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Processo nº 245/97
1ª Secção Rel. Cons. Monteiro Diniz
Acordam no Tribunal Constitucional:
1 - No Tribunal de Trabalho de Lisboa, A., com o patrocínio do Ministério Público, intentou acção emergente de contrato de trabalho, sob forma sumária, contra B., peticionando a condenação da Ré na quantia de 369.360$00, a título de retribuição mínima devida, comissões não pagas, férias, subsídios de férias e subsídio de Natal, a que acrescem juros de mora à taxa legal, até ao integral pagamento da quantia em dívida.
A Ré contestou o pedido e a Autora respondeu à contestação, vindo depois a proceder-se à audiência de julgamento (fls. 44 a 49) na qual foi proferida sentença julgando-se a acção em parte provada e procedente e condenando-se a Ré no pagamento à Autora da quantia global de 214.260$00, com acréscimo de juros à taxa legal até integral cumprimento.
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2 - Inconformada com o assim decidido veio a Ré interpor recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, atravessando logo a seguir um novo requerimento - depois de a Autora vir aos autos sustentar a inadmissibilidade do recurso por força de o valor da causa ser inferior à alçada da Relação - no sentido daquele recurso ser entendido como interposto para o Tribunal Constitucional.
O senhor Juiz, (a fls. 59) não admitiu tal recurso com base na ausência dos respectivos pressupostos de admissibilidade.
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3 - A Ré apresentou então o requerimento de fls. 60 segundo o qual 'vem reclamar da não admissão de recurso', ajuntando que 'com efeito no presente caso, sem haver decisão não era possível arguir a inconstitucionalidade; assim o art. 70º do Dec. Lei 28/82, só tem aplicação quando haja alegações'.
Manifestando embora dúvidas no sentido de o requerimento em que foi vertida a reclamação não preencher os requisitos previstos no artigo 76º, nº
4, da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, o senhor Juiz (a fls. 63 v.) determinou a subida dos autos a este Tribunal.
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4 - O processo foi com vista ao senhor Procurador-Geral Adjunto que considerou configurar-se a presente reclamação como manifestamente infundada.
Seguiram-se os demais vistos de lei, cabendo agora apreciar e decidir.
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5 - Em conformidade com o disposto nos artigos 280º, nº 1, alínea b) da Constituição e 70º, nº 1, alínea b) da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, na redacção dada pela Lei nº 85/89, de 7 de Setembro, cabe recurso para o Tribunal Constitucional das decisões dos tribunais que apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo.
Vem este Tribunal entendendo, em jurisprudência uniforme e reiterada, que o pressuposto de admissibilidade deste tipo de recurso - do qual a reclamante se serviu - no atinente ao exacto significado da locução 'durante o processo' utilizado naqueles normativos, deve ser tomado não num sentido puramente formal (tal que a inconstitucionalidade pudesse ser suscitada até à extinção da instância), mas num sentido funcional, tal que essa invocação haverá de ter sido feita em momento em que o tribunal a quo ainda pudesse conhecer da questão. Ou seja: a inconstitucionalidade haverá de suscitar-se antes de esgotado o poder jurisdicional do juiz sobre a matéria a que (a mesma questão de inconstitucionalidade) respeita. Um tal entendimento decorre do facto de se estar justamente perante um recurso para o Tribunal Constitucional, o que pressupõe, obviamente, uma anterior decisão do tribunal a quo sobre a questão
(de constitucionalidade) que é objecto do mesmo recurso.
Deste modo, porque o poder jurisdicional se esgota, em princípio, com a prolação da sentença e porque a eventual aplicação de uma norma inconstitucional 'não constitui erro material, não é causa de nulidade da decisão judicial, nem torna esta obscura ou ambígua', há-de ainda entender-se que o pedido de aclaração de uma decisão judicial ou a reclamação da sua nulidade não são já, em princípio, meios idóneos e atempados para suscitar a questão de inconstitucionalidade.
