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Processo nº 836/05
1ª Secção
Relatora: Conselheira Maria João Antunes
Acordam, em conferência, na 1ª secção do Tribunal Constitucional
1. Nos presentes autos de reclamação, vem a reclamante A., Lda. requerer a
reforma quanto a custas do Acórdão nº 646/2005, 16 de Novembro de 2005, pelo
qual se decidiu não conhecer do objecto da reclamação e condenar a reclamante
nas custas, fixando-se a taxa de justiça em vinte unidades de conta.
É o seguinte, para o que agora releva, o teor do Acórdão:
« I. Relatório
1. Nos presentes autos de reclamação, vindos do Tribunal da Comarca de Ponta
Delgada, em que é reclamante A., Lda. e reclamado o Ministério Público, foi
proferida por aquele Tribunal, em 4 de Março de 2005, decisão de não admissão de
recurso para o Tribunal Constitucional.
(...)
2. Foi então apresentada reclamação do despacho que não admitiu o recurso para o
Tribunal Constitucional (...)
3. Seguidamente, foi proferido o seguinte despacho:
«De harmonia com o disposto nos art.ºs 69.º da L.O.T.C. e 688.º/2 do C.P.C. o
prazo para apresentação de reclamação contra o indeferimento do recurso é de 10
dias a contar da sua notificação.
Averigue, por isso, a Secção de que forma deu entrada em juízo o requerimento de
fls. 149.
Caso tenha sido apresentado em 29.3.2005 há que dar cumprimento ao art.º 145.º/6
do C.P.C., o que desde já se determina».
4. O senhor funcionário judicial lavrou então a seguinte cota no processo:
«Em 04.04.05 averiguei junto da Secção Central a forma de entrada do
requerimento em tribunal, tendo sido informado que o mesmo tinha sido entregue
em mão, pelo que procedi a liquidação de multa».
5. A reclamante foi notificada para proceder, até 12 de Abril de 2005, ao
pagamento de multa no valor de duzentos e sessenta e sete euros, nos termos do
nº 6 do artigo 145º do Código de Processo Civil (fls. 33 e seg.), não tendo
efectuado tal pagamento.
6. Os autos foram remetidos a este Tribunal, a coberto do seguinte despacho:
«O julgamento de reclamação do despacho que indeferira o requerimento de recurso
compete ao Tribunal Constitucional, mos termos do art.º 77.º da L.O.T.C..
Essa apreciação há-de estender-se, quanto a nós, à sua admissibilidade (veja-se
por identidade de razão da Relação de Lisboa de 3.10.2000, CG, IV, 143)
Por conseguinte, ordeno a desapensação dos autos principais destes autos de
reclamação e a sua remessa ao Tribunal Constitucional, para apreciação, uma vez
que nada existe que importe reparar».
7. No Tribunal Constitucional, o Ministério Público pronunciou-se pela forma
seguinte:
«Não encontramos, certificada nos autos, a data em que o despacho de rejeição do
recurso de constitucionalidade, proferido em 4.3.05 (fls. 26) terá sido
notificado ao recorrente. De qualquer modo, face ao teor da decisão judicial que
ordenou expressamente o cumprimento do disposto no n.º 6 do art.º 145.º do
C.P.C., cabia à parte o ónus de pagar tal multa ou – se discordasse da decisão
do juiz de que a reclamação era intempestiva – atacar ou impugnar tal decisão.
Não tendo adoptado qualquer destas atitudes processuais, verifica-se que a
reclamação é efectivamente intempestiva.
Acresce que o recorrente não suscitou, durante o processo, a questão de
inconstitucionalidade da norma que constitui “ratio decidendi” do despacho de
fls.24: a constante do art.º 60.º, n.º 2, al. a), do C.C.J., sendo certo que a
interpretação normativa ali delineada não constitui seguramente “decisão
surpresa”, com a qual o recorrente não pudesse e devesse contar».
Dispensados os vistos, cumpre decidir.
II. Fundamentação
Atento o trânsito em julgado do despacho pelo qual se determinou o pagamento da
multa prevista no artigo 145º, nº 6, do Código de Processo Civil (supra, ponto
3.), é de considerar assente nos autos que o acto processual de apresentação de
reclamação do despacho que não admitiu o recurso para o Tribunal Constitucional
foi praticado num dos três dias úteis subsequentes ao termo do prazo previsto
(nºs 5 e 6 do referido preceito). Sendo certo que não veio a ser paga a multa
para cujo pagamento foi o reclamante notificado, não é válido o acto que
consistiu em reclamar do despacho que não admitiu o recurso para o Tribunal
Constitucional (artigo 145º, nºs 5 e 6, do Código de Processo Civil e artigo 69º
da LTC).
