Proc. 1512/09.6YRLSB 5ª Secção
Desembargadores: Pulido Garcia - - -
Sumário elaborado por João Ramos
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Proc. 1512/09.6YRLSB
No Processo NUIPC 1295/07.4PCAMD, foi, por despacho do Exm.º Juiz da 5.ª Vara Criminal de Lisboa, proferido a 25 de Maio de 2009, esse Tribunal declarado incompetente para proceder ao julgamento do arguido, identificado nos autos, e declarado competente, para o efeito, o Tribunal da Comarca da Grande Lisboa Noroeste (Juízo de Grande Instancia Criminal) - (despacho esse que aqui se tem como reproduzido; cfr. fls. 5-6 destes autos).
Remetidos os autos, e feita a sua distribuição, pelo Exm.ª Juiz da 2.ª secção – Juiz 4, da Comarca da Grande Lisboa-Noroeste – Sintra - Juízo Grande Inst. Criminal - foi proferido despacho no qual se entendeu ser competente para julgamento a 5.ª Vara Criminal de Lisboa (despacho esse que aqui se tem como reproduzido; cfr. fls. 7-8 destes autos).
Ambos os despachos daqueles Exm.°s Magistradas, em conflito, transitaram em julgado.
Gerou-se, assim, um conflito negativo de competência (art.º 34' do C.P.P.) que há que ver solucionado, em obediência ao estipulado nos art.°s 35.° e 36.° do C.P.P. (na redacção resultante da Lei n.° 48/2007, de 29/8), para o que esta Relação, nos termos do art.º 11% n.° 5, a), do C.P.P. (na redacção resultante da Lei n.° 48/2007, de 29/8), dispõe de competência.
Observado o disposto no art.º 36.°, n.° 1 do aludido Código, a Exm.ª Procuradora-Geral Adjunta(1) emitiu esclarecido parecer, como é seu hábito (cfr.fls.13-14), e mais nenhuma outra alegação foi apresentada.
Compulsando os presentes autos, além do atrás descrito, resulta dos mesmos o seguinte:
- Os autos tiveram inicio a 28.12.2007, por denúncia de factos ocorridos na Damaia, Amadora, à data comarca de Lisboa;
- A acusação foi deduzida a 26.3.2009 e os autos remetidos para distribuição pelas Varas Criminais de Lisboa a 18.5.2009 e distribuídos à 5.ª Vara a 21.5.2009.
Do que vem de ser referido retira-se que a questão controvertida, de cuja resolução há-de sair a decisão do presente conflito negativo de competência, se consubstancia no seguinte:
- Dentro do circunstancialismo supra descrito, a qual dos dois Tribunais em conflito caberá proceder, no identificado processo, ao julgamento do arguido, na sequência da acusação contra o mesmo deduzida a 26-3-2009, face à entrada em vigor em 14-4-2009, do D.L. no 25/2009, de 26/1 e ao disposto no art.º 52% no 1 deste diploma legal?
A Exma. Procuradora-Geral Adjunta, no seu douto parecer, e reflectindo a posição do M.º P.° nesta Relação, aponta para que a competência seja deferida à 5.ª Vara Criminal de Lisboa.
Em abono da tese que defende, adere à posição expressa pelo Exm.º Juiz da 2.ª secção – Juiz 4, da Comarca da Grande Lisboa-Noroeste, e aduz que é seu entendimento
'... tendo o art.52°., n°. 1 do DL n°. 25109) de 26.01 restringido as hipóteses de transição de processos para as comarcas-piloto aos casos `expressamente' previstos naquele referido diploma e não tendo as situações da natureza daquela que ora nos ocupa sido contempladas na previsão, a consequência jurídica a extrair é a de considerar não ser de fazer transitar o respectivo processo para a comarca da Grande Lisboa-Noroeste, mantendo-se a competência da comarca de Lisboa, onde o mesmo pendia à data da entrada em vigor do diploma em referência.
Acrescentar-se-á, na linha de múltiplas decisões jurisprudenciais — designadamente as tomadas na sequência do alargamento da competência territorial da comarca de Loures (quando esta passou a ter jurisdição sobre Odivelas e Sacavém) e dos conflitos de competência então ocorridos que vieram a ser apreciados e decididos por este Tribunal da Relação de Lisboa -, ser de entender que a acção penal se inicia no momento em que a autoridade toma conhecimento do acto ilícito pelo que a data relevante para a fixação da competência territorial é a do início do processo, correspondente à data do inicio do inquérito (cfr. nesse sentido, entre muitos outros, os ACRL de 16.01.03, P.9383/02-9, Rel.:- Nuno Gomes da Silva, ACRL de 13.04.00, P1501/00-9, ACRL de 25.05.00, P.3079/00, ACRL de 18.02.97, CJ 1/97, 160 e ACSTJ de .03,10:1990, BMJ 400, 544), pelo que, salvo melhor opinião, não deverá ser seguido outro entendimento senão o de que o processo a que respeita o presente conflito se encontrava pendente na comarca de Lisboa e deverá, consequentemente, prosseguir termos na mesma comarca, tendo presentes os comandos legais acima apontados. '
Vejamos:
Ambos os tribunais em conflito, para negarem a sua própria competência para a tramitação e julgamento do processo em causa, reportam-se ao momento em que, para tal fim, e em seu critério, se deve ter como fixada a competência, nos termos e para efeitos do disposto no art.° 24.° da Lei n.° 52/2008, de 28/02(2), que aprova a nova Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais.
