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Processo nº 58/2006
2ª Secção
Relator: Conselheira Maria Fernanda Palma
Acordam, em Conferência, na 2ª Secção do Tribunal Constitucional
1. Nos presentes autos foi proferida a seguinte Decisão Sumária:
1. Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, A. e
outros interpuseram recurso contencioso de anulação do acto administrativo do
Vereador do Pelouro do Urbanismo da Câmara Municipal da Covilhã, que ordenou a
realização de obras num talude.
O Tribunal Administrativo de Círculo de Coimbra, por decisão de 28 de Janeiro de
2004, considerou o seguinte:
Os recorrentes interpuseram recurso contencioso da decisão de 2003/06/26, que
ordenou a realização de obras de consolidação do talude.
Efectivamente, por despacho de 26 de Junho a autoridade recorrida determinou que
os recorrentes fizessem obras de consolidação do talude, que ameaça ruína.
No entanto, esta não foi a primeira decisão sobre a questão.
Em 2003/02/05 o vereador do Pelouro do Urbanismo da Câmara Municipal da Covilhã,
o mesmo que proferiu a decisão recorrida, determinara que os recorrentes
efectuassem as obras de consolidação do talude porque, tal como resultou da
vistoria efectuada em 2003/01/14, “o talude natural que teve origem no desmonte
de granito aquando da construção do edifício apresenta descompressões do maciço
que acusam instabilidade ... situação coloca em causa a segurança dos moradores
ao nível do r/c, pois em caso de ruína pode esmagar parte deste espaço”.
Para que um acto administrativo seja contenciosamente recorrível tem de revestir
duas características: tem de ser o acto pelo qual a Administração define a sua
esfera jurídica ou a esfera de outros sujeitos de direito; o acto deve
constituir a resolução final da Administração, definindo a sua situação jurídica
ou a de pessoas que com ela estão, ou pretendem estar, em relação jurídica.
Tem, pois, de ser definitivo.
O que é um acto confirmativo?
Acto confirmativo é aquele que, dirigindo-se ao mesmo destinatário, repete o
conteúdo de um acto administrativo definitivo e executório anterior, sem que o
reexame dos pressupostos decorra da revisão imposta por lei - Sérvulo Correia,
Noções de Direito Administrativo, 1982, I, pág. 346 e segs.
“É confirmativo, e portanto contenciosamente irrecorrível, o acto que se limita
a manter a situação jurídica do interessado, definida por acto administrativo
anterior, apresentando ambos os mesmos elementos e sem que, no período de tempo
intermédio, tenha havido modificação das condições de facto nem alteração da
disciplina jurídica” – ac S.T.A. 28/6/1984, recurso 17 642, AD 282-625.
Portanto, um acto que repete o conteúdo de acto definitivo anterior é
confirmativo, não é definitivo (definitivo é o anterior, agora repetido) e,
portanto, não é contenciosamente recorrível.
O acto confirmativo não é acto administrativo definitivo por lhe faltar a
natureza inovatória, porquanto não modifica o ordenamento jurídico.
O acto recorrido determina, de novo, a realização de obras pelos recorrentes,
nos exactos moldes decididos anteriormente.
Em consequência, o recurso foi rejeitado.
2. Os recorrentes interpuseram recurso para o Supremo Tribunal Administrativo
que, por acórdão de 23 de Agosto de 2005, considerou o seguinte:
O relato que antecede evidencia que os Recorrentes impugnaram contenciosamente o
despacho, de 2003/06/26, do Sr. Vereador do Pelouro do Urbanismo da Câmara
Municipal da Covilhã - que lhes ordenou que procedessem à consolidação do talude
aqui em causa - e que fundamentaram esse recurso na nulidade desse acto.
Tal recurso foi, porém, rejeitado por ter sido entendido que o acto impugnado
era irrecorrível e que essa irrecorribilidade decorria do facto do mesmo se
limitar a determinar, “de novo, a realização de obras pelos Recorrentes, nos
exactos moldes decididos anteriormente”, isto é, advinha do mesmo se apresentar
como meramente confirmativo de despacho anterior.
É desta sentença que vem o presente recurso jurisdicional onde se sustenta a sua
nulidade - por se não pronunciar sobre alguns dos fundamentos do recurso
contencioso - e a sua ilegalidade - por fazer errado julgamento no tocante às
questões neles suscitadas.
