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Processo n.º 733/05
2.ª Secção
Relator: Conselheiro Paulo Mota Pinto
Acordam, em conferência, na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
I. Relatório
1.Em 11 de Outubro de 1995 A., S.A., requereu, no Tribunal Judicial de Vila Nova
de Gaia, a consignação em depósito das acções da B., S.A., de que eram titulares
C. e D., residentes em Lisboa, e E. e F., residentes em Vila Nova de Gaia. Na
sua contestação, os dois primeiros vieram arguir a incompetência do tribunal em
razão do território, alegando tentativa de desaforamento ilícito, por os
restantes demandados terem adquirido as suas únicas 20 acções da B. às 18 horas
da véspera da propositura da acção e depois do termo do prazo de validade da
oferta de aquisição anunciada em 10 de Maio de 1995 e suspensa por efeito de
providência cautelar deferida pelo 3.º Juízo Cível do Porto.
Por sentença de 14 de Abril de 2004, o 2.º Juízo Cível do Tribunal Judicial de
Vila Nova de Gaia decidiu julgar E. e F. partes ilegítimas na acção,
absolvendo-as da instância, e julgar-se, em consequência, incompetente em razão
do território, ordenando a remessa dos autos aos Juízos Cíveis de Lisboa,
condenando ainda a requerente como litigante de má fé.
De tal decisão foi interposto recurso pela requerente, vindo o Tribunal da
Relação do Porto a deliberar, em 10 de Novembro de 2004, não se ter verificado
“tentativa ilícita de desaforamento” designadamente porque, como se escreveu:
“os requeridos não podem ser considerados simulados, visto que a sua
legitimidade deriva de facto aquisitivo que o próprio Tribunal deu como
verdadeiro.”
Os primeiros dois demandados apresentaram então requerimento em que interpunham
recurso, arguíam a nulidade do acórdão, pediam a sua reforma, reiteravam a
questão da falsidade e ainda pediam fosse efectuada “rectificação de erro de
escrita constante das alegações dos agravados” a respeito do valor do recurso.
O Desembargador-relator, notando que as únicas pretensões “seguem procedimentos
diferentes, e não compatíveis entre si” notificou os agravados para “optarem por
uma das pretensões”, o que estes acabaram por fazer dando preferência ao
recurso, que lhes foi indeferido.
2.Interpuseram os agravados reclamação para o Supremo Tribunal de Justiça ao
abrigo do disposto no artigo 688.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, por
entenderem, designadamente, que
“O acórdão de 16.11.2004 é, pois, recorrível ao abrigo do disposto no art.º
678.º, n.º 2, do CPC, por ofender caso julgado.”
e que, face à “impugnação dos documentos juntos aos autos, a instâncias das ora
Reclamantes, destinados a fazer prova de que os Requeridos E. e F. eram
accionistas da B.”, bem como à não realização das diligências probatórias
requeridas pelos agravados ou ordenadas pelo Tribunal,
“A Relação, antes de revogar a decisão, tinha de conhecer da falsidade arguida,
que a 1.ª instância julgara dispensável (…) E tinha de decidir sobre a requerida
apreensão dos documentos relativos a falsificação de registo de acções
escriturais (…) E tinha de conhecer da ilicitude do uso que esta pretende fazer
das referidas falsificações nos autos respectivos.”
Acrescentando, antes de suscitar a inconstitucionalidade do entendimento dado
aos artigos 678.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil:
“Não o tendo feito, o sindicado acórdão da Relação violou a lei, sendo, por
isso, recorrível, atento o valor da causa.”
A agravante veio responder invocando o disposto no n.º 4 do artigo 111.º do
Código de Processo Civil, que limita ao Tribunal da Relação os recursos sobre a
matéria de incompetência relativa.
Por despacho de 17 de Maio de 2005, do Sr. Vice-Presidente do Supremo Tribunal
de Justiça, foi indeferida a reclamação, por se considerar indissociável a
decisão sobre a ilegitimidade da que incidiu sobre a incompetência territorial
do tribunal de 1.ª instância, sendo que se entendeu que o recurso da então
reclamada abrangia ambas e que de nenhuma inconstitucionalidade padeciam as
normas impugnadas.
