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Processo n.º 763/05
2.ª Secção
Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues
Acordam, em conferência, na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
A – Relatório
1 – A. reclama para a conferência, ao abrigo do disposto no n.º 3 do
art. 78º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual versão (LTC),
contra a decisão sumária do relator, de não conhecimento do recurso interposto
para o Tribunal Constitucional do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (STJ),
de 6 de Julho de 2005, acórdão este que lhe indeferiu o pedido de reforma do
anterior acórdão do mesmo Supremo Tribunal, de 4 de Maio de 2005.
2 – Fundamentando a sua reclamação, o reclamante aduz o seguinte
discurso argumentativo:
«[…]
O despacho do Exmo. Sr. Conselheiro-Relator, sendo solitário (porquanto era de
três Srs. Conselheiros que se esperava - e espera - uma decisão), é tudo menos
sumário.
E o simples facto de o Sr. Conselheiro-Relator ter expendido 27 longas páginas
numa decisão que se diz sumária mostra bem que a questão colocada nada tem de
simples.
O recurso é interposto ao abrigo da alínea b) do nº 1 do art. 70º da Lei 28/82,
de 15.11.
Diz o nº 1 do art. 78º-A da Lei 28/82, que “Se entender que não pode conhecer-se
do objecto do recurso, ou que a questão a decidir é simples, designadamente por
a mesma já ter sido objecto de decisão anterior do Tribunal ou por ser
manifestamente infundada, o relator profere decisão sumária, que pode consistir
em simples remissão para anterior jurisprudência do Tribunal.”
Ora, sendo certo que não existe decisão anterior sobre esta matéria, o simples
facto de o Exmo. Sr. Conselheiro-Relator ter necessitado de tão longa exposição
(ainda que manifestamente infundada, na perspectiva do recorrente...) para
concluir do manifesto infundado do recurso (na sua perspectiva...), evidencia
que a questão nada tem de simples nem de infundada. Ao invés, é uma questão nova
e com sólido fundamento, radicando na aplicação de uma norma, resultante da
conjugação de várias normas - nenhuma delas, de per si, inconstitucional -, que
constituiu, em absoluto, uma decisão-surpresa, motivo pelo qual não era possível
ao recorrente, antecipadamente, prever a aplicação dessa norma, que resulta de
uma interpretação, de cariz inconstitucional, dessas outras normas.
A norma cuja inconstitucionalidade se pretende ver apreciada é a que resulta da
interpretação dos arts. 217º, 224º e 236º, todos do Código Civil, e arts. 12º,
nº 1-a) e 13º, nº 1 do D.L. 64-A/89, de 27.2, segundo a qual se distingue entre
a declaração de cessação do contrato de trabalho emitida pelo empregador
fictício ou a (eventualmente) emitida pelo empregador real, para concluir que,
não tendo sido o empregador real a emitir a declaração de cessação, não há
despedimento, tudo isto após se ter procedido a uma “requalificação” de toda a
relação laboral do A., ao longo dos anos, e daí se ter extraído a (correcta)
conclusão de que deve o trabalhador ser tido como trabalhador efectivo do
empregador real (B.), assim tendo direito a todas as diferenças entre o que
recebeu e o que receberia se tivesse sido tratado como tal.
Ora, ao contrário do expendido pelo Exmo. Sr. Conselheiro-Relator, uma vez feita
essa requalificação e, portanto, de se considerar que o A. era trabalhador da
B., do que se trata aqui é de entender que a carta de cessação (de pretenso e
ilegal contrato a termo certo) enviada pelo empregador fictício não produz os
mesmos que - quando não existe empregador fictício - produz a carta de cessação
(de pretenso e ilegal contrato a termo certo) enviada pelo empregador (o único).
E, portanto, in casu, considerar que, apesar de todo o “esquema' fictício e
fraudulento utilizado – e, até certo ponto, sancionado pelo Supremo Tribunal de
Justiça -, ainda assim, só se procedente do empregador real (a B.) é que a carta
produziria o efeito de uma cessação factual, equivalente ao despedimento, como é
jurisprudência unívoca e, designadamente, dos dois Acórdãos do STJ invocados no
pedido de reforma do Acórdão.
Parece, pois, inequívoco que as normas ou princípios constitucionais violados
são os princípios da igualdade, estabelecido no art. 13º, e da segurança no
emprego, plasmado no art. 53º, ambos da Constituição da República Portuguesa, o
primeiro incluído no Título I da Parte I (Direitos e Deveres Fundamentais) e o
segundo no Capítulo III, do Título II da mesma, relativo aos Direitos,
Liberdades e Garantias, os quais, nos termos do art. 18º, nº 1 da mesma, são
directamente aplicáveis e vinculam as entidades públicas e privadas.
Viola o art. 13º, na medida em que estabelece uma diversa (e inaceitável)
consequência para o despedimento de um trabalhador, como é o caso do A.,
contratado (e despedido) através de um esquema fraudulento de contratação com
interposição fictícia de empresas, em relação aos demais trabalhadores
contratados sem essa interposição fictícia, pois que não equipara, em relação a
ele, a declaração de cessação do (ilícito) contrato a termo certo, sendo o termo
nulo, ao despedimento ilícito, sendo certo que tal equiparação é sempre feita,
em relação aos demais trabalhadores.
E viola o art. 53º, na medida em que o despedimento ocorrido, enquadrado no
esquema de contratação fraudulenta utilizado pelas RR., é um verdadeiro
despedimento sem justa causa, proibido por este normativo constitucional,
representando a interpretação dada pelo douto acórdão aos concernentes artigos
da lei ordinária, não atribuindo à declaração de cessação comunicada pela C.,
Lda. o mesmo efeito que teria se tivesse sido emitida pela B., uma clara
violação desse princípio com assento e dignidade constitucional.
A inconstitucionalidade da 'norma” resultante da interpretação efectuada foi já
suscitada no processo, em pedido de reforma do Acórdão proferido pelo STJ, e não
antes porquanto foi este alto Tribunal o primeiro a fazer uma tal interpretação,
a qual (quer pelo seu absurdo intrínseco, quer pelas absurdas consequências já
referidas nesse pedido de reforma) apanhou o recorrente completamente de
surpresa, não sendo, por isso, lícito exigir-lhe que tivesse previsto a
aplicação de tal “norma' e, prevenindo-a, tivesse previamente suscitado a
questão da sua inconstitucionalidade (de resto, já perante o Acórdão do Tribunal
da Relação, suscitara uma outra, de algum modo paralela, e de violação de uma
das normas agora invocadas).
Termos em que deve a presente reclamação ser considerada procedente e, em
consequência, ser o recorrente notificado para apresentar alegações, nas quais,
com mais delonga, possa demonstrar a existência da inconstitucionalidade, a
qual, de forma alguma, constitui uma questão simples ou manifestamente
infundada, que pudesse ser resolvida pelo Exmo. Sr. Conselheiro-ReIator, em
decisão sumária (e, de facto, de sumária nada teve...)».
3 – A recorrida B., s.a., não respondeu.
4 – A decisão reclamada tem o seguinte teor:
«1 – A. recorre para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do
disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei n.º 28/82, de 15 de
Novembro, na sua actual versão (LTC), do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
(STJ), de 6 de Julho de 2005, acórdão este que lhe indeferiu o pedido de reforma
do anterior acórdão do mesmo Supremo Tribunal, de 4 de Maio de 2005, afirmando,
no seu requerimento de interposição de recurso, que “a norma cuja
inconstitucionalidade se pretende ver apreciada é a que resulta da interpretação
dos artigos 217º, 224º e 236º, todos do Código Civil, e artigos 12º, n.º 1,
alínea a) e 13º, n.º 1, do DL. 64-A/89, de 27/2, segundo a qual se distingue
entre a declaração de cessação do contrato de trabalho emitida pelo empregador
fictício ou a (eventualmente) emitida pelo empregador real, para concluir que,
não tendo sido o empregador real a emitir a declaração de cessação, não há
despedimento, tudo isto após se ter procedido a uma “requalificação” de toda a
relação laboral do A. ao longo dos anos, e daí se ter extraído a (correcta)
conclusão de que deve o trabalhador ser tido como trabalhador efectivo do
empregador real (B.), assim tendo direito a todas as diferenças entre o que
recebeu e o que receberia se tivesse sido tratado como tal”.
Mais diz, no mesmo requerimento, que «a inconstitucionalidade da
“norma” resultante da interpretação efectuada foi já suscitada no processo, em
pedido de reforma do Acórdão proferido pelo STJ, e não antes porquanto foi este
alto Tribunal a fazer uma tal interpretação, a qual (quer pelo seu absurdo
intrínseco, quer pelas absurdas consequências já referidas nesse pedido de
reforma) apanhou o recorrente completamente de surpresa, não sendo, por isso,
lícito exigir-lhe que tivesse previsto a aplicação de tal “norma” e,
prevenindo-a, tivesse previamente suscitado a questão da sua
inconstitucionalidade (de resto, já perante o Acórdão da Relação, suscitara uma
outra, de algum modo paralela, e de violação de uma das normas invocadas)».
2 – Porque se configura uma situação enquadrada na hipótese
recortada no n.º 1 do art. 78º-A da LTC, passa a decidir-se imediatamente.
3 – O objecto do recurso de fiscalização concreta de
constitucionalidade previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 280º da
Constituição e na alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da LTC, disposição esta que
se limita a reproduzir o comando constitucional, consubstancia-se na questão de
(in)constitucionalidade da norma(s) de que a decisão recorrida faça efectiva
aplicação ou que constitua o fundamento normativo do aí decidido.
