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Proc. nº 503/96
1ª Secção
Rel: Cons. Ribeiro Mendes
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
I
1. A., juíza de Direito a exercer funções no Tribunal Cível de
............, interpôs recurso contencioso para o Supremo Tribunal de Justiça do acórdão do Plenário do Conselho Superior da Magistratura proferido em 11 de Julho de 1995 que lhe aplicara a sanção disciplinar de quinze meses de inactividade. O recurso foi entregue pela recorrente na secretaria do Conselho Superior da Magistratura em 15 de Novembro de 1995, referindo-se que o acórdão do Plenário do Conselho Superior da Magistratura fora objecto de pedido de aclaração, rejeitado por novo acórdão de 3 de Outubro de 1995, notificado em 6 do mesmo mês e ano.
Remetido o recurso e os autos de processo disciplinar ao Supremo Tribunal de Justiça em 22 de Novembro de 1995, suscitou o representante do Ministério Público a questão prévia da extemporaneidade do recurso, invocando que o prazo de 30 dias de interposição de recursos contenciosos era um prazo substantivo de caducidade, que se contava nos termos do art. 279º do Código Civil, atento o estatuído no art. 28º, nº 2, da Lei de Processo nos Tribunais Administrativos (LPTA, Decreto-Lei nº 267/85, de 16 de Julho), não lhe sendo aplicáveis as normas dos arts. 144º, nº 3, e 145º, nºs. 5 e 6, do Código de Processo Civil, sendo certo que a recorrente não suscitara a verificação de justo impedimento.
Ouvidos a recorrente e o Conselho Superior da Magistratura sobre a questão prévia suscitada, este último manifestou concordância com a tese sustentada pelo representante do Ministério Público, ao passo que a recorrente se opôs a tal entendimento e à procedência da questão prévia. Na resposta da recorrente, sustentou-se que o prazo para interposição do recurso se devia contar não a partir da notificação à própria recorrente, mas antes da notificação feita ao seu mandatário forense (ocorrida apenas em 12 de Outubro de
1995) e que ao respectivo modo de contagem se deviam aplicar não as regras da LPTA, mas antes as do Código de Procedimento Administrativo, nomeadamente a da alínea b) do art. 72º. Nessa ocasião, suscitou-se igualmente uma questão de inconstitucionalidade respeitante 'à interpretação do artigo 28º, nº 2, da Lei de Processo nos Tribunais Administrativos, em detrimento da aplicação do artigo
72º alínea b), do Código de Procedimento Administrativo', por força da remissão do art. 178º do Estatuto dos Magistrados Judiciais, em virtude da violação dos arts. 20º, nº 1, 1ª parte e 32º, nº 1, da Constituição (a fls. 59 e seguintes dos autos). E, na conclusão dessa peça processual, indicou-se que 'o artigo 28º, nº 2, da lei de Processo nos Tribunais Administrativos está ferido de inconstitucionalidade material por infringir, privando, em absoluto, a possibilidade de recurso, todas as garantias processuais consagradas no artigo
20º, nº 1, 1ª parte e 32º, nº 1, ambos da CRP, incluindo, necessariamente, o princípio do duplo grau de jurisdição, sendo que o sistema de recurso previsto nos artigos 168º e seguintes da lei 28/85 deve ser interpretado e aplicado com essa garantia constitucional' (a fls. 62).
Através de acórdão proferido em 30 de Abril de 1996, tirado com um voto de vencido, a Secção de Contencioso do Supremo Tribunal de Justiça julgou procedente a questão prévia suscitada, decidindo não admitir o recurso, dada a sua intempestividade.
Pode ler-se nesse acórdão sobre a questão de constitucionalidade:
' Mas sustenta a recorrente que o nº 2 do art. 28 do Dec.[-Lei] 267/85 é materialmente inconstitucional por a privar, em absoluto, de interpor recurso, impedindo-lhe as garantias processuais consagradas nos arts. 20º, nº 1, 1ª parte, e 32º, nº 1 da C.R.P., incluindo, necessariamente, o princípio do duplo grau de jurisdição.
Com o devido respeito não lhe assiste razão.
Estabelece a 1ª parte do nº 1 do referido art. 20 que a todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legítimos, o que não está em causa, pois o que ali se não dispõe é que será sempre, sem qualquer limite temporal, permitido interpor recurso de qualquer decisão. Aliás isso iria contra a indispensável estabilidade das decisões, decorrido que seja o prazo fixado para poderem ser impugnadas.
