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Processo n.º 615/05
3.ª Secção
Relator: Conselheiro Gil Galvão
Acordam, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional:
I – Relatório.
1. A., ora recorrente, intentou, no Tribunal Judicial da Comarca de Gondomar,
acção declarativa contra o Centro Nacional de Pensões, ora recorrido, pedindo,
para o que agora importa, que: “[...] b) seja reconhecido que viveu mais de dez
anos consecutivos em união de facto com B.; [...] d) seja o Centro Nacional de
Pensões condenado a reconhecer à A. o direito às prestações sociais por morte do
beneficiário B., beneficiário n.º -------------, nos termos do regime geral da
segurança social nos montantes legais e com efeitos desde 26 de Julho de 2000”.
2. O Tribunal Judicial da Comarca de Gondomar decidiu julgar a acção
“parcialmente procedente, por provada e, em consequência, declarar que a autora
[...] viveu mais de dez anos consecutivos em união de facto com B. [...] e
parcialmente improcedente, por não provada, na parte restante, dela absolvendo o
réu”.
3. Inconformada com esta decisão a ora recorrente apelou para o Tribunal da
Relação do Porto que, por acórdão de 9 de Novembro de 2004, julgou o recurso
improcedente.
4. Novamente inconformada a Autora recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça
que, por acórdão de 31 de Maio de 2005, negou provimento à revista. Para tanto,
escudou-se na seguinte fundamentação:
“A questão específica colocada na presente revista enquadra-se na questão
global, discutida na jurisprudência (incluindo a do Tribunal Constitucional),
qual é a de saber se os requisitos exigíveis ao membro sobrevivo da união de
facto para que possa aceder às prestações por morte do companheiro, beneficiário
de qualquer regime público de segurança social - artigos 40, nº1, al. a) e 41,
n.º2 do Estatuto das Pensões de Sobrevivência (aprovado pelo DL 142/73, de 31 de
Março, na redacção que lhe foi dada pelo DL 191-B/79, de 25 de Junho), artigo 8°
do DL 322/90, de 18 de Outubro, Dec. Reg. 1/94, de 18 de Janeiro, Lei 135/99, de
28 de Agosto, entretanto revogada pela Lei 7/2001, de 11 de Maio - se reconduzem
apenas à prova relativa ao estado civil de solteiro, viúvo ou separado
judicialmente de pessoas e bens do referido beneficiário e à circunstância do
respectivo interessado ter vivido em união de facto, há mais de dois anos com o
falecido, ou, se, pelo contrário, continua a ser exigida também e
cumulativamente a prova da sua carência de alimentos, que não pode ser
satisfeita nem pela herança do falecido beneficiário, nem pelas pessoas a quem
legalmente podem ser exigidos.
Lê-se no acórdão recorrido:
«O art. 6° da Lei n.º135/99, de 28 de Agosto, (entretanto revogado pelo art.10°
da Lei n.º7/2001, de 11 de Maio), ao fazer a remissão para a existência dos
condicionalismos previstos no art.2020° do CC., continuou, em nosso entender, a
fazer depender a concessão de atribuições de prestações sociais à pessoa não
casada ou separada judicialmente de pessoas e bens que vivesse com o companheiro
falecido há mais de dois anos à data da morte deste em condições análogas às dos
cônjuges, desde que conseguisse provar:
- que tinha direito a exigir alimentos, por não os poder obter de ex-cônjuge,
descendentes, ascendentes ou irmãos;
- e também não conseguir obtê-los através da herança, devido a inexistência de
rendimentos ou rendimentos insuficientes desta.
Por sua vez, é-nos dado constatar que o art.6° da Lei nº7/2001, de 11 de Maio,
que substituiu aquela Lei, não alterou a respectiva regulação, só vindo a
clarificar, em nosso entender, que os direitos às prestações por morte do
beneficiário se efectivam através de uma única acção proposta contra a
instituição competente para a respectiva atribuição, pondo assim fim a uma velha
questão sobre a qual a Jurisprudência se mostrava dividida e que era a de saber
se seriam necessárias duas acções quando eram solicitadas prestações sociais à
Segurança Social através do então Centro Nacional de Pensões ou a outra
instituição (uma, instaurada contra a herança, para se comprovar a inexistência
ou insuficiência de rendimentos, e outra contra a instituição competente para
conseguir obter as competentes prestações sociais, depois de obtido o
reconhecimento do pedido efectuado na primeira acção).
