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Processo n.º 859/04
1.ª secção Relator: Conselheiro Pamplona de Oliveira
ACORDAM NO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL
A. reclama nos termos do n.º 4 do artigo 76.º da Lei do Tribunal Constitucional contra o despacho que, no 2º Juízo Cível do Tribunal Judicial da Comarca de Santarém, lhe não admitiu, com fundamento em extemporaneidade, o recurso que pretende interpor para o Tribunal Constitucional.
O representante do Ministério Público neste Tribunal sustenta, no seu visto, que o reclamante deverá ser previamente convidado a constituir advogado, atento o disposto no n. 1 do artigo 83º da LTC.
Importa decidir, tendo em conta o seguinte:
O ora reclamante começou por impugnar no 2º Juízo Cível do Tribunal Judicial da Comarca de Santarém o despacho de indeferimento do pedido de apoio judiciário
–que incluía a solicitação de pagamento de honorários a patrono por si escolhido
– que formulara perante o Centro Distrital de Solidariedade e Segurança Social de Santarém. O recurso foi, no entanto, rejeitado por despacho de 10 de Fevereiro de 2004 com fundamento em extemporaneidade do requerimento de interposição. O reclamante pediu a aclaração deste despacho (fls. 51), que foi indeferida (fls. 53); depois, requereu a reforma da decisão (fls. 57), o que igualmente foi indeferido
(fls. 60); finalmente, recorreu para o Tribunal Constitucional (fls. 62), com invocação das alíneas b), f) e i) do n. 1 do artigo 70º da LTC, por entender que a decisão de não conhecer do seu recurso “está ferida de ilegalidade e inconstitucionalidade, atenta as normas ínsitas os artigos 254º n. 1 e 4 e 255º n. 1 do Código de Processo Civil e no artigo 28º n. 2 da Lei 30-E/2000 de 20 de Dezembro e a interpretação e aplicação que delas se fez na decisão recorrida que
é ilegal e inconstitucional.” Esse requerimento apresenta-se assinado pelo recorrente e, também, pelo advogado indicado como seu patrono no requerimento de apoio judiciário. O recurso não foi admitido por despacho de 20 de Maio de 2004 (fls. 64), e daí a presente reclamação.
Importa ter desde logo em conta que se a decisão da presente reclamação revogar o despacho de indeferimento faz caso julgado quanto à admissibilidade do recurso
(artigo 77º n. 4 da LTC), o que impõe que o Tribunal se pronuncie sobre a verificação da globalidade dos pressupostos do recurso ou recursos interpostos.
Haverá que começar por considerar, para efeito de julgamento da reclamação em análise, que o reclamante está regularmente representado; a peça que contém a reclamação está assinada pelo advogado escolhido pelo interessado, conforme resulta abundantemente dos autos. Tanto basta, nas presentes circunstâncias em que se discute matéria relacionada com a recusa de pagamento dos honorários do patrono do reclamante no âmbito de um pedido de apoio judiciário, para dar por verificada a regularidade da representação. Pretende o reclamante interpor recurso da decisão com um triplo fundamento: o constante das alíneas b), f) e i) do n. 1 do artigo 70º da LTC.
Acontece que, manifestamente, não se verificam os pressupostos relativos ás alíneas f) e i) do n. 1 do mencionado artigo 70º; com efeito, não há qualquer vestígio de controvérsia sobre a aplicação ou desaplicação de norma em contrariedade com convenção internacional ou com o decidido, sobre esse assunto, pelo Tribunal Constitucional. É ainda evidente que a decisão não fez aplicação de qualquer norma cuja ilegalidade tenha sido previamente suscitada no processo com qualquer dos fundamentos referidos nas alíneas c), d) e e) do mesmo preceito, tal como se exige na citada alínea f).
Resta, portanto, saber se subsiste fundamento para o recurso interposto ao abrigo da alínea b) do n. 1 do artigo 70º da LTC. Entre os pressupostos deste tipo de recurso avulta o da preexistência de uma questão de inconstitucionalidade normativa, a qual deve, aliás, ser obrigatoriamente suscitada pelo recorrente perante o Tribunal recorrido por forma a que este a deva conhecer e decidir (artigo 72º n. 2 da LTC). Tal questão não se confunde, porém, com a ocorrência de vício de inconstitucionalidade de que porventura enferme a decisão recorrida.
Ora a verdade é que a acusação de inconstitucionalidade que o reclamante formula no processo tem como objecto o despacho recorrido e não uma qualquer norma que o mesmo tenha aplicado. E isto é assim ainda que o recorrente tenha usado uma formulação equívoca ao recorrer de decisão que “está ferida de ilegalidade e inconstitucionalidade, atenta as normas ínsitas os artigos 254º n. 1 e 4 e 255º n. 1 do Código de Processo Civil e no artigo 28º n. 2 da Lei 30-E/2000 de 20 de Dezembro e a interpretação e aplicação que delas se fez na decisão recorrida que
é ilegal e inconstitucional”, pois o que verdadeiramente contesta é a conformidade constitucional da decisão, conforme resulta sem margem para dúvida do requerimento em que pediu a reforma do despacho impugnado.
Há assim que reconhecer que o recurso interposto não pode ser admitido, razão pela qual deve ser indeferida a reclamação.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC.
Lisboa, 19 de Janeiro de 2005
Carlos Pamplona de Oliveira Maria Helena Brito Rui Manuel Moura Ramos
[ documento impresso do Tribunal Constitucional no endereço URL: http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20050032.html ]