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Processo n.º 338/03
2.ª Secção
Relator: Conselheiro Paulo Mota Pinto
Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:
I. Relatório
1.Por sentença de 2 de Novembro de 2000, do Tribunal Judicial da Figueira da
Foz, e após diversos adiamentos motivados por ausência do arguido, foi este, A.,
melhor identificado nos autos, condenado como autor de um crime de emissão de
cheque sem provisão, previsto e punido pelo artigo 11.º, n.º 1, alínea a), do
Decreto‑Lei n.º 454/91, de 28 de Dezembro (na redacção do Decreto-Lei n.º
316/97, de 19 de Dezembro), na pena de 180 dias de multa, à taxa diária de
1200$00, e, subsidiariamente, a 120 dias de prisão, bem como nas custas do
processo.
Embora o seu advogado tivesse estado presente na leitura da sentença e o arguido
tenha, depois, pedido para ser notificado da liquidação da multa e das custas em
que foi condenado, tendo, depois, também solicitado o seu pagamento em
prestações, veio posteriormente requerer a sua notificação, bem como a do seu
mandatário, da sentença proferida.
Indeferido este requerimento, apresentou arguição de nulidade por falta de
notificação pessoal da sentença, que foi indeferida por despacho de 22 de Maio
de 2001, onde se considerou a falta de notificação pessoal mera irregularidade
já sanada, nos termos do disposto no artigo 123.º ou no artigo 121.º, n.º 1, al.
b), do Código de Processo Penal.
Interposto recurso para o Tribunal da Relação de Coimbra, este veio a negar-lhe
provimento.
Desta decisão não recorreu o arguido para o Tribunal Constitucional ou para
qualquer outro tribunal. Antes, com base no facto de o referido Tribunal de 2.ª
instância não se ter pronunciado sobre os recursos, retidos, dos dois despachos
da Mm.ª Juiz de 1.ª instância que haviam recusado diligências probatórias
requeridas pelo arguido quanto à “pré-datação” do cheque, veio invocar, perante
o próprio Tribunal da Relação de Coimbra, a
“nulidade do aresto recorrido, vício este que se reconduz à
inconstitucionalidade da interpretação adoptada pelo TRC da norma contida no
artigo 412.º, n.º 5, do CPP, por violação do direito de defesa do arguido, na
dimensão do direito ao recurso, consagrado no artigo 32.º, n.º 1, da CRP”.
Por acórdão de 26 de Fevereiro de 2003, o Tribunal da Relação de Coimbra
indeferiu esta reclamação, considerando, designadamente, o seguinte:
«Como é sabido, o direito ao recurso, muito embora se trate de um
direito/garantia fundamental, o qual não pode ser restringido a não ser nos
apertados limites previstos no art.º 18.°, n.ºs 2 e 3, da Constituição da
Republica Portuguesa, pode e deve, no entanto, não só ser regulamentado, mas
também disciplinado e adaptado à realidade processual, por forma a que não
conflitue com direitos da mesma matriz, funcione de modo eficaz e se desenvolva
e se concretize sem abuso, pelo que à lei ordinária cabe, inequivocamente, fixar
os pressupostos ou condições de exercício dos recursos (cfr. Vieira de Andrade,
Os direitos fundamentais na Constituição da República de 1976, 1987, págs. 227 a
232).
Daí que o legislador na sua actividade de regulamentação, conquanto não possa,
em princípio, actuar por forma a afectar ou a modificar o conteúdo essencial
daquele direito fundamental, não só por tal redundar em verdadeira restrição,
como por constituir uma inversão da ordem constitucional, pode no entanto
concretizá-lo e discipliná-lo, designadamente, através da imposição de condições
ao seu exercício, posto que não atinja com elas o seu conteúdo essencial, isto
é, desde que não estabeleça imposições ou condicionalismos que impeçam o seu
regular exercício.