Atravessaram então os agravantes arguição de nulidade de tal despacho com
fundamento em omissão de pronúncia, mas tal incidente foi-lhes indeferido por
despacho de 17 de Junho de 2005.
3.Em 4 de Julho de 2005 o primeiro reclamante apresentou recurso desses dois
despachos para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto na alínea b) do
n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional, para obter apreciação da
conformidade constitucional das normas dos artigos 678.º, n.ºs 1 e 2, do Código
de Processo Civil. Por despacho de 5 de Julho, o Sr. Vice-Presidente do Supremo
Tribunal de Justiça decidiu não conhecer do requerimento de interposição do
recurso para o Tribunal Constitucional por entender, designadamente, que
“a admissibilidade do recurso agora interposto para o Tribunal Constitucional
tenha de ser apreciada no tribunal a quo e terá de sê-lo da decisão que aí o não
admitiu, pois esta, repetimos, só se consolidou após o despacho que indeferiu a
reclamação”.
4.Inconformado, o mesmo reclamante apresentou, em 20 de Setembro de 2005,
requerimento em que invocou, nomeadamente, que
“Nos termos do disposto no art.º 70.º, n.º 3, da LTC, a decisão dos presidentes
dos tribunais superiores competentes para apreciar das reclamações deduzidas ao
abrigo do art.º 688.º do CPC, de não admissão dos recursos interpostos para os
mesmos tribunais superiores, é passível de recurso para o Tribunal
Constitucional.”
O Vice-Presidente do Supremo Tribunal de Justiça admitiu a reclamação em 22 de
Setembro de 2005.
No Tribunal Constitucional, o Ministério Público pronunciou-se nos seguintes
termos:
“Se se considerar – na esteira do decidido por acs. 486/05 e 505/05 – que a
decisão de fls. 99/100 se configura como uma rejeição do recurso interposto para
este Tribunal, afigura-se que a reclamação será de considerar como
manifestamente infundada, já que o reclamante não identifica nem especifica
adequadamente qualquer questão de inconstitucionalidade normativa, idónea para
servir de base ao recurso interposto, limitando-se a dissentir do sentido das
decisões proferidas no caso concreto, e sendo ainda evidente e incontroverso que
nenhuma norma ou princípio constitucional impõe o acesso irrestrito ao Supremo
para facultar a controvérsia sobre matérias de natureza procedimental ou
adjectiva, o que sempre tornaria o recurso «manifestamente infundado».”
Cumpre agora apreciar e decidir.
II. Fundamentos
5.Antes de mais importa fixar o âmbito da presente reclamação, que não é
inteiramente claro – como não o foi para o Vice-Presidente do Supremo Tribunal
de Justiça que determinou a remessa dos autos a este Tribunal. É certo que visa
um único despacho, do Vice-Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, que
recusou admitir o recurso de constitucionalidade interposto dos seus anteriores
despachos. O que, importa referi-lo, fez nos seguintes termos:
“temos entendido que a competência do presidente do tribunal superior nos termos
do art.º 688.º do CPC, como decorre deste normativo e dos princípios gerais do
processo civil, limita-se as questões da admissibilidade e do momento de subida
dos recursos.
Exercendo tal competência, por alguns tida por inconstitucional porque,
rigorosamente, não se trata de actividade jurisdicional, não está o presidente
obrigado à rígida observância de critérios legais, devendo antes, numa atitude
prudente, avaliar, em cada caso, se as questões da admissibilidade ou do momento
da subida dos recursos, deve ser apresentada e decidida pelo tribunal superior.
Na verdade, as decisões do presidente, quando favoráveis ao reclamante não são
definitivas cabendo, sempre, a última palavra à conferência no tribunal superior
(art.º 689.°, n.º 2, do CPC).
Não podem, pois, suscitar-se e pretender que se decidam outras questões no
âmbito deste incidente, para além da referida admissibilidade e do momento da
subida.