Vejamos, pois, começando-se pela alegada nulidade da sentença recorrida.
1. A lei fulmina com a nulidade a sentença em que o Juiz “deixe de pronunciar-se
sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia
tomar conhecimento”, o que significa que a nulidade da sentença com fundamento
em omissão de pronúncia está relacionada com o incumprimento de um dos deveres
do Juiz, qual seja o de conhecer e resolver de todas as questões que as partes
hajam submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja
prejudicada pela solução dada a outras - arts. 668.º, n.º 1, al. d), e 660.º,
n.º 2, do CPC.
Dever esse que os Recorrentes entendem ter sido violado por a sentença sob
censura não ter conhecido de todas as questões suscitadas, designadamente não
ter conhecido da (1) irregularidade da notificação do acto impugnado, (2) da
ilegalidade da vistoria, (3) da questão da propriedade do talude e (4) da falta
de fundamentação dos diversos actos ora em causa. - vd. conclusões A a I.
Todavia, não têm razão.
Com efeito, as questões cujo conhecimento os Recorrentes reclamam ter sido
omitido só podiam ser conhecidas se o recurso tivesse sido admitido e se o seu
mérito tivesse sido apreciado, uma vez que as mesmas ou se relacionam com o
fundo da causa ou têm a ver com a comunicação do acto aos seus destinatários.
Ora, não tendo tal acontecido e tendo o recurso sido rejeitado liminarmente e,
portanto, tendo aquele soçobrado não por razões inerentes ao seu mérito mas por
razões adjectivas relacionadas com a impossibilidade da sua apreciação as
questões que os Recorrentes entendiam dever ser conhecidas não o puderam ser.
Ou seja, a sorte do recurso jogou-se em momento anterior à possibilidade do
conhecimento das questões nele suscitadas e essa rejeição impossibilitou o
conhecimento legal dessas questões.
Porque assim importa concluir que a sentença recorrida não é nula e,
consequentemente, que as conclusões A a I são improcedentes.
2. O Sr. Juiz a quo rejeitou o recurso contencioso por entender que o despacho
impugnado - de 26/6/2003 - se limitava a confirmar um acto definitivo anterior -
de 5/03/2003 - e que, sendo assim, era este e não aquele que devia ser objecto
de impugnação contenciosa. Com efeito, limitando-se o acto impugnado a ordenar,
“de novo, a realização de obras pelos Recorrentes nos exactos moldes decididos
anteriormente” aquele mais não fizera do que “manter a situação jurídica do
interessado, definida por acto administrativo anterior apresentando ambos os
mesmos elementos e sem que, no período intermédio, não tenha havido modificação
das condições de facto nem alteração da disciplina jurídica.”
O que significa que a situação jurídica dos Recorrentes fora definida pelo
primeiro desses actos, pelo que era esse que deveria ter sido atacado, e daí a
rejeição do recurso contencioso.
Nesta conformidade, o presente recurso jurisdicional deveria atacar esse preciso
julgamento, demonstrando o seu erro quando entendeu que o acto impugnado era
meramente confirmativo do despacho da mesma Autoridade de 05/02/2003 e que essa
circunstância determinava a sua irrecorribilidade. E isto porque os recursos
jurisdicionais são o meio normal de se obter a revogação ou a anulação de uma
sentença inquinada por um vício formal ou por um erro de julgamento.
Ou seja, cumpria aos Recorrentes expor as razões, de facto e/ou de direito, que
evidenciavam que, contrariamente ao decidi-do, o despacho recorrido não era
meramente confirmativo de acto administrativo anterior e que, não o sendo, era
susceptível de ser autonomamente impugnado. Só assim poderiam lograr convencer
este Tribunal que a decisão recorrida estava ferida por erro de julgamento e de
que, por isso, devia ser alterada ou anulada.
