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Processo n.º 497/2005
3.ª Secção
Relator: Conselheiro Bravo Serra
1. Na acção administrativa especial de pretensão conexa
com actos administrativos que A. propôs pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do
Porto contra a Secretária de Estado da Indústria, Comércio e Serviços e contra
os contra interessados particulares B. e outros – acção essa na qual o autor
peticionava a anulação do despacho nº 249/SEICS/2004, proferido em 4 de Março de
2004 por aquela Secretária de Estado e publicado na II Série do Diário da
República de 13 de Abril de 2004 sob o nº 7244/2004, em consequência se
revogando a lista de transição do pessoal do quadro da Inspecção-Geral das
Actividades Económicas, na parte que dizia respeito à carreira de inspector
técnico especialista principal, e integrando o autor na carreira de inspecção e
na categoria de inspector técnico especialista principal –, foi, naquele
Tribunal e em 29 de Março de 2005, proferido acórdão que julgou tal acção
parcialmente procedente.
Nesse aresto, foi recusada, por inconstitucionalidade, a
aplicação das normas constantes do nº 3 do artº 8º, em conjugação com o nº 2 do
artº 10º, ambos do Decreto Regulamentar nº 48/2002, de 26 de Novembro, e do nº 3
do artº 9º do Decreto-Lei nº 112/2001, de 6 de Abril.
Pode ler-se no referido acórdão na parte que ora releva:
–
“(...)
O Decreto-Lei n.º 112/01, de 06/04, procedeu [à] re[e]struturação
das carreiras dos funcionários ligados ao exercício de funções de inspecção ou
fiscalização, tendo criado três carreiras com diferentes requisitos
habilitacionais e definindo regras, designadamente, de intercomunicabilidade de
carreiras e de transição para as novas carreiras.
Decorre do disposto nos artigo[s] 9.º, n.º 3 e 16.º do D.L. 112/01,
em conjugação com o disposto nos artigos 8.º, n.º 3 do D. Regulamentar n.º
48/2002, de 26/11, que os subinspectores passaram a integrar, com efeitos
reportados a 01 de Julho de 2000, a carreira de Inspecção Técnica, com a
categoria de Inspector Técnico Principal, passando à frente dos então
inspectores de 2.ª classe, cuja transição ao abrigo do disposto no art. 10.º do
D.R. n.º 48/2002, os posicionou, em 01 de Julho de 2000, na categoria de
Inspectores Técnicos, não existindo prevista na lei, quanto a estes
funcionários, qualquer regra especial de transição.
Decorre dos referidos preceitos legais, que da sua aplicação
resulta, de facto, uma situação de inversão hierárquica.
Importa, agora, porém, apurar de tal situação assenta numa
justificação que torne aceitável o resultado verificado ou não, isto é, se a
inversão das posições relativas detidas pelos funcionários à data da publicação
de tais diplomas legais violam o princípio da coerência e da equidade que
presidem ao sistema de carreiras da função pública.
Conforme é entendimento doutrinal e jurisprudencial pacífico a não
inversão das posições relativas de funcionários ou agentes por mero efeito da
reestruturação de carreiras constitui um princípio geral que é corolário do
princípio da igualdade dos cidadãos perante a lei, consagrado, em geral, no
artigo 13.º da CRP, e, no domínio das relações laborais, no artigo 59.º, n.º 1,
alínea a), da CRP. Este princípio, como limite à discricionariedade legislativa,
não exige o tratamento igual de todas as situações, mas, antes, implica que
sejam tratados igualmente os que se encontram em situações iguais e tratados
desigualmente os que se encontram em situações desiguais, de maneira a não serem
criadas discriminações arbitrárias e irrazoáveis, porque carecidas de fundamento
material bastante. O princípio da igualdade não proíbe que se estabeleça,
distinções, mas sim, distinções desprovidas de justificação objectiva e racional
– neste sentido v.j. Ac Tribunal Constitucional n.º 128/99, de 03-03-199[9],
processo n.º 140/97, publicado no BMJ, n.º 485, pág. 26.
[À] face deste princípio da não inversão das posições relativas de
funcionários ou agentes por mero efeito da reestruturação de carreiras, não
poderá admitir-se, por carência de justificação objectiva e racional, que
funcionários de categoria superior sejam colocados em categoria inferior [à]
daqueles outros, apenas por se ter previsto quanto a estes uma regra especial de
transição que permite a intercomunicabilidade de carreiras, sem que tal
transição tenha qualquer justificação, sequer ao nível dos requisitos
habilitacionais exigidos.
Na situação em apreço, somos do entendimento que se está perante uma
situação em que aquele princípio da inversão das posições relativas foi violado,
pois como resulta da matéria de facto apurada, o Autor, que detinha a categoria
de inspector de 2.ª classe foi ultrapassado, com referência a 01 de Julho de
2000, por um conjunto de funcionários que eram apenas subinspectores, isto é,
situados dois níveis abaixo na carreira e que, por força das normas legais supra
referidas, lhe passaram à frente, tendo sido colocados na categoria de
Inspectores Técnicos Principais ao passo que o Autor foi colocado como Inspector
Técnico, isto é, um nível abaixo daqueles.
O artigo 204.º da CRP impõe que os tribunais, nas suas decisões, não
apliquem normas que infrinjam o disposto na Constituição ou os princípios nela
consagrados.
O disposto nos artigos 9.º, n.º 3 do DL 112/01 e 8.º n.º 3 do D.R.
n.º 48/2002, pelas razões supra referidas, violam o disposto no art. 13.º e 59.º
da CRP, o que inquina tais normas de inconstitucionalidade material, afectando,
consequentemente, a validade do despacho impugnado, que, por isso, deve ser
anulado por carecer de base legal.
(...)
Afigura-se-nos ainda que da apontada inconstitucionalidade material
dos artigos supra referidos não se segue que o Autor tenha direito a ser
posicionado na categoria de Inspector Técnico Especialista Principal.