Ora, estabelecendo o referido n.° 5 do art.º 412.° do C. Pr. Penal, que “havendo
recursos retidos, o recorrente especifica obrigatoriamente, nas conclusões,
quais os que mantêm interesse”, sempre interpretamos a imposição ou
condicionamento desta norma, no sentido, que se nos afigura ser evidente, de que
tal não constitui qualquer restrição ao direito ao recurso, mas sim mera
regulamentação do mesmo ou, quando muito, disciplina e adaptação à realidade
processual, consabido que não impede, minimamente, o seu regular e eficaz
exercício, sendo que, ao invés, visa uma precisa e expedita actividade decisória
do tribunal superior, mediante a indicação clara e concreta por parte do
recorrente de quais os recursos retidos que mantêm interesse, na altura de subir
o recurso interposto da decisão que tiver posto termo à causa, sendo certo que
aqueles são instruídos e julgados conjuntamente com este, em conformidade com o
preceituado no art.º 407.º, n.º 3, do C. Pr. Penal.
O que se visa é assim, sem dúvida, e sem que nisso se veja qualquer excesso, o
dever de colaboração do recorrente e a sua responsabilização, por forma a que as
impugnações judiciais não constituam mais uma forma de entorpecimento e de
protelamento da justiça.
E por isso é que Maia Gonçalves, no seu Código Penal Anotado, 1999, pág. 737,
considera o dispositivo em causa (n.° 5 do art.º 412.°), introduzido pela Lei
n.° 59/98, de 25 de Agosto, de “muito interesse”, sendo certo que “em processos
volumosos e complexos será susceptível de facilitar o trabalho dos juízes do
tribunal superior.”
E sobre a questão em causa, acrescenta:
“Não nos diz a lei quid juris no caso de o recorrente omitir este ónus. Cremos
que em face do texto legal, que é terminante – o recorrente especifica
obrigatoriamente – a falta de especificação implica a desistência dos recursos
retidos que não são especificados.”
E é também conhecida a jurisprudência do S.T.J., neste mesmo sentido.
Por todos, cfr. o douto Acórdão daquele S.T.J., de 18.11.99, in Proc. 1019/99:
“Se o arguido e recorrente não especificou ou afirmou, na altura própria, como
determina o art.º 412.°, n.° 5, do CPP, que mantinha interesse no recurso
interlocutório, estamos perante uma situação que é equiparada ou equivalente à
desistência do recurso, ou seja, uma verdadeira desistência, quanto aos seus
efeitos, que implica o não conhecimento desse recurso interlocutório.”»
2.Inconformado com esta decisão, o recorrente apresentou recurso para o Tribunal
Constitucional ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei
de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (Lei do
Tribunal Constitucional), para apreciação da conformidade com a Constituição da
norma
“contida no n.° 5 do artigo 412.° do CPP, quando interpretada no sentido de que
a não especificação, nas conclusões de recurso, de quais entre os recursos
retidos, se mantém interesse, implica a desistência dos mesmos, sem que ao
recorrente seja dada a oportunidade de suprir tal deficiência ou omissão, por
notificação visando esse desiderato.”
Admitido o recurso, o recorrente encerrou assim as suas alegações:
«1. É inconstitucional a norma constante do artigo 412.°, n.º 5, do Código de
Processo Penal, quando interpretada da forma levada a efeito pelo TRC na decisão
recorrida (ou seja, de que a omissão na especificação nas conclusões do recurso
principal, dos recursos retidos em cuja apreciação se mantém interesse, implica
a desistência dos mesmos) por violação do princípio constitucional das garantias
de defesa, na dimensão do direito ao recurso consagrado no n.° 1 do artigo 32.°
da CRP.
2. Uma vez que tal implica uma desproporcionada restrição do aludido direito a
defesa, com a capa – implícita – de se “facilitar o trabalho dos Juízes”,
situação esta que nunca por nunca pode ser erigida para restringir os direitos
de defesa.
3. Tal interpretação mostra-se abusiva e injusta, porquanto não dá qualquer
possibilidade ao arguido de suprir o que resulta de erro ou omissão do defensor:
não cumprimento do ónus imposto pelo n.° 5 do artigo 412.° do CPP.
