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Procº nº 600/97. Plenário. Relator:- BRAVO SERRA.
I
1. Por despacho de 21 de Outubro de 1997, o Juiz do Tribunal de comarca de Arraiolos, no processo relativo à eleição da Câmara Municipal de Mora, considerou que os documentos, apresentados pelos candidatos da lista proposta pela Coligação Democrática Unitária, A., B. e C. - por intermédio dos quais intentavam comprovar a sua inscrição no recenseamento eleitoral - não podiam 'valer como certidões de elegibilidade', dado que nos mesmos não constava a identificação dos cidadãos a que eles reportavam. Em consequência, convidou o mandatário da aludida lista a apresentar, em três dias, 'certidões de elegibilidade' dos referidos candidatos.
Os documentos em causa, conforme se alcança dos autos, são
«talões», todos eles com as mesmas asserções impressas, que rezam assim:-
CERTIDÃO
Para os efeitos requeridos, certifico que o cidadão acima identificado se encontra inscrito no recenseamento eleitoral organizado por esta Comissão Recenseadora, com o nº de eleitor ________
______________,____,de____________de__________
O Presidente da Comissão Recenseadora
__________________________________________
Nos documentos apresentados pelos candidatos em apreço encontram-se dactilografados o nome da localidade - Mora - e, bem assim, a indicação de 10 Outubro 1977, sendo que o que os diferencia é a circunstância de, no espaço reservado ao nº de eleitor, no referente ao candidato A., se mencionar 3166, no do candidato B., 2505 e, no do candidato C., 1374.
Encontram-se posteriormente juntos aos autos três
«requerimentos», cada um deles formulado por cada um dos candidatos acima referidos, dirigidos ao Presidente da Comissão Recenseadora da freguesia de Mora, solicitando a passagem de 'certidão de capacidade eleitoral activa' do próprio, sendo que neles é, por entre o mais, indicado o nome, data do nascimento, filiação, naturalidade, profissão, residência, número do Bilhete de Identidade e respectivo arquivo que o emitiu e número de inscrição do requerente no recenseamento eleitoral daquela freguesia.
2. Em 29 de Outubro de 1997 o referenciado Juiz, porque entendeu que os documentos então juntos ao processo estavam incompletos, já que, na sua perspectiva, apenas continham uma solicitação e não também a declaração emitida pelo presidente da comissão recenseadora, rejeitou a candidatura apresentada por aqueles cidadãos.
Do assim decidido reclamou o mandatário da lista da CDU, que
à peça processual corporizadora da reclamação juntou certidões emanadas da Comissão Recenseadora da freguesia de Mora, as quais atestam a inscrição dos candidatos em apreço e comprovam que uma fotocópia a elas anexa - de cada um dos
«requerimentos» acima aludidos e que continham ainda, na sua parte inferior, os
«talões» cujos originais, em separado, foram apresentados na fase inicial do processo - foi extraída de um documento arquivado naquela Comissão.
Nessas mesmas certidões, inter alia, exara-se que 'tendo sido feita a certificação referida a 10 de Outubro de 1997, os serviços administrativos da Comissão Recenseadora, procederam, por lapso, ao corte da parte inferior do referido impresso, devolvendo tão somente essa parte ao requerente, na convicção de que essa mesma parte seria bastante para certificar a inscrição no recenseamento eleitoral, tendo-se mantido no arquivo da Comissão Recenseadora a parte superior do requerimento'.
Por despacho de 3 de Novembro de 1997 indeferiu o Juiz do Tribunal de comarca de Arraiolos a deduzida reclamação.
Disse-se, no que ora releva, nesse despacho:-
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Com efeito, a apresentação de reclamação não pode servir como nova oportunidade para o mandatário da CDU suprir deficiências que atempadamente foi convidado a suprir, por despacho onde aliás constava de forma clara a forma de o fazer, mas que, por força do entendimento perfilhado pela comissão recenseadora da freguesia de Mora, acabou por não acatar.
Na verdade, o despacho de fls. 77 é claro: nele, por se entender que os documentos de fls. 8, 12 e 16 não podiam valer como certidões de elegibilidade, foi o mandatário da CDU convidado a apresentar certidões de capacidade eleitoral activa dos referidos candidatos.
