Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Jurisprudência da Relação Criminal
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 - ACRL de 12-03-2009   Crime de ameaças. Elementos constitutivos. Bens jurídicos protegidos.
I .O tipo de ilícito configurador da proibição de limitar ou condicionar a liberdade e a capacidade de decisão de um individuo, confere ao crime de ameaças a morfologia de um ilícito em que o legislador visa tutelar a liberdade da pessoa enquanto sujeito socialmente vinculado mas, do mesmo passo, individualmente detentor de um direito de não ser condicionado por factores exteriores à formação livre da sua capacidade de agir e de se movimentar sem restrições de qualquer espécie que não sejam a vinculação a um dever-social e juridicamente prevalente.
II. A acção ou acto de ameaçar traduz-se numa prefiguração ou anúncio de assumpção e execução de um facto contrário à capacidade de determinação e de decisão de alguém e susceptível de afectar, no futuro, bens pessoais, como a vida, a integridade física, a liberdade pessoal, a liberdade e autodeterminação sexual ou bens patrimoniais de elevado valor.
IV.Para o preenchimento do tipo objectivo descrito na norma incriminadora, exige-se que a ameaça contra alguém contenha em si uma aptidão mobilizadora adequada a provocar medo ou inquietação: a) que corresponda a um mal, seja de natureza pessoal, seja de natureza patrimonial; b) que o mal objecto da ameaça seja futuro, não podendo ser um mal actual ou iminente, porque neste caso estar-se-á perante uma tentativa de execução do respectivo mal; c) que a sua ocorrência dependa da vontade do agente.
V.Não se exige, no entanto, que a ameaça provoque medo ou inquietação. Antes necessário se torna que seja adequada a provocar um estado de temor ou medo capaz de constranger, de forma reputada relevante, a paz individual ou a liberdade de determinação da pessoa visada. O futuro mal anunciado pelo sujeito activo há revelar-se apto para, numa avaliação objectiva, se configurar como condicionador da liberdade de determinação da pessoa alvo da ameaça e subjectivamente idóneo a inculcar no visado um estado de medo e inquietação constrangedora da sua normal e fluente forma de agir.
VI.O critério da adequação da ameaça a provocar medo ou inquietação é objectivo-individual, devendo ser interpretado no sentido de que deve considerar-se adequada a ameaça que, tendo em conta as circunstâncias em que é proferida e a personalidade do agente, é susceptível de intimidar ou intranquilizar qualquer pessoa.
VII.O mal ameaçado, ou seja, o anúncio de um mal, tem de constituir, obrigatoriamente, crime (facto ilícito típico).
VIII. Os olhares fixos em lugares públicos não reúnem, por si só, a virtualidade de constituírem “ameaça de um mal futuro”, não encerram em si anúncio de um mal, não têm a potencialidade de influenciar negativamente o normal agir e estar de um cidadão e de lhe perturbar o quotidiano.
Proc. 628/02.4PCCSC.L 3ª Secção
Desembargadores:  Rui Gonçalves - Conceição Gonçalves - -
Sumário elaborado por Ivone Matoso