Imprimir acórdão
Processo n.º 757/04
2.ª Secção Relator: Conselheiro Paulo Mota Pinto
Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:
1.Notificado do Acórdão n.º 723/2004, deste Tribunal, que negou provimento ao recurso de constitucionalidade por ele interposto do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 13 de Maio de 2004, veio A. “expor e requerer” o seguinte:
«O objecto do presente recurso é a inconstitucionalidade material do art.º
1349.º, n.º 1, do Código Civil na interpretação de que aquele que está interessado em levantar uma construção (nova) pode levantar andaime e/ou colocar objectos sobre prédio alheio e/ou fazer passar por ele materiais para a obra. O douto acórdão de fls. decidiu não julgar inconstitucional o art.º 1349.º, n.º
1, do Código Civil, interpretado no sentido de permitir a quem pretende levantar construção nova levantar andaime, colocar objectos sobre prédio alheio, e fazer passar por ele os materiais para a obra, se tais actos forem indispensáveis para a construção (o negrito é do signatário). Tal decisão suscita dúvidas ao recorrente, porquanto nada se diz, pelo menos expressamente, sobre a constitucionalidade do preceito em causa quando os actos referidos não sejam indispensáveis para a construção. Torna-se, pois, no entender do recorrente que o recorrente seja esclarecido
[sic], no sentido de – e só assim se pronunciará totalmente sobre o objecto do recurso – se se entendeu que o art.º 1349.º, n.º 1, do Código Civil é, ou não, inconstitucional, na interpretação de permitir os actos ali referidos, quando os mesmos não forem indispensáveis para a construção.
É o que se requer, com invocação do disposto nos art.ºs 669.º, n.º 1, alínea a), e 716.º, n.º 1, do CPC, aplicáveis por força do art.º 69.º da Lei n.º 28/82.» Notificada para se pronunciar, a recorrida concluiu que o “pedido de esclarecimento formulado não tem qualquer fundamento e apenas se pode compreender numa estratégia de entorpecimento da justiça, procurando a todo o custo impedir a formação de caso julgado e assim prolongar o prejuízo da Requerida ora Recorrida”, dessa conduta devendo, no entender da recorrida, este Tribunal “extrair as devidas consequências”. Cumpre decidir.
2.Adianta-se, desde já, que quer o pedido de aclaração formulado, quer a arguição de nulidade, aparentemente nele implícita, carecem de qualquer fundamento. Na verdade, o acórdão reclamado decidiu não julgar inconstitucional “o artigo
1349º, n.º 1, do Código Civil, interpretado no sentido de permitir a quem pretende levantar construção nova levantar andaime, colocar objectos sobre prédio alheio, e fazer passar por ele os materiais para a obra, se tais actos forem indispensáveis para a construção”. Ora, pode ler-se nesse artigo 1349.º, n.º 1, do Código Civil que “se, para reparar algum edifício ou construção, for indispensável levantar andaime, colocar objectos sobre prédio alheio, fazer passar por ele os materiais para a obra ou praticar outros actos análogos, é o dono do prédio obrigado a consentir nesses actos” (itálico aditado). É, pois, a própria lei a exigir a indispensabilidade dos actos em questão, o que se sublinhou também no acórdão reclamado, sendo de duvidar que a dita
“interpretação” que o reclamante alega, agora, também ter pretendido ver apreciada pelo Tribunal Constitucional – não apenas a referente à inclusão naquela norma dos casos de levantamento de nova construção, mas também a de os actos nela referidos não serem indispensáveis – possa, de todo, caber nessa disposição. Seja, porém, como for quanto a este ponto, e decisivamente, o certo é que o acórdão ora reclamado começa logo por uma transcrição do acórdão do Tribunal da Relação recorrido na qual se afirma que, para a realização das obras de acabamento do prédio vizinho, a recorrida “necessita de utilização do prédio do agravante”, e se diz ainda, mais à frente, nada haver “na alegação do agravante que justificasse uma recusa à pretendida, necessária e legal utilização pela agravada do prédio do agravante com vista à realização das citadas obras”. É, pois, manifesto que a interpretação sobre a qual o reclamante pretende agora que o Tribunal Constitucional se pronuncie – fundamentando o pedido de esclarecimento e a implícita arguição de nulidade na falta de pronúncia sobre ela –, relativa à não indispensabilidade dos actos em questão para o levantamento de nova construção, para além de não ter cabimento na letra da lei, não foi aplicada pelo tribunal recorrido. Sobre ela não só não tinha, como não podia, pois, o Tribunal Constitucional pronunciar-se no presente recurso de constitucionalidade. E tudo isto resulta claramente do acórdão reclamado, no qual se transcreveu a passagem relevante do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa recorrido e se sublinhou a exigência, constante da lei e desse acórdão, de que os actos questionados fossem indispensáveis para a obra. Admitindo-se embora que o comportamento do reclamante, ao deduzir a presente reclamação, só por si não constitui indício de má fé processual, o certo é que a presente reclamação tem, portanto, de ser desatendida.
3.Pelos fundamentos expostos, o Tribunal Constitucional decide desatender a presente reclamação e condenar o reclamante em custas, com 15 (quinze) unidades de conta de taxa de justiça.
Lisboa, 26 de Janeiro de 2005 Paulo Mota Pinto Maria Fernanda Palma Mário José de Araújo Torres Benjamim Rodrigues Rui Manuel Moura Ramos
[ documento impresso do Tribunal Constitucional no endereço URL: http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20050049.html ]