Por sua vez o citado art. 32, nº 1 estipula que o processo criminal assegurará todas as garantias de defesa. Mas, transpondo esta norma para o processo disciplinar, também o recorrente dispôs de todas essas garantias. E se lhe não é admitido o recurso, só de si poderá queixar-se por ter deixado esgotar o prazo de que para o efeito dispunha.
Repare-se que, mesmo no processo criminal, é de 10 dias o prazo para interposição dos recursos ordinários - art. 411 nº 1 do Cód. Proc. Penal - enquanto no caso presente a recorrente até dispunha do mais amplo prazo de 30 dias.
Mesmo admitindo que a Constituição consagra o princípio do duplo grau de jurisdição, só haveria inconstitucionalidade material se a lei ordinária negasse
à recorrente a possibilidade de recurso - e aqui não era o caso - ou lhe concedesse para o efeito um prazo tão curto que equivalesse praticamente a negar-lhe tal possibilidade - o que também não é o caso.
Pelo que não se considera o art. 28, nº 2 do Dec-[-Lei] nº 267/85 ferido de inconstitucionalidade material.' (a fls. 68 vº a 69)
No voto de vencido junto ao acórdão é posta em causa a bondade da escolha das normas de direito ordinário aplicáveis ao caso feita pela tese marioritária, mas não a constitucionalidade das normas escolhidas.
Inconformada com esta decisão, dela interpôs a recorrida recurso de constitucionalidade, nos termos da alínea b) do nº 1 do art. 70º da Lei do Tribunal Constitucional. Nesse requerimento indicou a recorrente o objecto do recurso nos seguintes termos:
' Atendendo a que o art. 178º da Lei nº 21/85 apenas [...] refere «os trâmites processuais dos recursos», aplicar os termos em que se contam os prazos dos recursos contenciosos de actos anuláveis acima referidos a um recurso cujo prazo
é estabelecido em dias (30) e em sede própria, e que, nem sequer, tem por objectivo um acto anulável, traduz um critério de subsidiariedade manifestamente desadequado, além de, na medida em que restringe um prazo processual de recurso, acarretar, desde logo, a violação de uma garantia de defesa - a primeira consagrada nos artigos 168º e seguintes da Lei 21/85.
Por outras palavras, a interpretação do art. 178º da Lei 21/85 no sentido de ser subsidiariamente aplicável o art. 28º, nº 2, da Lei de Processo nos Tribunais Administrativos, em detrimento, como defende a requerente, da aplicação do art. 72º al. b), do Código de Procedimento Administrativo, está ferida de inconstitucionalidade material por infringir os acima citados princípios constitucionais [os consagrados nos arts. 20º, nº 1, 1ª parte - acesso ao direito e aos tribunais - e 32º, nº 1, - duplo grau de jurisdição, aplicáveis imediatamente nos termos do nº 1 do art. 18º, todas da Constituição, devendo atentar-se igualmente no nº 2 do mesmo art. 18º], uma vez que, objectivamente, retira à requerente a garantia de ver observado o princípio constitucional do duplo grau de jurisdição, bem como o princípio de acesso ao direito e aos tribunais.' (a fls. 75-76)
O recurso foi admitido por despacho do relator de fls. 78.
2. Subiram os autos ao Tribunal Constitucional.
Apresentaram alegações a recorrente e o Conselho recorrido.
A recorrente propugnou pela procedência do recurso, formulando as seguintes conclusões:
'
1º
O acórdão recorrido interpreta o art. 178º da Lei nº 21/85 considerando que aos recursos das deliberações do CSM para o STJ são subsidiariamente aplicáveis as normas que regem os trâmites processuais dos recursos de contencioso administrativo interposto para o STA.
2º
Segundo essa interpretação tais prazos contam-se nos termos do art. 28º, nº 2 do Dec-Lei nº 267/85, de 16 de Julho.
3º
Desse critério interpretativo resulta que o último dia do prazo para a recorrente ter interposto o recurso foi 13/11/95.
4º
Como a recorrente interpôs o recurso em 15/11/96, a sua interposição foi extemporânea.
Porém,
5º
Essa interpretativa é restritiva de direitos e garantias constitucionais.
Na verdade,
6º
O prazo para a interposição desse recurso deve ser feita à luz do art. 144º, nº 3 do CPC, não incluindo pois Sábados, Domingos e feriados.
7º
Essa interpretação decorre do disposto no art. 82º da LPTA.
