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Processo nº 386/97
2ª Secção Relator: Cons. Guilherme da Fonseca
Acordam, em conferência, na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal Administrativo (Secção do Contencioso Administrativo), em que figuram como recorrente a Caixa Geral de Aposentações e como recorrido A., pelos fundamentos da EXPOSIÇÃO do Relator, a fls. 84 e seguintes, que aqui se dá por inteiramente reproduzida, e que não foi abalada pelas respostas da recorrente e do recorrido, limitando-se aquela a insistir pela competência do Tribunal Constitucional, com apelo à doutrina do acórdão nº 66/91, publicado no Diário da República, II Série, nº 152, de 5 de Julho de 1991, 'para conhecer da questão da compatibilidade do artigo 1º do Decreto-Lei nº 362/78, de 28 de Novembro, na interpretação que lhe foi dada pelo douto Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, com o Acordo celebrado entre a República de S. Tomé e Príncipe aprovado pelo Decreto-Lei nº 550-N/76, de 12 de Julho, por violação da regra definidora da escala da hierarquia normativa', decide-se, em parte, não tomar conhecimento do recurso e, noutra parte, na esteira do acórdão nº 354/97, publicado no Diário da República, II Série, nº 138, de 18 de Junho de 1997, negar provimento ao recurso. Lisboa, 08 de Outubro de 1997 Guilherme da Fonseca Fernando Alves Correia José de Sousa e Brito Bravo Serra Messias Bento José Manuel Cardoso da Costa
Processo nº 386/97
2ª Secção Relator: Cons. Guilherme da Fonseca
EXPOSIÇÃO
1. A Caixa Geral de Aposentações veio interpor recurso para este Tribunal Constitucional do acórdão da 1ª Secção (Secção do Contencioso Administrativo), de 15 de Maio de 1997, 'nos termos das alíneas b) e i) do nº 1 do artigo 70º e do artigo 75º-A da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro' e invocando o seguinte no requerimento de interposição do recurso:
'A norma cuja fiscalização concreta de constitucionalidade se pretende é a do artigo 1º do Decreto-lei nº 362/78, na interpretação que dela foi feita no douto acórdão do STA que antecede.
Os princípios e normas constitucionais que se consideram violados são os seguintes:
a) o princípio da igualdade, consagrado no artigo 13º da Constituição da República Portuguesa;
b) a excepção ao princípio da equiparação dos estrangeiros e apátridas com os cidadãos portugueses consagrada no nº 2 do artigo 15º da Constituição da República Portuguesa;
c) o princípio segundo o qual o direito internacional convencional, regularmente aprovado ou ratificado, vigora na ordem interna enquanto vincular o Estado Português consagrado na parte final do nº 2 do artigo 8º da Constituição da República Portuguesa.
A inconstitucionalidade da citada norma do artigo 1º do Decreto-Lei nº 362/78, de 28 de Novembro, na interpretação que lhe foi dada no acórdão de que se recorre, foi suscitada pela ora recorrente na resposta (nº 7) e nas alegações que ofereceu no âmbito do recurso contencioso, no Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa (nºs 4 e 7), bem como nas alegações que ofereceu no âmbito do recurso jurisdicional interposto para o Supremo Tribunal Administrativo (nºs 7,
9 e 12).'
2. O acórdão recorrido, que reconheceu 'o direito
à pensão de aposentação aos funcionários e agentes da antiga administração ultramarina desde que contassem 15 anos de serviço (agora, por força do DL
23/80 de 29.2, 5 anos), e houvessem efectuado descontos, para aquele efeito, mas que, no entanto, não reunissem condições de facto para a aposentação, nomeadamente por não poderem ingressar no quadro geral de adidos, por terem deixado de ter nacionalidade portuguesa, nos termos do disposto no artº 4º do DL
308-A/75 de 24-6', na parte que interessa, tomou a seguinte posição:
'Finalmente, não haverá que considerar-se a interpretação adoptada como conflituante com o princípio constitucional de igualdade p. no artº 13º da CRP.
Este princípio tem sido, unanimemente entendido como simples proibição do arbítrio, impondo tratamento igual a situações iguais, mas diferente tratamento para situações desiguais. Como acima se referiu, a situação dos antigos funcionários e agentes da antiga administração ultramarina portuguesa apresentava especialidades, problemas específicos a impor, em nome de justiça um tratamento especial, em relação aos restantes funcionários e agentes de Administração pública nacional, pelo que não se verifica a indicada violação de tal princípio constitucional.
