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Proc. nº 310/97
2ª Secção Relator: Cons. Luís Nunes de Almeida
Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
I - RELATÓRIO
1. Por Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 26 de Fevereiro de 1997, foi negado provimento ao recurso interposto por A. e outros da decisão de 2 de Julho de 1996, do 3º Juízo do Tribunal de Trabalho de Lisboa, que, embora julgando inconstitucional a norma constante da al. c) do nº 1 do artigo 4º do Decreto Lei nº 138/85, de 3 de Maio, julgou extintos os contratos de trabalho por caducidade - verificação da impossibilidade superveniente, absoluta e definitiva de os trabalhadores prestarem o seu trabalho ou de a entidade empregadora o receber -, e julgou ainda válida e procedente a excepção peremptória de prescrição dos créditos dos trabalhadores, invocada pelos Réus B. e Estado Português.
2. Não se conformando com aquele aresto da Relação de Lisboa, os recorrentes interpuseram recurso da mesma para este Tribunal, ao abrigo da al. g) do nº 1 do artigo 70º da L.T.C., com fundamento na aplicação implícita da alínea c) do nº 1 do artigo 4º do Decreto-Lei nº 138/85, de 3 de Maio, norma essa que fora declarada inconstitucional com força obrigatória geral pelo Acórdão nº 162/95, (publicado no Diário da República I Série A, nº 106, de 8 de Maio de 1995).
O recurso assim pretendido não foi admitido, por despacho do M.mo Juiz Desembargador Relator daquele Relação, de 13 de Março de 1997, no qual se entendeu:
não estão ainda esgotadas todas as instâncias de recurso ordinário.
3. Os recorrentes apresentaram reclamação deste despacho, alegando nomeadamente:
Com efeito, o que o nº 2 do artigo 70º da Lei nº 28/82, de 15 de de Novembro estabelece, é que apenas se pode recorrer para o Tribunal Constitucional de decisões que não admitam recurso ordinário (por a lei o não prever ou por já haverem sido esgotados todos os que no caso cabiam), mas apenas quanto aos recursos previstos nas alíneas b) e f) do mesmo artigo 70º.
Ora os recorrentes interpuseram o recurso para o Tribunal Constitucional, nos termos da alínea g) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, pelo que manifestamente, o recurso interposto não cabe na previsão do nº 2 do artigo 70º da Lei nº 28/82.
4. Subiram os autos a este Tribunal, onde o Ministério Público, no seu visto, emitiu parecer no sentido de ser deferida a reclamação, por se verificarem os pressupostos de admissibilidade do recurso de constitucionalidade interposto.
Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
II - FUNDAMENTOS
5. Os reclamantes fundamentaram o recurso, como se pode ver do respectivo requerimento de interposição, na al. g) do nº 1 do artigo 70º da L.T.C.
O que significa que entendem que a decisão recorrida aplicou norma já anteriormente julgada inconstitucional, mais concretamente, que o Tribunal da Relação de Lisboa proferiu decisão contrária ao conteúdo do Acórdão nº 162/95, deste Tribunal.
Ora, é claro e pacífico que neste tipo de recursos não recai sobre o recorrente a obrigação de esgotar os recursos ordinários, como sucede nos recursos interpostos ao abrigo da alínea b). Antes pode funcionar como um recurso directo, apresentando-se à parte a alternativa de usar ainda dos recursos ordinários à sua disposição, antes de recorrer para o Tribunal Constitucional, ou de dele se socorrer de imediato.
É o que resulta expressamente do nº 2 do artigo 70º da LOTC, quando apenas impõe tal ónus aos recursos interpostos ao abrigo das alíneas b) e f) do seu nº 1.
6. Por outro lado, para apurar se se está perante o pretendido recurso de constitucionalidade, há que verificar se a decisão recorrida procedeu à aplicação da norma anteriormente julgada inconstitucional, competindo a este tribunal fazer a interpretação do sentido e alcance das suas declarações de inconstitucionalidade.
Esta questão foi já apreciada por este Tribunal, no seu Acórdão nº 528/96, (publicado no Diário da República, II Série, nº 165, de 18 de Julho de 1996), e também pelos Acórdãos nº 564/96, inédito, que remete para o anterior, e nº 1121/96, igualmente inédito.
Dada a identidade de situações, adopta-se aqui a orientação seguida naqueles arestos:
a) que cabe o recurso previsto na alínea g) do nº 1 do artigo 70º da LTC, quando haja contradição entre a decisão recorrida e acórdão do Tribunal Constitucional que haja declarado uma inconstitucionalidade com força obrigatória geral;
b) que cabe ao Tribunal Constitucional fazer a interpretação do sentido e alcance da suas declarações de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral;
c) que a declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, constante do Acórdão nº
162/95, «impede pelo menos, que a extinção ou cessação dos contratos de trabalho se faça sem que aos trabalhadores se pague uma indemnização - recte, a indemnização correspondente à que lhes seria devida se tivesse havido despedimento colectivo.»;
d) que o acórdão recorrido «não teve em conta o sentido e o alcance, atrás fixados, da declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral»;
e) que, consequentemente, se encontra preenchido o pressuposto do recurso de constitucionalidade.
7. Com efeito, o que os reclamantes peticionaram foi o direito a uma indemnização, tendo o acórdão recorrido entendido que, verificado o fenómeno jurídico da caducidade, como forma de extinção dos respectivos contratos de trabalho, os créditos dos ora reclamantes se encontravam prescritos, ou seja, extintos.
Pois bem, sobre esta questão da caducidade dos contratos de trabalho, pronunciou-se este Tribunal efectivamente pela inconstitucionalidade da norma em causa, nomeadamente no Acórdão nº 358/94
(inédito), este em identidade de situação com a que se verifica nos autos de onde provém a presente reclamação, e ainda nos Acórdãos nº 81/92 (Acórdãos do Tribunal Constitucional, 21º volume, pág. 275), nº 353/94 (Diário da República, nº 206, de 6 de Setembro de 1994) e nº 176/95
(também inédito), entre outros.
Tanto basta para que se considere preenchido o pressuposto processual deste tipo de recurso de constitucionalidade.
III - DECISÃO
8. Nestes termos, defere-se a presente reclamação.
Lisboa, 5 de Novembro de 1997 Luís Nunes de Almeida José de Sousa e Brito Messias Bento Guilherme da Fonseca Fernando Alves Correia José Manuel Cardoso da Costa