Imprimir acórdão
Processo n.º 835/05
3ª Secção
Relator: Conselheiro Vítor Gomes
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
1. A. reclama, nos termos do artigo 77.º da Lei n.º 28/82, de 15 de
Novembro, do despacho de 12 de Julho de 2005, proferido pelo do relator do Proc.
n.º 1255/05-5 do Supremo Tribunal de Justiça, que não admitiu, por considerá-lo
extemporâneo, um recurso que interpôs para o Tribunal Constitucional de um
acórdão daquele Supremo Tribunal.
Alega que à contagem do prazo desencadeado por notificações
efectuadas pela secretaria se aplica a regra do n.º 4 do artigo 260.º-A do CPC,
de modo que o prazo decorrente de uma notificação por carta registada que se
presuma feita a uma sexta‑feira só começa a correr na segunda-feira seguinte.
Assim, o recurso foi interposto no 3.º dia após o termo do prazo, pelo que deve
ser liquidada a multa a que se refere o n.º 6 do artigo 145.º do CPC e o recurso
admitido.
O Ex.mo Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer nos termos
seguintes:
“A presente reclamação é manifestamente improcedente. Na verdade, ocorrendo uma
notificação feita pela secretaria ao mandatário, é evidentemente aplicável o
regime prescrito no art.º 254.º do CPC para as notificações por via postal
registada. Deste modo, não é naturalmente convocável o regime prescrito no art.º
260.º-A, nºs. 3 e 4, já que o mesmo se reporta apenas às notificações entre
mandatários e – a nosso ver – supõe que as mesmas terão ocorrido através de
meios não previstos como idóneos para a realização de notificações pela
secretaria.
Acresce que o reclamante não requer sequer, perante o Tribunal “a quo”, o
pagamento da multa que sempre seria devida pela prática do acto para além do
prazo peremptório – o que só por si, segundo entendimento jurisprudencial
reiterado – condenaria a sua pretensão.”
2. Dos autos resulta, com interesse para a decisão da reclamação, o seguinte:
a) O reclamante foi notificado de um acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
que rejeitou um recurso em processo penal em que era recorrente ( Autos de
Recurso Penal n.º 1255/05; Recurso Penal nº 3740/04.4 da 4ª Secção do Tribunal
da Relação de Coimbra / Processo Comum – Tribunal Colectivo - n.º 202/97.57AGRD,
do 3.º Juízo da Comarca da Guarda), por carta registada de 14 de Junho de 2005;
b) Interpôs recurso deste acórdão para o Tribunal Constitucional, mediante
requerimento enviado por telecópia para a secretaria daquele Supremo Tribunal,
em 4 de Julho, com o seguinte teor:
“A., não se conformando com a decisão do douto acórdão que rejeitou o recurso,
vem interpor recurso do mesmo para o Tribunal Constitucional da referida decisão
invocando a inconstitucionalidade da mesma bem como a inconstitucionalidade do
art.º 400º F) do Código de Processo Penal.”
c) Sobre esse requerimento recaiu o despacho reclamado, de 12 de Julho de
2005, com o seguinte teor:
“O recurso entrou fora de prazo, visto que, sendo tal prazo de dez dias e
presumindo‑se o requerente notificado no dia 17/6 (Cf. fs. 3966), o termo de tal
prazo ocorreu no passado dia 27/6. O terceiro dia útil depois desse termo,
ocorreria a 30/6.
Ora, o requerimento deu entrada, por faz, no dia 4/7. Logo, está completamente
fora de prazo.
Assim, não admito o recurso interposto.”
3. A notificação do acórdão de que se pretende recorrer foi expedida
pela secretaria do Supremo Tribunal de Justiça, para o escritório do mandatário
do reclamante, por carta registada de 14 de Junho de 2005, pelo que se presume
feita no terceiro dia posterior, ou seja a 17 de Junho de 2005, que recaiu numa
Sexta-feira (artigo 254.º, n.ºs 3 e 4 do CPC). Sobre este aspecto não há
controvérsia. Assim, supondo a aplicação da regra geral (artigos 279.º, alínea
b) e 296.º do Código Civil) iniciando-se a respectiva contagem no dia seguinte
àquele em que a notificação se considera efectuada, o prazo de 10 dias para a
interposição do recurso para o Tribunal Constitucional (artigo 75.º da LTC)
teria início no dia seguinte (Sábado) e terminaria em 27 de Junho
(Segunda-feira). Com a multa a que se refere o n.º 5 do artigo 145.º do CPC,
poderia o acto ser praticado até ao dia 30 de Junho de 2005. Em 4 de Julho, data
em que o recurso se considera interposto [artigo 150.º, n.º 2, alínea c) do
CPC], o direito de praticar o acto estava extinto (n.º 3 do artigo 145.º do
CPC).