Na verdade, a inconstitucionalidade reside em, por via da revisão
das carreiras, a lei ter permitido que os subinspectores tivessem, sem razão
justificativamente válida, ultrapassado os seus superiores hierárquicos,
incluindo o aqui Autor (sendo este o vício que cumpre eliminar) e não permitir
ao aqui Autor que, com fundamento numa ilegalidade, seja, sem qualquer outra
razão que o justifique, promovido àquela categoria.
Assim, do apontado vício de inconstitucionalidade material apenas se
segue a condenação da Administração Pública a operar o reposicionamento dos
funcionários, levando em consideração aquela inconstitucionalidade, ou seja, a
posicionar os funcionários, m[a]xime, o aqui Autor como se aquelas normas não
existissem, designadamente, em termos salariais.
(...)”
Do acórdão de que parte se encontra extractada recorreu
para o Tribunal Constitucional ao abrigo da alínea a) do nº 1 do artº 70º da Lei
nº 28/82, de 15 de Novembro, o Representante do Ministério Público junto do
Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, por intermédio de tal recurso
intentando a apreciação das normas constantes do nº 3 do artº 8º, em conjugação
com o nº 3 do artº 10º, um e outro do Decreto Regulamentar nº 48/2002, de 26 de
Novembro, e do artº 9º, nº 3, do Decreto-Lei nº 112/2001, de 6 de Abril.
Os autos foram remetidos ao Tribunal Constitucional em
14 de Junho de 2005.
2. Determinada a feitura de alegações, rematou a
entidade recorrente a por si produzida com o seguinte quadro conclusivo: –
“1 - As normas constantes do artigo 8°, nº 3, em conjugação com o artigo 10°, nº
2, do Decreto Regulamentar nº 48/02, de 26 de Novembro, e do artigo 9°, nº 3,
do Decreto-Lei nº 112/01, de 6 de Abril, ao implicarem que – no âmbito da
reestruturação de carreiras dos funcionários ligados ao exercício de funções de
inspecção ou fiscalização – ocorra uma inversão das posições relativas detidas
pelos funcionários à data da publicação de tais diplomas, violadora do princípio
da coerência e equidade, por desprovida de fundamento material adequado, com
reflexos no escalão remuneratório respectivo, violam os princípios
constitucionais constantes dos artigos 59° e 13° da Constituição da República
Portuguesa.
2 - Termos em que deverá confirmar-se o juízo de inconstitucionalidade constante
da decisão recorrida.”
Por seu turno, o recorrido concluiu a sua resposta à
alegação dizendo –
“A) O ora recorrido, subscreve a conclusão I das alegações do Ministério
Público na qual defende que ‘As normas constantes do artigo 8°, nº 3, em
conjugação com o artigo 10°, nº 2, do Decreto Regulamentar nº 48/02, de 26 de
Novembro, e do artigo 9°, nº 3, do Decreto-Lei nº 112/01, de 6 de Abril, ao
implicarem que – no âmbito da reestruturação de carreiras dos funcionários
ligados ao exercício de funções de inspecção ou fiscalização – ocorra uma
inversão das posições relativas detidas pelos funcionários à data da publicação
de tais diplomas, violadora do princípio da coerência e equidade, por desprovida
de fundamento material adequado, com reflexos no escalão remuneratório
respectivo, violam os princípios constitucionais constantes dos artigos 59° e
13° da Constituição da República Portuguesa.’
B) Bem como o princípio da protecção da confiança na medida em que os
funcionários têm o direito de confiar que a Administração e que o legislador não
os prejudique[m] arbitrariamente.
C) Termos em que deverá confirmar-se o juízo de inconstitucionalidade
constante da decisão recorrida”.
Cumpre decidir.
3. Por intermédio do Decreto-Lei nº 112/2001, de 6 de
Abril, operou-se o estabelecimento e definição das carreiras de inspecção da
Administração Pública, criando, nas inspecções-gerais, serviços e organismos da
administração central e regional autónoma, incluindo os serviços públicos nas
modalidades de serviços personalizados do Estado e de fundos públicos, que
tivessem nos respectivos quadros de pessoal carreiras de inspecção próprias para
o exercício de funções compreendidas no âmbito do poder de autoridade do Estado
(com excepção dos serviços e organismos que disponham de carreiras constituídas
como corpo espacial), as carreiras de inspecção de inspector superior (na qual
se integravam as categorias de inspector superior principal, inspector superior,
inspector principal e inspector) inspector técnico (integrando as categorias de
inspector técnico especialista principal, inspector técnico especialista,
inspector técnico principal e inspector técnico) e inspector-adjunto (que
integrava as categorias de inspector-adjunto especialista principal,
inspector-adjunto especialista, inspector-adjunto principal e
inspector-adjunto), carreiras essas de regime especial e cujas estruturas e
escalas salariais constavam do mapa I anexo a tal diploma (cfr. artigos 1º a 6º
daquele diploma).
No referido mapa anexo, surpreendem-se as seguintes
escalas salariais: –
___________________________________________________________________
Escalões
Carreiras Categorias
1 2 3 4 5
____________________________________________________________________________
Inspector superior.……Inspector superior principal…..……….780 830 880
900 -
Inspector superior……………………………………670 720
750 780 -
Inspector principal…………………………………..560 620
670 720 -
Inspector………………………………………………….500 530
560 600 -
Estagiário…………………………………………………370 -
- - -
__________________________________________________________________________________
Inspector técnico.......Inspector técnico especialista principal….570 620
670 720 -
Inspector técnico especialista…………………510
540 570 600 -
Inspector técnico principal……………………..440
480 510 540 -
Inspector técnico…………………………………….360 380
410 440 -
Estagiário…………………………………………………250 -
- - -
__________________________________________________________________________________
Inspector-adjunto…….Inspector-adjunto especialista principal..390 410
430 450 470
Inspector-adjunto especialista……………….345
355 370 385 400
Inspector-adjunto principal…………………...290
305 320 340 355
Inspector-adjunto……………………………………240 255
270 285 300
Estagiário………………………………………………..190 -
- - -
Por outro lado, vieram dispor os artigos 9º, 14º, 15º,
16º e 19º do Decreto-Lei nº 112/2001: –
Artigo 9.º
Intercomunicabilidade entre carreiras
1 – Os inspectores técnicos especialistas com três anos de serviço
na categoria e os inspectores técnicos especialistas principais, em ambos os
casos com a habilitação mínima de curso superior que não confira o grau de
licenciatura, podem candidatar-se à categoria de inspector principal da carreira
de inspector superior, desde que em alternativa:
a) Sejam detentores dos requisitos habilitacionais exigíveis para ingresso nesta
carreira;
b) Tenham frequentado, com aproveitamento, a formação definida nos termos do
artigo 14.º;
c) Tenham obtido qualificações reconhecidas no âmbito dos sistemas educativos ou
da formação profissional, em domínios relevantes para a missão dos serviços, a
definir no aviso de abertura de concurso.