Se assim não for, isto é, se os Recorrentes se limitarem a reafirmar o que já
disseram no Tribunal a quo, repetindo o ataque ao acto impugnado nos moldes já
ensaiados na petição inicial, e se alhearem das razões que determinaram a
decisão que pretendem ver revogada, a sentença recorrida não poderá ser objecto
de sindicância no Tribunal ad quem, uma vez que o objecto do recurso
jurisdicional é a sentença e não o acto administrativo contenciosamente
impugnado. - vd., entre outros, Acórdãos deste STA de 2/2/00 (rec. 44.101), de
28/3/01 (rec.46.232), de 512/02 (rec. 48.198), de 19/6/02 (rec. 47.367), de
24/10/02 (rec. 43.420) e de 12/11/02 (rec. 645102) e Acórdão do Pleno deste
Tribunal, de 912199, Rec. n.º 38.625.
Ora, como se verá, estas regras não foram observadas pelos Recorrentes.
3. Na verdade, os Recorrentes iniciam as suas alegações procurando demonstrar
que a sentença era nula e que essa nulidade advinha do facto de a mesma não ter
conhecido de todas as questões que haviam suscitado, sintetizando esse
argumentário nas conclusões A a I. E, portanto, nesta parte a sentença recorrida
não vem impugnada por razões especificamente atinentes à bondade da decisão que
rejeitou o recurso contencioso.
O que vale por dizer que tais conclusões são inócuas relativamente à
demonstração do erro da fundamentação dessa rejeição e, portanto, são
irrelevantes no tocante à questão que ora se aprecia.
E o mesmo se diga no que respeita às conclusões J a N.
Com efeito, estas conclusões limitam-se a afirmar que o recurso contencioso era
atempado não só porque o acto efectivamente lesivo era o acto impugnado como
também porque os actos que o antecederam eram nulos. Ou seja, tais conclusões
não se debruçam nem atacam a decisão que considerou que o acto impugnado era
irrecorrível por ser meramente confirmativo de acto administrativo anterior.
E discurso alegatório nelas concentrado nada acrescenta, servindo apenas para
tentar demonstrar a ilegalidade do acto impugnado e não para atacar a decisão de
rejeição do recurso em função da irrecorribilidade do despacho impugnado. O que
significa que a bondade, ou o erro, do decidido e da sua fundamentação não foram
postas em causa neste recurso jurisdicional e que este serviu tão só para os
Recorrentes repetirem o ataque ao acto impugnado já ensaiado na petição inicial.
Sendo assim, e sendo que o recurso jurisdicional se destina a obter a revogação
do decidido no Tribunal a quo em função dos erros de julgamento cometidos e
sendo que estes eventuais erros não se mostram atacados, este recurso tem,
necessariamente, de improceder.
Em consequência, foi negado provimento ao recurso.
3. Os recorrentes interpuseram recurso de constitucionalidade nos seguintes
termos:
A. e OUTROS, Recorrentes já identificados nos autos de recurso contencioso de
anulação supra referenciados, em que é Recorrido o VEREADOR DO PELOURO URBANISMO
DA C. M. COVILHÃ, inconformados com o Douto Acórdão do S.T.A. de fls...., que
julgou improcedente o recurso jurisdicional por si interposto, vem dele recorrer
para o Tribunal Constitucional, com os fundamentos seguintes:
- O recurso de constitucionalidade é interposto ao abrigo da alínea b) do nº 1
do art. 280º da Constituição e da alínea b), do n° 1, do art. 70º da Lei n°
28/82 de 15/11, com as alterações introduzidas pela Lei n° 85/89, de 7 de
Setembro e pela Lei 13-A/98, de 26 de Fevereiro;
- Pretendem os Recorrentes ver apreciada a inconstitucionalidade do art. 102° da
L.P.T.A. (DL n° 267/85 de 16 de Julho com a dimensão interpretativa que foi
aplicada no douto Acórdão recorrido, segundo a qual se o Recorrente
jurisdicional, nas conclusões do recurso apresentado para o tribunal “ad quem”
atacar o acto contenciosamente impugnado e não a sentença recorrida, deve o
mesmo recurso improceder, sem mesmo se dar ao Recorrente a possibilidade de
completar e corrigir as conclusões apresentadas;
- Esta dimensão interpretativa do art. 102° da L.P.T.A., seguida pelo Acórdão
recorrido viola o princípio da tutela jurisdicional efectiva consagrada nos
arts. 20º, n° 1 e art. 268º, n° 4 da Constituição da República Portuguesa;
- A questão da inconstitucionalidade só agora foi invocada, obviamente, por só
agora o douto Acórdão recorrido aplicar aquela dimensão interpretativa do art.