Por isso, e uma vez que neste apenso se proferiram já despachos de indeferimento
da reclamação e do requerimento para reforma da anterior decisão, nenhuma outra
questão poderá aqui suscitar-se, nomeadamente, e sem embargo da norma do art.º
70.°, n.º 1, b), da Lei n.º 28/82, a da admissibilidade do recurso para o
Tribunal Constitucional.
Por um lado, a resposta positiva à questão da admissibilidade ou da subida
imediata só se torna definitiva após decisão da conferência, no tribunal
superior que, implícita ou explicitamente, a confirmar.
Por outro, a resposta negativa tem, por sua vez, o efeito de consolidar a
decisão do tribunal a quo que não admitiu, ou reteve, o recurso.”
É igualmente certo que a presente reclamação tem como fundamento a violação da
norma do artigo 70.º, n.º 3, da Lei do Tribunal Constitucional e o facto de os
fundamentos do dito despacho invocarem “normas jurídicas (…) inovadoras e
inconstitucionais”, dizendo-se na reclamação:
“É o caso da norma segundo a qual não está o presidente obrigado à rígida
observância de critérios legais, devendo, antes, numa atitude prudente, avaliar,
em cada caso, se as questões de admissibilidade ou do momento da subida dos
recursos, deve ser apresentada e decidida pelo tribunal superior.
Tal norma, extraída do art.º 689.°, n.º 1, do CPC, viola os princípios da
confiança e da segurança jurídica implícitos no princípio do Estado de Direito
consagrado no art.º 2.º da Constituição. Com feito, segundo ela, os presidentes
dos tribunais superiores podem julgar, em matéria de admissão de recursos
previstos na lei, não segundo normas jurídicas de conteúdo bem determinado, mas
segundo o seu prudente arbítrio – o que deixa o cidadão na eterna incerteza
sobre se o acesso ao direito por via do direito ao recurso consignado na lei à
data da instauração da acção, será ou não assegurado pelos tribunais até ao
termo do processo.
Tal norma viola, pois, também, as normas dos art.ºs 20.°, n.ºs 1 e 4, 202.°, n.º
2, e 203.° da Constituição. Segundo ela, em matéria de recursos os cidadãos não
poderiam contar com a sujeição dos presidentes dos tribunais apenas à norma
jurídica de conteúdo bem determinado, mas sim a critérios pessoais de
conveniência dos respectivos titulares.”
Não se trata, porém, de um recurso de constitucionalidade “autónomo” dirigido a
esta decisão jurisdicional (e nessa medida passível de um tal recurso de
constitucionalidade); isto, embora numa passagem pareça ser exactamente isso que
pretende: “[n]os termos do disposto no art.º 70.º, n.º 3, da LTC, a decisão dos
presidentes dos tribunais superiores competentes para apreciar das reclamações
deduzidas ao abrigo do art.º 688.º do CPC, de não admissão dos recursos
interpostos para os mesmos tribunais superiores, é passível de recurso para o
Tribunal Constitucional.” Trata-se, antes, de uma reclamação quanto à não
admissão ou retenção do anterior recurso, em decisão dita de “não conhecimento”,
mas, até nos termos de anterior jurisprudência deste Tribunal (acórdãos n.ºs
486/05 e 505/05, ambos disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt),
correspondente a um indeferimento do requerimento de recurso para efeito do
disposto no n.º 4 do artigo 76.º e artigo 77.º da Lei do Tribunal
Constitucional.
Surge, pois, na sequência de um anterior recurso de constitucionalidade e
derivada deste: é o que se conclui não só de o reclamante não invocar qualquer
alínea do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional que pudesse
fundar o recurso e, antes, pedir “a revogação do Despacho ora reclamado” (o que
não se compagina com o objectivo de um recurso, mas sim de uma reclamação), mas,
sobretudo, por se ter conformado com o entendimento do Vice-Presidente do
Supremo Tribunal de Justiça que admitiu a remessa dos autos ao Tribunal
Constitucional como reclamação (e não ter reagido ao pedido de rejeição liminar
da reclamação, formulado pela reclamada).
