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Procº nº 101/97.
2ª Secção. Relator:- BRAVO SERRA.
(Consº LUÍS NUNES DE ALMEIDA)
I
1. Não se conformando com o acórdão proferido pelo Tribunal de comarca de Guimarães que os condenou na pena de um ano de prisão e cinquenta dias de multa à taxa diária de Esc. 4.000$00, recorreram para o Supremo Tribunal de Justiça os arguidos A. e B., desse mesmo aresto também tendo recorrido o Ministério Público.
Por acórdão de 23 de Março de 1995 aquele Alto Tribunal negou provimento ao recurso dos arguidos, concedendo, porém, provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público, razão pela qual cada um daqueles arguidos foi condenado na pena de dois anos de prisão e cem dias de multa à taxa diária de Esc. 7.500$00.
Encontrando-se os autos já no Tribunal de comarca de Guimarães, aqueles arguidos aí apresentaram requerimento por intermédio do qual arguiram diversas nulidades, de entre estas se contando a que consistiria em não se não ter cumprido a segunda parte do nº 5 do artº 113º do Código de Processo Penal, em virtude de, eles mesmos, não terem sido notificados para a audiência que teve lugar no Supremo Tribunal de Justiça.
Neste particular, pode ler-se em tal requerimento:-
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52. E deveriam ter sido notificados pessoalmente do mesmo, de acordo com o disposto no art. 113º nº 5 II-Parte do C.P.P.
53. Com efeito, resulta desta parte do preceito que, além do mais, as notificações respeitantes à sentença não podem ser feitas ao respectivo defensor ou mandatário.
54. E daqui resulta o caracter pessoal de tal notificação.
55. Sendo certo que tal preceito tem inequivocamente natureza imperativa.
56. Não podendo, por isso, ser ultrapassado por qualquer outra interpretação diferente que, a existir, estará necesariamente eivada de nulidade e até de inconstitucionalidade, por violação de Lei expressa.
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................................................... EM CONCLUSÃO
4) Por último, e sempre subsidiariamente, deve ter-se como não transitado o acórdão proferido, face ao incumprimento do artigo 113º nº 5 II-Parte do C.P.P., devendo ser os arguidos pessoalmente notificados do mesmo, sob pena de interpretação inconstitucional de tal preceito, por violação de Lei expressa, além das consequências antes referidas - cfr. 119º al. c) ou, quando menos,
123º, ambos do C.P.P.
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Por acórdão de 7 de Dezembro de 1995, o Supremo Tribunal de Justiça indeferiu a reclamação.
Usou-se nesse aresto, por entre outra, a seguinte argumentação:-
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Dispõe o art. 61-1 a) CPP que o arguido goza, em especial, em qualquer fase processual, e salvas as excepções da lei, do direito de estar presente aos actos processuais que directamente lhe disserem respeito.
Prevê a lei que este princípio possa comportar excepções e situações há que justificam plenamente a sua inaplicabilidade.
Uma destas situações é constituída pelos recursos, mormente no para o Supremo a justificação enquadra-se na natureza e finalidade do recurso, reflectindo-se estas na sua estrutura e regulamentação.
Trata-se de um recurso de revista embora alargada - recurso limitado, em princípio, a matéria de direito (CPP - 433) e que, mesmo quando conhece ao abrigo do art. 410-2 CPP, o máximo que nesse capítulo pode decidir é, reconhecida que seja a existência relevante de um vício relativo à matéria de facto e aí enunciado, anular o acórdão e determinar o reenvio do processo (CPP -
436).
Porque perante o Supremo não se pode renovar a prova e porque este apenas conhece de direito, compreende-se que as pessoas a convocar para a audiência de julgamento se reduzam às que, intervindo (e mesmo assim, nem todas
- pense-se na hipótese de o arguido ou o assistente ser licenciado em Direito), são técnicas em direito - o Mº Pº, o defensor do arguido e os representantes do assistente e das partes civis (CPP - 421, 1 e 2).
Não havia, pois, que proceder à notificação da data designada para a audiência neste Supremo aos arguidos nem para eles comparecerem, mas sim ao seu defensor (e esta foi-o - fls. 453 v).
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Do acórdão de que parte imediatamente acima se encontra transcrita solicitaram os arguidos a respectiva aclaração e, ao mesmo tempo, interpuseram recurso para o plenário das Secções Criminais daquele Supremo Tribunal.
Por acórdão de 7 de Março de 1996, foi indeferido o pedido de aclaração e não foi admitido o recurso intentado interpor para o plenário das Secções Criminais.
Desse acórdão reclamaram os arguidos para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça. Por acórdão de 2 de Maio de 1996, o mesmo Supremo indeferiu o solicitado, referindo a propósito:-
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2 - Se após o acórdão que recaísse sobre o pedido de aclaração, os arguidos viessem interpor o aludido recurso caberia ao relator pronunciar-se sobre a sua admissibilidade e, caso fosse recusada, podiam os arguidos reclamar para a conferência.