Na verdade, o nº 2 do art.6° enuncia, expressamente que «Em caso de inexistência
ou insuficiência de bens da herança, ou nos casos referidos no número anterior,
o direito às prestações efectiva-se mediante acção proposta contra a instituição
competente para a respectiva atribuição», o que significa, em nossa opinião, que
o legislador pretendeu que tais direitos apenas fossem reconhecidos e
efectivados ao membro sobrevivo da união de facto, através de uma única acção
judicial contra a instituição competente para a respectiva atribuição, acção
essa na qual o A. tivesse alegado e conseguido provar:
a) que, à data da morte do companheiro, com ele vivia em união de facto há mais
de dois anos consecutivos - art.2020°-1ª parte do CC.;
b) que carecia de alimentos e não podia exigi-los a ex-cônjuge, descendentes,
ascendentes ou irmãos - art. 2009°, alíneas a) a d), ex vi da parte final do
n.º1 do art.2020° do CC.;
c) que a mesma herança os não podia proporcionar por inexistência ou
insuficiência de bens ou rendimentos - parte intermédia da previsão do preceito
citado. » .
É este o entendimento que consideramos correcto sobre a questão e que já
expressámos, entre outros, na revista 316/02-2, onde ainda tivemos ocasião de
nos pronunciar sobre a constitucionalidade da interpretação normativa subjacente
nos seguintes termos:
«Por fim, defende a recorrente a inconstitucionalidade do artigo 8° do DL
322/90, de 18 de Outubro por violação do disposto no artigo 26 da Constituição
da República Portuguesa e dos direitos e garantias dos cidadãos que vivem em
união de facto face aos casados para efeito de atribuição de pensão por morte.
Argumenta a recorrente que:
«Os cônjuges são titulares das pensões de sobrevivência, destinada a compensar
da perda dos rendimentos de trabalho determinada pela morte, não necessitando,
para que tal lhes seja reconhecido, de mais nenhum outro requisito e
independentemente de qualquer vencimento pessoal, ou estabilidade económica.
Ora, apesar do artº 8 prever as situações de união de facto, ofende os direitos
dos cidadãos abrangidos, quando faz depender a atribuição das pensões de
sobrevivência da verificação dos requisitos do art.º 2020° do CC, em vez de
unicamente condicionar essa atribuição à verificação dos requisitos previstos
nos artº 2 do decreto regulamentar 1/94 de 18/01, ou seja, a viver há mais de
dois anos nas condições análogas às dos cônjuges, assim como é suficiente fazer
prova do matrimónio.».
Entendemos, no entanto, que, face ao vigente quadro jurídico‑constitucional
regulamentador da família não merecem acatamento estes argumentos tendentes a
equiparar o casamento à união de facto. Evidentemente que a união de facto -
pese embora a crescente e justificada (como inegável fenómeno social) protecção
de que tem sido alvo por parte do legislador - não se pode equiparar ao
casamento, pois daquela não decorrem os deveres e os efeitos exclusivos deste.
Tal não impede, como ensina Pereira Coelho, RLJ, ano 120-82 e sgs., que a união
de facto se qualifique como relação de família, embora de conteúdo
incomparavelmente mais pobre que a relação matrimonial, sendo certo que, por
isso e na fase actual do nosso direito, se não deva considerar com tal cariz
para a generalidade dos efeitos.
Daí que os efeitos gerais do casamento não sejam extensivos à união de facto,
sob pena de eventual violação do principio constitucional da «protecção ao
casamento», consagrado no artigo 36, nºs 1 e 2 da nossa Lei Fundamental - loc
cit., página 84.
E daí também que, quando o legislador resolve intervir na área da união de
facto, o faz sempre de uma forma específica e rigorosamente delimitadora.
Como o fez recentemente a Assembleia da República, no âmbito em apreço, com a
publicação da Lei 7/2001, de 11 de Maio, sobre a adopção de medidas de protecção
das uniões de facto, onde se constata que o regime de acesso às prestações por
morte do beneficiário, estabelecido no seu artigo 6°, continua a depender da
verificação das «condições constantes no artigo 2020 do Código Civil» (n.º1),
ficando também agora claro - em confirmação da orientação jurisprudencial que
perfilhamos -- que, no caso de inexistência ou insuficiência de bens da herança,
a acção deve ser logo dirigida contra a instituição competente (n.º 2 ).
Inexiste, portanto, a apontada inconstitucionalidade.».