Trata-se de um pressuposto específico do recurso de
constitucionalidade que é exigido pela natureza instrumental (e incidental) do
recurso de constitucionalidade tal como o mesmo se encontra desenhado no nosso
sistema constitucional, de controlo difuso da constitucionalidade de normas
jurídicas pelos vários tribunais, bem como pela natureza da própria função
jurisdicional constitucional (cf. Cardoso da Costa, «A jurisdição constitucional
em Portugal», in Estudos em homenagem ao Professor Doutor Afonso Rodrigues
Queiró, Boletim da Faculdade de Direito de Coimbra, I, 1984, pp. 210 e ss., e,
entre outros, os Acórdãos n.º 352/94, publicado no Diário da República II Série,
de 6 de Setembro de 1994, n.º 560/94, publicado no mesmo jornal oficial, de 10
de Janeiro de 1995 e, ainda na mesma linha de pensamento, o Acórdão n.º 155/95,
publicado no Diário da República II Série, de 20 de Junho de 1995, e, aceitando
os termos dos arestos acabados de citar, o Acórdão n.º 192/2000, publicado no
mesmo jornal oficial, de 30 de Outubro de 2000).
Neste domínio, há que acentuar que, nos processos de fiscalização
concreta, a intervenção do Tribunal Constitucional se limita ao reexame ou
reapreciação da questão de (in)constitucionalidade que o tribunal a quo apreciou
ou devesse ter apreciado.
Na verdade, o conhecimento da questão de constitucionalidade há-de
poder, efectivamente, reflectir-se na decisão recorrida, implicando a sua
reforma, no caso de o recurso obter provimento.
Tal só é possível quando a norma cuja constitucionalidade o Tribunal
Constitucional aprecie tenha constituído a ratio decidendi da decisão recorrida
ou seja o fundamento normativo da decisão recorrida.
Por outro lado, cumpre acentuar que, sendo o objecto do recurso de
fiscalização concreta de constitucionalidade constituído por normas jurídicas
que violem preceitos ou princípios constitucionais, não pode sindicar-se no
recurso de constitucionalidade a decisão judicial em sim mesma quando esta faça
aplicação directa de preceitos ou princípios constitucionais ou o modo como a
mesma determinou o direito infraconstitucional e o aplicou às circunstâncias
concretas do caso.
Como já se afirmou, é sempre forçoso que no âmbito dos recursos
interpostos para o Tribunal Constitucional se questione a
(in)constitucionalidade de normas, não sendo, deste modo, admissíveis os
recursos que, ao jeito da Verfassungsbeschwerde alemã ou do recurso de amparo
espanhol, sindiquem sub species constitutionis a concreta aplicação do direito
efectuada pelos demais tribunais, em termos de se assacar ao acto judicial de
“aplicação” a violação (directa) dos parâmetros jurídico-constitucionais. Ou
seja, não cabe a este Tribunal apurar e sindicar a bondade e o mérito do
julgamento efectuado in concreto pelo tribunal a quo – a intervenção do Tribunal
Constitucional não incide sobre a correcção jurídica do concreto julgamento, mas
apenas sobre a conformidade constitucional das normas aplicadas pela decisão
recorrida, cabendo ao recorrente, como se disse, nos recursos interpostos ao
abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º, o ónus de suscitar o problema de
constitucionalidade normativa num momento anterior ao da interposição de recurso
para o Tribunal Constitucional [cf. Acórdão n.º 199/88, publicado no Diário da
República II Série, de 28 de Março de 1989; Acórdão n.º 618/98, disponível em
www.tribunalconstitucional.pt, remetendo para jurisprudência anterior (por
exemplo, os Acórdãos nºs 178/95 - publicado no Diário da República II Série, de
21 de Junho de 1995 -, 521/95 e 1026/9, inéditos e o Acórdão n.º 269/94,
publicado no Diário da República II Série, de 18 de Junho de 1994)].
A este propósito escreve Carlos Lopes do Rego («O objecto idóneo dos
recursos de fiscalização concreta de constitucionalidade: as interpretações
normativas sindicáveis pelo Tribunal Constitucional», in Jurisprudência
Constitucional, 3, p. 8) que “É, aliás, perceptível que, em numerosos casos –
embora sob a capa formal da invocação da inconstitucionalidade de certo preceito
legal tal como foi aplicado pela decisão recorrida – o que realmente se pretende
controverter é a concreta e casuística valoração pelo julgador das múltiplas e
específicas circunstâncias do caso sub judicio […]; a adequação e correcção do
juízo de valoração das provas e de fixação da matéria de facto provada na
sentença (…) ou a estrita qualificação jurídica dos factos relevantes para a
aplicação do direito […]».
4 – Depois, em segundo lugar, para que este Tribunal possa tomar conhecimento do
recurso, torna-se forçoso que a questão de inconstitucionalidade tenha sido
suscitada em tempo e por modo funcionalmente adequado para que o tribunal
recorrido pudesse conhecer dela.
A suscitação durante o processo tem sido entendida, de forma reiterada pelo
Tribunal, como sendo a efectuada em momento funcionalmente adequado, ou seja, em
que o tribunal recorrido pudesse dela conhecer por não estar esgotado o seu
poder jurisdicional. É evidente a razão de ser deste entendimento: o que se visa
é que o tribunal recorrido seja colocado perante a questão da validade da norma
que convoca como fundamento da decisão recorrida e que o Tribunal
Constitucional, que conhece da questão por via de recurso, não assuma uma
posição de substituição à instância recorrida, de conhecimento da questão de
constitucionalidade fora da via de recurso. É por isso que se entende que não
constituem já momentos processualmente idóneos aqueles que são abrangidos pelos
incidentes de arguição de nulidades, pedidos de aclaração e de reforma, dado
terem por escopo não a obtenção de decisão com aplicação da norma, mas a sua
anulação, esclarecimento ou modificação, com base em questão nova sobre a qual o
tribunal não se poderia ter pronunciado (cf., entre outros, os acórdãos n.º
496/99, publicado no Diário da República II Série, de 17 de Julho de 1996, e
Acórdãos do Tribunal Constitucional, 33º vol., p. 663; n.º 374/00, publicado no
Diário da República II Série, de 13 de Julho de 2000, BMJ 499º, p. 77, e
Acórdãos do Tribunal Constitucional, 47º vol., p.713; n.º 674/99, publicado no
Diário da República II Série, de 25 de Fevereiro de 2000, BMJ 492º, p. 62, e
Acórdãos do Tribunal Constitucional, 45º vol., p. 559; n.º 155/00, publicado no
Diário da República II Série, de 9 de Outubro de 2000, e Acórdãos do Tribunal
Constitucional, 46º vol., p. 821, e n.º 364/00, inédito). Excepção a tal regra
são apenas aquelas hipóteses ditas de excepcionais em que o recorrente é
confrontado com a utilização insólita e imprevisível, por parte da decisão, da
norma, ou seja, naqueles casos em que seria desrazoável e inadequado exigir do
interessado um prévio juízo de prognose relativo a tal aplicação em termos de se
antecipar ao proferimento da decisão, suscitando antecipadamente assim a questão
de inconstitucionalidade (cf., entre outros, os acórdãos n.º 489/94, publicado
no Diário da República II Série, de 16 de Dezembro de 1994, e Acórdãos do
Tribunal Constitucional, 28º, p. 415; n.º 310/00, publicado no Diário da
República II Série, 17 de Outubro de 2000, e Acórdãos do Tribunal
Constitucional, 47º vol., p.853 e n.º 120/02, publicado no Diário da República
II Série, de 15 de Maio de 2002, e Acórdãos do Tribunal Constitucional, 52º, p.
575).
5 – Ora, no caso em apreço, verifica-se a falta de dois desses
pressupostos específicos do recurso de constitucionalidade: a não impugnação de
norma que haja constituído o fundamento normativo da decisão e a falta de
atempada e adequada suscitação da questão de inconstitucionalidade.
Na verdade – no que tange ao primeiro – o que recorrente, sob a
capa da invocação de uma questão de inconstitucionalidade, verdadeiramente,
controverte é, indistintamente, a correcção do juízo de fixação da matéria de
facto efectuado pelas instâncias e que foi relevado pelo Supremo e a correcção
da qualificação jurídica, feita por este, dos factos relevantes para a aplicação
do direito ordinário (a correcção do juízo subsuntivo ao direito aplicável do
quadro de facto que vem fixado das instâncias). E, no tocante ao segundo, não
pode considerar-se estar o recorrente dispensado do ónus de, prévia e atempada,
suscitação da questão de inconstitucionalidade.
6 – Senão vejamos, recordando a história do caso, na parte útil à
presente decisão. O recorrente intentou acção emergente de contrato individual
de trabalho, com processo comum, contra B., S.A., D., L.da, E., L.da e C., L.da,
pedindo, em resumo, a condenação da Ré B. no pagamento de diferenças salariais,
provenientes de subsídios de férias e de Natal, de turno, de horas
extraordinárias e de gratificações à generalidade dos trabalhadores da B. e na
reintegração, como seu trabalhador, com a categoria de fiel de armazém, com as
funções e remuneração inerentes, tendo o Autor, após, a audiência de julgamento
e prolação da decisão sobre a matéria de facto, que não foi objecto de qualquer
reclamação, requerido a substituição da reintegração pela indemnização devida em
função da idade.
