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Processo nº 628/96 Plenário Relator: Cons. Guilherme da Fonseca
Acordam no Plenário do Tribunal Constitucional:
1. A recorrente A., com os sinais identificadores dos autos, notificada do acórdão nº 331/97, a fls 330 e seguintes, veio 'requerer a REFORMA' desse aresto, invocando o artigo 669º, nº 2, a) e b), do Código do Processo Civil
(versão de 1995/1996), e adiantando, em síntese, as seguintes razões:
- a norma do artigo 83º, nº 2, do Decreto-Lei nº 845/76, de 11 de Dezembro, 'foi julgada inconstitucional pelos Acórdãos fundamento' e 'o mesmo preceito foi julgado constitucional pelos Acórdãos recorridos': 'a norma ou é constitucional ou inconstitucional', não podendo relevar a perspectiva com que ela pode ser vista.
- 'Mas, mais do que isso, o que está em causa é a actualização ou não actualização do montante indemnizatório expropriativo e não a 'perspectiva em planos distintos'...', sendo que, 'entre a data da publicação da DUP e a fixação judicial do quantum indemnizatório medeia sempre um lapso de tempo durante o qual se avilta o valor da moeda e, se essa circunstância não for tida em consideração, daí resultam prejuízos para o expropriado' ('Por isso no caso em apreço entende-se que a actualização deverá fazer-se a partir, pelo menos, da decisão da 1ª instância').
- É, assim, indubitável que a preterição da regra da actualização a influir no cálculo do montante da indemnização significa, de todo em todo, uma violação grave da norma constitucional da 'justa indemnização'/artº 62º da Lei Fundamental', e, em consequência, 'a interpretação feita com base no disposto no artº 805º/3 do Cód. Civil é inconstitucional, por ofender os princípios constitucionais ínsitos nos artºs 13º/1 e 62º/2 da Lei Fundamental e o artº 23º do DL 438/91'.
E conclui a recorrente o requerimento deste modo:
'Termos em que deve ser reformado o Acórdão por violação de lei expressa e já constarem do processo documentos/elementos que, só por si, implicam necessariamente decisão diversa da proferida e que VV Exªs, por lapso manifesto, não tomaram em consideração.
Doutra forma, há déficit intelectual na arquitectura dos Acórdãos recorridos'.
2. Em resposta veio o Ministério Público dizer que 'deverá ser naturalmente julgado improcedente o pedido de reforma deduzido', pois a recorrente 'persiste teimosamente em recolocar sistematicamente à apreciação deste Tribunal questões já perfeitamente decididas e arrumadas', sendo manifesto que 'a questão que agora vem recolocar - e traduzida na 'actualização da indemnização' que pretende ser-lhe devida - ao abrigo do preceituado no nº 2 do artigo 669º do Código de Processo Civil, não tem sequer sentido enquanto reportada ao acórdão de que reclama - o proferido pelo Plenário deste Tribunal - que se limitou a dirimir questão estritamente procedimental, traduzida na manifesta inexistência dos pressupostos de admissibilidade do recurso a que alude o artigo 79º-D da Lei nº 28/82.'.
3. Vêm os autos à conferência, com dispensa de vistos.
A faculdade de requerer a reforma da sentença - aqui o citado acórdão nº
331/97 - foi estendida com o artigo 669º a mais duas hipóteses, na versão actual e vigente do Código de Processo Civil (redacção dos Decretos-Leis nºs 329-A/95, de 12 de Dezembro, e 180/96, de 25 de Setembro), assentando ambas - suposto que tal versão é aplicada in casu (cfr. artigos 6º do Decreto-Lei nº 180/96, que aditou o artigo 25º ao Decreto-Lei nº 329-A/95) - em 'manifesto lapso do juiz', quer 'na determinação da norma aplicável ou na qualificação jurídica dos factos'
(alínea a) do nº 2), quer quando 'constem do processo documentos ou quaisquer elementos que, só por si, impliquem necessariamente decisão diversa da proferida', por não terem sido tomados em consideração (alínea b) do nº 2).
