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Processo n.º 81‑A/01
2.ª Secção
Relator: Conselheiro Mário Torres
Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional,
1. O recorrente A., notificado do despacho da Relatora,
Conselheira Maria Fernanda Palma, de 13 de Abril de 2005, que determinou a sua
notificação para se pronunciar sobre questões prévias suscitadas nesse despacho
e para produzir alegações (fls. 1566 e 1567 do processo principal), veio, “ao
abrigo das disposições conjugadas dos artigos 29.°, n.º 1, da Lei n.º 28/82, de
15 de Novembro, 127.°, n.ºs 1 alínea c), e 2, e 128.°, n.° 1, do Código de
Processo Civil e 43.°, n.° 1, do Código de Processo Penal, requerer (...) a
recusa da intervenção no presente processo daquela Juíza”, com os seguintes
fundamentos:
“1. Em 27 de Abril de 2001, no Processo de Reclamação n.° 561/00,
que corria termos pela 2.ª Secção desse Tribunal Constitucional, o recorrente
apresentou o requerimento (...) que faz as folhas 62 a 66 do referido Processo
n.° 561/00, no qual pedia a aclaração do Acórdão n.° 144/2001, de 28 de Março de
2001 (...), que fora proferido e assinado pela Senhora Conselheira Maria
Fernanda Palma (relatora) e outros.
2. No posterior Acórdão n.° 273/2001, de 26 de Junho de 2001 (...),
subscrito pela Senhora Conselheira Maria Fernanda Palma (relatora) e outros, que
conheceu daquele requerimento, foi decidido a final:
«8. Considerando o teor do requerimento de fls. 62 a 66, determina‑se que se
extraia cópia do mesmo e se remeta ao Conselho Superior da Magistratura.»
3. O Conselho Superior da Magistratura, com base nessa participação, instaurou
ao recorrente, em 2 de Outubro de 2001, o Processo Disciplinar n.° 138/01 (...),
no âmbito do qual deliberou, por Acórdão do Plenário de 17 de Fevereiro de 2004
(...), aplicar-lhe a pena de 45 dias de multa.
4. Dos pontos 6.°, 7.° e 8.° do referido Acórdão do Plenário, de 17 de Fevereiro
de 2004, resulta que a referida punição teve por base as expressões constantes
daquele ponto 6.°, transcritas do referido requerimento do recorrente, de fls.
62 a 66 do Processo n.° 561/00, que foram consideradas ofensivas da honra e da
consideração devida aos Juízes do Tribunal Constitucional, ou seja, desde logo e
directamente, aos juízes do Tribunal Constitucional que proferiram e assinaram o
Acórdão n.° 144/2001 – Conselheira Maria Fernanda Palma e outros.
5. Em 19 de Novembro de 2001, no mesmo Processo de Reclamação n.º 561/00, da 2.ª
Secção desse Tribunal Constitucional, o recorrente apresentou o requerimento
(...) que faz as folhas 90 e 91 do referido Processo n.º 561/00, no qual pedia a
junção aos autos da cópia do seu requerimento à Segurança Social de pedido de
apoio judiciário e criticava a decisão ilegal da relatora Senhora Conselheira
Maria Fernanda Palma (...), que fora proferida e assinada pela própria.
6. No posterior despacho de 4 de Dezembro de 2001 (...), subscrito pela Senhora
Conselheira Maria Fernanda Palma (relatora), que conheceu daquele requerimento,
foi decidido no ponto 2.:
«2. Extraia‑se cópia do requerimento de fls. 90 e 91 e envie‑se ao Conselho
Superior da Magistratura, sublinhando‑se a utilização de termos e expressões
inadmissíveis em que o requerente é reincidente.»
7. O Conselho Superior da Magistratura, com base nessa participação, instaurou
ao recorrente o Processo Disciplinar n.º 110/02, no âmbito do qual deliberou,
por Acórdão do Plenário, de 11 de Março de 2003 (...), aplicar‑lhe a pena de 60
dias de suspensão.
8. Do referido Acórdão do Plenário, de 11 de Março de 2003, resulta que a
referida punição teve por base as expressões constantes dos pontos 3.° e 4.° de
fls. 2, transcritas do referido requerimento do recorrente, de fls. 90 e 91 do
Processo n.º 561/00, que foram consideradas ofensivas da honra e da
consideração devida à Senhora Juíza do Tribunal Constitucional Maria Fernanda
Palma.