Porque o procedimento adoptado pelos arguidos foi diverso e, subsidiariamente, no mesmo requerimento, interpunham recurso, a conferência, de imediato à deliberação de indeferimento da pretensão da aclaração, pronunciou-se sobre essa outra recusando-a por não ser hipótese que tivesse cabimento no disposto no art. 11 CPP.
Deste acórdão não cabe reclamação - o art. 405 CPP contempla hipótese totalmente distinta, a sua simples e atenta leitura revela-o com suficiente clareza. A ratio da reclamação e a natureza da decisão - uma deliberação, tomada pois em órgão colegial - afastam também a possibilidade de acolhimento da pretensão dos arguidos.
Consequentemente - porque inaplicável aquela disposição, também não compete do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça pronunciar-se sobre a questão.
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2. Após a notificação deste acórdão, atravessaram os arguidos nos autos requerimento por intermédio do qual pretendiam, do aresto de 7 de Dezembro de 1995 (recorda-se, o que indeferiu a arguição de nulidades), interpor recurso para o Tribunal Constitucional.
Esse recurso não foi admitido por despacho prolatado em 23 de Setembro de 1996 pelo Conselheiro Relator do Supremo Tribunal de Justiça.
De tal despacho foi pelos arguidos solicitada a respectiva aclaração, o que foi indeferido por despacho, lavrado pelo mesmo Conselheiro Relator, em 29 de Outubro de 1996.
Após a notificação deste último despacho, vieram os arguidos
'Recorrer para a Secção Criminal do S.T.J.' e, 'Subsidiáriamente, por mera cautela, e apenas para a hipótese de se considerar, o que se não espera, que tal recurso não tem cabimento', reclamar para o Tribunal Constitucional.
3. O Representante do Ministério Público junto deste órgão de fiscalização concentrada da constitucionalidade normativa pronunciou-se no sentido de ser indeferida a presente reclamação.
Cumpre decidir.
II
1. Adianta-se desde já que a vertente reclamação não pode lograr deferimento.
E não pode uma vez que (e suposto que os ora reclamantes efectivamente suscitaram, de modo claro e perceptível ou, o que é o mesmo, de forma processualmente adequada, uma questão de constitucionalidade referentemente a uma dada norma constante do ordenamento jurídico infraconstitucional) o recurso desejado interpor para este Tribunal do acórdão lavrado pelo Supremo Tribunal de Justiça em 7 de Dezembro de 1995 é, de modo claro, extemporâneo, pois que de há muito havia já expirado o prazo para do mesmo ser apresentada impugnação perante o Tribunal Constitucional.
E nem se objecte com o disposto no nº 2 do artº 75º da Lei nº
28/82, de 15 de Novembro, tendo por suporte fáctico, in casu, o recurso que desse aresto os agora reclamantes pretenderam interpor para o plenário das Secções Criminais do Supremo Tribunal de Justiça ou a reclamação que endereçaram ao Presidente desse Alto Tribunal do acórdão que aquele recurso para o plenário não admitiu.
2. É que, no caso in specie, tais formas de impugnação não estão previstas no ordenamento jurídico adjectivo criminal (cfr. sobre uma situação que apresenta semelhanças com a presente, os Acórdãos deste Tribunal números 511/93, ainda inédito, 181/93, este publicado na 2ª Série do Diário da República de 21 de Julho de 1993, e 298/97 e exposição prévia do Relator, ainda inéditos).
Defende a maioria dos Juízes que compõem esta Secção que o prescrito no nº 2 do artº 75º da Lei nº 28/82 há-de ser entendido como reportado a recursos ordinários efectivamente previstos no ordenamento jurídico, e não a modos de impugnação de que as «partes» lancem mão mas que, ou são recursos não qualificáveis como recursos ordinários, ou são formas impugnativas não previstas nem admissíveis por aquele ordenamento, ou são recursos que, muito embora a lei os qualifique como ordinários, não podem, como tal, ser tidos em vista para efeitos daquele preceito (cfr. sobre este último ponto, por entre muitos, o Acórdão deste Tribunal nº 181/93, in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 24º vol., 485 a 494) .
No caso sub iudicio, os aludidos recurso para o plenário das Secções Criminais do Supremo Tribunal de Justiça e a reclamação dirigida ao Presidente desse Supremo não tinham qualquer suporte legal e, consequentemente, não se pode dizer que aquelas formas de impugnação de que se serviram os ora reclamantes se integram na expressão recurso ordinário utilizada no mencionado nº 2 do artº 75º.
III
Em face do exposto, indefere-se a vertente reclamação, condenando-se os reclamantes nas custas processuais, fixando a taxa de justiça em três unidades de conta.
Lisboa, 29 de Outubro de 1997
Bravo Serra
Messias Bento
Guilherme da Fonseca
Fernando Alves Correia
Luís Nunes de Almeida
José de Sousa e Brito
José Manuel Cardoso da Costa