8º
Bem como do art. 72º, alíneas a) e b) do CPA.
9º
Trata-se dum prazo judicial processual.
10º
A interpretação do art. 178º citado, do acórdão recorrido, é contrária ao princípio constitucional do duplo grau de jurisdição, que decorre do art. 32º, nº 1 da CRP.
11º
Bem como ao direito geral à protecção jurídica, sob a forma de garantia de acesso aos tribunais consagrada no art. 20º, nº 1 da CRP.
12º
Essa interpretação restritiva é desconforme a uma garantia constitucional.
13º
Colmata uma lacuna recorrendo à lei mais desfavorável à definição do prazo de recurso.
14º
Incumbindo o dever de aplicação do direito legal em conformidade com os direitos, liberdades e garantias.
15º
Da interpretação do acórdão recorrido resulta uma aplicação anti-garantística do prazo do exercício do direito ao recurso.
16º
A interpretação do art. 178º feita pelo acórdão recorrido está ferida de inconstitucionalidade material.
17º
O acórdão recorrido deve pois ser revogado.
18º
Com a consequência de o recurso se considerar interposto atempadamente.' (a fls. 94 a 98)
O Conselho Superior de Magistratura sustentou, nas contra-alegações, que o recurso interposto não merecia provimento, visto que, estando assegurada a impugnação contenciosa da decisão disciplinar em prazo razoável (30 dias), o modo de contagem desse prazo traduz uma concretização das garantias constitucionais, sendo certo que 'existem, como é exigível na ordem jurídica, normas reguladoras que impõem um limite temporal para interpor recurso das decisões', não estando afectados de inconstitucionalidade os arts. 178º do Estatuto dos Magistrados Judiciais e 28º, nº 2, da Lei do Processo nos Tribunais Administrativos (a fls. 101 a 105).
3. Foram corridos os vistos legais.
Por não haver razões que a tal obstem, impõe-se conhecer do objecto do recurso.
II
4. Importa começar por fixar o objecto do recurso.
Da leitura das peças processuais relevantes atrás referidas, resulta que a recorrente impugnou a constitucionalidade da norma do art. 178º do Estatuto dos Magistrados Judiciais (E.M.J., Lei nº 21/85, de 30 de Julho), interpretada no sentido de que a mesma remete - no que toca à impugnação contenciosa de deliberações tomadas pelo Conselho Superior da Magistratura em matéria disciplinar - para a forma de contagem de prazos de interposição do recurso contencioso estabelecida no nº 2 do art. 28º da LPTA. No entender da recorrente, a norma do art. 178º do E.M.J., na indicada interpretação e conjugada, por isso, com o nº 2 do art. 28º da LPTA, violaria os arts. 20º, nº
1, 1ª parte, e 32º, nº 1, da Constituição.
As normas em causa têm a seguinte redacção:
Art. 178º E.M.J. - (Lei Subsidiária) - 'São subsidiariamente aplicáveis as normas que regem os trâmites processuais dos recursos de contencioso administrativo interpostos para o Supremo Tribunal Administrativo'.
Art. 28º, nº 2, LPTA - (a epígrafe do artigo indica 'prazos de recurso') - 'Os prazos estabelecidos no número anterior contam-se nos termos do artigo 279º do Código Civil, sem prejuízo do disposto nos artigos 31º, nº 2, e 85º.'
5. Fixado o objecto do recurso, dir-se-á preliminarmente que não cabe ao Tribunal Constitucional sindicar a correcção da interpretação do direito ordinário feita pela Secção de Contencioso do Supremo Tribunal de Justiça, no acórdão recorrido, devendo relembrar-se que houve mesmo um voto de vencido sobre essa matéria.
Na verdade, e como se dispõe no art. 71º, nº 1, da Lei do Tribunal Constitucional, 'os recursos de decisões judiciais para o Tribunal Constitucional são restritos à questão da inconstitucionalidade ou da ilegalidade suscitada'.
Ora, lendo as peças processuais subscritas pelo mandatário da recorrente, nomeadamente as alegações apresentadas no recurso de constitucionalidade, fica-se com a ideia de que a recorrente pretendia que o Supremo Tribunal de Justiça tivesse interpretado restritivamente a norma do art.
178º do E.M.J., considerando a referência a trâmites como englobando apenas os actos de processo não regulados nos arts. 168º e seguintes daquele diploma, devendo considerar-se aplicável à contagem dos prazos de recurso o disposto no art. 72º, alínea b), do Código de Procedimento Administrativo de 1991 ou o disposto no art. 82º LPTA conjugado com aquele art. 72º.