9. Dos teores daqueles requerimentos, contendo as referidas expressões, das
participações disciplinares ao Conselho Superior da Magistratura determinadas
no Acórdão n.º 273/01 e no despacho de 4 de Dezembro de 2001, acima transcritas
nos pontos 2. e 6. do presente requerimento, da existência dos processos
disciplinares em causa e da mencionada aplicação das penas disciplinares ao
recorrente, tem conhecimento a Senhora Conselheira Maria Fernanda Palma.
10. Seja como for, o certo é que, nos referidos Processos Disciplinares n.ºs
138/2001 e 110/2002, pendentes no Conselho Superior da Magistratura, a Senhora
Conselheira Maria Fernanda Palma figura como ofendida e o recorrente como
arguido.
11. Ora, esta situação integra perfeitamente a previsão das disposições
conjugadas da alínea c) do n.º 1 e do n.º 2 do artigo 127.° do Código de
Processo Civil, que prevê os casos em que as partes podem opor suspeição ao
juiz.
12. E como é consabido «... as causas criminais...», referidas no n.º 2 do
referido artigo 127.° do Código de Processo Civil, abrangem todas as causas
reguladas pelo chamado Direito Sancionatório, ou seja, todas as causas em que
estejam em causa não só crimes mas também contra‑ordenações, transgressões e
infracções disciplinares, como no presente caso.
13. No processo penal, o legislador em vez de definir através de uma enumeração
casuística os fundamentos da recusa, como faz no mencionado artigo 127.° do
Código de Processo Civil para o processo civil, preferiu utilizar a técnica da
cláusula geral, dispondo no artigo 43.°, n.° 1, do Código de Processo Penal,
que «A intervenção de um juiz no processo pode ser recusada quando correr o
risco de ser considerada suspeita, por existir motivo, sério e grave, adequado a
gerar desconfiança sobre a sua imparcialidade».
14. No presente caso, o recorrente, subjectivamente, teme seriamente que a
intervenção da Senhora Conselheira Maria Fernanda Palma seja parcial.
15. Sendo certo constituir já um mau prenúncio o facto de a Senhora Conselheira
Maria Fernanda Palma, conhecedora dos factos descritos, não ter motu proprio
pedido escusa no presente processo.
16. Objectivamente, os factos descritos constituem motivo sério e grave,
adequado a gerar desconfiança sobre a imparcialidade da recusada, correndo a
sua intervenção no processo o risco de ser considerada suspeita.
17. Assim, deverá ser deferido o pedido de recusa no presente caso, em tudo
semelhante ao decidido no douto Acórdão proferido, em 6 de Maio de 2004, no
Processo n.º 1413/04 (Incidente de recusa) da 5.ª Secção do Supremo Tribunal de
Justiça (...).
18. Por todo o exposto, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 29.º,
n.º 1, da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, 127.º, n.ºs 1, alínea c), e 2, e
128.º, n.º 1, do Código de Processo Civil e 43.º, n.º 1, do Código de Processo
Penal, requer‑se que o presente requerimento de recusa seja julgado procedente
e que, em consequência, a Senhora Conselheira Maria Fernanda Palma seja impedida
de intervir no presente processo.”
