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Procº nº 252/97 Rel. Cons. Alves Correia
Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que figuram como recorrente A. e como recorrido o Ministério Público, pelo essencial dos fundamentos da Exposição do Relator de fls. 418-423 - à qual a recorrente não respondeu e que mereceu a concordância do recorrido -, decide-se não tomar conhecimento do recurso e condenar a recorrente em custas, fixando-se a taxa de justiça em cinco Unidades de Conta.
Lisboa, 15 de Julho de 1997 Fernando Alves Correia Luís Nunes de Almeida Bravo Serra José de Sousa e Brito Messias Bento Guilherme da Fonseca José Manuel Cardoso da Costa
Procº nº 252/97 Rel. Cons. Alves Correia
Exposição nos termos do artigo 78º-A da Lei do Tribunal Constitucional (Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, na redacção da Lei nº 85/89, de
7 de Setembro):
1. Por Acórdão da 7ª Vara Criminal do Círculo de Lisboa, de 19 de Dezembro de 1995, foi A. condenada a 4 anos de prisão por, em conjugação com outro arguido, ter cometido um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punido no nº 1 do artigo 21º do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro.
Interposto, pela arguida, recurso de tal decisão, com fundamento na violação do disposto nos artigos 31º daquele diploma legal e 40º, 50º, 72º e 73º do Código Penal de 1995 - o primeiro respeitante à atenuação ou dispensa de pena, o segundo relativo aos fins das penas, o terceiro referente à suspensão da execução da pena de prisão e os dois últimos dispondo sobre a atenuação especial da pena - veio o Supremo Tribunal de Justiça, por Acórdão de 16 de Janeiro de
1997, a negar-lhe provimento, confirmando integralmente o acórdão recorrido.
2. Ainda inconformada, apresentou a arguida recurso para este Tribunal, com fundamento na recusa de aplicação dos normativos supra referidos, ao abrigo do disposto na alínea a) do nº 1 do artigo 280º da Constituição e da alínea a) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional (Lei nº 28/82, de 15 de Novembro), porquanto, como escreveu, 'sendo o Direito Criminal verdadeiro Direito Constitucional aplicado', a recusa de aplicação daquelas normas terá violado 'o princípio da proporcionalidade e adequação das penas previsto no artigo 18º, nº 2, da Constituição da República Portuguesa'. Do mesmo passo, solicitou a concessão de 'apoio judiciário na modalidade de isenção do pagamento de preparos, custas, Imposto de Justiça, e demais encargos judiciais'.
3. Por despacho de 24 de Abril de 1997, foi o recurso admitido - e indeferido o pedido de apoio judiciário, com fundamento em que 'os recursos para o Tribunal Constitucional são isentos de custas, salvo situações que se não colocam na presente fase processual - cfr. artigo 84º, nº 1, da Lei nº 28/82, de
15.11'.
Saliente-se, no entanto, que, nos termos do nº 2 deste artigo, haverá condenação em custas quando o Tribunal não tomar conhecimento do recurso, por não verificação de qualquer pressuposto da sua admissibilidade.
In casu, é uma decisão de não conhecimento do recurso que se preconiza, justamente pela inverificação dos respectivos pressupostos.
4. Nos termos do nº 3 do artigo 76º da Lei do Tribunal Constitucional, a decisão que admita o recurso não vincula este Tribunal, pelo que haverá sempre que proceder à reaferição dos pressupostos do recurso interposto. No caso sub judicio, foi este intentado ao abrigo do disposto na alínea a) do nº 1 do artigo 280º da Constituição e da alínea a) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, pelo que, além dos requisitos gerais, hão-de estar preenchidos dois requisitos específicos deste tipo de recurso: a formulação de um juízo de inconstitucionalidade de uma norma jurídica e a desaplicação ou recusa de aplicação dessa norma jurídica na decisão sob recurso, com fundamento na sua inconstitucionalidade. Isto mesmo resulta
do Acórdão nº 350/92 (publicado no Diário da República, II Série, de 16 de Março de 1993), onde se sublinha que 'só se abre a via do recurso para o Tribunal Constitucional, com base na recusa de aplicação de uma norma jurídica, se o tribunal a quo tiver rejeitado, com fundamento na sua inconstitucionalidade, a aplicação ao caso concreto do conteúdo ou do regime jurídico constante de uma determinada norma jurídica' (cfr. também o Acórdão nº
206/92, publicado no Diário da República, II Série, de 12 de Novembro de 1992). Ora, no caso vertente, verifica-se que o acórdão recorrido não formulou um juízo de inconstitucionalidade para respaldar a não aplicação das normas que a recorrente quer ver apreciadas sub specie constitutionis. De facto, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, aqui sob recurso, detendo-se especificamente sobre os artigos invocados pela recorrente, considerou que, em relação ao disposto no artigo 31º do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro, 'a actuação da arguida
(...) não se enquadra em qualquer daquelas situações típicas' (as recortadas nesse normativo) - o que, por implicar aplicação de uma pena cujo limite mínimo
é de 4 anos, também logo afasta a aplicação do disposto no nº 1 do artigo 50º do Código Penal. Por sua vez, o disposto no artigo 72º do mesmo Código não seria aplicável, por 'as circunstâncias que efectivamente depõem a favor da arguida' não diminuirem 'de forma acentuada a ilicitude do facto, a sua culpa ou a necessidade da pena', como o exige a previsão da norma.
5. Em suma: a recusa de aplicação das normas invocadas pela recorrente não teve por base um juízo de inconstitucionalidade, que caberia ao Tribunal Constitucional reapreciar, mas sim um juízo hermenêutico, que escapa inteiramente ao controlo deste Tribunal. Assim, o recurso interposto ao abrigo da alínea a) do nº 1 do artigo 280º da Constituição e da alínea a) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, porque não preenche os pressupostos específicos da sua admissibilidade, deveria ter sido indeferido pelo tribunal a quo, nos termos do nº 2 do artigo 76º da Lei do Tribunal Constitucional. Não o tendo sido, não deve o Tribunal Constitucional dele conhecer.
6. Acrescente-se que a pretensão da recorrente nunca poderia ser satisfeita através da convolação do recurso de uma alegada, mas inexistente, decisão positiva de inconstitu- cionalidade (a resultante de um juízo de inconstitucionalidade formulado pelo Tribunal a quo) no recurso de uma decisão negativa de inconstitucionalidade (a resultante da aplicação de uma norma impugnada com fundamento em inconstitucionalidade), pois tal seria juridicamente inadmissível, por implicar uma alteração completa do quadro jurídico sob apreciação. Mas, ainda que tal operação fosse juridicamente admissível, ela nunca poderia ter lugar no caso concreto, já que não houve invocação da inconstitucionalidade de qualquer norma durante o processo. Assim, também restariam inverificados os pressupostos para interpor um recurso ao abrigo do disposto na alínea b) do nº 1 do artigo 280º da Constituição e da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional.
7. Ouçam-se as partes, por cinco dias, nos termos da parte final do nº 1 do artigo 78º-A da Lei do Tribunal Constitucional.
Lisboa,