Este caso teve recurso para o Tribunal Constitucional, que, através do seu
acórdão n.º195/2003-3ª Secção, de 9 de Abril de 2003, sufragou o juízo de
constitucionalidade acabado de transcrever, decidindo «não julgar
inconstitucional a norma do artigo 8°, nº1, do Decreto-Lei n.º 322/90, de 18 de
Outubro, na parte em que faz depender a atribuição da pensão de sobrevivência
por morte do beneficiário da segurança social, a quem com ele convivia em união
de facto, de todos os requisitos previstos no nº1 do artigo 2020° do Código
Civil.».
Logo no ano seguinte; porém, o mesmo Tribunal, através do acórdão n.º88/04-3ª
Secção, de 10 de Fevereiro de 2004, veio a assumir posição contrária, decidindo
«julgar inconstitucional, por violação do princípio da proporcionalidade, tal
como resulta das disposições conjugada dos artigos 2°, 18°, n.º 2, 36°, n.º1, e
63°, n.ºs 1 e 3, todos da Constituição da República Portuguesa, a norma que se
extrai dos artigos 40°, n.º1 e 41º, nº 2, do Estatuto das Pensões de
Sobrevivência no Funcionalismo Público, quando interpretada no sentido de que a
atribuição da pensão de sobrevivência por morte de beneficiário da Caixa Geral
de Aposentações, a quem com ele convivia em união de facto, depende também da
prova do direito do companheiro sobrevivo a receber alimentos da herança do
companheiro falecido, direito esse a ser invocado e reclamado na herança do
falecido, com o prévio reconhecimento da impossibilidade da sua obtenção nos
termos das alíneas a) a d) do art.2009° do Código Civil».
Entretanto, em 29 de Março do corrente ano de 2005, com o acórdão nº159/2005, o
Tribunal Constitucional regressa ao primeiro entendimento, plasmado no acórdão
nº195/2003, emitindo um juízo de não inconstitucionalidade da norma extraída dos
artigos do Estatuto das Pensões de Sobrevivência supra transcritas, «na
interpretação segundo a qual a titularidade de pensão de sobrevivência em caso
de união de facto depende de o companheiro do falecido estar nas condições do
artigo 2020° do Código Civil, isto é, de ter direito a obter alimentos da
herança, por não os poder obter das pessoas referidas no artigo 2009, n.º1,
alíneas a) e d), do mesmo Código.».
E em reforço da argumentação, já expendida no acórdão nº195/2003, desta tese de
não inconstitucionalidade da interpretação normativa em apreço, concluindo - ao
contrário do defendido no acórdão n.º 88/04 - que dela não resulta qualquer
violação dos princípios constitucionais, mormente do princípio da
proporcionalidade, lê-se no referido e mais recente acórdão n.º159/2005 o
seguinte:
«Com efeito, o que está em causa no confronto de uma solução normativa com o
princípio da proporcionalidade não é simplesmente a gravidade ou a dimensão das
desvantagens ou inconvenientes que pode acarretar para os visados (com, por
exemplo, a necessidade da prova da carência de alimentos, ou, mesmo a exclusão
total de certos direitos). O recorte de um regime jurídico - como o da
destruição do vínculo matrimonial ou o dos seus efeitos sucessórios - pela
hipótese do casamento, deixando de fora situações que as partes não pretenderam
intencionalmente submeter a ele, tem necessariamente como consequência a
exclusão dos respectivos efeitos jurídicos. O que importa apurar é se tal
recorte é aceitável - se segue um critério constitucionalmente aceitável tendo
em conta o fim prosseguido e as alternativas disponíveis - sem deixar de
considerar a ampla margem de avaliação de custos e benefícios e como de escolha
dessa alternativas, que, à luz dos objectivos de política legislativa que ele
próprio define dentro do quadro constitucional, tem de ser reconhecida ao
legislador (e que este Tribunal reconheceu, por exemplo, no acórdão n.º187/01 ,
publicado no Diário da República, II série, de 26 de Junho de 2001 ).
Ora, como revela o paralelo da solução normativa em causa com a posição
sucessória do cônjuge sobrevivo e da união de facto - não equiparada, aliás,
pelas Leis n.ºs 135/99 e 7/2001 -, o tratamento post mortem do cônjuge é,
justamente, um daqueles pontos do regime jurídico em que o legislador optou por
disciplinar mais favoravelmente o casamento.