Como causa de pedir, o A. alegou, em síntese, que, desde Outubro de
1992 e até 31 de Dezembro de 2000, sempre trabalhou sob as ordens e direcção dos
encarregados da Ré B., cumpriu o horário de trabalho determinado por esta e com
ela ajustou os seus períodos de férias, não obstante durante esse lapso de
tempo haver estado formalmente vinculado, por diferentes períodos, a uma das
outras rés, através de contratos de trabalho temporário, mas que estes contratos
de trabalho eram nulos por corresponderem a um simples artifício de ocultação da
situação do Autor, enquanto verdadeiro trabalhador da Ré B., e que, por carta
datada de 11 de Dezembro de 2000, a Ré C., com quem então estava vinculado
formalmente, comunicou ao Autor não pretender renovar o “contrato de trabalho a
termo”, celebrado em 1 de Abril de 2000, pelo que o mesmo caducaria em 31 de
Dezembro, pelo que o Autor devia ter-se por ilicitamente despedido de empregado
da B..
7 – A acção foi julgada totalmente em 1ª instância, mas a Relação de
Coimbra, onde os autos subiram em consequência de recurso interposto pela Ré B.,
revogou a sentença e absolveu a recorrente de todos os pedidos.
8 – Inconformado, o Autor recorreu para o STJ, pedindo a revista da
decisão da apelação, com base nas seguintes conclusões:
«[…]
A) Não houve qualquer coincidência entre o objecto dos contratos (aliás, muitos
deles, não assinados) de prestação de serviços entre a B. e cada uma das demais
RR., por um lado, e as funções reais e efectivas desempenhadas pelo A., por
outro lado;
B) O autor sempre recebeu ordens da B., por ela eram definidas as suas funções e
as tarefas concretas a realizar em cada momento, (designadamente as de
motorista), com ela acertava férias, por ela era controlada a sua assiduidade;
C) Como tal, sempre o autor foi trabalhador da B., sendo a sua actividade
concretizada através de contratos de trabalho temporário com as outras RR., que
o cediam à utilizadora B.;
D) Não tendo essas empresas o respectivo alvará de empresas de trabalho
temporário, são tais contratos nulos;
E) Da nulidade desses contratos de trabalho temporário e da directa subordinação
do A. à R. B., resulta a sua conversão em contrato de trabalho sem termo
directamente com a B., desde 23.10.1992;
F) Ainda que, porventura, se não considerem tais contratos como de trabalho
temporário, estando provada a directa subordinação do A à R. B., sempre se
tratará de cedência ilegal, do que resulta, igualmente, a sua conversão em
contrato de trabalho sem termo, directamente com a B., desde 23.10.1992;
G) Como o Acórdão recorrido lucidamente afirma - na sua pág. 19 - Há, assim, que
concluir que todo o desempenho funcional do A. se processava à margem de
qualquer intervenção das co-Rés D., Lda., E. e C. portanto fora do âmbito de
execução dos designados 'contratos de prestação de serviços' que a recorrente
celebrou com essas Rés.
H) Não há que distinguir - e a Relação não explica por que razão distingue -
entre o último 'contrato', assinado pelo trabalhador e pela C., e os demais, uma
vez que não ocorre, a partir da data de 'início' do mesmo - 1 de Abril de 2000 -
qualquer alteração das funções do A. ou da sua subordinação jurídica à B.;
I) Não existe, portanto, em consequência da assinatura e 'início' do mesmo,
qualquer ruptura da continuidade ou, sequer, alteração da relação laboral entre
o A. e a B.;
J) Esse 'contrato' surge, assim, no mesmo quadro relacional dos anteriores,
significando a sua assinatura pelo A. a forma de manter o emprego;
L) Em consequência, o mesmo não tem virtualidade extintiva, não podendo operar a
cessação do contrato, por tempo indeterminado, que vigorava entre o A. e a B., o
qual, portanto, se manteve incólume;
M) Sendo de natureza excepcional as normas que permitem a intermediação de
terceiras empresas entre o trabalhador e o utilizador da prestação, toma-se
evidente que ficou indemonstrada qualquer razão válida, legítima e legal para
essa interposição;
N) O ónus da alegação e prova de que a intermediação das empresas 2ª, 3ª e 4ª
RR. era uma intermediação lícita, cabia às RR., ónus que, manifestamente, não
cumpriram;
O) Igualmente lhes cabia o ónus da alegação e prova de que com a assinatura do
'contrato' com a C. teria o A. intenção de fazer cessar o contrato existente que
o ligava directamente à B., ónus que, também, manifestamente, não cumpriram;
P) Em consequência do exposto, foi ilícito o despedimento do A., sem justa causa
nem precedência de processo disciplinar;
Q) Ao entender de modo diverso, violou o Tribunal da Relação, entre outras, as
normas do art. 342º do Código Civil, arts. 3º, 12º e 13º do D.L. 64-A/89, de
27.2, arts. 4º, 7º, 10º, 16º e 26º do D.L. 358/89, de 17.10;
R) E ao admitir a intermediação ou interposição fictícia de terceiras empresas,
definindo a natureza dos contratos em função do objecto social das empresas
interpostas e não do seu real conteúdo e objectivo, fez uma interpretação das
leis de trabalho, designadamente do art. 3º do D.L. 358/89, de 17.10, que viola
o princípio constitucional da segurança no emprego, expressamente consagrado no
art. 53º da Constituição;
S) E ainda, ao admitir essa intermediação ou interposição fictícia de terceiras
empresas, aceitando a diferenciação de remuneração do A. em relação aos
trabalhadores da B. com a mesma função, fez uma interpretação das leis de
trabalho, designadamente do art. 19º-b) do D.L. 49408, de 24.11.1969, que viola
o direito à retribuição do trabalho segundo o princípio de que para trabalho
igual salário igual, expressamente consagrado no art. 59º, nº 1-a) da
Constituição;
T) Quanto à indemnização de antiguidade (questão cuja apreciação pela Relação
ficou prejudicada pela decisão ora em revista), a mesma deve corresponder a um
mês de remuneração de base por cada ano de antiguidade ou fracção;
U) Tendo o A. começado a trabalhar para a B., através de contratos de trabalho
temporário inválidos com as outras RR. em 23 de Outubro de 1992 e tendo a
sentença sido proferida em 13 de Dezembro de 2002, deveria a indemnização
atribuída pela mesma ter sido a correspondente a 11 meses de remuneração de base
(dez anos completos e fracção de um ano) segundo o salário de 2002;
V) Tendo em conta o Acórdão de Uniformização de Jurisprudência 1/2004, a
sentença a que se referem os nºs 1 a 3 do artigo 13º do Decreto-Lei 64-A/89, de
27 de Fevereiro, não será necessariamente a de 1ª instância, mas sim aquela -
sentença ou acórdão - que venha em definitivo a julgar a ilicitude do
despedimento, pelo que deverá o quantum da remuneração de base e a antiguidade
ser reportados à data da prolação do acórdão desse Supremo Tribunal.
X) Em consequência do exposto, o montante da indemnização de antiguidade a
atribuir ao A. deverá ter em conta todo o tempo que venha a decorrer até ser
proferido o acórdão, bem como a remuneração que, então, vigore (€ 1.042 mensais,
em 2004; 12 anos, neste momento).
Z) Ao ter atribuído apenas o valor correspondente a 8 meses, e segundo o salário
de 2001, violou a douta sentença recorrida os arts. 13º, nº 1 do Decreto-Lei
64-A/89 e 663º do CPC, violação que o Tribunal da Relação não fez cessar,
prejudicada que ficou tal questão pelo teor da decisão proferida».
9 – Por acórdão de 4 de Maio de 2005, o STJ concedeu parcial
provimento ao recurso, condenando a Ré B. no pagamento das diferenças salariais,
por haver entendido que o Autor era efectivamente seu trabalhador, e
absolvendo-a do pedido de pagamento da indemnização por antiguidade e por
retribuições vincendas, por considerar não estar provado ter sido despedido por
tal entidade patronal.
Na parte útil à melhor compreensão desta decisão, escreveu-se nesse
acórdão do STJ:
«[…]
3.1.3. Ou seja, é inequívoco em face da factualidade apurada, que a prestação de
trabalho do A. no período de tempo em análise se prestou de forma juridicamente
subordinada à R. B. e em dessintonia, quer com o que estabeleciam os 'contratos
de trabalho a termo' sucessivamente celebrados entre o A. e as 2ª a 4ª RR. (que
identificavam estas como entidade patronal do A. e aludiam na respectiva
cláusula 5ª à sede das mesmas como local normal de trabalho do A.), quer com os
sucessivos 'contratos de prestação de serviços' celebrados entre estas RR. e a
R. B. (cuja cláusula 3ª prescrevia que os trabalhadores encarregados da execução
dos serviços pelo segundo outorgante dependerão exclusivamente dele, quer
jurídica quer economicamente, recebendo do mesmo as ordens, instruções e
informações necessárias à boa prestação do trabalho)
Como também se refere no acórdão recorrido, a realidade apurada no processo e
que terá de constituir suporte da decisão de direito não é minimamente
demonstrativa de que os acordos celebrados pela R. B. se revestem das
características dos denominados 'contratos de prestação de serviços', ou seja,
que foi na execução desses contratos e sob a autoridade, direcção e fiscalização
dos restantes outorgantes (as 2ª a 4ª RR.) que o A. desenvolveu a sua actividade
laboral.
E, por esta mesma razão, a realidade apurada no processo não traduz também a
execução dos diversos 'contratos de trabalho a termo” celebrados entre o A. e as
2ª a 4ª RR.
Pode assim afirmar-se que existe uma acentuada divergência entre o nomen
atribuído aos contratos escritos, o seu clausulado e a realidade.
