Imprimir acórdão
Processo nº 35/97
1ª Secção Rel. Cons. Tavares da Costa tem exposição
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional
1.- Nestes autos de fiscalização concreta de constitucionalidade, em que A. interpôs recurso, ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, do acórdão do Supremo Tribunal Administrativo - 1ª Secção, 2ª Subsecção do Contencioso Administrativo - de 22 de Outubro de 1996, mantendo o despacho reclamado que lhe não recebera recurso de aresto anterior, considerando o disposto na alínea d) do artigo 103º do Decreto-Lei nº 267/85, de 16 de Julho (Lei de Processo nos Tribunais Administrativos - LPTA), foi, oportunamente, lavrada exposição, nos termos do nº 1 do artigo 78º-A da Lei nº 28/82.
Emitiu-se, na ocasião, parecer no sentido de se negar provimento ao recurso, tendo presente que as questões a decidir, no domínio da constitucionalidade, se identificavam a outras já objecto de decisões anteriores do Tribunal.
Assim, estaria em causa a inconstitucionalidade orgânica da norma da alínea d) do citado artigo 103º, por alegada ausência de autorização legislativa do Governo, considerando o entendimento professado segundo o qual o instituto de suspensão da eficácia dos actos administrativos integra o conteúdo essencial do direito ao recurso contencioso contra actos administrativos ilegais - e, daí, a invocação dos artigos 20º, nº 1, e 268º, nº 4, da Constituição da República (CR) - matéria esta da área da competência da Assembleia da República, que a não exerceu, nem sequer autorizou o Governo a legislar, consubstanciando-se, assim, o vício de inconstitucionalidade resultante da violação do disposto na alínea b) do nº 1 do artigo 168º da CR.
De resto, por respeitar a proibição de recurso jurisdicional à organização e competência dos tribunais, também de idêntico vício padeceria a norma, agora por violação do disposto na alínea q) do mesmo nº 1 do artigo 168º.
Ora, como se ponderou na exposição lavrada, a tese defendida pelo recorrente, nesta dupla vertente, já foi analisada pelo Tribunal Constitucional que a afastou, em termos que agora se retomam e reafirmam, para eles se remetendo (cfr. acórdão nº 447/93, publicado no Diário da República, II Série, de 23 de Abril de 1994).
2.- O recorrente questiona, igualmente, a conformidade constitucional da norma em sindicância face ao princípio da igualdade, à conjugação do direito ao recurso com a organização hierárquica dos tribunais e à efectividade de um duplo grau de jurisdição.
Na aludida exposição, para a qual se remete e com a qual se concorda, no essencial, considerou improcedentes os pontos de vista a este respeito desenvolvidos pelo interessado, em termos que este, na sua resposta, não logrou abalar.
Com efeito, defende-se nesta última peça processual que a questão de fundo, relativa à essencialidade, no acesso à justiça, do duplo grau de jurisdição, não é uma questão simples, considerando as respectivas implicações e os desenvolvimentos doutrinais e jurisprudenciais que a matéria tem merecido, nomeadamente em ordenamentos jurídicos estrangeiros.
Assistiria razão ao recorrente se a 'simplicidade' a que se refere o nº 1 do artigo 78º-A fosse reportada à matéria de constitucionalidade, em si. No entendimento da jurisprudência deste Tribunal, que se vem firmando, a 'simplicidade' em causa não tem, apenas, esse recorte, dirigindo-se, também, ao caso concreto dos autos submetidos à apreciação do relator, de modo que, 'ponderando a anterior jurisprudência do Tribunal e não havendo razões que levem, nesse caso, a decidir em contrário, conduzirá a que o juízo a formular a respeito dessa questão venha a ser justamente idêntico ao anteriormente efectivado e que consubstancia aquela jurisprudência' (cfr. acórdão nº 1192/96, publicado no Diário da República, II Série, de 13 de Fevereiro de 1997).
Ou seja, mantém-se integralmente o teor da exposição para a qual se remete e com a qual, como já se registou, se concorda no essencial.
3.- Nos termos do exposto, decide-se negar provimento ao recurso, confirmando-se a decisão recorrida no que respeita à matéria de constitucionalidade.
Custas pelo recorrente com taxa de justiça que se fixa em 5 (cinco) Ucs.