102° LPTA, julgando o recurso jurisdicional improcedente.
NESTES TERMOS, deverá o presente recurso ser admitido.
Cumpre apreciar.
4. Sendo o presente recurso interposto ao abrigo dos artigos 280º, nº 1, alínea
b), da Constituição e 70º, nº 1, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional, é
necessário, para que se possa tomar conhecimento do seu objecto, que a questão
de constitucionalidade haja sido suscitada durante o processo.
O Tribunal Constitucional tem entendido este requisito num sentido funcional. De
acordo com tal entendimento, uma questão de constitucionalidade normativa só se
pode considerar suscitada de modo processualmente adequado quando o recorrente
identifica a norma que considera inconstitucional, indica o princípio ou a norma
constitucional que considera violados e apresenta uma fundamentação, ainda que
sucinta, da inconstitucionalidade arguida. Não se considera assim suscitada uma
questão de constitucionalidade normativa quando o recorrente se limita a
afirmar, em abstracto, que uma dada interpretação é inconstitucional, sem
indicar a norma que enferma desse vício, ou quando imputa a
inconstitucionalidade a uma decisão ou a um acto administrativo.
Por outro lado, o Tribunal Constitucional tem igualmente entendido que a questão
de constitucionalidade tem de ser suscitada antes da prolação da decisão
recorrida, de modo a permitir ao juiz a quo pronunciar-se sobre ela. Não se
considera assim suscitada durante o processo a questão de constitucionalidade
normativa invocada somente no requerimento de aclaração, na arguição de nulidade
ou no requerimento de interposição de recurso de constitucionalidade (cf., entre
muitos outros, o Acórdão nº 155/95, D.R., II Série, de 20 de Junho de 1995).
Os recorrentes sustentam que não tiveram oportunidade processual para suscitar a
questão que pretendem ver apreciada, invocando, ainda que implicitamente, o
carácter imprevisível da decisão recorrida.
No entanto, a decisão recorrida apenas explicitou que os recorrentes, num
recurso de uma decisão que considera que o acto impugnado é meramente
confirmativo de um acto administrativo anterior, devem impugnar os fundamentos
de tal entendimento e não limitar‑se a reiterar os argumentos anteriormente
apresentados nos autos relativos à impugnação do acto confirmativo (argumentos
que não foram apreciados pelo tribunal, precisamente por estar em causa a
impugnação de um acto confirmativo). Não se trata, portanto, de uma decisão
objectivamente inesperada, já que somente referiu qual deve ser a estratégia
processual a adoptar numa dada situação (a dos autos), estratégia processual
cuja previsão é exigível ao intérprete.
Por outro lado, e decisivamente, a dimensão normativa identificada pelos
recorrentes reporta-se à possibilidade de correcção de deficiências das
conclusões das alegações de recurso.
É manifesto que nos presentes autos o Supremo Tribunal Administrativo negou
provimento ao recurso, não por as conclusões das alegações apresentadas
enfermarem de uma qualquer deficiência suprível por via da resposta a um convite
para aperfeiçoamento, mas antes por a argumentação desenvolvida pelos
recorrentes nas alegações, argumentos naturalmente sintetizados nas conclusões,
ser, no caso, improcedente.
A dimensão normativa impugnada não foi pois aplicada pela decisão recorrida.
Não se verificam, portanto, os pressupostos processuais do recurso interposto,
pelo que não se tomará conhecimento do respectivo objecto.
5. Em face do exposto, decide‑se não tomar conhecimento do objecto do presente
recurso.
Os recorrentes reclamaram, ao abrigo do artigo 78º‑A, nº 3, da Lei do Tribunal
Constitucional, nos seguintes termos:
A. e OUTROS, recorrentes já identificados nos autos de recurso supra
referenciados, em que é recorrido o VEREADOR DO PELOURO DE URBANISMO DA CÂMARA
MUNICIPAL DA COVILHÃ, não se podendo conformar com a douta decisão sumária de
1/2/2006, vem dela reclamar para a conferência nos termos do disposto no art.