Perante esta divergência, e tendo presente que o contrato individual de trabalho
tem natureza consensual, bem como que o traço caracterizador deste tipo
contratual (enquanto facto gerador da situação jurídico-laboral) reside na
circunstância de a actividade do trabalhador ser prestada de forma juridicamente
subordinada, a questão de determinar a entidade a quem o trabalhador está
laboralmente vinculado não pode ater-se à identificação da entidade patronal em
sentido formal (pessoa jurídica que outorga o contrato escrito), exigindo ao
intérprete uma análise exaustiva do comportamento das partes na execução do
contrato de modo a identificar a entidade sob cujo poder de direcção o
trabalhador presta a sua actividade hetero-determinada: será essa a entidade
patronal.
Como refere Abel Ferreira3, 'no estado actual do Direito do Trabalho e no plano
da determinação do empregador, sempre que a lei não indique expressamente noutro
sentido, a subordinação jurídica continua a constituir o único critério
disponível de averiguação da existência da relação de trabalho para efeitos de
aplicação da legislação laboral”.
Neste sentido de que o que releva fundamentalmente numa relação contratual desta
natureza é a existência de subordinação jurídica em relação ao dador de
trabalho, também se tem orientado a jurisprudência deste Supremo Tribunal4,
admitindo que o pagamento da retribuição, assim como a realização de outras
diligências, possa ser efectuado por outras entidades (como sucedeu no caso
'sub-judice' - vide 2.81.), sem que tal ponha em causa a natureza laboral da
relação em que se verifica a heterodeterminação da actividade do trabalhador.
Conclui-se, assim, que se estabeleceu e esteve em vigor entre o A. como
trabalhador e a R. B. como entidade patronal a partir de 23 de Outubro de 1992
um contrato individual de trabalho, tal como esta figura contratual vem definida
no art. 1º do DL nº 49.408 de 24 de Novembro de 1969 (LCT).
*
3.1.4. Perante esta realidade, a interposição das 2ª a 4ª RR. (que na verdade
não dirigiam a actividade laboral do A.) no contexto das relações que
efectivamente perduraram no tempo entre o A. e a 1ª R., mais não pode significar
do que um artifício jurídico com vista a encobrir verdadeiras relações laborais
entre a R. B. e o A. (que, formalmente, era trabalhador da 2ª e 4ª RR.).
É certo que a necessidade de colocar à mão das empresas instrumentos que lhes
permitam satisfazer necessidades de mão de obra pontuais, imprevistas ou de
curta duração, justifica figuras como o 'trabalho temporário' ou a 'cedência
ocasional de trabalhadores”, mas o legislador demonstrou bem o carácter
excepcional destas figuras que se afastam do chamado modelo de trabalho típico e
rodeou a sua admissibilidade de parâmetros rígidos e particulares cuidados.
Assim, o DL nº 358/89 de 17.10, alterado pela Lei nº 146/99 de 2.9 (LTT) veio
claramente combater a interposição fictícia e em fraude à lei, estabelecendo um
conjunto de regras, das quais se destacam as que dispõem taxativamente sobre as
formas jurídicas ao abrigo das quais é lícita a cedência (contrato de trabalho
temporário e cedência ocasional de trabalhadores) - arts. 9º, 17º, 18º, 26º e
27º - e as que responsabilizam o beneficiário do trabalho (utilizador ou empresa
cessionária) desconsiderando a empresa interposta em caso de ilicitude - arts.
10º, 11º, nº 4, 16º, nº 2, 18º, nº 5 e 30º.
Estas regras têm carácter imperativo, não admitindo que se constituam esquemas
de cedência de mão de obra à margem do que nelas se estabelece.
É também certo que as empresas vêm recorrendo recentemente a processos de
externalização ou 'subcontratação', recorrendo a empresas externas para
satisfação de necessidades que não se prendem directamente com o seu objecto
principal, o que fazem muitas vezes através de contratos de prestação de
serviços que estas últimas empresas executam com trabalhadores a elas vinculados
e que exercem a actividade laboral sob a direcção das mesmas.
Contudo, a subcontratação não pode também constituir um expediente fraudatório,
destinado a iludir as normas imperativas de Direito do Trabalho e
consubstanciando uma 'desresponsabilização do empresário principal relativamente
a um processo produtivo que se encontrava na sua esfera de direcção e com o qual
se avantajou de forma que repugna à consciência jurídica'5.
É esta situação que ocorre no caso dos autos.
É patente, perante a factualidade apurada, o desdobramento dos vínculos
contratuais que formalmente enquadram a prestação de actividade pelo trabalhador
para excluir o seu enquadramento num vínculo contratual duradouro que perdurou
entre 1991 e 2000, materialmente estabelecido entre dois sujeitos sem qualquer
vínculo formal entre si (o A. e a B.), e que perdurou inalterado apesar dos
sucessivos escritos e de vários interregnos em que não existia nenhum contrato a
termo formalmente em vigor.
Os negócios jurídicos que permitem a intermediação de terceiras entidades,
contrariando normas imperativas, são nulos nos termos do disposto no art. 294º
do CC.
É absolutamente demonstrativa de que, sob a capa de uma aparente
'subcontratação', o que se pretendia era colocar o A. à disposição da R. B. para
trabalhar para esta - através de um esquema de intermediação à margem daqueles
que a lei admite e para afastar a prestação de actividade do A. à B. durante
mais de 9 anos do regime do contrato individual de trabalho -, a evidente
desconformidade entre o estabelecido nos clausulados dos contratos a termo e dos
contratos de prestação de serviços, por um lado, e a apurada actuação dos seus
outorgantes, por outro.
E são também reveladores deste intuito fraudatório os factos que se verificaram
em Setembro de 2000 no sentido da modificação de procedimentos na transmissão de
ordens aos trabalhadores da 'cedência' após um trabalhador intentar uma acção
judicial contra a B. (2.64. a 2.69.), sendo certo que, mesmo com esta
modificação de procedimentos, as ordens e instruções necessárias eram dadas por
um trabalhador da C., que para o efeito contactava o encarregado de armazém,
passando do mesmo passo, algumas ordens do Sr. F. a ser sempre dadas por
intermédio daquele trabalhador (2.68. e 2.69.), o que denota um procedimento
tendente a mostrar algo de diverso do que realmente ocorre.
Igualmente é significativo que todos os contratos a termo celebrados tenham sido
sempre assinados, em nome das diversas entidades patronais identificadas nos
escritos, pela mesma pessoa: G., agora formalmente sócio da C., Lda. (vide
2.28.).
São pois nesta perspectiva nulos por fraude à lei, quer os contratos a termo
subscritos pelo A., quer os contratos de prestação de serviços subscritos pelas
RR., não produzindo quaisquer efeitos no que diz respeito ao vínculo laboral
permanente que se formou entre o A. e a R. SoporceI através do exercício estável
e continuado da actividade do primeiro de modo juridicamente subordinado à
segunda.
Em virtude desta nulidade, não têm estes escritos quaisquer relevância para a
apreciação do caso 'sub-judice', persistindo apenas como facto jurídico genético
dos direitos invocados pelo A. o contrato individual de trabalho sem termo que
se estabeleceu entre si e a R. B..
*
3.1.5. Perante esta constatação de que se firmou entre a R. B. e o A. um
contrato individual de trabalho, só por si suficiente para se proceder à
apreciação dos pedidos condenatórios formulados pelo A. que pressupõem a
vigência de um vínculo contratual com tal natureza, entendemos que perdem relevo
os pedidos relativos à declaração de que os contratos de trabalho a termo
celebrados consubstanciam 'contratos de trabalho temporário' e à declaração de
que os contratos de prestação de serviços celebrados entre as RR. consubstanciam
'contratos de utilização de trabalho temporário'.
Esta construção jurídica - tendente à declaração de que estes efectivos
contratos de trabalho temporário e contratos de utilização de trabalho
temporário são nulos e determinam nos termos do disposto nos arts. 10º e 16º, nº
3 da LTT que se considere prestado o trabalho ao utilizador com base em contrato
individual de trabalho sem termo - além de ser de difícil sustentação em face
das regras interpretativas estabelecidas no CC para os negócios formais6
revela-se destituída de interesse face à consideração de que se firmou e
desenvolveu entre o A. e a R. B. um contrato individual de trabalho sem termo e
de que os contratos de trabalho a termo e os contratos de prestação de serviços
formalmente celebrados são nulos por fraude à lei nos termos do art. 294º do CC.
*
3.1.6. De acordo com o entendimento expresso no acórdão recorrido, o contrato de
trabalho por tempo indeterminado existente entre o A. e a B. terminou com a
celebração entre o A. e a C., Lda., em 1 de Abril de 2000, do último contrato a
termo. Como resulta do exposto, é de subscrever a afirmação constante do acórdão
recorrido de que 'todo o desempenho funcional do A. se processava à margem de
qualquer intervenção das co-Rés D., Lda., E. e C. portanto fora do âmbito de
execução dos designados 'contratos de prestação de serviços' que a recorrente
celebrou com essas Rés.'
Contudo, não se vislumbra razão válida para distinguir de todos os contratos a
termo celebrados até Abril de 2000 o último 'contrato', assinado pelo A. e pela
C..
Foi esta fundamental distinção do acórdão em revista que determinou a absolvição
do pedido da B.. De acordo com a tese sufragada pela Relação, a partir de Abril
de 2000 o A. estava vinculado à co-R, C. através do último contrato a termo
celebrado e esta era a sua entidade patronal, não obstante a disponibilidade da
força de trabalho do A. em relação à B., vindo o dito contrato a termo a caducar
por iniciativa daquela co-R.