4. Pretende, porém, o recorrente que se aplique à contagem deste
prazo a regra do n.º 4 do artigo 260.º-A do CPC, que dispõe:
“(…)
4. Se a notificação ocorrer no dia anterior a feriado, sábado, domingo ou férias
judiciais, o prazo para a resposta a tal notificação inicia-se no primeiro dia
útil seguinte ou no primeiro dia posterior ao termo das férias judiciais,
respectivamente, salvo nos processos judiciais que correm termos durante as
férias judiciais.”
Nessa hipótese, o início da contagem do prazo ocorreria na
Segunda-feira, dia 20 de Junho, pelo que o acto poderia ser praticado com multa
até ao dia 4 de Julho de 2005, dia em que apresentou o requerimento.
Sucede que o n.º 4 do artigo 260.º do CPC contém uma regra especial
para a contagem do prazo decorrente de notificação entre mandatários nos termos
do artigo 229.º-A do CPC, como resulta da epígrafe do preceito. A consagração de
um regime especial de início da contagem do prazo nesta situação explica-se pelo
facto de, podendo a notificação entre mandatários fazer-se por qualquer dos
meios previstos no artigo 150.º do CPC, incluindo através de telecópia e de
correio electrónico e depois da hora normal de funcionamento do escritório do
destinatário – meios que, ao tempo da introdução deste regime de notificação
entre mandatários pelo Decreto-Lei n.º 183/2000, de 10 de Agosto, não estavam
previstos para as notificações efectuadas pela secretaria (cfr. actualmente o
n.º 2 do artigo 254.º CPC, na redacção introduzida pelo Decreto-Lei n.º
324/2003, de 27 de Dezembro) – o legislador ter pretendido preservar a
disponibilidade efectiva do prazo integral, sem obrigar os profissionais do foro
à desproporcionada cautela de verificar a existência de eventuais notificações
até ao fim do dia anterior a feriado, sábado (domingo é redundante) e férias
judiciais.
Esta regra aplica-se, apenas, nesse domínio específico da
notificação entre mandatários como resulta da inserção sistemática, da história
e da teleologia do preceito. Aliás, há quem defenda, ancorado na razão que
inspirou este regime (Carlos Lopes do Rego, Comentários ao Código de Processo
Civil, vol. I, pág. 249), uma interpretação restritiva mesmo neste domínio,
excluindo a aplicação da regra especial quando a notificação entre mandatários
se faça por carta registada.
Fora dele, designadamente quanto ao início de contagem de prazos
desencadeados por notificações efectuadas pela secretaria – ao menos quando a
notificação se faça por carta registada como foi o caso, deixando-se de remissa
a hipótese de a notificação ter lugar pelo meio previsto no n.º 2 do artigo
260.º do CPC, sendo contudo de assinalar que o uso dessa via é condicionado à
actuação anterior do notificando, o que pode justificar que este deva tomar
cautelas especiais – aplica-se a regra geral de que o prazo começa a correr
automaticamente (independentemente de assinação ou de qualquer outra
formalidade, como anteriormente se dizia) pelo simples facto de ter chegado o
dies a quo ou de ter sido praticado o acto que o determina (Cf. no sentido de
que este modo de determinação do termo inicial do prazo constitui a regra geral,
embora anteriormente à introdução da regra especial em análise, Lebre de
Freitas, Código de Processo Civil Anotado, Vol. 1.º, anot. ao artigo 144.º,
págs. 248-249).
5. Decisão
Pelo exposto decide-se indeferir a reclamação e condenar o
reclamante nas custas, fixando a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de
conta.
Lisboa, 14 de Dezembro de 2005
Vítor Gomes
Maria dos Prazeres Pizarro beleza
Artur Maurício