Também, em nada o regime jurídico criticado conflitua com o nº 2 do artº 15º CRP pois não estamos em face de qualquer exercício de funções públicas por estrangeiros, mas antes, e apenas, a regularização de uma situação que teve como pressuposto o exercício de funções públicas sob administração portuguesa'.
3. Acontece que este Tribunal Constitucional, no seu acórdão nº 354/97, publicado no Diário da República, nº 138, II Série, de 18 de Junho de 1997, decidiu já que a norma 'do artigo 1º do Decreto-Lei nº 362/78, de 28 de Novembro (alterado pelo Decreto-Lei nº 23/80, de 29 de Fevereiro), quando interpretada no sentido de que nela se não exige que os funcionários e agentes da administração pública das ex-províncias ultramarinas possuam a nacionalidade portuguesa para lhes poder ser atribuída a pensão de aposentação requerida ao abrigo daquele decreto-lei', não é inconstitucional, quando confrontada com o artigo 13º (conjugado com o artigo 15º, nº 2) da Lei Fundamental.
Não havendo motivo para divergir desse entendimento, seguido já por outros acórdãos posteriores do Tribunal Constitucional, há apenas que remeter para os fundamentos do citado aresto e confirmar o julgado no acórdão recorrido quanto à questão de
(in)constitucionalidade.
4. Invocou ainda a recorrente como fundamento do recurso de constitucionalidade a alínea i) do nº 1 do artigo 70º, da Lei nº
28/82, de 15 de Novembro, querendo com isso reportar-se ao entendimento do acórdão recorrido sobre 'qualquer eventual conflito de normas' a resolver' segundo o princípio 'lex posterior derrogatro legi priori'.
'Esta consideração - acrescentou-se no aresto -
é, também, válida, em relação ao possível conflito das normas em exame com o artº 1º do Acordo entre a República Portuguesa e a República de S. Tomé e Príncipe, aprovado para vigorar na ordem jurídica portuguesa pelo DL. 550-N/76 de 12.7, isto se se adoptar a posição (não pacífica, aliás) da posição paritária do direito internacional convencional e a lei ordinária interna. A esta luz, o DL 362/78, por posterior, teria revogado as anteriores disposições do referido Tratado que com aquela lei interna conflituassem'.
Esta perspectiva foi também abordada no citado acórdão nº 354/97 e aí, por remissão para o anterior acórdão nº 405/93, entendeu-se - também na presente hipótese - que 'os casos de contrariedade de norma constante de acto legislativo com uma convenção internacional só podem ser objecto de recurso para o Tribunal Constitucional - recurso que 'é restrito às questões de natureza jurídico-constitucional e jurídico-internacional implicadas na decisão recorrida' (cf. nº 2 do artigo 71º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro) - na hipótese prevista na alínea i) do nº 1 do artigo 70º da mesma Lei. Ou seja: só pode recorrer-se para este Tribunal das decisões 'que recusem a aplicação de norma constante de acto legislativo com fundamento na sua contrariedade com uma convenção internacional, ou a apliquem em desconformidade com o anteriormente decidido sobre a questão pelo Tribunal Constitucional'.
Só que não se configuram in casu tais situações da alínea i):
- não há um juízo de recusa de aplicação ou de desaplicação de qualquer norma constante de acto legislativo, nomeadamente a questionada norma do artigo 1º do Decreto-Lei nº 362/78, 'com fundamento na sua contrariedade com uma convenção internacional', aqui o Acordo entre a República Portuguesa e a República de S. Tomé e Príncipe, aprovado para vigorar na ordem jurídica portuguesa pelo Decreto-Lei nº 550-N/76, de 12 de Julho, antes havendo uma aplicação do direito interno (e não cabe a hipótese de recurso de decisões que apliquem norma cuja contrariedade com convenção internacional haja sido suscitada durante o processo, como é a postura da recorrente).
- não há um juízo de aplicação 'em desconformidade com o anteriormente decido sobre a questão pelo Tribunal Constitucional' e nem sequer a recorrente identifica qualquer jurisprudência anterior deste Tribunal.
Por conseguinte, não se verificam os requisitos do tipo de recurso previsto naquela alínea i) do nº 1 do artigo 70º, aditado pela Lei nº 85/90, de 7 de Setembro, não podendo, neste parte, tomar-se conhecimento do presente recurso de constitucionalidade.
5. Ouçam-se as partes, por cinco dias, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 78º-A, nº 1, da citada Lei nº 28/82, aditado pelo artigo 2º, da Lei nº 85/89, de 7 de Setembro.