Lisboa, 7 de Outubro de 1997 Alberto Tavares da Costa Armindo Ribeiro Mendes Vítor Nunes de Almeida Maria Fernanda Palma José Manuel Cardoso da Costa Processo nº 35/97
1ª Secção Rel. Cons. Tavares da Costa
Exposição a que se refere o nº 1 do artigo 78º-A da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro.
1.1.- A., identificado nos autos, requereu, em 9 de Maio de 1996, ao Supremo Tribunal Administrativo (STA), a suspensão da eficácia da deliberação proferida na sessão do Conselho Superior do Ministério Público, de 28 de Março anterior, que classificou de medíocre o serviço do requerente na comarca de
....................., como delegado do Procurador da República.
O STA, por acórdão de 2 de Julho seguinte da 2ª Subsecção da 1ª Secção, indeferiu o pedido por entender não se mostrar preenchido o pressuposto enunciado na alínea a) do nº 1 do artigo 76º do Decreto-Lei nº 267/85, de 16 de Julho (LPTA - Lei de Processo nos Tribunais Administrativos).
Inconformado, interpôs o interessado recurso para o Tribunal Pleno da 1ª Secção, não obstante o disposto na alínea d) do artigo 103º da LPTA, que não admite o recurso em casos como o dos autos, logo suscitando no respectivo requerimento a inconstitucionalidade desta norma, orgânica e material.
O magistrado relator não recebeu o recurso, por o considerar legalmente inadmissível, tendo em consideração a norma em causa.
Reclamou, então, o interessado para a conferência a qual, no entanto, por acórdão de 22 de Outubro último, julgou improcedente a matéria da reclamação, não dando como existentes as alegadas inconstitucionalidades.
Pretende, agora, o requerente, recorrer para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº
28/82, de 15 de Novembro, de modo a que seja apreciada a constitucionalidade da norma da alínea d) do artigo 103º da LPTA - questão que afirma ter suscitado
'na interposição do recurso para o Tribunal Pleno e, relevantemente, na reclamação para a Conferência' - por considerar violados as seguintes normas e princípios da Constituição da República (CR):
- artigos 20º, nº 1, e 268º, nº 4, da CR [questão da inconstitucionalidade orgânica do artigo 103º, alinea d), da LPTA, 'por configurar uma intervenção do Governo em matéria que integra competência da Assembleia da República (AR)'];
- artigo 13º da CR (questão relativa à inconstitucionalidade material da mesma norma 'por configurar uma violação do princípio da igualdade');
- artigos 1º a 3º, 9º, alínea b), e 205º a 207º da CR
(questão relativa à inconstitucionalidade material da mesma norma 'por configurar uma violação do duplo grau de jurisdição');
- artigo 20º, nº 1, da CR (questão relativa à inconstitucionalidade material da citada norma 'por configurar uma violação do princípio de acesso ao direito e aos tribunais');
- artigos 211º, 212º, 213º e 214º da CR (questão relativa à inconstitucionalidade material da norma em causa 'por configurar uma violação do duplo grau de jurisdição, na medida em que, este, é imposto pela própria organização hierárquica dos tribunais e traduz a consagração de um princípio geral de processo que consagra uma garantia essencial dos interesses dos litigantes e do interesse superior da justiça').
1.2.- O Tribunal Constitucional tem-se pronunciado, por diversas ocasiões, a respeito da norma que ora se sindica, formulando sempre juízos de não inconstitucionalidade da mesma, nomeadamente nas vertentes postas em crise ou a elas reconduzíveis.
Nessa medida, entende-se que as questões a decidir, por já terem sido objecto de decisões anteriores do Tribunal, permitem e justificam o recurso ao expediente previsto no nº 1 do artigo 78º-A da Lei nº
28/82, pelo que se passa a emitir o parecer contemplado neste preceito.
2.- Assim, a primeira das questões enunciadas, relativa
à hipotética inconstitucionalidade orgânica da norma da alínea d) do artigo 103º da LPTA, na consideração que o Decreto-Lei nº 267/85 foi editado pelo Governo sem autorização legislativa da Assembleia da República, radica no entendimento segundo o qual o instituto da suspensão da eficácia de actos administrativos integra o conteúdo essencial do direito ao recurso contencioso contra actos administrativos ilegais - daí, a invocação dos artigos 20º, nº 1 e 268º, nº 4, da CR. De harmonia com esta perspectiva, a estatuição sobre a inexistência de recurso das decisões jurisdicionais proferidas nesta área da suspensão de eficácia seria da competência da Assembleia da República que a não exerceu, nem sequer autorizou o Governo a legislar [cfr. a alínea b) do nº 1 do artigo 168º da CR].