4. Pelo que, tendo até em conta as decisões do Tribunal Constitucional sobre a
inconstitucionalidade do artigo 412.°-2 do CPP, em situações análogas de falta
de menções obrigatórias em conclusões de recurso (e que aqui se dão por
reproduzidas) por maioria de razão é inconstitucional a interpretação adoptada
pelo TRC ora em recurso.
5. Assim, o TRC deveria ter julgado procedente a nulidade arguida no processo
(inconstitucionalidade da interpretação da norma aplicada). Deveria ter aceite
desde logo a indicação feita nesse requerimento de que se mantém interesse na
apreciação de todos os recursos retidos, e procedido ao seu julgamento.
6. Ficando claro que a interpretação de acordo com a CRP do n.° 5 do artigo
412.° do CPP, é a que permite suprir a omissão da menção dos recursos retidos em
que se mantém interesse nas conclusões de recurso, sob pena de limitação
desproporcionada das garantias de defesa do arguido, restringindo o seu direito
ao recurso previsto no artigo 32.°, n.° 1, CRP, e como tal o direito de acesso à
justiça.
7. Deve, pois, julgar-se inconstitucional a norma contida no n.° 5 do artigo
412.° do CPP na interpretação plasmada no acórdão recorrido, devendo, em
consequência desse Juízo ordenar-se ao TRC a alteração da sua decisão para outra
em sentido contrário que culmine com a notificação ao mandatário do arguido para
dizer quais os recursos retidos em que o arguido mantém interesse seguindo-se o
seu julgamento subsequente.
8. A decisão recorrida viola as normas constantes dos artigos 412.°, n.º 5, do
CPP e dos artigos 20.°, n.º 1, e 32.°, n.º 1, da CRP.»
Por sua vez, Ministério Público encerrou assim as suas contra-alegações:
«1 – Não viola o direito ao recurso, ínsito no principio constitucional das
garantias de defesa, a imposição ao arguido do ónus de, no recurso que
interponha da decisão final condenatória, obrigatoriamente especificar quais os
recursos interlocutórios retidos em que mantém interesse.
2 – Não sendo perceptível, da peça recursória apresentada, considerada na sua
globalidade, a mínima referência a tais recursos retidos – omitindo o
arguido-recorrente qualquer alusão à existência de recursos retidos cuja
apreciação considera não precludida pelo teor da sentença final – não viola
qualquer preceito ou princípio constitucional a interpretação normativa que não
considera exigível a prolação de um convite ao aperfeiçoamento, já que o “vício”
em causa não transparece minimamente da peça processual produzida pelo
recorrente.»
Foi então proferido pelo relator no Tribunal Constitucional o seguinte despacho:
“Notifique o recorrente para, querendo, se pronunciar, no prazo de 10 (dez)
dias, sobre a questão prévia relativa ao eventual não conhecimento do recurso de
constitucionalidade, por, diversamente do que exige o artigo 72.º, n.º 2, da Lei
do Tribunal Constitucional, o recorrente não ter suscitado a questão da
constitucionalidade do artigo 412.º, n.º 5, do Código de Processo Penal, na
interpretação impugnada, antes de esgotado o poder jurisdicional do tribunal
recorrido (Tribunal da Relação de Coimbra), apesar de ter tido oportunidade para
tanto, por ter sido notificado para responder à posição do Ministério Público no
Tribunal da Relação de Coimbra, no sentido da aplicação daquela norma (fls. 640
e 644 dos autos).”
Respondeu o recorrente a essa questão, nos seguintes termos:
«1.°
É verdade que o ora Recorrente não respondeu ao parecer emitido pelo Ex.m.º
Senhor Procurador do Ministério Público logo após a subida dos autos ao Tribunal
da Relação de Coimbra.
2.°
O que o Recorrente fez foi, apenas e tão só, aguardar que a Relação de Coimbra
proferisse a sua decisão final.
3.°
Só perante o Acórdão da Relação, o Recorrente se apercebeu que, a interpretação
adoptada do artigo 412.°, n.º 5, do CPP, nesse acórdão, poderia levantar
questões de constitucionalidade.
4.°
E, portanto, só nesse momento resolveu e pôde agir: em primeiro lugar por via da
reclamação e, em segundo para o Tribunal Constitucional, através do recurso.