Essa controvérsia sobre a interpretação do art. 178º EMJ - que opôs a recorrente ao representante do Ministério Público e ao Conselho recorrido - foi dirimida pelo Supremo Tribunal de Justiça de forma definitiva.
Ao Tribunal Constitucional cabe apenas pronunciar-se sobre se tal norma do art. 178º E.M.J., interpretada como remetendo, em matéria de contagem de prazos do recurso contencioso, para o art. 28º, nº 2, LPTA, viola normas ou princípios constitucionais.
6. Recorda-se que o Conselho Superior da Magistratura deliberou aplicar uma sanção disciplinar à recorrida, magistrada judicial, no final de um processo disciplinar contra ela instaurado.
A impugnação contenciosa de uma sanção disciplinar pública constitui uma forma de reacção contra um acto administrativo, neste caso praticado por um
órgão constitucional autónomo, o Conselho Superior da Magistratura, convocando, desde logo, a garantia constitucional contemplada no nº 4 do art. 268º da Constituição:
' É garantido aos interessados recurso contencioso com fundamento em ilegalidade, contra quaisquer actos administrativos, independentemente da sua forma, que lesem os seus direitos ou interesses legalmente protegidos.'
Comentando os nºs. 4 e 5 do art. 268º da Constituição (os quais prevêem, por um lado, o direito de recurso contencioso contra actos administrativos ilegais e o direito de acesso à justiça administrativa para tutela dos direitos ou interesses legalmente protegidos dos administrados), afirmam Gomes Canotilho e Vital Moreira que tal direito de recurso e o direito de acesso constituem 'refracções necessárias do direito geral de acesso aos tribunais para defesa de direitos e interesses legitimos (art. 20º-1)'
(Constituição da República Portuguesa Anotada, 3ª ed., Coimbra, 1993, pág. 937).
Sendo os magistrados judiciais titulares de órgãos de soberania, tal não impede que estejam sujeitos à acção disciplinar de um órgão constitucional autónomo, o Conselho Superior da Magistratura. A parte final do nº 1 do art.
219º da Constituição confere a esse Conselho a competência para o exercício da acção disciplinar relativamente aos juízes.
Naturalmente que, sendo os juízes titulares de órgãos de soberania que são os tribunais, no domínio da acção disciplinar instaurada contra alguns deles há-de estar assegurada também a garantia constitucional em matéria de disciplina da função pública, constante do nº 3 do art. 269º da Constituição: 'Em processo disciplinar são garantidas ao arguido a sua audiência e defesa'. E, como atrás se disse, da decisão final em matéria disciplinar proferida pelo Conselho Superior da Magistratura há-de caber recurso contencioso, de harmonia com o nº 4 do art. 268º da Constituição.
7. Na sequência do que acaba de referir-se, compreende-se dificilmente que a recorrente sustente que lhe são aplicáveis directamente as garantias dos arguidos em processo criminal (art. 32º, nº 1, da Constituição) ou que a interposição do recurso contencioso de anulação em matéria disciplinar traduza uma garantia de um segundo grau de jurisdição (no fundo, parece que a recorrente configura a decisão disciplinar proferida pelo plenário do Conselho Superior da Magistratura como uma decisão judicial e não como um acto administrativo, contenciosamente recorrível).
8. Afastada esta ambiguidade no discurso da recorrente, a questão de constitucionalidade que é posta ao Tribunal Constitucional parece ser singelamente a seguinte: violará a Constituição o estabelecimento de um prazo de
30 dias, contado de forma contínua, para impugnar contenciosamente a decisão proferida em matéria disciplinar pelo Conselho Superior da Magistratura?
Ora, é indiscutível que o direito de acesso aos tribunais em geral, bem como no domínio do contencioso administrativo (arts. 20º, nº 1, e 268º, nºs. 4 e
5, da Constituição) postula o direito a prazos razoáveis para propor acções ou para interpor recursos, vedando o estabelecimento pelo legislador de prazos de caducidade exíguos no respeitante aos direitos de acção ou de recurso (neste sentido, veja-se Gomes Canotilho e Vital Moreira, ob. cit., pág. 163).
Na jurisprudência do Tribunal Constitucional, tem sido acolhido este entendimento, considerando-se que os poderes de conformação do legislador no estabelecimento de prazos de caducidade estão sujeitos a limites de razoabilidade, sob pena de violação do princípio da proporcionalidade.