Ora, o que os factos provados denotam é que a actividade do A., que à data da
celebração deste último contrato se desenvolvia nas instalações da B. sem nenhum
contrato escrito que formalmente estivesse em vigor, continuou a desenvolver-se
no mesmo condicionalismo de subordinação jurídica à R. B., não tendo ocorrido, a
partir da data de 'início' do mesmo - 1 de Abril de 2000 - qualquer alteração
nas funções do A. ou no circunstancialismo em que ele desenvolvia a sua
actividade laboral (2.29. a 2.36.).
A situação laboral do A. na B. permaneceu inalterada apesar da subscrição do
novo contrato, como anteriormente sucedera sempre que, mais de uma dezena de
vezes, foram sendo celebrados sucessivos contratos a termo com as segunda e
terceira RR.
Como se refere no douto parecer junto aos autos (a fls. 1051), este contrato a
termo é afinal 'mais um de uma série de contratos celebrados entre os AA. e as
co-RR. no presente processo com o intuito, não de modelar uma relação laboral
entre as partes, mas antes de iludir a realidade, defraudando a aplicação de
dispositivos legais que ao caso caberia'.
Tem pois razão o recorrente quando afirma que este 'contrato' surge no mesmo
quadro relacional dos anteriores e, em consequência, não tem virtualidade
extintiva (como nenhum dos outros teve), não podendo operar a cessação do
contrato por tempo indeterminado que vigorava entre o A. e a B. desde 23 de
Outubro de 1992, o qual, portanto, se manteve em execução e incólume.
*
3.1.7. Haverá ainda que fazer uma referência às regras do ónus da prova, uma vez
que o acórdão recorrido não fez uma aplicação correcta das mesmas.
Na verdade, ao invés do que refere o acórdão recorrido, o A. invocou e
demonstrou em juízo uma relação de facto que constitui o suporte de um contrato
individual de trabalho por tempo indeterminado que, assim, se firmou entre si e
a B. a partir de 23 de Outubro de 1992, relação de trabalho efectiva esta que se
manteve e continuou a desenrolar após 1 de Abril de 2000.
Cumpriu pois o que estabelece o art. 342º, nº 1 do CC no que respeita aos
pedidos que se fundavam na existência de um vínculo contratual daquela natureza.
A R. B., por seu turno, não demonstrou - como alegara na sua contestação e,
consequentemente, tinha o ónus de provar - que estiveram em execução meros
contratos de prestação de serviços, através dos quais as demais RR. asseguravam
o funcionamento de determinados sectores ou áreas de serviço da B., utilizando
os seus trabalhadores admitidos por contrato de trabalho a termo, cuja
actividade dirigiam e organizavam com vista à prestação do serviço.
O que é patente é que os 'contratos' escritos não tiveram qualquer projecção na
conformação ou no desenrolar da relação laboral que, entre 1992 e 2000
mantiveram o A. e a R. B., vínculo laboral este que, como se refere no douto
parecer junto aos autos (a fls. 1042) 'permaneceu inalterado para lá dos seus
sucessivos inícios e cessações, bem como dos interregnos contratuais mais ou
menos prolongados.”
Demonstrados os factos constitutivos deste vínculo laboral duradouro, nada mais
incumbia ao A, provar, constituindo tarefas de qualificação jurídica que ao
tribunal incumbem (art. 664º do CPC) as de saber (se se considerar que tal
interessa à composição do litígio o que, já vimos, não ocorre) se os contratos a
termo consubstanciam contratos de trabalho temporário e se os contratos de
prestação de serviços consubstanciam contratos de utilização de trabalho
temporário cuja nulidade tem como consequência se considere o trabalho prestado
ao utilizador com base num contrato individual de trabalho sem termo.
Procedem pois, também, as conclusões das alegações da recorrente quanto ao
problema da repartição do ónus da prova.
3.1.8. Em face do exposto, deverá concluir-se que subsiste a decisão da 1ª
instância na parte em que declarou ter-se estabelecido entre o A. e a R. B. um
contrato individual de trabalho sem termo a partir de 23 de Outubro de 1992 e em
que, considerando o A. como assalariado da B., e ponderando as funções por ele
exercidas e os grupos de remunerações e escalões definidos no Guia do
Trabalhador dessa R., lhe reconheceu o estatuto profissional de GR 11, escalão 3
até Outubro de 1999 e de GR 10, escalão 3, desde essa data até 31 de Dezembro de
2000, enquadramento este que não foi posto em causa pela recorrida B. (nem na
apelação, nem na revista), pelo que não deverá nesta sede ser reapreciado.
Impõe-se assim manter a condenação da R. B., em consequência da vigência no
período apontado de um contrato individual de trabalho sem termo com o A. e do
reconhecimento do aludido estatuto profissional, no pagamento das diferenças
salariais (incluindo de subsídios de férias e de Natal), diferenças de subsídio
de turno, diferenças de valor da remuneração horária relativa às horas
extraordinárias e ainda as gratificações generalizadas a todos os trabalhadores
da B. e não pagas ao mesmo nos montantes, respectivamente, de € 32.603,25
(6.536.364$00); € 359,13 (72.000$00); € 1.066,78 (213.871$00) e € 5.977,94
(1.198.400$00), bem como juros de mora vencidos e vincendos sobre estas
prestações à taxa legal, contados desde a data do vencimento de cada uma das
diferenças ou prestações em falta, relativos aos últimos cinco anos e até
efectivo reembolso.
E, deste modo, fica prejudicada a apreciação das suscitadas
inconstitucionalidades, todas elas relacionadas com a interpretação de regras
legais - os arts. 3º do DL nº 358/89 e 19º, al. b) da LCT - efectuada pelo
Tribunal da Relação de modo que não foi acolhido por este Supremo Tribunal.
*
*
3.2. Do alegado despedimento e das suas consequências
*
Alega o A. ter sido alvo de um despedimento nulo e, com base nesse despedimento
peticiona uma indemnização de antiguidade que, na revista, pretende ver fixada
em montante equivalente a um mês de remuneração de base por cada ano de
antiguidade ou fracção contando-se todo o tempo até à data do presente acórdão
(conclusões T a Z).
A recorrida a este propósito invoca que não houve qualquer despedimento do A.
por parte da B., nem esta tinha legitimidade para o fazer por não ser sua
entidade patronal.
Ora se, como resulta do exposto, a B. tinha absoluta legitimidade para despedir
o A. - já que era efectivamente sua entidade patronal -, já não pode afirmar-se,
em face da factualidade apurada, que a B. tenha procedido ao despedimento do A.
por não se ter apurado que o A. deixasse de prestar trabalho à R. B. na
sequência de esta ter emitido uma declaração negocial (expressa ou tácita) que
demonstrasse a sua vontade de extinguir o vínculo laboral.
Na verdade, o despedimento constitui estruturalmente um negócio jurídico
unilateral receptício, através do qual a entidade patronal revela a vontade de
fazer cessar o contrato de trabalho, estando o despedimento individual
regulamentado nos arts. 9º e ss. do D.L. nº 64-A/89 de 27 de Fevereiro.
A declaração negocial extintiva da entidade patronal pode ser expressa, quando
realizada directamente através de palavras, escrito ou qualquer outro meio
directo de comunicação, conforme dispõe o art. 217º do C.Civil.
Estabelece ainda a lei civil a possibilidade de a declaração negocial ser
meramente tácita, ou seja, a possibilidade de se considerar como válida uma
declaração negocial que se deduza de factos que 'com toda a probabilidade” a
revelem (cfr. o art. 217º do C.Civil).
No domínio do despedimento promovido pela entidade patronal, tem a
jurisprudência entendido que a vontade de pôr termo ao contrato há-de ser
'inequívoca”, razão por que se não tem admitido o despedimento tácito com a
amplitude que é conferida à declaração negocial tácita pelo art. 217º,
aceitando-se apenas os chamados 'despedimentos de facto” quando há uma atitude
inequívoca da entidade patronal que configura a manifestação da vontade de fazer
cessar a relação laboral e assim é entendida pelo trabalhador ao abrigo do nº 1
do art. 236º do C.Civil, preceito que dispõe valer a declaração negocial com o
sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário,
possa deduzir do comportamento do declarante7
*
O despedimento de facto tem assim que ser expresso ou extraído de factos que,
inequivocamente, revelam a vontade da entidade patronal de fazer cessar o
contrato (art. 217º citado) perante o homem normal (art. 236º citado) e, para
ser eficaz, tem de ser levado ao alcance da outra parte em condições de esta
poder tomar conhecimento da respectiva declaração de vontade (art. 224º do
C.Civil).
Há pois que proceder à análise da situação fáctica e verificar se a mesma denota
a existência de uma declaração de vontade da R. B. no sentido de fazer cessar o
vínculo laboral que mantinha com o A., ou seja, se a B. teve uma qualquer
atitude que inequivocamente denuncie a intenção de despedir, seja por palavras
(escritas ou meramente verbalizadas), atitudes ou por omissões que, segundo a
experiência comum, tenham o significado equivalente ao despedimento8
Ora o que se provou foi tão só que por carta datada de 11 de Dezembro de 2000 a
C. comunicou ao A. não pretender renovar o 'contrato de trabalho a termo certo'
celebrado em 1 de Abril de 2000, pelo que o mesmo caducaria em 31 de Dezembro de
2000 (2.37.), pelo que o A. deixou de trabalhar na B. na indicada data de 31 de
Dezembro de 2000 (2.38.).
Em face destes factos, é manifesto que não pode afirmar-se ter a R. B.
rescindido unilateralmente o contrato de trabalho 'sub-judice'.
Não está de modo algum demonstrado que a R. B. tenha tido qualquer intervenção
naquele acto, ou que de qualquer forma tenha procedido ao despedimento do A.
através dos seus legais representantes, ou que tenha delegado em alguém o poder
disciplinar que tinha sobre o A. (designadamente na emitente da carta datada de
11 de Dezembro de 2000).