5.°
Ou seja, nunca, em momento processual algum anterior à decisão da Relação, teve
o Recorrente oportunidade de invocar a inconstitucionalidade da interpretação
adoptada, apenas tendo-a em momento posterior na reclamação da decisão proferida
na Relação e, posteriormente, no requerimento de interposição de recurso para
este Tribunal.
6.°
Isto porque a decisão tomada pela Relação no sentido de rejeição de apreciação
dos recursos retidos não era susceptível de recurso, não cabendo na previsão
legal de nenhuma das alíneas do artigo 432.° do CPP.
7.°
Veja-se o Ac. TC 89-391-2, de 14-09-1989, que deferiu a reclamação contra não
admissão do recurso por se entender que a reclamante, durante o processo, não
dispôs de oportunidade processual para levantar a questão da
inconstitucionalidade, cujo sumário é o seguinte:
I – Decorre do disposto no artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82 que,
por um lado, o recurso de inconstitucionalidade só pode ter por objecto normas
jurídicas, pelo que não cabe na sua competência o controlo de outro tipo de
actos jurídicos, designadamente de decisões judiciais, e que, por outro lado,
esse seu controlo normativo compreende não só a norma jurídica como o que
simplesmente se reporte a certa dimensão ou interpretação dada pelas instâncias
à norma questionada.
II – Para ser admissível o recurso para o Tribunal Constitucional das decisões
dos tribunais que apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada
durante o processo é necessário, pelo menos em geral, que a questão de
inconstitucionalidade seja levantada antes de esgotado o poder jurisdicional do
juiz sobre a matéria a que tal questão de inconstitucionalidade respeita.
III – É porém admissível recurso nos casos em que ao ser suscitada a questão de
inconstitucionalidade o poder jurisdicional já se havia esgotado com a prolação
da sentença em situações excepcionais e anómalas em que o interessado antes de
proferida a decisão não havia disposto de qualquer oportunidade processual para
levantar questão de inconstitucionalidade.
8.°
É exactamente este o caso. Antes do acórdão da Relação, a parte não poderia
adivinhar o sentido da decisão, porquanto não suscitou antes desse momento
problemas de constitucionalidade.
9.º
Acresce que, não poderia o Recorrente invocar na resposta ao parecer do MP (à
qual efectivamente não respondeu) uma inconstitucionalidade que considerava
existir nesse parecer, na medida em que essa invocação só pode ser feita
relativamente a decisões dos Tribunais e não em relação a meros pareceres.
Face ao exposto requer a V. procedência do recurso interposto para o Tribunal
Constitucional nos termos das respectivas motivações e conclusões.»
Cumpre agora apreciar e decidir.
II. Fundamentos
3.Importa começar por apreciar a questão prévia suscitada.
Vem posta em causa no presente recurso, interposto ao abrigo da alínea b) do n.º
1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional, a constitucionalidade do
artigo 412.º, n.º 5, do Código de Processo Penal, interpretado no sentido de que
o não cumprimento do ónus de especificação, ali consagrado, dos recursos
interlocutórios em que o recorrente mantém interesse é fundamento para a não
apreciação dos recursos interlocutórios retidos, quando nenhuma referência se
lhes tenha de todo feito na motivação de recurso.
Ora, para se poder tomar conhecimento de um recurso de constitucionalidade como
o presente, interposto ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei de
Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, torna-se
necessário, a mais do esgotamento dos recursos ordinários e de que a norma
impugnada tenha sido aplicada como ratio decidendi pelo tribunal recorrido, que
a inconstitucionalidade desta tenha sido suscitada durante o processo. Este
último requisito deve ser entendido, segundo a jurisprudência constante deste
Tribunal (veja-se, por exemplo, o acórdão n.º 352/94, in Diário da República, II
série, de 6 de Setembro de 1994), “não num sentido meramente formal (tal que a
inconstitucionalidade pudesse ser suscitada até à extinção da instância)”, mas
“num sentido funcional”, de tal modo “que essa invocação haverá de ter sido
feita em momento em que o tribunal a quo ainda pudesse conhecer da questão”,
“antes de esgotado o poder jurisdicional do juiz sobre a matéria a que (a mesma
questão de constitucionalidade) respeita”, por ser este o sentido que é exigido
pelo facto de a intervenção do Tribunal Constitucional se efectuar em via de
recurso, para reapreciação ou reexame, portanto, de uma questão que o tribunal
recorrido pudesse e devesse ter apreciado (ver ainda, por exemplo, o Acórdão n.º
560/94, Diário da República, II série, de 10 de Janeiro de 1995, e ainda o
Acórdão n.º 155/95, in Diário da República, II série, de 20 de Junho de 1995).