Esta distinção entre a posição post mortem do cônjuge e a do companheiro em
união de facto - que, aliás, podem concorrer entre si depois da morte do
beneficiário - é adequada à prossecução do fim do incentivo à família fundada no
casamento, que não é constitucionalmente censurável - e antes recebe até (pelo
menos numa certa leitura) particular acolhimento no texto constitucional. A
conveniência de tal distinção de tratamento post mortem, com os concomitantes
reflexos patrimoniais, pode ser, e será com certeza, diversamente apreciada a
partir de certas perspectivas, no debate político-legislativo - em que poderão
vir a encontrar acolhimento argumentos como o da distinção entre o direito a
alimentos e a pensão de sobrevivência, a existência e o sentido dos descontos
efectuados pelo companheiro falecido, à luz do regime então vigente e da sua
situação pessoal, ou a maior ou menor conveniência em aprofundar consequências
económicas específicas de uma relação familiar como o casamento. Mas a
Constituição não proscreve esta distinção, ainda quando ela tem como
consequência deixar de fora do regime estabelecido para a posição sucessória do
cônjuge o companheiro em união de facto.».
Podemos, assim, concluir que é conforme à Constituição a interpretação normativa
de que os requisitos exigíveis ao membro sobrevivo de união de facto para que
possa aceder às prestações por morte do companheiro (não casado, ou separado
judicialmente de pessoas e bens), beneficiário de qualquer regime público de
segurança social, são cumulativamente:
--a prova da união de facto, por mais de dois anos, entre o sobrevivo
interessado e o falecido beneficiário;
--a prova de que o sobrevivo interessado carece de alimentos e de que estes não
podem ser prestados nem pela herança do falecido beneficiário, nem pelas pessoas
a quem legalmente podem ser exigidos”.
5. É desta decisão que vem interposto, ao abrigo da alínea b), do n.º 1, do
artigo 70º da LTC, o presente recurso, através de um requerimento que tem o
seguinte teor:
“[...], Recorrente no recurso de revista do acórdão proferido nos autos da acção
declarativa de condenação, com processo comum sob a forma ordinária, à margem
referenciados, em que é Recorrido o CENTRO NACIONAL DE PENSÕES, vem, com pedido
de apoio judiciário, nos termos do artigo 70º, n.º 1 alínea b) da Lei número
28/82 de 15 de Novembro, recorrer do douto acórdão com fundamento em
inconstitucionalidade da interpretação dada no mesmo à norma do artigo 6° da Lei
135/99 de 28 de Agosto, hoje artigo 6° da Lei 7/2001 de 11 de Maio, por violação
dos princípios da igualdade e da proibição do excesso tal como a recorrente
pugnou no seu recurso de revista dirigido ao Supremo Tribunal de Justiça”.
6. Já neste Tribunal foi o recorrente notificado para alegar, o que fez, tendo
concluído da seguinte forma:
“1ª) Deve o acórdão recorrido ser revogado, reconhecendo-se o direito da
Recorrente às prestações sociais destinadas à protecção na eventualidade de
morte em caso de união de facto.
2ª) A norma do artigo 6º da Lei 135/99 de 28 de Agosto – hoje artigo 6º da Lei
7/2001 de 11 de Maio – deve ser interpretada no sentido de que o direito às
prestações por morte, titulado por membro sobrevivo da união de facto, é
independente de a herança do falecido ter ou não bens que suportem o encargo de
alimentos.
3ª) É que, no tocante à protecção na eventualidade de morte do beneficiário de
segurança social, verifica-se que a lei estabeleceu um princípio geral de
aplicabilidade do respectivo regime a todos aqueles que reúnam as condições
previstas no artigo 2020.° do Código Civil, ou seja, aqueles que no momento da
morte de pessoa não casada ou separada judicialmente de pessoas e bens, viva
com ela há mais de dois anos em condições análogas às dos cônjuges.
4ª) É hoje reconhecível ao companheiro sobrevivo gozar simultaneamente do
direito a alimentos, por via do disposto no artigo 2020.° do Código Civil, por
um lado, e do direito às prestações sociais por morte do seu companheiro, por
outra, face ao estabelecimento do citado princípio geral.
5ª) Para o reconhecimento do direito às prestações sociais por morte do
companheiro é necessário e suficiente a prova do preenchimento dos requisitos
legalmente impostos para a eficácia da união de facto, sendo irrelevante, nesta
matéria, saber se o companheiro sobrevivo necessita ou não dessas prestações
para assegurar a sua sobrevivência ou como mero complemento a esta.
6ª) Deve ser reconhecido à Recorrente o direito às prestações sociais por morte
do seu companheiro, B., beneficiário número --------, nos termos do regime geral
da segurança social nos montantes legais e com efeitos desde 26 de Julho de
2000.