2 – Os inspectores técnicos com três anos de serviço na categoria e
os inspectores técnicos principais podem candidatar-se a concursos para a
categoria de ingresso na carreira de inspector superior, com dispensa da
frequência e aprovação no respectivo estágio, desde que reúnam os requisitos
habilitacionais exigíveis para o ingresso nesta carreira.
3 – Os inspectores-adjuntos especialistas com três anos de serviço
na categoria e os inspectores-adjuntos especialistas principais podem
candidatar-se à categoria de inspector técnico principal, desde que em
alternativa:
a) Sejam detentores dos requisitos habilitacionais exigíveis;
b) Tenham frequentado, com aproveitamento, a formação definida nos termos do
artigo 14.º;
c) Tenham obtido qualificações reconhecidas no âmbito dos sistemas educativos ou
da formação profissional, em domínios relevantes para a missão dos serviços, a
definir no aviso de abertura de concurso.
4 – Os inspectores-adjuntos com três anos de serviço na categoria e
os inspectores-adjuntos principais podem candidatar-se a concursos para a
categoria de ingresso na carreira de inspector técnico, com dispensa da
frequência e aprovação no respectivo estágio, desde que reúnam os requisitos
habilitacionais exigíveis para o ingresso nesta carreira.
5 – Nos casos referidos nos números anteriores, a integração na nova
carreira e categoria faz-se em escalão a que corresponda índice igual àquele que
o funcionário detém na categoria de origem ou no índice superior mais
aproximado, se não houver coincidência.
Artigo 14.º
Regulamentação
1 – A aplicação do disposto no presente diploma aos serviços e
organismos a que se refere o n.º 1 do artigo 2.º faz-se, em cada caso, mediante
decreto regulamentar.
2 – Os decretos regulamentares previstos no número anterior, a
aprovar no prazo de 90 dias, estabelecem, designadamente, as carreiras a prever,
o conteúdo funcional, as regras próprias de transição e demais regulamentação
considerada necessária.
3 – Os decretos regulamentares podem, ainda, prever a integração nas
carreiras de inspecção de funcionários integrados noutras carreiras, desde que
desempenhem funções de natureza inspectiva e reúnem os requisitos legais
exigidos.
4 – Para a carreira de inspector-adjunto pode também prever-se a
transição de funcionários que, não reunindo os requisitos legais exigidos,
desempenhem funções inspectivas e detenham formação profissional adequada.
5 – Os estágios a que se referem os artigos 4.º, 5.º e 6.º têm a
duração mínima de um ano.
Artigo 15.º
Regime geral de transição
1 – Os funcionários dos serviços e organismos abrangidos pelo
presente diploma, integrados em carreiras de inspecção, transitam para carreira
com iguais requisitos habilitacionais de ingresso.
2 – A categoria de integração na nova carreira é a equivalente à
detida na data da transição, sem prejuízo da introdução de novos ajustamentos
necessários para a sua adaptação à nova estrutura da carreira, tendo em conta,
designadamente, o disposto no artigo 16.º
3 – A transição faz-se para o escalão igual ao que o funcionário
detém na categoria de origem.
4 – O tempo de serviço prestado na categoria de origem conta para
efeitos de promoção como se tivesse sido prestado na nova categoria, sem
prejuízo do disposto no número seguinte.
5 – Quando a transição resulta da fusão de duas categorias, releva
na nova categoria, para efeitos de promoção, apenas o tempo de serviço prestado
na categoria mais elevada da anterior carreira.
Artigo 16.º
Regras especiais de transição
1 – Os funcionários que à data da entrada em vigor do presente
diploma reúnam os requisitos necessários à aplicação dos mecanismos de
intercomunicabilidade de carreiras a que se refere o artigo 9.º transitam para a
categoria correspondente da carreira constante do presente diploma.
2 – Para efeitos da transição a que se refere o número anterior, os
requisitos de qualificação profissional a que se referem os n.ºs 1 a 3 do artigo
9.º do presente diploma consideram-se preenchidos pela posse das qualificações
exigidas pelas regras de intercomunicabilidade ou de acesso, constantes dos
diplomas que regiam as anteriores carreiras.
3 – Os lugares em que actualmente estão providos os funcionários
referidos no n.º 1 são extintos e automaticamente aditados à categoria para a
qual transitam.
Artigo 19.º
Produção de efeitos
A transição para as novas carreira criadas pelo presente diploma,
bem como o correspondente abono do suplemento de função inspectiva, produz
efeitos reportados a 1 de Julho de 2000.