Poder-se-ia objectar a esta conclusão com a afirmação de que o próprio exercício
laboral do A. se desenrolou na sequência da celebração formal de contratos a
termo com as 2ª a 4ª RR., ou seja, independentemente de qualquer declaração
negocial da R. B..
Contudo, há que ter presente que a vinculação laboral do A. não tem como facto
jurídico genético a subscrição daqueles escritos mas, sim, o exercício
continuado de uma actividade laboral em beneficio da R. B. e uma situação de
subordinação jurídica à mesma (vide 2.7., 2.10., 2.29. a 2.36., 2.39. a 2.49. e
2.61. a 2.63.)
É em virtude de atitudes concretas da R. B. que, através dos seus encarregados,
dirigia, fiscalizava e organizava a actividade laboral que o A. exercia ao seu
serviço, que se afirmou a sua vinculação laboral ao A. e a sua persistência a
partir de 1 de Abril de 2000.
Quanto ao alegado despedimento, provou-se tão só a factualidade constante dos
números 2.37. e 2.38., o que é manifestamente insuficiente para se concluir que
a R. B. procedeu ao despedimento do A. com efeitos a partir de 31 de Dezembro de
2000.
Tal não significa que o contrato individual de trabalho 'sub-judice”, não tenha
cessado, neste ou noutro momento. O que não pode é afirmar-se que a missiva
remetida pela R. 'C.' ao A., desacompanhada de qualquer outra atitude da R. B.,
consubstancie uma declaração negocial extintiva emitida por esta última com a
virtualidade de fazer cessar o contrato que a vinculava ao A. e que este
desempenhava já desde 19929
Era ao A. que competia provar os factos integradores da hipótese legal do art.
13º do D.L. nº 64-A/89 de 27 de Fevereiro, para beneficiar dos direitos
indemnizatório e retributivo aí previsto, factos nos quais se incluía a
ocorrência do despedimento, como resulta da regra geral estabelecida no art.
342º, nº 1 do C.Civil.
Assim, porque inexistiu o alegado despedimento no dia 31 de Dezembro de 2000 -
despedimento cuja ocorrência incumbia ao A. provar nos termos do art. 342º do
C.Civil, enquanto facto constitutivo do seu direito -, não pode este
considerar-se ilícito, conforme invoca o A. nestes autos, nem tão pouco pode
atribuir-se-lhe as peticionadas indemnização por antiguidade e retribuições até
à data do presente acórdão».
10 – Invocando a existência de oposição entre os fundamentos e o
julgado concernente à parte em que saiu vencido e o disposto nos art. 668º, n.º
1, e 732º e 716º do Código de Processo Civil, o Autor reclamou deste acórdão,
alegando em certo ponto do seu discurso:
«[…]
VI. Há, pois, uma patente contradição entre a fundamentação e a decisão, na
parte que se refere ao 'despedimento', pois que neste, tal como em tudo o mais,
a empregadora fictícia apenas se substituiu à empregadora real na emissão dessa
declaração. Foi apenas o último acto da farsa encenada entre a B. e as co-RR,
para defraudarem a lei e, 'através de um esquema de intermediação à margem
daqueles que a lei admite', 'afastar a prestação de actividade do A. à B.
durante mais de 9 anos do regime do contrato individual de trabalho' (douto
Acórdão, pág. 20).
E, sendo a declaração receptícia, como bem se afirma, só a poderia entender um
declaratário normal, colocado na posição do A., como uma declaração de cessação
do contrato. Assim a entendeu ele e, por isso, considerou cessado o contrato.
Informando-se depois, descobriu nela um despedimento ilícito!
Há, portanto, uma nítida contradição entre a fundamentação e a decisão.
(Da qual resultará, aliás, esta consequência extraordinária: se existe um
contrato de trabalho (real) entre o A. e a B. e esta não despediu o A., então
estará o contrato em vigor? Deverá o A. apresentar-se às portas da B. para
oferecer a sua prestação de trabalho?
E resultaria esta, ainda mais extraordinária: o empregador deveria, ainda assim,
ser condenado pelo não cumprimento tempestivo da obrigação de pagamento da
retribuição... mas, neste caso, sem as deduções a que se refere o art. 13º, nº 2
da LCCT!).
Desta contradição parecem, aliás, ter-se apercebido V.Exas., quando referem que
'Poder-se-ia objectar a esta conclusão com a afirmação de que o próprio
exercício laboral do A. se desenrolou na sequência da celebração formal de
contratos a termo com as 2ª a 4ª RR., ou seja, independentemente de qualquer
declaração negocial da R. B.”. Porém, logo a minimizando com a consideração de
que não é essa subscrição o facto genético da vinculação do A. à B..
É, todavia, irrefragável que, não sendo essa subscrição o facto genético da
vinculação, ela é o facto que, aparente e formalmente, a enquadra e delimita,
levando a que seja, pelo A., entendida como declaração da entidade empregadora a
(ilícita) declaração de cessação do contrato emitida por quem subscrevera o
'contrato-documento' e que, naturalmente, em todo o esquema fraudulento montado,
actua no interesse e por conta da B..
É, portanto, claramente contraditório com os fundamentos da decisão considerar
que, no quadro de facto existente, tal declaração não configura um efectivo e
ilícito despedimento - como tal entendido pelo declaratário - e,
consequentemente, não reconhecer os direitos do A. às retribuições vincendas e à
reintegração ou indemnização de antiguidade.
VII. Qualquer diversa interpretação das normas dos arts. 217º, 224º e 236º,
todos do Código Civil e arts. 12º, nº 1-a) e 13º, nº 1 do D.L. 64-A/89, de 27.2,
como a expendida no douto Acórdão, será inconstitucional, por manifesta violação
dos princípios da igualdade, estabelecido no art. 13º, e da segurança no
emprego, plasmado no art. 53º, ambos da Constituição da República Portuguesa, o
primeiro incluído no Título I da Parte I (Direitos e Deveres Fundamentais) e o
segundo no Capítulo III, do Título II da mesma, relativo aos Direitos,
Liberdades e Garantias, os quais, nos termos do art. 18º, nº 1 da mesma, são
directamente aplicáveis e vinculam as entidades públicas e privadas».
11 – Este pedido foi indeferido pelo acórdão, ora recorrido, com
base nas seguintes considerações:
«[…]
Caberá anotar, antes de mais, que a arguição de nulidades decisórias constitui
“reclamação” e não pedido de “reforma” sempre que, como ao caso importa, a
decisão censurada não seja já objecto de recurso ordinário.
Assim, a pretensão em análise será havida como “reclamação”.
A nova lei impõe que o silogismo da sentença se ache correctamente estruturado,
por forma a que a conclusão extraída corresponda às premissas de que ela emerge:
“a desconformidade não está no conteúdo destas mas no processo lógico
desenvolvido” (Ac. STJ de 31/3/93 in C.J., STJ, 1993, II, 55).
Conforme salientam Lebre de Freiras e outros (in “Código de Processo Civil
Anotado”, vol. II, pág. 670), “… esta oposição não se confunde com o erro na
subsunção dos factos à norma jurídica ou, muito menos, com o erro na
interpretação desta: quando, embora mal, o Juiz entenda que dos factos apurados
resulta determinada consequência jurídica e este seu entendimento é expresso na
fundamentação, ou dela decorre, encontramo-nos perante o erro de julgamento…”.
Se, ao invés decorrer a assinalada desconformidade, a decisão é nula por
contradição entre a fundamentação lavrada e o segmento decisório – arts. 668º,
nº 1, al. c), 716º e 732º do Código de Processo Civil.
2.2
Examinando a p.i., verifica-se que a tese do Autor – toda ela – radica no
entendimento de que lhe dever ser reconhecida a categoria de trabalhador
efectivo da “B.”: uma vez assente essa qualificação, o Autor vem reclamar, por
um lado, o pagamento de diferenças salariais durante o tempo em que prestou
serviço para a Ré e, por outro, o pagamento de uma indemnização por pretenso
despedimento ilícito.
É absolutamente certo que o Acórdão em análise “requalificou” toda a relação
laboral do Autor, ao longo dos anos, concluindo que o mesmo deve ser tido como
trabalhador efectivo Ré “B.”.
De seguida extraiu as consequências jurídicas que essa “requalificação”
comporta, no que tange às diferenças remuneratórias entre o que o Autor
efectivamente recebeu e o que receberia se tivesse sido tratado como trabalhador
efectivo daquela Ré.
Coisa diferente se passou na óptica do Acórdão, quanto ao pretenso despedimento
ilícito que o Autor igualmente invoca.
Neste particular, entendeu o mesmo acórdão que a factualidade provada não
evidencia que a Ré “B.” tenha rescindido unilateralmente o contrato de trabalho
com o Autor.
No que respeita à cessação do contrato de trabalho – diz o Acórdão – apenas se
provou que a Co-Ré “C.” comunicou ao Autor, por carta de 11/12/00, não pretender
renovar o “contrato de trabalho a termo certo” celebrado em 1/4/00, pelo que o
mesmo caducaria em 31 de Dezembro seguinte, “…desacompanhada de qualquer outra
atitude da R. B., consubstancia uma declaração negocial extintiva, emitida por
esta última, com a virtualidade de fazer cessar o contrato que a vinculava ao A.
e que este desempenhava já desde 1991”.
Em absoluta consonância com esta fundamentação, conclui o Acórdão que o Autor
não logrou provar, como lhe cabia, o pretendido despedimento, com a consequência
de não lhe merecer dúvidas as indemnizações que, neste âmbito, reclama.