Por outro lado, respeitando a proibição de recurso jurisdicional à organização e competência dos tribunais, também neste ponto a norma padeceria de idêntico vício [cfr. a alínea q) do nº 1 do mesmo artigo
168º].
A tese professada - que, por exemplo, foi defendida por Luciano Marcos, em anotação publicada na Revista Jurídica, nº
13/14 (1990), págs. 41 e segs. - foi já encarada pelo Tribunal Constitucional que, no entanto, a afastou, em termos que merecem ser novamente acolhidos.
É assim que se ponderou no acórdão nº 447/93, publicado no Diário da República, II Série, de 23 de Abril de 1994:
'[...] uma tal posição conduziria necessariamente à conclusão de que toda a regulamentação adjectiva de procedimentos cautelares cíveis, na medida em que integrassem o conteúdo essencial do direito de acção judicial, só poderia ser feita por lei da Assembleia da República ou por decreto-lei autorizado por esta'[...] conclusão que se acha 'claramente repudiada pela própria Constituição, já que, em matéria processual, a lei fundamental só inclui na reserva relativa da Assembleia da República a legislação sobre o processo criminal [artigo 168º, nº 1, alínea c)], bem como sobre o 'regime geral dos actos ilícitos de mera ordenação social e do respectivo processo [artigo 168º, nº 1, alínea d), da Constituição]. A edição de disposições claramente adjectivas, como as referentes à admissibilidade de recursos jurisdicionais, em processo civil, comum ou laboral, e em processo administrativo, não cabe na reserva relativa de competência da Assembleia da República.'
Como ainda se pondera no citado acórdão, só quando se trate de processo constitucional, criminal ou contra-ordenacional é [sempre] da competência da Assembleia da República, por expressa disposição constitucional, legislar sobre tais processos [reserva de competência absoluta no caso de processo constitucional - artigo 167º, alínea c), da CR; reserva relativa nos outros casos, devendo referir-se que, no último, a competência parlamentar abrange apenas o regime geral deste processo - artigo 168º, nº 1, alíneas c) e d)].
3.- O naipe de alegados vícios de inconstitucionalidade material da norma da alínea d) do artigo 103º da LPTA pode assim parametrizar-se:
a) de acordo com o princípio da igualdade;
b) da conjugação de um direito ao recurso com a organização hierárquica dos Tribunais;
c) da efectividade de um duplo grau de jurisdição.
3.1.- No que toca à violação do princípio da igualdade, resultaria esta da existência, ou não, de um duplo grau de jurisdição, fundamentada mormente em meras 'categorias subjectivas', determinadas pela diferente autoria do acto, sem objectiva e justificada razão de ser. Nesta óptica, a diversidade de regimes - possibilidade de recurso de decisões que conheçam do pedido de suspensão se proferidas por tribunais administrativos de círculo, inviabilidade de recurso para idênticas decisões se proferidas pela 1ª Secção do STA - consubstanciaria uma desigualdade não justificada de tratamento, ainda mais flagrante se atendermos, como salienta Luciano Marcos no trabalho já citado, a que pode ocorrer no âmbito de relações jurídico-administrativas com o mesmo objecto, como é o caso de acto praticado por um director-geral com delegação de poderes ou pelo ministro respectivo.
O Tribunal Constitucional, no entanto, não tem considerado pertinente este tipo de argumentação.
Lê-se em acórdãos como o mencionado nº 447/93, ou o nº 249/94, publicado no Diário da República, II Série, de 27 de Agosto de 1994, na sequência, aliás, de incontestada e reiterada corrente jurisdicional, não ter a proibição de discriminações, contida no artigo 13º da CR de significar uma exigência de igualdade absoluta em todas as situações, nem proibir diferenciações de tratamento.
A partir desta premissa, que se tem por axiomática, o Tribunal encontra justificação para a admissão de um duplo grau de jurisdição quando se está perante uma decisão proferida por juiz singular, permitindo o recurso para uma formação colegial de uma das subsecções da 1ª Secção do STA, diferentemente se dispondo quando a suspensão é directamente requerida no STA, cabendo a decisão a um colégio de três juízes conselheiros, 'oferecendo a decisão as mesmas garantias que a proferida, em via de recurso jurisdicional, por subsecção da 1ª Secção, relativamente aos processos de suspensão interpostos nos tribunais administrativos de círculo'.