78° A, n° 3, da LTC e com os fundamentos seguintes:
1.- Na douta decisão sumária entendeu-se que a dimensão normativa impugnada não
foi aplicada pela decisão recorrida porque o Supremo Tribunal Administrativo
(S.T.A.) ter considerado a argumentação dos Recorrentes improcedente.
2.- Salvo o devido respeito o S.T.A. não chegou a apreciar a argumentação
desenvolvida pelos Recorrentes nas alegações, por entender que os Recorrentes se
limitaram a repetir o ataque ao acto impugnado e não apontaram os erros de
julgamento da sentença:
“Nesta conformidade, o presente recurso jurisdicional deveria atacar esse
preciso julgamento, demonstrando o seu erro quando entendeu que o acto impugnado
era meramente confirmativo do despacho da mesma Autoridade de 05/02/2003 e que
essa circunstância determinava a sua irrecorribilidade. E isto porque os
recursos jurisdicionais são o meio normal de se obter a revogação ou anulação de
uma sentença inquinada por um vício formal ou por um erro de julgamento”.
(...).
“Com efeito, estas conclusões limitam-se a afirmar que o recurso contencioso era
atempado não só porque o acto efectivamente lesivo era o acto impugnado como
também porque os actos que o antecederam eram nulos. Ou seja, tais conclusões
não se debruçam nem atacam a decisão que considerou que o acto impugnado era
irrecorrível por ser meramente confirmativo de acto administrativo de acto
administrativo anterior”.
(...)
“O que significa que a bondade, ou erro, do decidido e a sua fundamentação não
foram postas em causa neste recurso jurisdicional e que este serviu tão só para
os Recorrentes repetirem o ataque ao acto impugnado já ensaiado na petição
inicial.
Sendo assim, e sendo que o recurso jurisdicional se destina a obter a revogação
do decidido no Tribunal a quo em função dos erros de julgamento cometidos e
sendo estes eventuais erros não se mostram atacados, este recurso tem,
necessariamente, de improceder”.
3.- Ou seja, o STA não chegou a apreciar a questão da impugnabilidade do acto em
questão por entender que o Recorrente continuou a atacar o acto contenciosamente
impugnado e não a sentença recorrida.
4.- A bondade ou erro do decidido na sentença da primeira instância não chegou a
ser apreciado.
5.- E não chegou a ser apreciado porque o STA entendeu que o ataque dos
Recorrentes deveria ter sido dirigido à sentença e não ao acto impugnado.
6.- Esta ideia encontra-se fortemente arreigada na jurisprudência do STA que
entende que o tribunal não deve conhecer do objecto do recurso jurisdicional se
o recorrente não atacar directamente a sentença.
7.- Exemplos desta jurisprudência são os Acórdãos citados no Acórdão em apreço,
dos quais destacamos o Acórdão do Pleno do STA de 9/2/1999:
“II - Se nas conclusões da alegação o Recorrente se limita a alinhar razões e
fundamentos respeitantes a pretensas ilegalidades de acto administrativo, não
fazendo qualquer referência às razões e fundamentos do Acórdão Recorrido, nem
lhe imputando concretas violações de lei, o recurso terá de ser julgado
improcedente”.
8.- No presente caso, o tribunal a quo nem sequer chegou a apreciar o mérito das
conclusões J a N em que se afirmava que o recurso contencioso era atempado não
só porque o acto efectivamente lesivo era o acto impugnado como também porque os
actos que o antecederam eram nulos, o que poderá contender com a questão de o
acto impugnado ser ou não confirmativo do anterior.
9.- Sobrevalorizando-se aspectos formais determina-se a improcedência do
recurso.
10.- Sem se dar oportunidade aos recorrentes de corrigir estes aspectos formais
das suas conclusões de recurso.
11.- Os Recorrentes entendem que a sobrevalorização destes aspectos formais é
contra a ideia de justiça material e redunda em denegação de justiça: (neste
sentido: Mário Torres, in “Três falsas ideias simples em matéria de recursos
jurisdicionais no contencioso administrativo”).
12.- É esta a dimensão normativa impugnada que foi aplicada pela decisão do
S.T.A.
13.- E por isso a douta decisão sumária erra quando não reconhece esta dimensão
normativa e entende que o S.T.A. considera a argumentação desenvolvida pelos
recorrentes improcedente.