Perante esta sequência expositiva, não se vislumbra que o Aresto enferma de
vício que o Autor lhe aponta.
Da forma como, no caso, se entendeu que se constituíra o vínculo laboral do
Autor – e da natureza que se atribuiu a esse vínculo – não decorre que o
Tribunal houvesse sumariamente de concluir pela cessação ilícita desse vínculo
por banda da “B.”.
São coisas absolutamente distintas, com suporte factual também diverso.
Poderá discordar-se da construção jurídica operada – que já é imodificável – mas
não será validamente sustentável pretender-se que essa construção contém um
insanável vício contraditório entre as premissas aceites e a solução alcançada.
O que sucede é, tão-somente, que o Autor censura a orientação perfilhada pelo
Acórdão no tocante ao pretenso despedimento mas como está bom de ver, essa
censura é insindicável nesta sede.
2.3
Nem se diga também que a tese do Acórdão viola os preceitos constitucionais da
igualdade – art. 13º e da segurança no emprego – art. 53º do C.R.P..
Se na óptica do Acórdão, a entidade empregadora é a “B.” e esta não despediu o
Autor, resulta evidente que nenhuma atitude ilícita pode ser assacada à Ré neste
particular e, nessa medida, não se vislumbra a assinalada violação daqueles
preceitos constitucionais.
Parece também claro que a tese expandida não contraria minimamente a
jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores a propósito da aposição indevida
de um termo na duração do contrato e do consequente despedimento ilícito no
final desse termo: se não houve despedimento por parte da entidade empregadora,
que era a “B.” – como concluiu o Acórdão – nem sequer se coloca o problema da
cessação do vínculo laboral na vertente da sua eventual ilicitude.
Os pressupostos factuais são geneticamente diversos e, consequentemente, nenhuma
comparação se consente entre o Acórdão dos autos e os demais Autos invocados
pelo Autor.
Finalmente, dir-se-á que o art. 3º nº 3 do Cód. Proc. Civil, ao proibir a
prolação de decisões-surpresa, veio garantir, em decorrência do princípio do
contraditório, “… a participação efectiva das partes no desenvolvimento de todo
o litígio, em termos de, em plena igualdade, poderem influenciar todos os
elementos (factos, provas, questões de direito) que se encontrem em ligação,
directa ou indirecta, em o objecto da causa e em qualquer fase do processo
apareçam como potencialmente relevantes para a decisão” (Lebre de Freitas e
outros, ob. Cit., vol. I, pág. 8).
No caso dos autos, e para além da qualificação dos vínculos laborais celebrados
pelo Autor – saber com que entidade empregadora e qual a sua duração temporal –
vinha suscitada uma outra questão: o eventual depedimento ilícito por banda da
B..
Ao resolver esta última questão – no sentido da já assinalada inverificação do
despedimento - o Tribunal mais não fez do que dar resposta a uma das pretensões
reclamadas pelo Autor, em cujo âmbito tiveram as partes plena oportunidade de
esgrimir os seus argumentos.
De resto, a decisão do Tribunal constitui, patentemente, uma das soluções
possíveis para a questão que lhe foi colocada.
É dizer, em suma, que essa decisão não pode constituir adjectivamente qualquer
surpresa para o Autor.
3.
Em face do exposto, acordam em indeferir a reclamação deduzida».
12 – Ora, como, linearmente, se constata do relato que se deixou
feito, a decisão pretendida recorrer não se fundou nas razões que o recorrente
pretende converter formalmente no critério normativo tido, por ele, como
aplicado como ratio decidendi do julgado, relativamente à improcedência dos
pedidos baseados na existência de um despedimento ilícito, efectuado por banda
da Ré B. (pagamento da indemnização por antiguidade, substituta da reintegração
do trabalhador, e por retribuições vincendas).
Na verdade, o acórdão, para negar o direito a tais indemnizações,
fundou-se, precisamente, na consideração de não estar provado, em sede de
fixação da matéria de facto, que o empregador real – a Ré B. – tenha emitido a
declaração de cessação do contrato de trabalho do recorrente, com cuja
existência o recorrente entra em linha de conta na formulação do critério
normativo cuja constitucionalidade pretende sindicar.
Por outro lado, o acórdão, em ponto algum, baseia, também, a solução
de o Autor não ter direito às quantias acabadas de referir na existência de
qualquer distinção entre a declaração de cessação de trabalho emitida pelo
empregador fictício e a eventualmente emitida pelo empregador real: pura e
simplesmente, o acórdão recorrido infere a solução da circunstância processual
de o Autor não haver provado, em sede de fixação dos factos, que a declaração
que foi levada ao seu conhecimento, de cessação do seu contrato de trabalho,
correspondeu a uma decisão ou vontade negocial da Ré B..
Os preceitos invocados pelo recorrente foram convocados pelo STJ
apenas para ajuizar se, perante o quadro de facto dado como assente pelas
instâncias, se poderia dar como provada a existência de uma declaração da Ré B.
de cessação do contrato de trabalho com o Autor. Ou seja, esse quadro jurídico
apenas serviu de base para o STJ indagar se, à luz dos comandos normativos que o
integram, a Relação poderia fazer o juízo probatório que fez, no sentido de não
estar provado que a Ré B. tenha emitido qualquer declaração de cessação do
contrato de trabalho com o Autor.
Sob a capa da formulação de um critério normativo cuja
inconstitucionalidade o recorrente pretende ver apreciada, o que o recorrente
verdadeiramente contesta é que o acórdão possa ter concluído, em sede de facto e
de direito, que a questão da existência do contrato de trabalho entre o Autor e
a Ré B. e a questão do seu despedimento são distintas, e como tais susceptíveis
de ter uma diferente resposta, não havendo entre ambas qualquer relação de
necessidade lógico-jurídica.
Ao contrário, para o Autor, o tribunal, ao concluir pela existência
de um contrato de trabalho entre o Autor e a Ré B., enquanto realidade
subjacente ao esquema formal construído pelos Réus, não poderia, igualmente,
deixar de ver, no plano da valoração das provas e da fixação dos factos da
causa, a comunicação de cessação, feita pela Ré C., como correspondendo,
necessária e inelutavelmente, também, a uma declaração de vontade negocial de
despedimento do Autor, feita, efectivamente, pela Ré B..
Constata-se, assim, que o que o recorrente questiona não é qualquer
critério normativo cuja aplicação haja constituído a ratio decidendi do julgado,
mas a decisão judicial em si mesma, no que importa à especificidade do juízo
probatório feito no sentido de não se ter dado como assente que a comunicação
tida pelo Autor como despedimento apenas formalmente correspondeu a uma
comunicação feita pela Ré C., já que o seu sentido e decisão de o comunicar fora
produto da vontade da Ré B..
Todavia, já se viu que essa impugnação não pode constituir objecto
do recurso constitucional.
Desde logo, por esta razão, não se poderá tomar conhecimento do
recurso.
13 – Mas, independentemente deste fundamento, outro existe que
conduz ao mesmo resultado. É que, ao contrário, do que o recorrente defende não
poderá considerar-se estar-se perante uma situação de aplicação insólita ou
imprevisível de uma norma que o dispense do cumprimento do ónus de adequada e
atempada suscitação da questão de constitucionalidade.
Na verdade, o recorrente não poderia deixar de antecipar a
utilização da norma cuja constitucionalidade pretende sindicar desde o início da
acção e, mormente, na alegação do recurso de revista para o STJ.
Recorde-se que o recorrente defendeu, desde sempre, a tese de que a
comunicação que lhe foi feita pela Ré C. de que o seu contrato de trabalho
caducaria em 31 de Dezembro de 2000 devia ser tida como uma comunicação de
despedimento feita pela Ré B., em virtude de dever ser tido como trabalhador
desta, pois, “sendo de natureza excepcional as normas que permitem a
intermediação de terceiras empresas entre o trabalhador e o utilizador da
prestação, torna-se evidente que ficou indemonstrada qualquer razão válida,
legítima e legal para essa interposição”, sendo que “o ónus da alegação e prova
de que a intermediação das empresas 2ª, 3ª e 4ª RR. era uma intermediação
lícita, cabia às RR., ónus que, manifestamente, não cumpriram” e que “igualmente
lhes cabia o ónus da alegação e prova de que com a assinatura do ‘contrato’ com
a C. teria o A. intenção de fazer cessar o contrato existente que o ligava
directamente à B., ónus que, também, manifestamente, não cumpriram” (conclusões
M a O, das ditas alegações de recurso).
Ora, ao recortar assim a questão – e admitido que seja, sem
demonstração, que a definição feita pelo recorrente corresponde a uma dimensão
normativa dos preceitos que refere – não poderia, então, o recorrente deixar de
antecipar a sua aplicação, pois elas regem sobre as modalidades da declaração
negocial (art. 217º do Código Civil), sobre a eficácia da declaração negocial,
sobre a determinação do sentido normal da declaração negocial (unilateral do
despedimento) (art. 224º e 236º do mesmo diploma substantivo) e sobre a
ilicitude do despedimento efectuado pela declaração negocial (art.ºs 12º, n.º 1,
alínea a), e 13º da Lei dos Despedimentos – DL. n.º 64-A/89, de 27/02) e todos
eles eram susceptíveis de ser convocados para determinar, em sede probatória da
realidade subjacente à aparência formal que afirmava, se teria havido uma
declaração de despedimento que correspondesse à vontade negocial da Ré B..
Usando os termos do Acórdão n.º 192/2000, publicado no Diário da
República II Série, de 30 de Outubro de 2000, há que ter em conta que “quem
pretenda recorrer para o Tribunal Constitucional com fundamento na aplicação de
uma norma que reputa inconstitucional, tem, porém, a oportunidade de suscitar a
questão de constitucionalidade perante o tribunal recorrido, antes de proferido
o acórdão da conferência de que se recorre…”.