6.Bem entendida a decisão que é objecto da presente reclamação e o seu
fundamento, diga-se algo sobre o seu objectivo. Tal reclamação visa,
tão-somente, que o recurso de constitucionalidade anteriormente apresentado
perante o Supremo Tribunal de Justiça seja admitido nos seus precisos termos –
isto é, um recurso dirigido contra os dois despachos do Vice‑Presidente do
Supremo Tribunal de Justiça que antecederam o despacho de não conhecimento do
recurso de constitucionalidade, e visando, ao abrigo do disposto na alínea b) do
n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional, a apreciação da
conformidade constitucional das normas do artigo 678.º, n.ºs 1 e 2, do Código de
Processo Civil.
Ora, como se tem dito em anterior jurisprudência – cfr. v. g. os acórdãos n.ºs
269/94 e 178/95 (publicados em Acórdãos do Tribunal Constitucional,
respectivamente, no 27.º vol., pp. 1165-1172, e no 30.º vol., pp. 1109-1119):
“este Tribunal nas reclamações, tendo nos autos elementos para isso, deve
decidir se sim ou não se verificam os demais pressupostos do recurso. Exige-o o
facto de a decisão que ele vier a proferir, quando revogue o despacho reclamado,
que é um despacho de indeferimento, fazer caso julgado quanto à admissibilidade
do recurso, como prescreve o artigo 77.º, n.º 4, da Lei do Tribunal
Constitucional.”
Desta forma, o que está em causa na reclamação dirigida à não admissão (“não
conhecimento”) do recurso não é a reapreciação dos fundamentos dessa decisão,
mas a verificação da indevida preterição de um recurso de constitucionalidade.
(Neste sentido, v. g., Acórdãos n.ºs 490/98, 24/99 e 571/99, todos disponíveis
em www.tribunalconstitucional.pt, e os dois últimos também no DR, II Série, de
11 de Março de 1999 e de 15 de Novembro de 2000, respectivamente).
Assim, muito embora, nos termos e com as reservas já referidas, o reclamante
tenha procurado fundamentar a sua reclamação com a impugnação da
constitucionalidade de uma norma que estaria subjacente ao despacho de
indeferimento da arguição de nulidade (para a qual até formulou um preciso
sentido e fixou a origem legal no n.º 1 do artigo 689.º do Código de Processo
Civil), não será de tal norma que cuidará a indagação subsequente, por não ser
essa a actividade jurisdicional associada à decisão das reclamações, mas sim a,
apenas, a da determinação da admissibilidade, ou não, do recurso de
constitucionalidade anteriormente interposto.
Caso estejam preenchidos os requisitos desse recurso, a reclamação será
deferida, o recurso admitido, e, então, o recorrente terá ocasião de produzir as
suas alegações sobre as questões de constitucionalidade nele suscitadas. Caso
não estejam preenchidos esses requisitos, a reclamação será indeferida, pouco
importando qual tenha sido a fundamentação da decisão reclamada.
Atendendo aos interesses últimos do reclamante e à fundamentação da reclamação
apresentada pelos reclamantes ao Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, tal
juízo sobre a admissibilidade do recurso é, aliás, o que mais importa.
7.Contra a admissibilidade do recurso de constitucionalidade que o ora
reclamante interpôs contra os despachos do Vice-Presidente do Supremo Tribunal
de Justiça não depõe – ao contrário do que pretendeu a ora reclamada na
sequência do entendimento daquele – o facto de se visar um despacho “que se
circunscreve à questão da admissibilidade do recurso”, mas sim a falta de
especificação adequada de uma verdadeira questão de constitucionalidade
normativa, resultante do entendimento dado aos n.ºs 1 e 2 do artigo 678.º do
Código de Processo Civil.