14.- O S.T.A. nem sequer pondera a argumentação desenvolvida pelos recorrentes
quanto à natureza e ao carácter lesivo do acto impugnado, pois entendeu que se
deveriam fazer referência às razões e fundamentos da sentença da primeira
instância.
15.- Interpretando o art. 102° do LPTA com o sentido de que se o Recorrente
jurisdicional, nas conclusões do recurso apresentado para o tribunal “ad quem”,
atacar o acto contenciosamente impugnado e não a sentença recorrida, o mesmo
recurso deve improceder, sem mesmo se dar ao Recorrente a possibilidade de
completar e corrigir as conclusões apresentadas.
16.- Por outro lado, respeitando as deficiências apontadas pelo STA às alegações
do recurso jurisdicional, e não à natureza e ao carácter lesivo do acto
impugnado, é obvio que estas deficiências apontadas pelo STA não foram objecto
de apreciação pela primeira instância.
17.- Tendo sido as deficiências apontadas às alegações do recurso jurisdicional
conhecidas, pela primeira vez, pelo STA na decisão em apreço.
18.- Os Recorrentes não puderam prever que o recurso por si interposto não seria
conhecido pelo facto de se terem limitado a fazer referências ao acto impugnado,
e não à decisão da primeira instância.
19.- Ou seja, que o seu recurso seria rejeitado por razões formais, sem ser
conhecido o mérito da questão.
20.- Pois, se o tivessem previsto, adoptariam um outro método de formulação
destas alegações formalmente mais correcto.
21.- Assim esta decisão do STA é objectivamente inesperada (ao contrário do
entendido da douta decisão sumária) e foi aplicada com um carácter inovador em
relação ao já anteriormente processado.
NESTES TERMOS, deverão V. Exas. revogar a decisão em apreço, conhecendo-se o
objecto do presente recurso.
A entidade recorrida pronunciou‑se do seguinte modo:
Salvo o elevado e devido respeito, a douta decisão proferida nos autos é
correcta quer na forma quer no conteúdo, pelo que deve ser mantida.
Nestes termos e nos demais de Direito e com o douto suprimento de Vossas
Excelências deve o requerimento apresentado ser indeferido, como é de inteira
JUSTIÇA!
Cumpre apreciar.
2. Os reclamantes pretendem demonstrar que a dimensão normativa impugnada foi
aplicada pelo tribunal a quo na decisão recorrida.
Como decorre dos elementos constantes dos autos transcritos na
Decisão Sumária reclamada, os reclamantes impugnaram uma dada dimensão normativa
do artigo 102º da Lei de Processo nos Tribunais Administrativos,
segundo a qual, impugnado o acto administrativo e não a sentença recorrida, o
recurso deve improceder, sem que seja dada oportunidade de correcção das
conclusões. No entanto, e como se demonstrou na Decisão Sumária, o acórdão
recorrido considerou improcedente o recurso em face dos argumentos apresentados
pelos recorrentes, considerando, pois, da fundamentação desenvolvida, e não
devido a deficiências das conclusões supríveis por via de resposta a um despacho
de aperfeiçoamento.
O fundamento da Decisão Sumária é, por conseguinte, a não aplicação pelo acórdão
recorrido da dimensão normativa impugnada, dado a decisão proferida pelo Supremo
Tribunal Administrativo no sentido do indeferimento do recurso não ter assentado
numa deficiência das conclusões das alegações de recurso, mas sim na estratégia
processual definida pelos recorrentes.
Isso mesmo resulta das transcrições que os reclamantes fazem na presente
reclamação do acórdão recorrido.
Por outro lado, a Decisão Sumária também tem por fundamento a não suscitação
durante o processo, de modo adequado, da questão de constitucionalidade
normativa, fundamento que não foi impugnado pelos reclamantes, pelo que a
Decisão Sumária sempre subsistiria.
Improcede, pois, a presente reclamação.
3. Em face do exposto, o Tribunal Constitucional decide indeferir a presente
reclamação.
Custas pelos reclamantes, fixando-se a taxa de justiça em 20 UCs.
Lisboa, 8 de Março de 2006
Maria Fernanda Palma
Benjamim Rodrigues
Rui Manuel Moura Ramos