Todavia, a orientação geral assim definida, não será de aplicar em determinadas situações de todo excepcionais, em que os interessados não disponham de oportunidade processual para suscitar a questão de constitucionalidade antes do proferimento da decisão, caso em que lhes deverá ser salvaguardado o direito ao recurso de constitucionalidade.
Na verdade, este Tribunal tem vindo a entender, num plano conformador da sua jurisprudência genérica, que naqueles casos anómalos em que o recorrente não disponha de oportunidade processual para suscitar a questão de constitucionalidade durante o processo, isto é, antes de esgotado o poder jurisdicional do tribunal a quo sobre a matéria a decidir, ainda assim existirá o direito ao recurso de constitucionalidade (cfr. por todos os acórdãos nºs
62/85, 136/85 e 94/88 no Diário da República, II Série, respectivamente, 31 de Maio de 1985, 28 de Janeiro de 1986 e 22 de Agosto de 1988, e 479/89, no Boletim do Ministério da Justiça, nº 389, pp. 222 e ss.).
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6 - Por outro lado, importa acentuar que o legislador constituinte elegeu como conceito identificador do objecto típico da actividade do Tribunal Constitucional em matéria de fiscalização da constitucionalidade
(cfr. os artigos 278º, 280º e 281º da Constituição) o conceito de norma jurídica pelo que apenas estas (e não já as decisões judiciais em si mesmas consideradas), podem nesta sede, na qual se incluem os processos de fiscalização concreta de constitucionalidade, ser objecto de sindicância.
Como vem sendo reiteradamente definido pela jurisprudência deste Tribunal, os recursos de constitucionalidade, sendo embora interpostos de decisões dos outros tribunais (decisões de provimento ou de rejeição) não visam impugnar a inconstitucionalidade de tais decisões, mas antes o juízo que nelas se contenha sobre a inconstitucionalidade ou não inconstitucionalidade de normas com interesse para o julgamento da causa (cfr. por todos, os acórdãos nºs
128/84 e 274/88, Diário da República, II série, de, respectivamente, 12 de Março de 1985 e 18 de Fevereiro de 1989).
E assim sendo, incumbe aos recorrentes, durante o processo, o
ónus de suscitar a questão de inconstitucionalidade das normas convocadas para a decisão da causa e por ela aplicadas, havendo de fazê-lo de modo directo, explícito e perceptível através da indicação das disposições legais sobre que se faz recair a suspeita do vício de inconstitucionalidade, em ordem a que os tribunais judiciais aquando do respectivo julgamento sejam confrontadas com a matéria da inconstitucionalidade e sobre ela possam proferir decisão de provimento ou de rejeição.
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7 - Ora, à luz dos princípios assim sumariamente expostos, há-de dizer-se que a reclamante não suscitou a inconstitucionalidade de qualquer norma aplicada como fundamento da decisão de que pretende recorrer, em termos de, com base nessa suscitação se poder interpor um recurso de constitucionalidade.
Com efeito, durante o processo, nomeadamente na contestação e no decurso da audiência de julgamento não foi suscitada de modo adequado e operativo a questão de inconstitucionalidade de qualquer norma jurídica aplicada ou aplicável como fundamento da decisão impugnada, limitando-se a reclamante no requerimento de interposição de recurso para o Tribunal da Relação a aduzir que
'todo o C.P.T. é inconstitucional pois viola o princípio constitucional da igualdade perante a Lei, e ofende o art. 13º da Constituição da República, designadamente o art. 26º, assim interpretado'.
É assim manifesto que nem o tempo, nem o modo, nem a substância de uma invocação de inconstitucionalidade formulada e deduzida em tais termos preeenchem os requisitos de que depende a abertura da via de impugnação constitucional.
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8 - Nestes termos, indefere-se a reclamação.
Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 5
(cinco) Ucs.
Lisboa, 1 de Outubro de 1997 Antero Alves Monteiro Diniz Alberto Tavares da Costa Armindo Ribeiro Mendes Maria da Assunção Esteves Vítor Nunes de Almeida José Manuel Cardoso da Costa