeito, tais vicissitudes bem demonstram o desvirtuamento dos mecanismos
processuais utilizados.
De resto, o presente Acórdão bem revela o carácter anómalo da estratégia
processual do recorrente.
Improcede, também, o requerido a fls. 112 e 113 deste traslado.
5. Em face do exposto, o Tribunal Constitucional decide indeferir as arguições
de nulidades constantes dos requerimentos de fls. 89 e ss., 99 e ss. e 112 e
113.
Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 20 UCs.
Lisboa, 23 de Março de 2006
Maria Fernanda Palma
Paulo Mota Pinto
Benjamim Rodrigues
Mário José de Araújo Torres
Rui Manuel Moura Ramos