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Processo n.º 906/2005.
3ª Secção.
Relator: Conselheiro Bravo Serra.
1. Inconformada com a sentença proferida no 4º Juízo Cível do
Tribunal de comarca de Leiria que fixou em € 29.647,34 o montante da
indemnização a pagar pelo IEP – Instituto das Estradas de Portugal aos
expropriados A., B., C., D., E. e F. em virtude da expropriação de uma parcela
de terreno da propriedade destes, com vista à construção da A-8, Caldas da
Rainha–Marinha Grande, apelou a expropriada em primeiro lugar indicada para o
Tribunal da Relação de Coimbra.
Na alegação adrede produzida, disse a impugnante, no que ora
releva: –
“(…)
10. Estatui o artigo 66º, n.º 1 da Constituição que ‘todos têm
direito a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado’.
11. E nas tarefas pragmáticas atribuídas ao Estado, dispõe o n.º
2 do mesmo diploma que incumbe àquele ‘ordenar e promover o ordenamento do
território, tendo em vista uma correcta localização das actividades, um
equilibrado desenvolvimento sócio-económico e a valorização da paisagem’ (alínea
b)) e ‘promover a integração de objectivos ambientais nas várias políticas de
âmbito sectorial’ (alínea f)).
14. A justa indemnização é a garantia económica que o artigo 62º,
n.º 2 da Constituição concede ao direito de propriedade.
15. O Tribunal Constitucional tem, para mais, considerado que o
direito à justa indemnização se traduz num direito fundamental da natureza
análoga à dos direitos, liberdades e garantias.
(…)
CONCLUSÕES
(…)
D. O direito à justa indemnização traduz-se num direito fundamental de natureza
análoga à dos direitos, liberdades e garantias.
(…)
H. A douta sentença recorrida violou o disposto nos artigos 1º, 22º, 23º, 24º,
25º. n.º 1, n.º 2 e n.º 3, alínea h), do Código das Expropriações, 62º, n.º 1 e
n.º 2, 66º, n.º 1 e n.º 2 da Constituição, 5º, n.º 2, alínea a) e 6º da Lei de
Bases do Ambiente e 659º, n.º 2 e n.º 3 do Código de Processo Civil.
(…)”.
Tendo o Tribunal da Relação de Coimbra, por acórdão de 14 de
Junho de 2005, julgado improcedente a apelação, fez a expropriada A. juntar aos
autos requerimento por via do qual manifestou a sua vontade de, ao abrigo da
alínea b) do nº 1 do artº 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, recorrer para
o Tribunal Constitucional.
O Desembargador Relator do mencionado Tribunal de 2ª instância,
por despacho de 13 de Julho de 2005, convidou a recorrente a esclarecer “quando
foi preenchido o requisito da admissibilidade do recurso previsto no artº 70º nº
1, b) da Lei 28/82 de 15/11”.
Na sequência, a impugnante veio dizer que “invocou violação de
norma constitucional nos parágrafos 10, 11 e 14 das alegações e D e H das
conclusões”.
O referido Desembargador Relator, por despacho de 19 de Setembro
de 2005, não veio a admitir o recurso, esteando-se, em síntese, na consideração
de que a recorrente não houvera suscitado a inconstitucionalidade de qualquer
norma.
É deste despacho que, pela aludida expropriada vem deduzida
reclamação para o Tribunal Constitucional, dizendo, em síntese, que invocou a
violação de norma constitucional “nos parágrafos 10, 11 e 14 das alegações e D e
H das conclusões”, tendo neste última conclusão referido que foram “violados
pela sentença de 1.ª instância os artigos ‘62º, n.º 1, 66º, n.º 1 e n.º 2 da
Constituição”, razão pela qual, “tendo o acórdão do Tribunal da Relação sido
julgado improcedente e tendo sido mantida a sentença da 1.ª instância, ao
interpor o recurso para este tribunal, na óptica da reclamante, mantinha-se a
invocada violação de norma constitucional”.
Ouvido sobre a reclamação, o Ex.mo Representante do Ministério
Público pronunciou-se no sentido de a mesma ser manifestamente improcedente, “já
que a reclamante não suscitou, durante o processo e em termos processualmente
adequados, qualquer questão de inconstitucionalidade normativa idónea para
suportar o recurso interposto para este Tribunal”.
Cumpre decidir.
2. Como resulta do relato supra efectuado, na peça processual
consubstanciadora da alegação do recurso de apelação interposto para o Tribunal
da Relação de Coimbra a ora reclamante não suscitou qualquer questão de
desconformidade com a Lei Fundamental por banda de norma ou normas vertidas no
ordenamento jurídico infra-constitucional, antes brandindo com o argumento de
que foi a sentença impugnada, ela mesma, que, ao decidir como decidiu, violou os
artigos 62º, números 1 e 2, e 66º, números 1 e 2, ambos do Diploma Básico.
Ora, como se sabe, objecto de fiscalização concreta da
constitucionalidade são as normas do ordenamento ordinário e não quaisquer
outros actos do poder público como, verbi gratia, as sentenças judiciais qua
tale consideradas.
E, por outro lado, como os recursos ancorados na alínea b) do nº
1 do artº 70º da Lei nº 28/82 têm, inter alia, como um dos seus requisitos, o da
suscitação, precedentemente à prolação da decisão judicial intentada colocar sob
a censura deste órgão de administração de justiça, da desarmonia constitucional
da norma aplicada nessa decisão, mister é que seja uma tal questão equacionada e
colocada à consideração do tribunal a quo.
Nada disso sucedeu no caso sub specie.
Neste contexto, indefere-se a reclamação, condenando-se a
impugnante nas custas processuais, fixando-se a taxa de justiça em vinte
unidades de conta.
Lisboa, 21 de Novembro de 2005
Bravo Serra
Gil Galvão
Artur Maurício