Como mais se observa, é relevante que o legislador haja pretendido garantir em qualquer caso a intervenção em última instância da
1ª Secção do STA (formação colegial), embora tal intervenção possa ocorrer em decisão de primeira (e única) instância, ou de decisão de segunda instância (em recurso jurisdicional), não se vislumbrando, nessa opção do legislador, a adopção de uma solução irrazoável ou desproporcionada, arbitrária ou sem fundamento material bastante.
Tão pouco, a esta luz, se argumente ter o legislador pretendido introduzir subjectivos favorecimentos, como parece dar a sugerir o recorrente e, de qualquer modo, já se defendeu (cfr., J.L.Pereira Coutinho, 'Sobre os recursos processados como recurso de agravo nos tribunais administrativos', in Revista de Direito Público, nº 4, págs. 41 e 42). Para o Tribunal Constitucional (citados arestos) tal ideia não explica o regime legal:
'De facto [escreve-se], os actos administrativos praticados pelo Governo e pelos seus membros podem ter a eficácia suspensa por decisão de única instância, sem que haja possibilidade de, na pendência do recurso contencioso, essa decisão ser revogada por uma instância ulterior, diversamente do que sucede em caso paralelo quanto a uma decisão dos tribunais administrativos de círculo.'
Afasta-se, assim, qualquer ideia de favorecimento de umas autoridades administrativas em detrimento de outras, na base da diversidade de soluções existente. E, remetendo-se para a jurisprudência que se vem seguindo, reitera-se o então decidido no caso vertente, por não se ver razão válida para dela nos afastarmos na especificidade deste caso.
3.2.- A questão do duplo grau de jurisdição é invocada igualmente pelo recorrente que, a propósito, traz à colação os artigos 1º a 3º, 9º, alínea b), e
205º a 207º da CR, e, numa outra perspectiva, decorrente da imposição da própria organização hierárquica dos Tribunais (em sua tese), os artigos 211º, 212º,
213º e 214º da lei fundamental.
As considerações anteriormente expendidas quanto ao princípio da igualdade antecipam já, de certo modo, a resposta a dar, sendo certo que, também neste capítulo, a jurisprudência constitucional a suporta, podendo citar-se, entre outros, além dos já mencionados, os acórdãos nºs. 65/88 e 202/90, publicados no Diário da República, II Série, de 20 de Agosto de 1988 e
21 de Janeiro de 1991, respectivamente.
Com efeito, o discurso argumentativo que, para afirmar uma exigência constitucional de duplo grau de jurisdição, convoca as normas constitucionais acima referenciadas assentes numa filosofia do Estado de direito pressupondo uma linha hierárquica na ordem dos tribunais judiciais - válida na ordem dos tribunais administrativos - a implicar essa garantia a cobrir todas as situações, esse discurso, foi afastado pelo Tribunal Constitucional em lugares como os citados acórdãos.
A circunstância de constitucionalmente se impor - observou-se no acórdão nº 65/88 e reafirmou-se no acórdão nº 202/90 - a estruturação, em três níveis, de certa ordem de tribunais (princípio afirmado, em primeira linha para os tribunais judiciais e porventura aplicável, por analogia, à ordem dos tribunais administrativos) não envolve logicamente que, em qualquer hipótese, sempre haja de haver recurso até ao tribunal colocado no topo da linha hierárquica desta ou daquela ordem de tribunais. Antes tal escalonamento das sucessivas instâncias, dentro da mesma ordem judiciária, exigirá apenas que, em alguns casos - naturalmente os de maior relevo (por aplicação do princípio da proporcionalidade, que domina o regime constitucional dos direitos, liberdades e garantias) - seja possível a impugnação de uma primeira decisão judicial junto de um tribunal superior e, eventualmente ainda, a impugnação da decisão deste último junto de outro tribunal necessariamente colocado um grau acima na escala hierárquica.