7ª) Deve declarar-se a inconstitucionalidade da interpretação dada no mesmo à
norma do artigo 6º da Lei 135/99 de 28 de Agosto, hoje artigo 6º da Lei 7/2001
de 11 de Maio, pela sentença em crise, por violação dos princípios da igualdade
e da proibição do excesso.”
7. Notificada a recorrida para contra-alegar, disse, nomeadamente, o seguinte:
“[...] Oferece o ora Recorrido o mérito do douto Acórdão de fls..., proferido
pelo Supremo Tribunal de Justiça (adiante designado por STJ), que de forma tão
sábia e proficiente negou provimento à Revista, confirmando a improcedência da
acção, absolvendo consequentemente o Réu no pedido, e considerou conforme à
Constituição, a interpretação de que os requisitos exigíveis ao membro sobrevivo
de união de facto para que possa aceder às prestações por morte do companheiro
(não casado, ou separado judicialmente de pessoas e bens), beneficiário de
qualquer regime público de segurança social, são cumulativamente:
- a prova da união de facto, por mais de dois anos, entre o sobrevivo
interessado e o falecido beneficiário;
- a prova de que o sobrevivo interessado carece de alimentos e de que estes não
podem ser prestados, nem pela herança do falecido beneficiário, nem pelas
pessoas a quem legalmente podem ser exigidos. [...]”
II – Fundamentação
8. A questão colocada à apreciação deste tribunal não é nova na jurisprudência
constitucional. Na verdade, conforme resulta da própria decisão recorrida, o
Tribunal Constitucional já teve ocasião de se pronunciar por diversas vezes
sobre a interpretação normativa agora questionada – a de que “os requisitos
exigíveis ao membro sobrevivo de união de facto para que possa aceder às
prestações por morte do companheiro (não casado, ou separado judicialmente de
pessoas e bens), beneficiário de qualquer regime público de segurança social,
são cumulativamente: a prova da união de facto, por mais de dois anos, entre o
sobrevivo interessado e o falecido beneficiário; a prova de que o sobrevivo
interessado carece de alimentos e de que estes não podem ser prestados nem pela
herança do falecido beneficiário, nem pelas pessoas a quem legalmente podem ser
exigidos, embora imputada a diferentes preceitos legais” – embora imputada tal
interpretação a diferentes preceitos legais.
Acontece, porém, que, no processo n.º 697/2004, foi decidido em Plenário do
Tribunal Constitucional, através do acórdão n.º 614/2005, de 9 de Novembro de
2005, embora com votos de vencido quanto à decisão da questão de
constitucionalidade, incluindo o do relator do presente processo, negar
provimento a um recurso interposto, ao abrigo do disposto no artigo 79º-D da Lei
do Tribunal Constitucional, do acórdão n.º 159/2005 (disponível na página
Internet do Tribunal Constitucional, no endereço
http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/), no qual se decidira “não
julgar inconstitucional a norma do artigo 41º, n.º 2, 1ª parte, do Estatuto das
Pensões de Sobrevivência, aprovado pelo Decreto-Lei n.º142/73, de 31 de Março,
na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 191-B/79, de 25 de Junho, na
interpretação segundo a qual a titularidade de pensão de sobrevivência em caso
de união de facto depende de o companheiro do falecido estar nas condições do
artigo 2020º do Código Civil, isto é, de ter direito a obter alimentos da
herança, por não os poder obter das pessoas referidas no artigo 2009º, n.º 1,
alíneas a) a d), do mesmo Código”.
Ora, sendo a questão de constitucionalidade objecto do presente processo
idêntica à decidida naquele acórdão e tendo o Plenário considerado não ser
inconstitucional a interpretação normativa “segundo a qual a titularidade de
pensão de sobrevivência em caso de união de facto depende de o companheiro do
falecido estar nas condições do artigo 2020º do Código Civil, isto é, de ter
direito a obter alimentos da herança, por não os poder obter das pessoas
referidas no artigo 2009º, n.º 1, alíneas a) a d), do mesmo Código”, há que, em
aplicação da doutrina do Plenário, inteiramente transponível para os presentes
autos, decidir em conformidade, negando provimento ao presente recurso.
III – Decisão
Nestes termos, decide-se negar provimento ao recurso.
Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de
conta.
Lisboa, 16 de Novembro de 2005
Gil Galvão
Bravo Serra
Maria dos Prazeres Pizarro Beleza
Vítor Gomes
Artur Maurício