Em 26 de Novembro de 2002 veio a lume o Decreto
Regulamentar nº 48/2002 que, por aplicação do regime previsto no Decreto-Lei nº
112/2001, veio a definir e regulamentar a estrutura das carreiras inspectivas do
quadro da Inspecção-Geral das Actividades Económicas, criando nas respectivas
carreiras de inspecção, como carreiras de regime especial, as carreiras de
inspector superior (integrando as categorias de inspector superior principal,
inspector superior, inspector principal e inspector), inspector técnico
(integrando as categorias de inspector técnico especialista principal, inspector
técnico especialista, inspector técnico principal e inspector técnico) e
inspector-adjunto (integrando as categorias de inspector-adjunto especialista
principal, inspector-adjunto especialista, inspector-adjunto principal e
inspector-adjunto), determinando que o ingresso na carreira de inspector
superior se faria, em regra, para a categoria de inspector, de entre indivíduos
habilitados com licenciatura adequada, com carta de condução de veículos
ligeiros, idade não superior a trinta e cinco anos e aprovados em estágio, com
classificação não inferior a Bom, que o ingresso na carreira de inspector
técnico se faria, em regra, para a categoria de inspector técnico, de entre
indivíduos habilitados com curso superior adequado que não confira o grau de
licenciatura, com carta de condução de veículos ligeiros, com idade não superior
a trinta e cinco anos e aprovados em estágio, com classificação não inferior a
Bom, e que o ingresso na categoria de inspector-adjunto se faria para a
categoria de inspector-adjunto, de entre indivíduos habilitados com o 12º ano de
escolaridade ou equivalente, com carte de condução de veículos ligeiros, com
idade não inferior a vinte e um anos nem superior a trinta e aprovados em
estágio com classificação não inferior a Bom – cfr. artigos 2º a 6º.
Nos artigos 8º, 10º e 12º do indicado Decreto
Regulamentar veio a ficar consagrado: –
Artigo 8.º
Formação
1 – Os cursos que integram os estágios previstos nos artigos 4.º,
5.º e 6.º do presente diploma são objecto de regulamento a aprovar por despacho
conjunto dos Ministros das Finanças e da tutela.
2 – A definição dos requisitos de formação exigida pelas regras de
intercomunicabilidade entre carreiras a que se referem a alínea b) do n.º 1 e a
alínea b) do n.º 3 do artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 112/2001, de 6 de Abril, é
estabelecida por despacho conjunto dos Ministros das Finanças e da tutela.
3 – Sem prejuízo do previsto no número anterior, para os efeitos
constantes da alínea b) do n.º 3 do artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 112/2001, de 6
de Abril, é válida e suficiente a formação adquirida nos termos da alínea d) do
n.º 2 do artigo 25.º do Decreto-Lei n.º 269-A/95, de 19 de Outubro, ou, em
alternativa, a prevista do artigo 28.º do mesmo diploma.
Artigo 10.º
Regra geral de transição
1 – Os funcionários providos nas actuais carreiras de inspecção
superior e de inspecção transitam para as novas carreiras, sendo integrados nos
escalões que possuíam à data da transição.
2 – As transições ocorrem em conformidade com o mapa do anexo II ao
presente diploma, que dele faz parte integrante.
3 – O tempo de serviços prestado na categoria de origem conta para
efeitos de promoção como prestado na nova categoria.
Artigo 12.º
Produção de efeitos
1 – A transição para as novas carreiras, nos termos dos n.ºs 1 e 2
do artigo 10.º do presente diploma, bem como o correspondente abono de
suplemento de função inspectiva, produz efeitos reportados a 1 de Julho de 2000.
2 – Aos funcionários que tenham mudado de categoria ou de escalão a
partir de 1 de Julho de 2000 são aplicáveis as transições constantes do mapa
anexo II ao presente diploma, com efeitos a partir da data em que as mesmas
ocorreram.
3 – Os funcionários que se aposentaram a partir de 1 de Julho de
2000 terão a sua pensão de aposentação calculada com base no índice que couber
ao último escalão em que ficarem posicionados e no correspondente suplemento de
função inspectiva.
O mapa do anexo II, referido no transcrito artº 10º,
fornece os seguintes comandos de transição: –
Situação de Origem.Transição
CategoriaEscalãoÍndiceEscalãoÍndiceCategoria
Inspector superior principal17351780Inspector superior principal
27552830
38003880
48604900
Inspector superior 16301670Inspector superior
26502720
36803750
47154780
5 7554780
Inspector principal15251560Inspector principal
25452620
35753670
46104720
56404720
66704720
Inspector 14601500Inspector
24702530
34903560
45104600
55354600
65604600
Estagiário 335 370Estagiário
Transição da carreira de inspecção para as carreiras de inspector técnico
e de inspector-adjunto
Situação de Origem.Transição
CategoriaEscalãoÍndiceEscalãoÍndiceCategoria
Inspector técnico especialista15251570Inspector técnico especialista
principal
25452620
35753670
46104720
56454720
Inspector técnico principal14601510Inspector técnico especialista
24702540
34903570
45104600
55354600
Inspector técnico de 1ª classe14001440Inspector técnico principal
24102480
34253510
44454540
54654540
64904540
Inspector técnico 2ª classe13351360Inspector técnico
23452380
33603410
43804440
54054440
64204440
Subinspector12601345Inspector-adjunto especialista
22702355
32803370
42954385
Situação de Origem.Transição
CategoriaEscalãoÍndiceEscalãoÍndiceCategoria
53055400
63255400
Agente12151290Inspector-adjunto principal
22252305
32353320
42454340
52555355
62755355
72855355
Estagiário 175 190Estagiário
Anote-se que, de harmonia com os artigos 21º, 22º e 23º
do Decreto-Lei nº 269-A/95, de 19 de Outubro, o pessoal do quadro da
Inspecção-Geral das Actividades Económicas das carreiras de inspecção
integrava-se em carreiras de regime especial que compreendiam a carreira de
inspecção superior (que se desenvolvia pelas categorias de inspector superior
principal, inspector superior, inspector principal e inspector) e de inspecção
(que se desenvolvia pelas categorias de inspector técnico especialista,
inspector técnico principal, inspector técnico de 1ª classe, inspector técnico
de 2ª classe, subinspector e agente).