Assim, no acórdão nº 148/87, considerou-se que o estabelecimento pela lei ordinária do prazo de um ano para ser exercido o direito de accionar a impugnação de um despedimento ilícito não se traduzia na supressão ou sequer na compressão do direito ao trabalho e à segurança de emprego, afirmando-se que a
'fixação de um prazo para o exercício do direito de impugnação do despedimento, além de não incidir sobre a própria regulamentação de trabalho, visa permitir uma solução de conflito aberto entre o trabalhador e a entidade empregadora, encontrada em tempo útil e limitado, por forma que os interesses em confronto sejam arbitrados ou julgados de molde que as situações em controvérsia não se arrastem numa indefinição sem limite, por certo contrária aos interesses de ambas as partes' (in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 9º vol., pág. 708).
No domínio do processo penal teve ocasião o Tribunal Constitucional de se pronunciar sobre a duração de determinados prazos, seja para requerer a instrução no processo penal comum, seja para interpor recursos em processo penal militar ou no domínio da Lei de Imprensa - cfr. acórdãos nºs. 428/95 (no Diário da República, II Série, nº 257, de 7 de Novembro de 1995), 34/96 (na II Série do mesmo jornal, nº 100, de 29 de Abril de 1996) e 41/96, ainda inédito. Tem prevalecido o entendimento, nessa jurisprudência, de que só estão afectadas de inconstitucionalidade as normas que estabeleçam prazos 'ostensivamente exíguos e inadequados para a organização de defesa' (formulação do acórdão nº 34/96).
Em todos estes casos, o Tribunal Constitucional entendeu que era 'ponto essencial' que o prazo estabelecido pelo legislador não se apresentasse 'como exíguo, por forma que de uma dimensão temporal desproporcionada' pudessem
'resultar manifestas e efectivas limitações do direito tutelado' (formulações do acórdão nº 148/87 atrás citado). Sendo tal prazo exíguo, já não se estaria face a condicionamentos de um direito fundamental de acesso à justiça, estabelecidos pelo legislador no uso de poderes de conformação, mas a verdadeiras restrições de tais direitos (por último, veja-se o acórdão nº 225/97, in Diário da República, II Série, de 26 de Junho de 1997).
9. Há-de convir-se que, sendo exercida a acção disciplinar contra um magistrado judicial, pessoa necessariamente com formação académica no domínio jurídico, não se possa considerar exíguo o prazo de 30 dias previsto no art. 169º, nº 1, do E.M.J., sendo os dias do prazo, contados seguidamente de harmonia com o art. 279º do Código Civil, para interpor o respectivo recurso contencioso de impugnação da decisão sancionatória, ainda que tal prazo seja inferior ao estabelecido para impugnação de outros actos administrativos (cfr. art. 28º, nº 1, alínea a), LPTA).
Não se vê como tal prazo se tenha de qualificar, por imperativo constitucional, como prazo de natureza processual - a que fosse, na altura, aplicável o modo de contagem previsto no art. 144º, nº 3, da versão então em vigor do Código de Processo Civil - ou seja tido o mesmo prazo como exíguo ou desproporcionado, susceptível de comprimir ou restringir o direito de recurso contencioso da recorrente.
Tão-pouco se pode dizer que a interpretação feita pela decisão recorrida, no que toca ao sentido de remissão feita no art. 178º do E.M.J., conduza a um resultado desproporcionado, susceptível de reduzir a zero os direitos processuais da recorrente.
10. Por último, importará referir que não pode o Tribunal Constitucional apreciar a decisão recorrida relativamente à opção tomada de aplicação do critério de contagem previsto no nº 2 do art. 28º LPTA pelo prisma da eventual violação da confiança da recorrente em que se seguiria o modo de contagem de prazos da versão então vigente do Código de Processo Civil, visto que se estaria então no domínio de um verdadeiro recurso de amparo (veja-se a situação contemplada no acórdão no 20/96, in Diário da República, II Série, nº
114, de 16 de Maio de 1996).
III
11. Nestes termos e pelas razões expostas, decide o Tribunal Constitucional negar provimento ao recurso, confirmando o julgamento de constitucionalidade constante do acórdão recorrido.
Lisboa, 2 de Julho de 1997 Armindo Ribeiro Mendes Maria da Assunção Esteves Vítor Nunes de Almeida Maria Fernanda Palma Antero Alves Monteiro Diniz Alberto Tavares da Costa José Manuel Cardoso da Costa