2. Dos elementos juntos aos autos resulta que:
1) Por acórdão proferido pelo Plenário do Conselho
Superior da Magistratura, em 17 de Fevereiro de 2004, no processo disciplinar
n.º 138/2001, foi confirmado o acórdão do Conselho Permanente do mesmo órgão, de
19 de Novembro de 2002, que aplicou ao ora recorrente a pena de 45 dias de
multa, por prática de infracção disciplinar, prevista e punida pelos artigos
82.º e 85.º do Estatuto dos Magistrados Judiciais, consistente na utilização, em
requerimento de aclaração do Acórdão n.º 144/2001, proc. n.º 561/2000, do
Tribunal Constitucional – subscrito pelos Ex.mos Conselheiros Maria Fernanda
Palma (Relatora), Bravo Serra e Luís Nunes de Almeida – de expressões
“objectivamente ofensivas da honra e consideração devida aos Juízes do Tribunal
Constitucional, o que o Sr. Juiz Bravo Belo bem sabiam e ultrapassaram tudo o
que se tornava necessário para a sua defesa da causa e de crítica objectiva”;
2) O referido processo disciplinar n.º 138/2001 foi
originado pela comunicação ao Conselho Superior da Magistratura do teor do
requerimento do recorrente de fls. 62 a 66 do referido proc. n.º 561/2000 (em
que era solicitada a aclaração do Acórdão n.º 144/2001), determinada na parte
final do Acórdão n.º 273/2001 do Tribunal Constitucional – subscrito pelos
Ex.mos Conselheiros Maria Fernanda Palma (Relatora), Bravo Serra e José Manuel
Cardoso da Costa –, que desatendeu aquele pedido de aclaração;
3) Por acórdão proferido pelo Plenário do Conselho
Superior da Magistratura, em 11 de Março de 2003, no processo disciplinar n.º
110/2002, foi confirmado o acórdão do Conselho Permanente do mesmo órgão, de 19
de Novembro de 2002, que aplicou ao ora recorrente a pena disciplinar de 60
dias de suspensão, por prática de infracção disciplinar, prevista e punida
pelos artigos 82.º e 85.º do Estatuto dos Magistrados Judiciais, consistente na
utilização, em requerimento (de fls. 90 e 91) de junção de documento destinado
ao referido proc. n.º 561/2000, reportando‑se a anterior despacho da Relatora,
Conselheira Maria Fernanda Palma, de expressões ofensivas da honra e
consideração devida a esta Juíza do Tribunal Constitucional, expressões que “em
termos de direito penal, fariam o Sr. A. incorrer num crime de injúrias, por
estarem verificados todos os elementos constitutivos deste ilícito penal”;
4) O referido processo disciplinar n.º 110/2002 foi
originado pela comunicação ao Conselho Superior da Magistratura do teor do dito
requerimento do recorrente de fls. 90 e 91 do proc. n.º 561/2000, determinada no
despacho de 4 de Dezembro de 2001 da Conselheira Relatora, do seguinte teor: “2.
Extraia‑se cópia do requerimento de fls. 90 e 91 e envie‑se ao Conselho Superior
da Magistratura, sublinhando‑se a utilização de termos e expressões
inadmissíveis em que o requerente é reincidente”;
5) Das deliberações do Plenário do Conselho Superior da
Magistratura referidas em 1) e 3) foram interpostos recursos para o Supremo
Tribunal de Justiça, respectivamente, em 21 de Abril de 2004 e em 6 de Maio de
2003, recursos que ainda se encontram pendentes.
3. Como se assinalou no Acórdão n.º 279/2003 deste
Tribunal:
“10. Ao contrário da situação de impedimento, em que o juiz se deve
declarar impedido, este não se pode declarar suspeito. As partes podem,
contudo, opor a suspeição do juiz nos casos enunciados no artigo 127.º do
Código de Processo Civil e este pode, nesses casos, mas sem que a lei a isso o
obrigue, pedir escusa de intervir na causa.
Se, contudo, ocorrer alguma das situações previstas no termos do
artigo 127.º do Código de Processo Civil e a parte que tenha legitimidade para o
efeito opuser a suspeição, não há que avaliar se tal situação é ou não apta a
fazer perigar a imparcialidade do juiz; a oposição de suspeição ou o pedido de
escusa devem, salvo os casos previstos no n.º 3 do citado artigo 127.º, ser
deferidos, evitando‑se, assim, que o juiz seja colocado numa situação em que se
possa duvidar da sua imparcialidade, mas não se formulando, de modo algum,
qualquer juízo de censura ou suspeita em concreto.”
No caso destes autos, como se referiu, está apurado que,
nos três anos antecedentes à presente oposição de suspeição, existiram causas,
de natureza sancionatória, entre o recorrente e a Juíza Conselheira questionada,
em que esta figurou como ofendida e participante.
Verifica‑se, assim, o fundamento de suspeição previsto
na alínea c) do n.º 1 e no n.º 2 do artigo 127.º do Código de Processo Civil,
sem que se mostre preenchida a previsão do n.º 3 do mesmo artigo, pelo que não
pode o Tribunal deixar de julgar procedente o incidente de suspeição.
4. Em face do exposto, acordam em deferir o presente
incidente de suspeição.
Lisboa, 14 de Dezembro de 2005.
Mário José de Araújo Torres
Benjamim Silva Rodrigues
Paulo Mota Pinto
Rui Manuel Moura Ramos