A existência, no plano organizatório, de sucessivas e escalonadas instâncias, dentro da mesma ordem judiciária, constituindo exigência constitucional, não implica, necessariamente, a pretendida proibição para o legislador ordinário de anular as competências das instâncias superiores sobre as inferiores. Não só o direito a tutela jurisdicional não é imperativamente referenciado a sucessivos graus de jurisdição - o que se abordará mais espaçadamente no ponto seguinte - como a própria norma do corpo do artigo 103º da LPTA acautela a possibilidade de recurso para o Pleno quando seja invocada a oposição de julgados, sem dúvida pela necessidade sentida de se evitarem situações como essas, em que a desejável uniformização jurisprudencial pode ser comprometida mediante a eventual existência de soluções opostas, a nível de direito aplicado, em dois acórdãos diferentes.
3.3.- Considera o recorrente, ainda, que a norma da alínea d) do artigo 103º da LPTA viola o princípio do acesso ao direito e aos tribunais acolhido no nº 1 do artigo 20º da CR - o que se articula apertadamente com essoutra problemática do duplo grau de jurisdição, em seu entender credenciada constitucionalmente.
Sob certo ângulo, ou dimensão, viu-se já, no ponto antecedente, não lhe assistir razão. Agora, no entanto, coloca-se mais frontalmente o princípio da efectividade do direito ao recurso - sem esquecer que, paralelamente, o acesso à justiça administrativa é acolhido pelo nº 4 do artigo 268º da CR, que garante aos interessados recurso contencioso com fundamento em ilegalidade, contra quaisquer actos administrativos, independentemente da sua forma, que lesem os seus direitos ou interesses legalmente protegidos.
Não obstante, regista-se neste domínio uma jurisprudência constitucional firme e impressiva - entroncando já na orientação assumida pela Comissão Constitucional - reflectida pelos acórdãos que têm vindo a ser citados, em termos que se aceitam e para os quais se remete, no sentido de que aquele artigo 20º, nº 1, da CR - e o artigo 268º, nº 4, do mesmo texto - não garante, por si só e em todos os casos, o duplo grau de jurisdição.
O nº 1 do artigo 20º, antes de mais, acolhe, para seguir outro aresto deste Tribunal, um direito que se caracteriza como o direito 'a ver solucionados os conflitos, segundo o direito estabelecido, por um
órgão que oferece garantias de imparcialidade e independência e perante o qual as partes se encontrem em condições de plena igualdade no que diz respeito à defesa dos respectivos pontos de vista (designadamente sem que a insuficiência de meios económicos possa prejudicar tal possibilidade)' - cfr. acórdão nº
211/93, publicado no Diário da República, II Série, de 28 de Maio de 1993.
A garantia judiciária mínima consiste em assegurar o acesso aos tribunais para dele se obter uma decisão, não obstante a eventual insuficiência de meios económicos, limitando-se o nº 1 do artigo 20º da CR a, imperativamente, garantir um 'patamar de jurisdição' (acórdão nº 65/88), concedendo-se ao legislador ordinário, de um modo geral, liberdade de conformação para intervir na matéria. Não é assim no domínio do processo criminal, nomeadamente no que às decisões condenatórias toca, mas, aqui, já o arrimo constitucional é outro, com destaque para o nº 1 do artigo 32º da Lei Fundamental (cfr., inter alia, a este propósito, não só o citado acórdão nº
447/93, como também os acórdãos nºs. 673/95 e 501/96, publicados no Diário da República, II Série, de 20 de Março e 3 de Julho de 1996, respectivamente).
O recurso aos tribunais, ainda que em uma única instância, responde, em princípio, minimamente que seja - e, particularmente, fora do processo criminal - às exigências de justiça implicadas na ideia de Estado de Direito, como se observou no acórdão nº 163/90, publicado no jornal oficial citado, II Série, de 18 de Outubro de 1991, podendo o legislador
'racionalizar este instituto processual' desde que não proceda à sua abolição ou o afecte substancialmente, entendendo-se como 'substancial' uma redução intolerável ou arbitrária, incompatível com o princípio do Estado de Direito democrático (artigo 2º da Constituição), como, por sua vez, se lê no citado acórdão nº 501/96.
Não é este o caso vertente.
4.- Assim sendo, tendo as questões a decidir constituído já objecto de decisões anteriores do Tribunal, lavra-se parecer, nos termos do nº 1 do artigo 78º-A da Lei nº 28/82 no sentido de não conhecimento do objecto do recurso.
Ouçam-se as partes nos termos do citado preceito.