Enquanto para a 5.ª Vara Criminal a competência se fixou apenas no momento da distribuição, para o Juízo da Grande Instância Criminal a competência fixara-se já aquando da instauração do inquérito.
2. Lei reguladora da competência
1 – A competência fixa-se no momento em que a acção se propõe, sendo irrelevantes as codificações de facto que ocorram posteriormente.
2 – São igualmente irrelevantes as modificações de direito, excepto se for suprimido o órgão a que a causa estava afecta ou lhe for atribuída competência de que inicialmente carecesse para o conhecimento da causa. '
Constitui regra geral a de que é territorialmente competente para conhecer de um crime o tribunal em cuja área se tiver verificado a consumação - art. 19°, n° 1, do CPP.
No caso em análise, os factos ilícito-criminais ocorreram na área da comarca de Lisboa, aqui tendo sido instaurado o respectivo inquérito.
Ora, em processo crime, o início do inquérito corresponde à propositura da acção, nesse momento se fixando a competência, sendo irrelevantes as modificações de facto ocorridas posteriormente – art.° 24°, n° 1, da Nova LOFTJ (correspondente ao art.° 22°, n° 1, da precedente LOFTJ) – como igualmente o são as modificações de direito, excepto se for suprimido o órgão a que a causa estava afecta ou lhe for atribuída competência de que inicialmente carecesse para o conhecimento da causa – art.° 240, n° 2, da mesma Lei.
Com a aquisição, pelo M°P°, da notícia do crime e a instauração do correspondente inquérito na comarca de Lisboa, fixara-se, pois, a competência desta comarca, no caso, e devido à distribuição efectuada, da 5.ª Vara Criminal.
Por imperativo da proibição do desaforamento, só se o caso estivesse expressamente previsto na lei, poderia o processo em causa ser deslocado do tribunal territorialmente competente para outro – art° 25° da Nova LOFTJ (correspondente ao art.º 23° da anterior LOFTJ).
Tal, porém, não acontece, inexistindo qualquer disposição legal que permita alterar a competência territorial fixada com a instauração do inquérito. Pelo contrário, o legislador de 2008 (tal como o de 1999) teve a preocupação de afirmar claramente o principio de que
'a competência se fixa no momento em que a acção se propõe' (art° 24°, n° 1), explicitando no art.º 52.º, n° 1, do D.L. n.° 25/2009, de 26/1 que
'Salvo nos casos expressamente previstos no presente decreto-lei, não transitam para os novos juízos quaisquer processos pendentes.'
E os casos expressamente previstos mostram-se indicados no art.° 32.0, desse diploma, referindo o seu n.° 3:
'-Transitam para o Juízo de Grande Instancia Criminal de Sintra, à data da instalação do mesmo, os processos que, cabendo no âmbito da sua competência, se encontrem pendentes:
Nas varas com competência mista cível e criminal do Tribunal da Comarca de Sintra;
No Tribunal da Comarca de Mafra.'
Assim, no caso concreto, a recomposição da área das comarcas de Lisboa e Grande Lisboa-Noroeste – com a atribuição, a partir da instalação do Tribunal desta última, a 14/4/2009, à mesma, da área do Município da Amadora, até então inserida na comarca de Lisboa, nenhuma consequência produz na questão da competência territorial para o conhecimento do processo em causa, uma vez que, anteriormente àquela data, o crime indiciado se havia consumado em área então pertencente à comarca de Lisboa e a competência desta comarca se fixara com a aquisição da noticia das infracções pelo M°P° e a instauração do inquérito correspondente.
Além dos arestos referidos pela Exma. P.G.A. cabe salientar que neste mesmo sentido apontou o STJ (embora no domínio da anterior legislação), no Ac. de 28/3/90 (CJ; XV, T. II, p. 16), bem como no Ac. de 9/5/90, in AJ, n° 9, p. 6, cit. por Maia Gonçalves, 'CPP Anot.', 98 ed., p. 129), de cujo sumário se extrai:
'(...) Tendo começado a correr um processo no tribunal então territorialmente competente, e havendo entretanto o local da consumação do crime passado a integrar-se em outra comarca, permanece a competência do primeiro tribunal para conhecer do crime (...)'.
Aliás, assim se decidiu já nesta Relação em caso de idênticos contornos – Despacho de 14/9/2009 da Exma. Desembargadora Presidente da 9a Secção, Proc°. n°. 1469/09.3YRLSB.
E, por o acerto de tal interpretação nos surgir evidente perante a uniformidade da jurisprudência, a clareza dos normativos aplicáveis e as circunstancias do caso, outro não pode ser, pois, o nosso entendimento e a nossa decisão.
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Pelo exposto, e sem a necessidade de maiores considerações: Dirime-se o presente conflito negativo julgando-se competente para o julgamento do aludido processo a 5.ª Vara Criminal de Lisboa.
Observe-se o disposto no art.º 36°, n.° 3, do C.P.P. (na redacção resultante da Lei n.° 48/2007, de 29/8).
Não é devida taxa de justiça.
(Processado e revisto pelo subscritor.)
Lx. 28-9-2009 a) Pulido Garcia
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(1) - Drª. Lucília Gago.
(2) - 'Lei reguladora da competência
1 - A competência fixa-se no momento em que a acção se propõe, sendo irrelevantes as modificações de facto que ocorram posteriormente.
2 - São igualmente irrelevantes as modificações de direito, excepto de for suprimido o órgão a que a causa estava afecta ou lhe for atribuída competência de que inicialmente carecesse para conhecimento da causa'.