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Proc. nº 210/97
2ª Secção Relator: Cons. Luís Nunes de Almeida
Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
I - RELATÓRIO
1. A. intentou acção de preferência, com processo ordinário, contra B. e C., acção que correu seus termos pelo 7º Juízo do Tribunal Cível da Comarca de Lisboa.
Na pendência da acção, veio o Autor a falecer, prosseguindo a acção com as herdeiras habilitadas, D. e E..
Por sentença de 10 de Fevereiro de 1993, o colectivo julgou a acção parcialmente procedente, reconhecendo ao Autor o direito de preferência por ele invocado, com a consequente substituição do C. adquirente na respectiva escritura pública de compra e venda.
Inconformado, o C. interpôs recurso dessa sentença, para o Tribunal da Relação de Lisboa.
Por sua vez, interpuseram as habilitadas recurso subordinado, restrito à parte da sentença que lhes era desfavorável, também para aquela Relação.
2. Nas suas alegações, o C. recorrente conclui que «a douta sentença recorrida violou [...] o artigo 62º da Constituição da República».
Por Acórdão de 2 de Fevereiro de 1995, o Tribunal da Relação de Lisboa negou provimento a ambos os recursos, confirmando a decisão recorrida.
Inconformados, ambos os recorrentes interpuseram recursos de Revista para o Supremo Tribunal de Justiça, vindo o recorrente C. a, nas respectivas alegações, concluir novamente que «o douto acórdão recorrido violou [...] o artigo 62º da Constituição da República».
3. Por Acórdão de 28 de Janeiro de 1997, o Supremo Tribunal de Justiça negou provimento a ambas as revistas.
Desta decisão interpôs o recorrente C. recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do artigo 70º, nº 1, alínea b), da LTC, «já que no referido douto acórdão não foram declarados inconstitucionais, como se requerera, os artigos 417º e 1117º, ambos do Código Civil», como se pode ler no respectivo requerimento.
O recorrente apresentou as respectivas alegações ainda no Supremo Tribunal de Justiça, aí se podendo ler que «ao decidir em contrário o douto acórdão recorrido viola os artigos 2º, 13º e 62º da Constituição da República.»
4. Admitido o recurso de constitucionalidade, e distribuídos os autos neste Tribunal, pelo relator do processo foi elaborada exposição prévia, nos termos do artigo 78ºA da LTC, entendendo que:
Nos termos do disposto no artigo 280º, nº 1, alínea b) da CRP, e no artigo 70º, nº1, b) da LTC, cabe recurso das decisões dos restantes tribunais que apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo.
Tem este Tribunal afirmado sucessivamente que não basta, assim, invocar a inconstitucionalidade de uma decisão judicial, já que as decisões judiciais não podem ser tidas como normas jurídicas, para o efeito de fiscalização da constitucionalidade.
Ora, no caso dos autos, o ora recorrente sempre imputou a inconstitu-cionalidade às decisões judiciais, nunca tendo, em qualquer dos seus articulados anteriores à interposição do recurso de constitucionalidade, suscitado a questão de inconstitucionalidade das normas constantes dos artigos
417º e 1117º do Código Civil, razão por que não fez referência, como o deveria ter feito - nos termos do artigo 75º-A da LTC - à peça processual em que tal suscitação ocorreu.
Notificadas nos termos do artigo 78º-A da LTC, vieram as recorridas, na sua resposta, manifestar concordância com o teor da exposição do relator.
Por sua vez, o recorrente alega na respectiva resposta que:
Na verdade, ao longo do processo (e não apenas agora) a questão da inconstitucionalidade das normas em causa nestes autos foi suscitada.
a) - Nas alegações para o Tribunal da Relação de Lisboa escreveu-se na conlusão J):
'J) ao decidir em sentido diverso a douta sentença recorrida violou artºs 405º, 763º, 1117º do Código Civil, (...), o artigo 62º da Constituição da Repúbli-ca...' (cfr. fls. 515)
Esta conclusão provem de II, A) das alegações (cfr. fls. 507 onde tal aspecto é devidamente desenvolvido).
b) - Nas alegações para o Supremo Tribunal de Justiça, por seu turno, afirmou-se, também na conclusão J):
'Ao decidir em sentido diverso o douto acórdão recorrido violou os artºs 405º, 753º, 1117º e 1410º do Código Civil, (...), o artigo 62º da Constituição da República...' (cfr. fls. 589).
Dispensados os vistos, cumpre decidir.
II - FUNDAMENTOS
5. O presente recurso vem interposto ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, o que significa que o recorrente pretende que seja apreciada a constitucionalidade de normas aplicadas na decisão recorrida, e cuja inconstitucionalidade tenha sido suscitada pelo recorrente durante o processo.
A Constituição da República e a Lei do Tribunal Constitucional atribuem a este um controlo da constitucionalidade de normas jurídicas, e não das decisões judiciais em si mesmas. Como flui do disposto no artigo 280º, nº 1, alínea b), da Constituição, e do artigo 70º, nº
1, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional, o recurso de constitucionalidade há-de interpor-se de decisões judiciais que apliquem norma jurídica cuja inconstitucionalidade o recorrente haja suscitado durante o processo.
Claramente se conclui nos presentes autos
que a única questão de inconstitucionalidade que o recorrente alguma vez suscitou foi a da própria decisão recorrida, não de quaisquer normas jurídicas por ela aplicadas. É o próprio recorrente, aliás, a afirmar na resposta apresentada que sempre invocou que a 'decisão' ou o 'acórdão' recorrido violaram determinado preceito constitucional. E das alegações por ele apresentadas nas instâncias nada mais flui quanto à alegada questão de inconstitucionalidade.
6. É quanto basta para que se conclua que o recorrente não suscitou a inconstitucionalidade de qualquer norma jurídica durante o processo, o que leva a que se não possa conhecer do presente recurso de constitucionalidade por manifesta falta de pressupostos de admissibilidade.
III - DECISÃO
7. Nestes termos, decide-se não tomar conhecimento do recurso.
Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em oito unidades de conta.
Lisboa, 19 de Junho de 1997 Luís Nunes de Almeida Bravo Serra José de Sousa e Brito Messias Bento Guilherme da Fonseca Fernando Alves Correia José Manuel Cardoso da Costa