Anote-se ainda, para a compreensão do problema de
constitucionalidade que se tem de enfrentar, que no nº 2 do artº 25º desse
Decreto-Lei nº 269-A/95, se prescrevia que o acesso nas carreiras de inspecção
se regia pelas seguintes normas:
a) Inspector técnico especialista, mediante de avaliação concurso curricular, de
entre inspectores técnicos principais com, elo menos três anos de serviços na
categoria classificados de Muito bom ou cinco anos classificados, no mínimo, de
Bom;
b) Inspector técnico principal, mediante concurso com prova de conhecimentos e
avaliação curricular, de entre inspectores técnicos de 1.ª classe com curso
superior não conferente do grau de licenciatura com, pelo menos, três anos de
serviço na respectiva categoria classificados de Muito bom ou cinco anos
classificados, no mínimo, de Bom;
c) Inspector técnico de 1.ª classe, mediante concurso com prova de conhecimentos
e avaliação curricular, de entre inspectores técnicos de 2.ª classe com, pelo
menos, três anos de serviço na respectiva categoria classificados de Muito bom
ou cinco anos classificados, no mínimo, de Bom;
d) Inspector técnico de 2.ª classe, mediante concurso com prova de conhecimentos
e avaliação curricular, de entre subinspectores com curso de formação para
inspector técnico de 2.ª classe com, pelo menos, três anos de serviço na
respectiva categoria classificados de Muito bom ou cinco anos classificados, no
mínimo, de Bom;
e) Subinspector, mediante concurso com prova de conhecimentos e avaliação
curricular, de entre agentes com, pelo menos, três anos de serviço na respectiva
categoria classificados de Muito bom ou cinco anos classificados, no mínimo, de
Bom;
3.1. Da matéria fáctica dada por assente na decisão
impugnada – e que este Tribunal não pode censurar – resulta que o ora
recorrente, ao tempo da produção de efeitos dos Decreto-Lei nº 112/2001 e
Decreto Regulamentar nº 48/2002, detinha a categoria de inspector técnico de 2ª
classe, tendo sido nomeado como inspector técnico de 1ª classe em 22 de Dezembro
de 2001.
Assim, de acordo com as disposições legais acima
transcritas, um funcionário na situação do impugnante transitou, por força do
mapa anexo II ao Decreto Regulamentar nº 48/2002, para a categoria de inspector
técnico da carreira de inspecção e, a partir de 22 de Dezembro de 2001, para a
categoria de inspector técnico principal, sendo que, um sub-inspector
transitaria para a categoria de inspector-adjunto especialista da mesma
carreira.
Simplesmente, em face da possibilidade conferida pelo
artº 9º do Decreto-Lei nº 112/2001, tornou-se possível aos inspectores-adjuntos
especialistas com três anos de serviço na categoria, de harmonia com o disposto
no seu nº 3, candidatarem-se à categoria de inspectores técnicos principais,
desde que, em alternativa, fossem possuidores dos requisitos habilitacionais
exigíveis, tivessem frequentado, com aproveitamento, a formação prevista no artº
14º desse diploma, ou tivessem obtido qualificações reconhecidas no âmbito dos
sistemas educativos ou da formação profissional, em domínios relevantes para a
missão dos serviços, sendo que, para efeitos da frequência da referida formação,
o nº 3 do artº 8º do Decreto Regulamentar nº 48/2002 entendeu como válido e
suficiente o concurso com prova de conhecimentos e avaliação curricular de
sub-inspectores que já detivessem curso de formação para inspector técnico de 2ª
classe com, pelo menos, três anos d serviços na respectiva categoria
classificados de Muito bom ou cinco anos com classificação mínima de Bom.
No que concerne aos então inspectores de 2ª classe da
Inspecção-Geral das Actividades Económicas (isto é, aos funcionários que
detivessem tal categoria da carreira de inspecção delineada no Decreto-Lei nº
269-A/95), nenhuma regra especial, à excepção das gerais contidas nos artigos
10º e 12º do Decreto Regulamentar nº 48/2002, foi prevista, não se podendo
olvidar que, de acordo com o mencionado Decreto-Lei nº 269-A/95, naquela
carreira, a categoria de sub-inspector era posicionada em nível hierárquico e
remuneratório (cfr., quanto a este último, o Mapa II Anexo a esse diploma)
inferior à categoria de inspector técnico de 2ª classe.
Poderão, por isso, surgir situações em que, por virtude
da transição, sub-inspectores com menor antiguidade na carreira de inspecção do
que a possuída pelos inspectores técnicos de 2ª classe e não apresentando,
relativamente a estes, mais elevados requisitos habilitacionais, sejam
posicionados, no domínio das carreiras de inspecção da Administração Pública, em
categorias mais elevadas (e com remuneração superior) do que aquelas em que,
também pela transição, foram posicionados aqueles inspectores técnicos.
3.3. É, pois, neste contexto que se terá de apreciar a
compatibilidade constitucional do comando extraível da conjugação das normas
ínsitas no nº 3 do artº 8º e do nº 10º, um e outro do Decreto Regulamentar nº
48/2002, e da alínea b) do nº 3 do artº 9º do Decreto-Lei nº 112/2001, na medida
– e tão só nessa medida – em que implique que, na reestruturação das carreiras
dos funcionários das carreiras de inspecção da Inspecção-Geral das Actividades
Económicas para efeitos daquele decreto-lei, possam os então sub-inspectores,
com menor antiguidade na carreira e que não detenham mais elevados requisitos
habilitacionais do que os então inspectores técnicos de 2ª classe, ser
posicionados em categorias mais elevadas do que aquela em que foram posicionados
os inspectores técnicos de 2ª classe.