Perfilhando o entendimento diverso supra descrito, o referido mandatário, sem fornecer qualquer explicação, juntou aos autos documentos que - alega-o agora - correspondem à parte do documento original de onde foram
'recortados' os documentos inicialmente apresentados.
Em nosso entender não pode considerar-se que os documentos ora apresentados completem os inicialmente juntos aos autos - aliás se assim o tivéssemos considerado, aquando da prolacção do despacho de fls. 77 teríamos, muito simplesmente, convidado o mandatário da CDU a apresentar a 'parte que faltava' aos documentos.
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................................................... .
E porque o prazo para corrigir deficiências das candidaturas é peremptório, sendo certo que as certidões ora juntas já não podem ser consideradas, e que por isso as mesmas não foram atempadamente supridas, conclui-se que não existirem razões para a alterar a decisão de fls. 88 e 89.
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É do indeferimento da sua reclamação, consubstanciado no despacho de que imediatamente acima se encontra transcrita parte, que o mandatário da CDU interpôs recuso para este Tribunal.
Cumpre decidir.
II
1. Adianta-se desde já que, na óptica deste órgão de administração de justiça, o vertente recurso deve lograr provimento.
Na verdade, ao fim e ao resto, o punctum saliens da rejeição das candidaturas dos cidadãos em causa residiu na circunstância de se ter entendido que os documentos juntos pelos falados candidatos antes do despacho de
29 de Outubro de 1997 - recorda-se os designados «talões» e os «requerimentos» que cada um deles dirigiu ao Presidente da Comissão Recenseadora da freguesia de Mora - não poderem, isolada ou conjuntamente, servir para atestar a inscrição no recenseamento eleitoral dos ditos candidatos.
É justamente neste ponto que o Tribunal diverge do que se considerou no despacho recorrido.
2. Efectivamente, é certo, por um lado, que, considerados isoladamente, os «talões» juntos com a demais documentação relativa aos candidatos, por si só, nada demonstram no tocante a deles se aferir da sua capacidade eleitoral activa, uma vez que, dizendo-se neles tão somente que 'o cidadão acima identificado se encontra inscrito no recenseamento eleitoral ... com o nº de eleitor (respectivamente, 3166, 2505 e 1374), não apresentam os mesmos nenhuns elementos de onde se possa extrair quem sejam os identificados.
De outro lado, certo é também que, por si só, os
«requerimentos» dirigidos ao Presidente da Comissão Recenseadora da freguesia de Mora nada provam quanto à inscrição no recenseamento, visto que se tratam unicamente de documentos contendo uma solicitação a ele dirigida.
Todavia, não se pode passar em claro que nesses
«requerimentos», e relativamente a cada um dos candidatos em crise, é efectuada a sua completa identificação e, a mais do que isso, é mencionado o número de eleitor que, também cada um, detém.
Ora, da conjugação dos «requerimentos» e dos «talões» levada a efeito pela simples confrontação dos números de eleitor num e noutro mencionados, não pode deixar de concluir-se que está efectuada a certificação de que cada um dos cidadãos em apreço - perfeitamente identificados nos primeiros - está inscrito, com determinado número, no recenseamento eleitoral.
Não alcançar uma tal conclusão redundaria numa actuação casuística demasiadamente formalista e obstaculante do exercício de um direito fundamental constitucionalmente consagrado.
III
Em face do que se deixa dito, o Tribunal, concede provimento ao recurso, declarando elegíveis para a Câmara Municipal de Mora os cidadãos A., B. e C., que se candidatam pela lista da Coligação Democrática Unitária.
Lisboa, 12 de Novembro de 1997.
Bravo Serra
José de Sousa e Brito
Alberto Tavares da Costa
Armindo Ribeiro Mendes
Messias Bento
Guilherme da Fonseca
Maria da Assunção Esteves
Vítor Nunes de Almeida
Fernando Alves Correia
Luis Nunes de Almeida
Maria Fernanda Palma
José Manuel Cardoso da Costa