Note-se, com efeito, que, embora questione o fundamento da decisão do Tribunal
da Relação quanto à competência territorial, o recorrente não questiona a norma
limitativa do recurso em matéria de competência relativa (a do artigo 111.º, n.º
4, do Código de Processo Civil). E note-se que, embora ponha em causa as normas
dos artigos 678.º, n.ºs 1 e 2, o despacho de não admissão do recurso proferido
no Tribunal da Relação do Porto invocou antes, além daquele n.º 4 do artigo
111.º, o artigo 114.º, n.º 2, e os n.ºs 2 e 3 do artigo 678.º do Código de
Processo Civil (sendo que no caso deste artigo as referências foram ao não
cabimento “em nenhuma das hipóteses previstas” nesses números). Uma vez, porém,
que a norma do n.º 2 do artigo 678.º admite “sempre” o recurso, ainda se poderia
eventualmente entender que a pluralidade de fundamentos autónomos para o
inviabilizar cederia perante uma previsão normativa que o concedesse sempre,
desde que obrigatoriamente entendida de modo a nela incluir o caso dos autos.
Só que tal entendimento – rectius: o entendimento de que, a não ser assim, a
norma do n.º 2 do artigo 678.º do Código de Processo Civil seria
inconstitucional – não foi invocado durante o processo. Pelo contrário, o que
nele se discutiu foi o alcance do recurso, ou a dimensão do caso julgado. Sobre
a inconstitucionalidade das normas dos dois números do artigo 678.º apenas se
escreveu que tal decorria da violação das “normas e [d]os princípios dos art.ºs
2.º, 20.º, n.ºs 1 e 4, 202.º, n.º 2, e 224.º, n.º 3, da Constituição.”,
invocando-se uma série de limitações que o princípio do Estado de Direito
dirigiria às particulares circunstâncias do caso, mas que de modo nenhum se
podem converter numa interpretação sindicável das normas impugnadas.
Ora, como se referiu no acórdão n.º 367/94 (publicado em Acórdãos do Tribunal
Constitucional, 28.º vol., pp. 147-159), e se repetiu no acórdão n.º 178/95, já
citado, impunha-se que o reclamante tivesse indicado – o que não fez – o
segmento de cada norma, a dimensão normativa de cada preceito, o sentido ou
interpretação, em suma, que tinha por violador da Constituição:
“De facto, tendo a questão de constitucionalidade que ser suscitada de forma
clara e perceptível (cf., entre outros, acórdão n.º 269/94, Diário da República,
II série, de 18 de Junho de 1994), impõe-se que, quando se questiona apenas uma
certa interpretação de determinada norma legal, se indique esse sentido (essa
interpretação) em termos de que, se este Tribunal o vier a julgar desconforme
com a Constituição, o possa enunciar na decisão que proferir, por forma a que o
tribunal recorrido que houver de reformar a sua decisão, os outros destinatários
daquela e os operadores jurídicos em geral, saibam qual o sentido da norma em
causa que não pode ser adoptado, por ser incompatível com a Lei Fundamental.
Escreveu-se a propósito no acórdão n.º 367/94 (Diário da República, II Série, de
7 de Setembro de 1994):
“Ao suscitar-se a questão de inconstitucionalidade, pode questionar-se todo um
preceito legal, apenas parte dele ou tão-só uma interpretação que do mesmo se
faça.
[...] esse sentido (essa dimensão normativa) do preceito há-de ser enunciado de
forma que, no caso de vir a ser julgado inconstitucional, o Tribunal o possa
apresentar na sua decisão em termos de, tanto os destinatários desta, como, em
geral, os operadores do direito ficarem a saber, sem margem para dúvidas, qual o
sentido com que o preceito em causa não deve ser aplicado, por, desse modo,
violar a Constituição.”»
Faltando um dos (necessários) pressupostos do recurso, não pode deferir-se a
reclamação, independentemente do problema de saber se pode considerar-se o
recurso como manifestamente infundado (como sugerido pelo Ministério Público),
por não ser possível fazer derivar das exigências constitucionais um direito de
acesso ao Supremo Tribunal de Justiça “para facultar a controvérsia sobre
matérias de natureza procedimental ou adjectiva”.
III. Decisão
Pelos fundamentos expostos, decide-se indeferir a reclamação, condenando o
reclamante em custas e fixando a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de
conta.
Lisboa, 7 de Fevereiro de 2006
Paulo Mota Pinto
Mário José de Araújo Torres
Rui Manuel Moura Ramos