Assim, é de concluir pela intempestividade da reclamação e, consequentemente,
pelo não conhecimento da mesma».
2. A reclamante peticiona a reforma quanto a custas e, subsidiariamente, a
dispensa ou redução da multa, nos termos do disposto no nº 7 do artigo 145º do
Código de Processo Civil, pelo seguinte requerimento:
«O Reclamante apresentou reclamação do despacho de indeferimento de
indeferimento do recurso para a conferência deste Venerando Tribunal em 24 ou
29/03/05, (uma vez que do duplicado do signatário não é claro se se trata de um
4 ou um 9)
2.º
O Tribunal “a quo” considerou intempestiva a reclamação.
3.º
A reclamante foi notificada para proceder ao pagamento da multa nos termos do
disposto no art. 145.º do C.P.C., cujo pagamento a Reclamante não requereu de
imediato por pensar estar em prazo para apresentação da reclamação.
4.º
Atento o montante da multa, a Reclamante entendeu não o pagar pensando que não o
fazendo a reclamação ficaria sem efeito e não subiria.
5.º
Afinal subiu.
6.º
Vindo a reclamação, como é óbvio, a ser declarada intempestiva.
7.º
Ora se era intempestiva pura e simplesmente deveria a peça ter sido mandada
desentranhar.
8.º
Não pode é a Reclamante, além de não ter recebido o crédito exequendo por
inexistência de bens do executado, ter pago os honorários do patrono nomeado à
contraparte, ainda se ver confrontada com o pagamento da módica quantia de 20
unidades de conta (1.780,00 € !)
9.º
É obra !
Face ao exposto deve o douto Acórdão ser reformulado quanto às custas e a
Reclamante delas isenta por intempestividade do recurso que por isso deveria ter
sido mandado desentranhar. Como assim se não entenda, o que só por mera hipótese
se formula, sem contudo se conceber requer-se a dispensa da multa, ou na pior
das hipóteses a sua redução, nos termos do disposto no n.º 7 do ar. 145.º do
C.P.C. atenta a enorme desproporção com a realidade em causa».
3. O Ministério Público respondeu ao pedido formulado, nos seguintes termos:
«1 - A pretensão deduzida carece manifestamente de fundamentos.
2 - Na verdade, o acórdão reclamado limitou-se estritamente a dirimir a
reclamação deduzida pela entidade recorrente – sendo evidente que, se esta
entendia que tal impugnação carecia de interesse, deveria naturalmente ter
manifestado tal posição no processo, dela desistindo.
3 - Não o fazendo, levou naturalmente a que este Tribunal Constitucional sobre
ela se pronunciasse – já que o Tribunal “a quo” não profere qualquer decisão
sobre tal reclamação, endereçada ao Tribunal Constitucional – o que originou
precisamente o débito de custas.
4 - Sendo que o montante destas se situou dentro dos limites legais e
corresponde inteiramente ao que a jurisprudência, reiterada e uniforme, vem
aplicando às situações análogas ou equivalentes».
Cumpre apreciar e decidir.
4. Conforme decorre da mera leitura do Acórdão mencionado, não houve ali lugar a
qualquer condenação em multa, pelo que carece de fundamento a formulação de
pedido ao abrigo do disposto no artigo 145º do Código de Processo Civil, que
dispõe acerca da multa devida por prática de acto processual dentro dos três
primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo.
Quanto ao mais, decorre da análise dos autos que a ora reclamante foi notificada
do despacho (supra, ponto 6. da decisão) pelo qual se determinou a remessa dos
mesmos a este Tribunal, para apreciação da admissibilidade da reclamação (fls.
37, 37 v. e 38). Por via desta notificação, foi então dada oportunidade à
reclamante para impugnar aquele despacho ou para desistir da reclamação.
Na inércia da reclamante, foi proferida decisão pelo Tribunal Constitucional, a
qual está sujeita a custas, nos termos e com os limites fixados na lei,
respeitados no caso em apreço (artigos 2º, 7º e 9º, nº 1, do Decreto-Lei nº
303/98, de 7 de Outubro). Aliás, não pode deixar de assinalar-se que também o
desfecho agora propugnado pela reclamante para ser levado a cabo no tribunal
recorrido – o desentranhamento da reclamação – constitui incidente tributado
(artigo 16º do Código das Custas Judicias). Seriam, é certo, diferentes os
valores em causa; porém, como já se demonstrou, estava na inteira
disponibilidade da reclamante impedir a prolação de decisão por este Tribunal,
com um regime próprio de custas.
5. Assim e pelo exposto, indefere-se a requerida reforma, quanto a custas, do
Acórdão nº 646/2005.
Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 15 (quinze) unidades de
conta.
Lisboa, 14 de Dezembro de 2005
Maria João Antunes
Rui Manuel Moura Ramos
Artur Maurício