No recente Acórdão nº 323/2005 (disponível em
http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20050323.html), tirado em
plenário, teve este Tribunal ocasião de discretear em dados passos: –
“ (…)
10. Assente que a norma conduz a situações em que funcionários com
menos tempo de serviço na categoria e, até, na categoria e na carreira, fiquem
posicionados em índice remuneratório superior ao de outros que hajam sido
promovidos à mesma categoria em momento anterior, importa lembrar que o Tribunal
Constitucional já teve ensejo de se pronunciar sobre algumas situações que
apresentam similitudes com a que agora é posta à sua consideração. Assim, para
só referir a jurisprudência mais directamente pertinente:
No Acórdão n.º 584/98 (Diário da República, II Série, de 30 de Março
de 1999), o Tribunal decidiu julgar inconstitucional – por violação do artigo
53.º, n.º 1, alínea a), da Constituição – a norma constante do artigo 2.º do
Decreto‑Lei n.º 347/91, de 19 de Setembro, enquanto restringe o descongelamento
na progressão nos escalões das categorias e carreiras do pessoal docente do
ensino superior e de investigação, mas tão‑só na medida em que o limite
temporal de antiguidade na categoria, ali estipulado para a primeira e segunda
fases do descongelamento, implique que funcionários mais antigos na mesma
categoria passem a auferir uma remuneração inferior à de outros, de menor
antiguidade e idênticas qualificações;
No Acórdão n.º 254/2000 (Diário da República, I Série-A, de 23 de
Maio de 2000), o Tribunal decidiu, na esteira de anteriores decisões em
processos de fiscalização concreta da constitucionalidade (Acórdãos n.ºs
180/99, 409/99 e 410/99, publicados no Diário da República, II Série, de 28 de
Julho e 10 de Março de 1999), declarar inconstitucionais, com força obrigatória
geral, por violação do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 59.º da
Constituição, enquanto corolário do princípio da igualdade consagrado no seu
artigo 13.º, as normas constantes do n.º 1 do artigo 3.º do Decreto‑Lei n.º
204/91, de 7 de Junho, e do n.º 1 do artigo 3.º do Decreto‑Lei n.º 61/92, de 15
de Abril, na medida em que, limitando o seu âmbito a funcionários promovidos
após 1 de Outubro de 1989, permitem o recebimento de remuneração superior por
funcionários com menor antiguidade na categoria;
No Acórdão n.º 356/2001 (Diário da República, I Série-A, de 7 de
Fevereiro de 2001), o Tribunal decidiu declarar a inconstitucionalidade, com
força obrigatória geral, da norma contida no n.º 1 do artigo 11.º do Decreto‑Lei
n.º 373/93, de 4 de Novembro, relativa à carreira de bombeiros sapadores, na
parte em que, limitando o seu âmbito a funcionários promovidos após 1 de Outubro
de 1989, permite o recebimento de remuneração superior por funcionários com
menor antiguidade na categoria;
No Acórdão n.º 426/2001 (Diário da República, II Série, de 16 de Novembro
de 2001), o Tribunal decidiu julgar inconstitucional, por violação do princípio
da igualdade, consagrado nos artigos 13.º, 47.º, n.º 2, e 59.º, n.º 1, alínea
a), da Constituição, as normas dos artigos 27.º, n.º 3, do Decreto‑Lei n.º
184/89 e 17.º, n.º 1, alínea b), do Decreto‑Lei n.º 353‑A/89, interpretados no
sentido da atribuição aos funcionários melhor classificados num concurso para
progressão na carreira, imediatamente promovidos a categoria superior, de
vencimento inferior ao que vem a ser atribuído aos outros funcionários que
ficaram inicialmente fora das vagas postas a concurso e que, por isso,
permaneceram na categoria inferior, só ulteriormente vindo a ser promovidos, no
âmbito do mesmo concurso, a que todos se apresentaram posicionados no mesmo
escalão.
No Acórdão n.º 405/2003 (Diário da República, I Série-A, de 15 de Outubro
de 2003), o Tribunal decidiu declarar, com força obrigatória geral, a
inconstitucionalidade, por violação do artigo 59.º, n.º 1, alínea a), da
Constituição, enquanto corolário do princípio constitucional da igualdade
consagrado no seu artigo 13.º, das normas conjugadas dos artigos 16.º, alínea
b), 85.º, n.º 1, e 86.º, n.º 1, do Decreto‑Lei n.º 564/99, de 21 de Dezembro, e
do mapa III constante do anexo II ao mesmo diploma, na medida em que permitem,
na carreira de técnico de diagnóstico e terapêutica, o recebimento de
remuneração superior por funcionários com menor antiguidade na categoria;
No Acórdão n.º 646/2004 (Diário da República, II Série, de 16 de Dezembro
de 2004), o Tribunal decidiu julgar inconstitucional, por violação do disposto
na alínea a) do n.º 1 do artigo 59º da Constituição, enquanto corolário do
princípio da igualdade consagrado no seu artigo 13.º, a norma constante n.º 4 do
artigo 21.º do Decreto-Lei n.º 404-A/98, de 18 de Dezembro, na medida em que,
limitando o seu âmbito apenas a funcionários cuja promoção ocorreu em 1997,
permite o recebimento de remuneração superior por funcionários com menor
antiguidade na categoria.
Não seria, porém, legítimo concluir, como pressupõe a argumentação do
Provedor de Justiça, pela existência de uma jurisprudência consolidada no
sentido de que a mera percepção de remuneração superior por funcionários com
menor antiguidade na categoria acarreta, só por si e inelutavelmente, a
inconstitucionalidade da norma que a isso conduz, por violação do princípio ‘a
trabalho igual, salário igual’, de tal modo que apenas restasse transpô-la, sem
mais ponderações, para o caso agora sujeito a apreciação.
Importa, com efeito, salientar que todas as hipóteses sobre que versaram estes
arestos, excepto aquela que foi objecto do Acórdão n.º 426/2001, apresentam uma
particularidade de que a norma agora examinada não comunga e é nesse contexto
que a sua doutrina deve ser entendida e com esse limite que deve ser transposta.
Em todas elas se verificava a interferência de um factor anómalo, de
circunstância puramente temporal, estranho à equidade interna e à dinâmica
global do sistema retributivo e sem relação com a natureza do trabalho ou com as
qualificações ou experiência dos funcionários confrontados, que era responsável
pela inversão das posições remuneratórias: o faseamento do descongelamento dos
escalões (Acórdão n.º 584/98), ter a promoção ocorrido antes ou depois de certa
data (Acórdãos n.ºs 254/2000, 356/2001 e 646/2004) ou o modo de operar a
transição perante sucessão de regimes estatutários (Acórdão n.º 405/2003).
