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Proc. nº 604/97 Plenário Rel.: Consº Luís Nunes de Almeida
Acordam, em sessão plenária, no Tribunal Constitucional:
1. A., mandatário da lista de candidatos à Assembleia de Freguesia de Bairros, no município de Castelo de Paiva, apresentada por um grupo de cidadãos eleitores e denominada 'Projecto Inovador de Bairros/PINBA', recorreu para o Tribunal Constitucional da decisão do juiz da comarca que considerou inelegível o primeiro candidato daquela lista, B., por este exercer as funções de chefe da Repartição de Finanças de Arouca.
Alega, em síntese, o recorrente que a inelegibilidade estabelecida na alínea a) do nº 1 do artigo 4º do Decreto-Lei nº 701-B/76, de
29 de Setembro, mesmo após a publicação da Lei nº 9/95, de 7 de Abril, apenas abrange os funcionários de finanças com funções de chefia que exerçam a respectiva actividade na área da autarquia a cujos órgãos se candidatam, como tem sido afirmado em uniforme e constante jurisprudência do Tribunal Constitucional. E que, para além disso, a norma que estabelece a referida inelegibilidade há-de ser tida por inconstitucional.
2. Resulta dos autos que o candidato julgado inelegível pelo juiz da comarca é o chefe da Repartição de Finanças de Arouca, ou seja, é um funcionário de finanças com funções de chefia que exerce a respectiva actividade na área de município diverso daquele em que se integra a freguesia
(Bairros) a cujo órgão autárquico (assembleia de freguesia) se pretende candidatar, já que a freguesia em causa faz parte do município de Castelo de Paiva.
Ora, muito embora desde o Acordão nº 230/85 (Acordãos do Tribunal Constitucional, 6º vol., págs.823 e segs.), este Tribunal venha sempre entendendo que a inelegibilidade estabelecida para os funcionários de finanças com funções de chefia 'apenas pretendeu referir-se aos órgãos das autarquias da
área onde eles exercem a
sua actividade', considerou o juiz da comarca, no caso vertente, que a situação se alterou com a entrada em vigor da Lei nº 9/95.
Na verdade, este último diploma legal veio esclarecer, através de um novo nº 2 aditado ao referido artigo 4º do Decreto-Lei nº
701-B/76, que a inelegibilidade prevista na alínea a) do nº 1 do mesmo artigo para os funcionários judiciais - aí referidos ao lado dos funcionários de finanças com funções de chefia - se não aplicava aos casos de candidaturas 'a
órgãos do poder local sediados em área de jurisdição diferente daquela onde exercem a função judicial'. Ora, segundo a decisão recorrida, esta alteração legislativa, introduzida em 1995 no que se refere à ineligibilidade dos funcionários judiciais - que passou inequivocamente a ser exclusivamente de
âmbito local - terá vindo demonstrar que o legislador pretendeu estabelecer uma inelegibilidade de âmbito nacional para os funcionários de finanças com funções de chefia, já que, quanto à respectiva inelegibilidade, não foi introduzida semelhante cláusula.
3. Contudo, este Tribunal não vê razões que justifiquem a alteração da sua jurisprudência sobre a matéria em causa.
Com efeito, a alteração legislativa de 1995 terá tido a sua razão de ser no facto de o Tribunal Constitucional ter inicialmente considerado que a inelegibilidade dos funcionários de justiça, ao contrário da respeitante aos funcionários de finanças com funções de chefia, era efectivamente de âmbito nacional, por se relacionar com o 'estatuto funcional' daqueles mesmos funcionários (cfr. Acórdão nº 225/85, Acórdãos...., 6º vol., págs. 793 e segs.). Assim, apenas quanto aos funcionários de justiça se tornaria necessário esclarecer que se pretendia reduzir a inelegibilidade ao âmbito exclusivamente local.
É bem verdade que, após a 2ª revisão constitucional, este Tribunal veio a considerar que, face ao novo artigo 50º, nº 3, da Constituição da República Portuguesa, a referida inelegibilidade dos funcionários de justiça apenas podia subsistir como mera inelegibilidade local, sendo um meio de defesa da liberdade de escolha dos eleitores (Acórdão nº
528/89, Acórdãos...., 14º vol., págs.333 e segs.; Acórdão nº 700/93, Diário da República, II série, de 20 de Janeiro de 1994). Este circunstancialismo, porém, em nada altera - antes pelo contrário - o facto de a inelegibilidade dos funcionários de finanças com funções de chefia dever manter o seu estrito âmbito local: é que as razões que levaram este Tribunal, em 1989 e em 1993, a concluir pela inaceitabilidade de uma inelegibilidade de âmbito nacional para os funcionários de justiça, face ao preceituado no nº 3 do artigo 50º da CRP, são igualmente válidas, e por maioria de razão, para os funcionários de finanças com funções de chefia.
4. Assim sendo, resulta que a inelegibilidade prevista na alínea a) do nº 1 do artigo 4º do Decreto-Lei nº 701-B/76 para os funcionários de finanças com funções de chefia apenas opera relativamente à respectiva candidatura a órgãos das autarquias em cuja área exerçam a sua actividade.
No caso vertente, como o candidato em causa exerce a respectiva actividade em Arouca, como chefe de repartição de finanças, e se pretende candidatar a órgão de poder local de uma freguesia (Bairros) sediada na
área do município de Castelo de Paiva, tem de se concluir que não ocorre qualquer inelegibilidade.
5. Nestes termos, concede-se provimento ao recurso, declarando-se elegível o candidato da lista 'Projecto Inovador de Bairros', B.,
à Assembleia de Freguesia de Bairros, no município de Castelo de Paiva.
Lisboa, 13 de Novembro de 1997 Luís Nunes de Almeida José de Sousa e Brito Armindo Ribeiro Mendes Messias Bento Maria da Assunção Esteves
Bravo Serra (com a declaração de que, tendo em conta a alteração introduzida no nº 2 do art. 4º do Decreto-Lei nº 701-B/76, de 29 de Setembro, pela Lei nº 9/95, de 7 de Abril, se mantivesse a posição que assumi na declaração de voto que apus ao Acórdão deste Tribunal nº 528/89, isso redundaria na criação de uma desigualdade sem fundamento entre os funcionários judiciais e os funcionários de finanças com funções de chefia. Daí que, em virtude daquela alteração, inflicta, quanto aos funcionários de finanças com funções de chefia, quanto àquela posição e, assim, nada oponho à decisão constante do presente aresto).
Alberto Tavares da Costa (com a declaração de que pelas razões desenvolvidas no texto do acórdão e tendo presente a alteração introduzida pela Lei nº 9/95, considero não se justificar a posição por mim anteriormente sustentada em acórdãos como o nº 528/89, publicado no Diário da República, II Série de 22 de Março de 1990).
José Manuel Cardoso da Costa (com a declaração de que é a mesma razão de 'paridade', que admiti poder prevalecer na declaração de voto que juntei ao Acórdão nº 230/85, que me leva agora a acompanhar a presente decisão, face à alteração legislativa de que na respectiva fundamentação se dá conta).