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Processo n.º 296/2005
2.ª Secção
Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues
Acordam, em conferência, na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
A – Relatório
1 – A Câmara Municipal de Barcelos vem arguir a nulidade do Acórdão
n.º 594/2005 que lhe indeferiu a reclamação deduzida nos termos do n.º 3 do
artigo 78º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual versão (LTC)
contra a decisão sumária proferida pelo relator de não conhecimento dos recursos
de constitucionalidade interpostos dos acórdãos prolatados pelo Tribunal da
Relação de Guimarães (TRG), de 15 de Outubro de 2003, e do Supremo Tribunal de
Justiça (STJ), de 13 de Janeiro de 2005.
2 – Como fundamentos a requerente alega, em síntese, que o acórdão
reclamado “passou ao largo, ignorando as razões invocadas pela CMB, e desviou-se
totalmente do fundamento invocado – e só ele – naquela decisão sumária” e que
adoptou um outro e distinto fundamento de não conhecimento do recurso de
constitucionalidade, traduzido em a norma constitucionalmente impugnada não ter
constituído ratio decidendi da decisão recorrida, pelo que incorreu na nulidade
de excesso de pronúncia, nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 668º do
Código de Processo Civil (CPC), por tal questão não poder ser conhecida sem
estar assegurada a audição da CMB reclamante, segundo o princípio do
contraditório”, princípio este imanente à ideia de Estado de direito democrático
consagrado no artigo 2º da Constituição e expressamente firmado quer no artigo
32º, n.º 1, da mesma Lei fundamental quer no artigo 3º do CPC, aplicável à
tramitação do recurso de constitucionalidade.
3 – A requerida A. respondeu, defendendo que a alegada falta de
discussão de argumentos das partes, que é o vício que a requerente imputa ao
acórdão reclamado, não constitui qualquer nulidade do acórdão.
B – Fundamentação
4 – A arguição de nulidade respeita apenas à decisão constante do
acórdão relativa ao não conhecimento do recurso interposto do acórdão do Supremo
Tribunal de Justiça, sendo de notar que o acórdão contém duas decisões distintas
e autónomas, embora ambas de não conhecimento de recursos de constitucionalidade
(uma relativa ao referido recurso e outra referente a recurso interposto
directamente do acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães).
Ora, antes de mais, cumpre notar que o acórdão reclamado se situou,
quanto ao conhecimento da questão da não admissibilidade do recurso de
constitucionalidade interposto do acórdão do STJ, dentro da mesma linha de
fundamentação desenrolada na decisão sumária, apenas acentuando o facto de a
dimensão normativa constitucionalmente impugnada dos art. 671º, n.º 1, e 673º do
Código de Processo Civil, ao não haver constituído ratio decidendi do acórdão
recorrido (do STJ), consubstanciar por si só, já, a falta de um dos pressupostos
específicos do recurso de constitucionalidade que obstava a que o Tribunal
Constitucional pudesse tomar conhecimento do mesmo. A decisão sumária, por seu
lado, considerara, do mesmo modo, que a norma constitucionalmente impugnada não
constituíra a “verdadeira ratio decidendi” do juízo sindicando e que sendo assim
o Tribunal Constitucional não poderia conhecer dele, porquanto isso
corresponderia a conhecer da constitucionalidade de uma norma que não poderia
reflectir-se na reforma da decisão (inutilidade da decisão).
Quer isto dizer que as duas decisões adoptam o mesmo fundamento de
decisão, diferenciando-se apenas na circunstância de a decisão sumária ir mais
longe, ao apontar qual a ratio legis da exigência do referido pressuposto
específico de constitucionalidade (exigência de a norma constitucionalmente
impugnada constituir fundamento normativo da decisão).
Ao contrário do sustentado, o acórdão reclamado não conheceu assim
de outra questão, não ocorrendo a nulidade invocada.
De qualquer modo, nunca se verificaria a nulidade arguida, por falta
de audição da recorrente.
Constitui jurisprudência firme do Tribunal a de que não tem as
partes de serem ouvidas sobre as questões que o relator conheça (ou,
evidentemente, possa conhecer) na decisão sumária (cf., a este propósito, os
Acórdãos nºs 19/99, 307/2001, 456/2002 e 125/05, disponíveis em
www.tribunalconstitucional.pt).
A conferência que decide nos termos do n.º 2 do art. 78º-A da LTC
tem os mesmos poderes do relator, podendo conhecer das mesmas questões e nos
mesmos termos em que este o faz, embora intervindo apenas se solicitada pelo(s)
reclamante(s), correspondendo, nesta perspectiva, a uma intervenção própria de
um recurso de reexame por banda de uma outra formação jurisdicional.
Ora, fora do âmbito das questões que constituem o objecto concreto
da reclamação, não se vê a mínima razão para, em termos diferentes do que sucede
com a decisão sumária, se exigir a observância do direito de audição no caso em
que a decisão da conferência se limita, como foi o caso, a conhecer apenas da
existência dos pressupostos do recurso de constitucionalidade. Naquele campo, a
audição da parte não reclamante impõe-se como cumprimento do direito de
contraditório decorrente do exercício do direito de reclamação. O mesmo não se
passa já quando está em causa apenas a falta de outros pressupostos do recurso
de constitucionalidade cujo conhecimento é feito pela conferência nos mesmos
termos em que o relator o poderia logo ter efectuado. A questão da exigência do
contraditório entre as partes põe-se aqui nos mesmos exactos termos que se
colocam relativamente à decisão sumária do relator, valendo aqui a fundamentação
constante da jurisprudência que se identificou e para a qual se remete. Tal,
como aí acontece, reclamante e reclamado estão na mesma posição (de não
audição), não se vendo como possa invocar-se o direito de contraditório que não
funciona nessa fase e sobre a “nova” questão para qualquer das partes.
Por último, importa dizer que com o que vai dito não se está a
sufragar um “juízo de não conhecimento de recurso de constitucionalidade com
qualquer fundamento, incluindo um fundamento relacionado com a questão de
fundo”, cuja adopção a reclamante entende violar a Lei Fundamental, por o caso
não preencher essas hipóteses, cingindo-se à situação acima caracterizada.
C – Decisão
5 – Destarte, atento tudo o exposto, o Tribunal Constitucional
decide indeferir a reclamação de arguição da referida nulidade.
Lisboa, 6 de Janeiro de 2006
Benjamim Rodrigues
Maria Fernanda Palma
Rui Manuel Moura Ramos