Não é desta natureza a norma agora em apreço, que desenvolve uma característica
do sistema retributivo da função pública que consiste em a evolução
remuneratória na carreira se processar por mudança de categoria (promoção) e
mudança de escalão dentro de cada categoria (progressão), de forma articulada e
complementar de modo a que a evolução por progressão venha a reflectir-se na
evolução por promoção.
Aliás, mesmo quanto ao Acórdão n.º 426/2001, há que ter em conta que o Tribunal
se encontrava aí sujeito às limitações cognitivas de um recurso de fiscalização
concreta incidente sobre uma decisão de recusa de aplicação da norma que veio a
ser julgada inconstitucional, não lhe cabendo averiguar os factos ou a melhor
interpretação do direito ordinário, não deixando, todavia, o acórdão de inserir,
no considerando final que antecede a decisão, um parêntesis em que se faz
referência à possibilidade de os funcionários com maior antiguidade na categoria
que haviam sido ultrapassados porventura terem também «antiguidade na carreira
idêntica ou maior».
11. Argumenta o Primeiro-Ministro que a norma em causa introduz uma
diferenciação constitucionalmente legítima, materialmente fundada, porque
reflecte a posição desigual que os funcionários detinham na categoria de origem,
dando continuidade à protecção da antiguidade nos seus vários contornos, que não
passa exclusivamente pelo processo de promoção, aportando em diferentes soluções
em função de situações de base com características diversas. E defende que a
violação do princípio da igualdade não pode ser aferida apenas pelo critério de
antiguidade na categoria, mas também pelo critério do escalão do posicionamento
de origem quando tem lugar a promoção, traduzindo a ideia de proporcionalidade
continuada, com valoração combinada da antiguidade e do mérito, que se quis
imprimir à evolução retributiva dos trabalhadores da Administração Pública.
Esta justificação só em parte pode ser acolhida, na perspectiva da
conformidade da referida norma com a Constituição, que é o que ao Tribunal
compete apreciar.
Como o Tribunal disse no acórdão n.º 584/98:
«O artigo 59.º, n.º 1, alínea a), da Constituição da República Portuguesa – ao
preceituar que ‘todos os trabalhadores [ ...] têm direito à retribuição do
trabalho, segundo a quantidade, natureza e qualidade, observando-se o princípio
de que para trabalho igual salário igual, de forma a garantir uma existência
condigna’ – impõe que a remuneração do trabalho obedeça a princípios de
justiça.
Ora a justiça exige que quando o trabalho prestado for igual em quantidade,
natureza e qualidade seja igual a remuneração. E reclama (nalguns casos apenas
consentirá) que a remuneração seja diferente, pagando-se mais a quem tiver
melhores habilitações ou mais tempo de serviço. Deste modo se realiza a
igualdade pois que, como se sublinhou no Acórdão n.º 313/89 (publicado nos
Acórdãos do Tribunal Constitucional, 13.º vol. T. II, pp. 917 e segs.), do que
no preceito constitucional citado se trata é um direito de igualdade.
Escreveu-se neste aresto:
‘O direito de que aqui se trata é um direito de igualdade – mas de uma igualdade
material que exige que se tome sempre em consideração a realidade social em que
as pessoas vivem e se movimentam – e não de uma igualdade meramente formal e
uniformizadora (cf. Francisco Lucas Pires, Uma Constituição para Portugal,
Coimbra, 1975, pp. 62 e segs.).
Uma justa retribuição do trabalho é, no fundo, o que os princípios enunciados no
preceito visam assegurar: a retribuição deve ser conforme à quantidade, natureza
e qualidade do trabalho; deve garantir uma existência condigna e a trabalho
igual – igual em quantidade, natureza e qualidade – deve corresponder salário
igual.
O princípio ‘para trabalho igual salário igual’ não proíbe, naturalmente, que o
mesmo tipo de trabalho seja remunerado em termos quantitativamente diferentes,
conforme seja feito por pessoas com mais ou menos habilitações e com mais ou
menos tempo de serviço, pagando-se mais, naturalmente, aos que maiores
habilitações possuem e mais tempo de serviço têm. O que o princípio proíbe é que
se pague de maneira diferente a trabalhadores que prestam o mesmo tipo de
trabalho, têm iguais habilitações e o mesmo tempo de serviço.
O que, pois, se proíbe são as discriminações, as distinções sem fundamento
material, designadamente porque assentes em meras categorias subjectivas.
Se as diferenças de remuneração assentarem em critérios objectivos, então elas
são materialmente fundadas e não discriminatórias [...]».
A esta luz, não será constitucionalmente vedado ao legislador, face ao referido
princípio, ordenar o sistema retributivo por forma a reflectir, na determinação
da remuneração dos trabalhadores da Administração Pública, o tempo de serviço na
carreira, ainda que daí resulte o recebimento de remuneração superior por
funcionários com menor antiguidade na categoria.
Com efeito, a carreira é o conjunto hierarquizado de categorias às quais
correspondem funções da mesma natureza a que os funcionários terão acesso de
acordo com a antiguidade e o mérito evidenciado no desempenho profissional (cf.
n.º 1 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 248/85, de 19 de Abril; definição que já
não será inteiramente exacta porque dos anexos ao Decreto-Lei n.º 404-A/98 e
412-A/98 resulta a existência de carreiras unicategoriais). Embora se
diferenciem em exigência, complexidade e responsabilidade (carreiras verticais)
ou apenas pela maior eficiência na execução das respectivas tarefas (carreiras
horizontais), as categorias da função pública, designadamente aquelas a que se
aplica o n.º 3 do artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 353-A/89, partilham a
identidade funcional correspondente a uma dada profissão.