No preâmbulo do Decreto-Lei nº 329-A/95 regista-se como 'de largo alcance' aquela norma e justifica-a assim o legislador:
'Destarte, sempre na preocupação de realização efectiva e adequada do direito material e no entendimento de que será mais útil, à paz social e ao prestígio e dignidade que a administração da justiça coenvolve, corrigir que perpetuar um erro juridicamente insustentável, permite-se, embora em termos necessariamente circunscritos e com garantias do contraditório, o suprimento do erro de julgamento mediante a reparação da decisão de mérito pelo próprio juiz decisor, ou seja, isso acontecerá nos casos em que, por lapso manifesto de determinação da norma aplicável ou na qualificação jurídica, a sentença tenha sido proferida com violação de lei expressa ou naqueles em que dos autos constem elementos, designadamente de índole documental, que, só por si e inequivocamente, impliquem decisão em sentido diverso e não tenham sido considerados igualmente por lapso manifesto. Claro que, para salvaguarda da tutela dos interesses da contraparte, esta poderá sempre, mesmo que a decisão inicial o não admitisse, interpor recurso da nova decisão assim proferida' (com o Decreto-Lei nº 180/96 acrescentou-se o nº 3 e deixou de falar-se quanto à alínea a) em 'violação de lei expressa').
Sendo notoriamente deslocada in casu a invocação da alínea b) nº 2, por não referir ou identificar idoneamente a recorrente elementos, nomeadamente de
índole documental que, 'só por si e inequivocamente, impliquem decisão em sentido diverso e não tenham sido considerados igualmente por lapso manifesto', talqualmente se expressa o legislador de 1995, a hipótese possível só poderia ter eventualmente cabimento na alínea a) do mesmo nº 2.
Mas aí também é indispensável que se demonstre, à luz da 'realização efectiva e adequada do direito material', que se cometeu 'um erro juridicamente insustentável', para ser suprido com a reparação da decisão de mérito pelo juiz ou pelo colectivo de juízes, conforme os caos.
Ora, nem a recorrente faz essa demonstração, nem se revela o tal 'erro juridicamente insustentável', qualquer que ele seja, de modo a poder dizer-se que houve da parte do acórdão em causa violação de lei expressa, por lapso manifesto de determinação da norma aplicável ou na qualificação jurídica dos factos.
O que se detecta, aliás, é o propósito da recorrente de recolocar de novo a discussão da conformidade constitucional do citado artigo 83º, nº 2, do Decreto-Lei nº 845/76, repondo sempre a temática da 'actualização ou não actualização do montante indemnizatório expropriativo' (e deslocando-a até para o terreno da 'interpretação feita com base no disposto no artº. 805º/3/ do Cód. Civil', que, em seu entender, seria inconstitucional).
A tudo isto já se respondeu nos autos com os acórdão nºs 1128/96 e
23/97, não podendo agora repor-se a discussão, pois esgotou-se já o poder jurisdicional deste Tribunal Constitucional (artigo 666º do Código de Processo Civil), e, além disso, o acórdão de que se pretende a reparação, tal como se posiciona a recorrente, limitou-se a confirmar o despacho do relator que não admitiu o recurso interposto para o Plenário do Tribunal (nada mais do que isso, confinando-se 'a dirimir a questão estritamente procedimental', como regista o Ministério Público na sua resposta).
Em suma: inexistindo fundamento para reformar o acórdão nº 331/97, a fls.
330 e seguintes dos autos, pois não se demonstra nenhum lapso manifesto que envolva erro de julgamento, é totalmente infundado o pedido da recorrente.
4. Termos em que, DECIDINDO, indefere-se o pedido de reforma do acórdão nº 331/97 e condena-se a recorrente nas custas, com a taxa de justiça fixada em trinta unidades de conta. Lisboa, 27 de Maio de 1997 Guilherme da Fonseca Bravo Serra Messias Bento Antero Alves Monteiro Diniz Fernanda Palma Assunção Esteves Vítor Nunes de Almeida Armindo Ribeiro Mendes Luís Nunes de Almeida