E é claro que não poderá deixar de entender-se que o recorrente tem
essa oportunidade quando a apreensão do sentido com que a norma é aplicada numa
decisão posteriormente proferida poderá/deverá ser perscrutado no(s)
articulado(s) processual(ais), funcionalmente previstos para discretear
juridicamente sobre as questões, cuja decisão tem de ditar, por antecedentemente
colocadas, e em que aquele sentido, cuja inconstitucionalidade se poderá
questionar, se apresenta como um dos plausíveis a ser aplicados pelo juiz.
Digamos que as partes têm um dever de prudência técnica na antevisão
do direito plausível de ser aplicado, fundado no facto de exercerem um mandato
forense por profissão e de esta pressupor o conhecimento das regras técnicas
aplicáveis às resolução das questões que colocam ao tribunal. O dever de
suscitação da inconstitucionalidade durante o processo e pela forma adequada
enquadra-se nesses parâmetros.
Ora, como o próprio recorrente afirma, a questão de
inconstitucionalidade relativa à formulação efectuada, tida por norma, apenas
foi colocada no pedido de “reforma” do acórdão, ou melhor, segundo a
qualificação feita Supremo e insindicável pelo Tribunal Constitucional, no
pedido de declaração de nulidade do acórdão antes proferido, na parte em que
aquele negara a revista pedida relativa à condenação da Ré B. no pagamento das
remunerações vincendas e da indemnização por antiguidade, devida pelo alegado
despedimento.
Sendo assim, falece, igualmente, o pressuposto específico deste
recurso, de prévia e adequada suscitação da questão de constitucionalidade.
14 – Destarte, atento a tudo o exposto, o Tribunal Constitucional
decide não tomar conhecimento do recurso.
Custas pelo recorrente, com taxa de justiça que se fixa em 8 UCs».
B – Fundamentação
5 – O reclamante refuta a decisão sumária, em primeiro lugar, com o
fundamento de que não é caso que caiba na hipótese definida no n.º 1 do art.
78º-A da LTC, de a questão a decidir ser simples, designadamente por a mesma já
ter sido objecto de decisão anterior do Tribunal ou por ser manifestamente
infundada. E nesse sentido aduz que não existe decisão anterior sobre a matéria
e que não pode ser havida como simples uma questão cuja decisão necessitou de
“tão longa exposição”.
Antes de mais importa anotar que a circunstância de a decisão
sumária ser extensa não tem nada a ver com a complexidade jurídica da questão,
podendo a mesma ser justificada por uma pretensão de maior clareza e de maior
completude em relação à solução alcançada.
Não foi, todavia, ao abrigo de tal segmento do preceito que a
decisão sumária foi proferida. Em ponto algum do seu discurso se afirma que se
decidia imediatamente por a questão ser simples, designadamente por a questão já
ter sido objecto de decisão anterior que se identificasse, ou por ser
manifestamente infundada.
O sentido da decisão reclamada é de não conhecimento do recurso e
estribou-se na falta dos pressupostos específicos do recurso de
constitucionalidade que nela se apreciaram.
Torna-se, assim, evidente que a decisão sumária foi proferida por se
considerar que ocorria a hipótese recortada na primeira parte do n.º 1 do art.
78º-A da LTC: “se entender que não pode conhecer-se do objecto do recurso…”.
O preceito em causa distingue claramente duas hipóteses em que pode
ser proferida decisão sumária: uma, consubstanciada em não conhecimento do
objecto do recurso e outra, já de conhecimento do objecto do recurso mas em que
a questão a decidir (ou seja a questão de constitucionalidade) é simples,
podendo essa simplicidade resultar do facto de a questão a decidir já ter sido
objecto de decisão anterior ou ser manifestamente infundada.
Deste modo a inobservância dos analisados pressupostos do recurso de
constitucionalidade – não sindicação de uma norma mas da própria decisão
judicial e não suscitação da questão de inconstitucionalidade durante o processo
– constitui fundamento para o relator proferir decisão sumária,
independentemente da complexidade que a análise desses pressupostos exige e de
existir ou não decisão anterior sobre casos análogos.
Improcede, pois, o primeiro fundamento da reclamação.
E o mesmo se poderá desde já dizer quanto aos demais, porquanto o
reclamante não logra infirmar a bondade da fundamentação aduzida relativamente à
falta dos pressupostos específicos do recurso de constitucionalidade nela
examinados.
Quanto à inobservância do ónus de prévia e adequada suscitação, o
reclamante limita-se a afirmar o que já antes dissera, não rebatendo os
argumentos aduzidos na decisão reclamada para concluir, como concluiu, no
sentido de não estar dispensado do cumprimento de tal ónus.
No que respeita ao fundamento de o reclamante não controverter norma
que haja constituído fundamento normativo da decisão mas “a decisão judicial em
si mesma, no que importa à especificidade do juízo probatório feito no sentido
de não se ter dado como assente que a comunicação tida pelo Autor como
despedimento apenas formalmente correspondeu a uma comunicação feita pela Ré C.,
já que o seu sentido e decisão de o comunicar fora produto da vontade da Ré B.”,
importa referir que o reclamante se mantém, na própria reclamação, no mesmo
plano.
Na verdade, ao dizer que
“uma vez feita essa requalificação e, portanto, de se considerar
que o A. era trabalhador da B., do que se trata aqui é de entender que a carta
de cessação (de pretenso e ilegal contrato a termo certo) enviada pelo
empregador fictício não produz os mesmos (efeitos – ter-se-á, porventura, querer
dizer) que – quando não existe empregador fictício produz a carta de cessação
(de pretenso e ilegal contrato a termo certo) enviada pelo empregador (o único).
E, portanto, in casu, considerar que, apesar de todo o “esquema” fictício e
fraudulento utilizado – e até certo ponto, sancionado pelo Supremo Tribunal de
Justiça – e, ainda assim, só se procedente do empregador real (a B.) é que a
carta produziria o efeito de uma cessação factual, equivalente ao despedimento,
como é jurisprudência unívioca e, designadamente, dos dois Acórdãos do STJ
invocados no pedido de reforma”,
o reclamante continua a controverter a correcção do juízo de facto,
com a respectiva consequência jurídica, tirada pelo acórdão recorrido sobre a
autoria da vontade de despedir o recorrente ou seja, a discutir a decisão
judicial em si mesma.
C – Decisão
6 – Destarte, atento tudo o exposto, o Tribunal Constitucional
decide indeferir a reclamação.
Custas pelo reclamante, com taxa de justiça que se fixa em 20 UCs.
Lisboa, 6 de Janeiro de 2006
Benjamim Rodrigues
Maria Fernanda Palma
Rui Manuel Moura Ramos
3 'Grupos de Empresas e Relações Laborais' in I Congresso de Direito do
Trabalho, Memórias, p. 289
4 Vide, particularmente significativo a este propósito, o recente Ac. do STJ de
2004.10.07 (Revista nº 1002/04, da 4ª Secção)
5 Vide J.N. Zenha Martins, 'A descentralização produtiva e os grupos de empresas
ante os novos horizontes laborais', in Questões Laborais, 18, p. 232, e também
pp. 194 e ss. e 225 e ss. Também o douto parecer junto aos autos a fls. 1025,
citando Däubler, alude às situações em que o cedente de mão de obra se apresenta
como 'empresário autónomo com organização própria' que envia os seus
trabalhadores para outra pessoa, mas dando a impressão de que estes 'vão
trabalhar segundo as instruções do cedente' cumprindo obrigações por este
contratualmente assumidas com o empresário através de contratos de prestação de
serviços ou de empreitada,
6 Estabelecendo o art. 238º do CC que a declaração negocial não pode valer com
um sentido que não tenha um mínimo de correspondência no texto do documento
ainda que imperfeitamente expresso, não se vê como extrair dos textos dos
contratos de trabalho a termo e dos contratos de prestação de serviços
documentados nos autos, com estipulações contratuais consentâneas com os títulos
neles apostos, que a vontade dos seus outorgantes fosse no sentido da celebração
de contratos de trabalho temporário e de contratos de utilização de trabalho
temporário. Por outro lado, a factualidade apurada nos autos é absolutamente
omissa quanto à vontade das partes contratantes, não permitindo afirmar ter
ocorrido divergência entre essa vontade e a declaração ou qualquer dos vícios da
vontade previstos na lei civil (arts. 240º e ss. do CC). Só a realidade da
execução da prestação laboral do A. leva a considerar não terem os vínculos
negociais concretamente estabelecidos correspondência com as estipulações
contratuais constantes dos documentos.
7 Vide os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 83.12.16, in B.M.J.
332/410, de 99.04.14 (Revista nº 72/99, 4ª secção), de 2000.11.15 (Revista nº
219/99, da 4ª secção), de 2001.02.01 (Revista nº 3432/00, da 4ª secção), de
2001.02.21 (Revista nº 3109/00, da 4ª secção) e de 2004.03.09 (Revista nº
4675/02, da 4ª secção).
8 Vide o Ac. do STJ de 2000.6.7 (Revista nº 281/99, da 4ª secção),
9 Em caso similar, no sentido de que é inócua no âmbito da relação de trabalho
sem termo surgida “ope legis” entre o trabalhador e uma empresa utilizadora, a
declaração de caducidade do contrato de trabalho emitida pela empresa de
trabalho temporário em consequência de alegada caducidade do contrato de
utilização, vide o Ac. do STJ de 98.03.03 (Revista nº 84/97, da 4ª Secção).