Deste modo, não se apresenta como solução normativa destituída de fundamento
material face ao princípio da igualdade, a diferenciação remuneratória na
categoria superior, mesmo que implique o recebimento de remuneração superior
pelo funcionário menos antigo nessa categoria, que resulte do diferente
posicionamento atingido nos escalões da categoria de origem, desde que isso
corresponda a um factor objectivo, susceptível de repercutir-se nas
características do trabalho prestado ou nas capacidades e qualificações
profissionais dos trabalhadores em causa, como sucede com a maior antiguidade na
carreira. Face à substancial homogeneidade do conteúdo funcional das diversas
categorias que a compõem, a valorização da experiência profissional inerente ao
maior tempo de serviço na carreira não colide com os parâmetros da igualdade
retributiva da alínea a) do n.º 1 do artigo 59.º da Constituição visto que não é
desrazoável presumir que essa maior experiência global se possa traduzir num
melhor desempenho. Por outro lado, não se trata de uma solução dirigida a
beneficiar ou desfavorecer uma classe de funcionários determinada segundo um
elemento arbitrariamente fixado, porque a antiguidade ou tempo de serviço na
carreira é uma característica que todos compartilham e com que todos contam na
melhoria da sua situação retributiva.
Assim, na medida em que a diferenciação remuneratória na categoria de promoção
reflecte a maior antiguidade na carreira, a ‘inversão de posições relativas’
denunciada pelo Provedor de Justiça não pode ser censurada pelo Tribunal por
violação do referido princípio constitucional, cabendo na discricionariedade
legislativa quanto à conformação do sistema retributivo da função pública.
12. Sucede, porém, que a aplicação da norma em causa conduz, noutras situações,
como se revela pelos exemplos atrás mencionados, a que funcionários com menos
tempo de serviço, não só na categoria mas também na carreira, passem a auferir
remuneração superior à de funcionários mais antigos (na mesma categoria e
carreira).
Ora, para justificar, face ao referido princípio, a dimensão ou conteúdo
normativo que conduz a essa diferenciação de tratamento remuneratório já não
pode invocar-se a maior experiência profissional, inerente ao tempo de serviço
na carreira, nem o Tribunal divisa qualquer outro fundamento constitucionalmente
atendível.
Nem pode aceitar-se, como sustenta o Primeiro-Ministro, que o tertium
comparationis para avaliar a violação do princípio da igualdade seja o simples
critério do ‘escalão do posicionamento de origem quando tem lugar a promoção’,
porque esse nem sempre traduz a incorporação de um elemento susceptível de ser
valorado pelo legislador dentro da margem de conformação que lhe é reconhecido,
por ainda lhe poder ser ligado um efeito de diferenciação transportável para a
categoria superior, na medida que tenha relação com a natureza ou com as
características do trabalho prestado. Na hipótese que agora examinamos, o
diferente posicionamento nos escalões da categoria de origem, que vai determinar
impulsos diversos na promoção, traduz apenas o facto, que para este efeito é
acidental, de o funcionário menos antigo ter permanecido na categoria inferior
até que se completasse um outro módulo de tempo para a progressão, enquanto o
funcionário primeiramente promovido inicia um novo módulo para progressão na
categoria de destino.
Importa, finalmente, sublinhar que não pertence ao domínio de jurisdição do
Tribunal indagar se a emergência de situações de desigualdade representa um
resultado inescapável do modo como foi concebido e gizado o novo sistema
retributivo. Como se salientou no Acórdão n.º 254/2000, a invocação de um
interesse esteado no estatuto remuneratório da função pública «não assume uma
qualquer especificidade de onde decorra a postergação do princípio de ‘para
trabalho igual, salário igual’».
De todo o exposto resulta que a norma constante do artigo 17.º, n.º 3, do
Decreto-Lei n.º 353‑A/89, de 16 de Outubro, aditada a este diploma pelo artigo
27.º do Decreto-Lei n.º 404-A/98, de 18 de Dezembro, quando conjugada com os
Anexos ao referido Decreto-Lei n.º 404-A/98 e ao Decreto-Lei n.º 412-A/98, de 30
de Dezembro, viola o princípio constitucional “para trabalho igual salário
igual”, mas apenas na medida em que conduz ao recebimento de remuneração
superior por funcionários que, cumulativamente, detenham menor antiguidade na
categoria e na carreira.
(…)”.
A doutrina perfilhada no aresto de que se fez larga
transcrição é, com as devidas adaptações, aplicável ao caso sub iudicio, no qual
dos normativos em apreço pode resultar, sem que se lobrigue uma razão
justificativa para tanto, que na transição para a estrutura das carreiras de
inspecção da Administração Pública estabelecida pelo Decreto-Lei nº 112/2001, um
inspector técnico de 2ª classe da Inspecção-Geral das Actividades Económicas,
com maior antiguidade na carreira e que não detenha menos requisitos
habilitacionais, possa ser posicionado em categoria hierarquicamente inferior e
a que corresponda inferior remuneração relativamente àquela em que foi
posicionado um sub-inspector daquela Inspecção-Geral.
4. Em face do que se deixa dito: –
a) Julga-se inconstitucional, por violação do artigo
59º, nº 1, alínea a) da Constituição, enquanto corolário do princípio da
igualdade consagrado no seu artigo 13º, a norma resultante da conjugação das
normas ínsitas no nº 3 do artº 8º e do nº 10º, um e outro do Decreto
Regulamentar nº 48/2002, e da alínea b) do nº 3 do artº 9º do Decreto-Lei nº
112/2001, na medida em que implica que, na transição para a estrutura das
carreiras de inspecção da Administração Pública, definida neste último diploma,
um inspector técnico de 2ª classe da Inspecção-Geral das Actividades Económicas,
que possua igual ou superior antiguidade e não detenha inferiores requisitos
habilitacionais, possa ser posicionado em categoria inferior e com menor
remuneração do que aquela em que foi posicionado um sub-inspector da mesma
Inspecção-Geral;
c) Em consequência, nega-se provimento ao recurso.
Lisboa, 16 de Novembro de 2005
Bravo Serra
Maria dos Prazeres Pizarro Beleza
Vítor Gomes
Gil Galvão
Artur Maurício