Analisando os autos, conclui-se sem margem para dúvidas que no presente caso não
estão preenchidos os requisitos indispensáveis ao conhecimento do recurso, desde
logo porque o recorrente não cumpriu o referido ónus de suscitar a questão de
constitucionalidade durante o processo, entendida essa expressão com o sentido
acima enunciado. Como o próprio recorrente reconhece, não suscitou, perante o
tribunal a quo, a inconstitucionalidade da norma que pretende ver apreciada no
presente recurso de constitucionalidade.
Não estamos perante uma daquelas situações excepcionais, em que o recorrente
tenha sido confrontado com uma aplicação ou interpretação normativa de todo
imprevista e inesperada. Na verdade, o recorrente foi especificamente alertado
para a posição do Ministério Público no sentido da impossibilidade de se
conhecer do recurso, por omissão de cumprimento do ónus de indicação dos
recursos interlocutórios em cuja apreciação mantinha interesse processual, o
que, aliás, também reconhece. No parecer do Procurador-Geral Adjunto do Tribunal
da Relação de Coimbra, notificado ao recorrente (cf. fls. 644, que menciona
juntar “fotocópia integral do parecer do Ex.m.º Procurador”), escreveu-se:
“Na sequência do indeferimento de certas diligências que o arguido pretendia que
fossem feitas (cfr. fls. 283 e 301), foi interposto recurso do respectivo
despacho, o qual foi admitido a subir com o que viesse a ser interposto da
decisão final (cfr. fls. 321).
No entanto não há que conhecer deste recurso uma vez que, nas conclusões da
motivação que apresentou relativa ao recurso da sentença, não manifestou
interesse em que o mesmo fosse conhecido, ou seja, não deu cumprimento
(obrigatório) ao que se determina no n.º 5 do art.º 412.° do CPPenal.” (Itálicos
aditados).
Ora, o recorrente podia ter respondido, nessa altura, pondo em causa o
entendimento advogado pelo representante do Ministério Público, e suscitando a
inconstitucionalidade da norma do n.º 5 do artigo 412.º do Código de Processo
Penal. Era, para tal, irrelevante que essa norma não constasse de despacho ou
decisão judicial, antes tendo sido invocada pelo Ministério Público. Mais do que
só passível de aplicação abstracta, tal norma passou então a estar invocada no
processo para obtenção de um certo efeito, sobre ela (rectius: em função dela)
tendo de se pronunciar o tribunal a quo.
O recorrente dispôs, pois, de oportunidade para se pronunciar sobre a
inconstitucionalidade, que entendia existir, da norma em causa, mas não o fez.
Ao esperar para ver, o recorrente deixou passar a oportunidade processual para
suscitar atempadamente a questão de constitucionalidade.
Assim, por não ter sido suscitada a questão de constitucionalidade “durante o
processo” (cfr., por ex., o Acórdão n.º 90/85, publicado em Acórdãos do Tribunal
Constitucional, 5.º vol., pp. 663-672), não se pode tomar conhecimento do
recurso.
III. Decisão
Com estes fundamentos, o Tribunal Constitucional decide:
a) Não tomar conhecimento do recurso de constitucionalidade interposto;
b) Consequentemente, condenar o recorrente em custas, fixando a taxa de
justiça em 10 (dez) unidades de conta.
Lisboa, 6 de Dezembro de 2005
Paulo Mota Pinto
Mário José de Araújo Torres
Rui Manuel Moura Ramos