Ao recurso interposto de decisão que indefere produção de prova apresentada na contestação, deve (face ao disposto no nº1 do artº 407º, a contrario, do CPP) ser fixado o regime de subida deferida, a subir com o recurso que vier a ser interposto da decisão final.
Proc. 2887/07.7TDLSB-A.L1 3ª Secção
Desembargadores: Fernando Correia Estrela - - -
Sumário elaborado por Ivone Matoso
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Proc.º n.º 2887/07.7TDLSB-A.L1
3.ª Secção
Decisão sumária.
I - No Proc. n.º 2887/07.7TDLSB-A do 2º Juízo Criminal de Lisboa, por despacho de 20 de Novembro de 2008, foi decidido, nomeadamente:
'…no concernente à prova documental pretendida, através do tribunal, suscitada na sequência da contestação apresentada [pela arguida A], indefere-se a mesma, porquanto ela é irrelevante e juridicamente inadmissível considerando, nomeadamente os princípios subjacentes ao objectivo e legalidade da prova (art. 124° e 125° do CPP).
A prova documental requerida pela arguida está discriminada a fls. 76 desta certidão e traduz-se no que se segue :
-' em que seja oficiado à Direcção do DIAP de Lisboa para informar do número de participações efectuadas por elementos do M°P° desde 2003 até à presente data, contra que agentes e quais os crimes em causa;
-seja oficiada à PGR para informar se deu entrada alguma participação efectuada pela Ex' Sr° M contra o bastonário da Ordem dos Advogados pela comparação dos magistrados com a PIDE/DGS'.
II - Inconformada com aquele despacho de indeferimento a arguida A interpôs recurso em 18.12.2008, pugnando pela admissibilidade da prova requerida e ordenada a sua produção.
III - O recurso foi admitido a fls. 25, nos seguintes termos:
Por estar em tempo, ter legitimidade e a decisão ser recorrível, admito o recurso interposto.
O recurso sobe em separado, imediatamente e tem efeito não suspensivo (art.º 406.º/2,407.º/1, e 408 n.º 3 a contrario).
IV – Decidindo.
1. Foi fixado ao recurso o regime de subida imediata e efeito devolutivo.
Nos termos do artº 414º, nº 3, do C.P.P., a decisão sobre o regime de subida do recurso não vincula o tribunal superior, pelo que pode este tribunal alterar o momento de subida do mesmo e é precisamente isso que se fará na presente decisão sumária, verificando-se, assim, uma circunstância que obsta ao conhecimento do recurso (artº 417º, nº 6, al. a), do C.P.P..)
O recurso interposto de decisão que indefere produção de prova apresentado na contestação, deve ser fixado o regime de subida deferida, a subir com o recurso que vier a ser interposto da decisão final, face ao disposto no n°1 do art. 407°- a contrario - do CPP.
No sentido ora propugnado quanto ao efeito a fixar ao recurso em apreciação, decidiu-se designadamente no acórdão do TRE de 12.12.1995 (recurso n° 701/1995,relator Políbio Flor, BMJ 452-509), com o seguinte sumário:
'Sobe a final com o recurso que for interposto da decisão que puser termo à causa o recurso interposto do despacho que indeferiu um requerimento do arguido formulado na contestação para a produção de prova'.
Nos termos do art. 407.º, n.º 1, do C. P. Penal, sobem imediatamente os recursos cuja retenção os tornaria absolutamente inúteis. Prevê-se neste n.º 1 uma cláusula geral. O n.º 2 da mesma disposição legal estabelece situações típicas e taxativas em que os recursos têm subida imediata. Por sua vez o n.º 3 da mesma disposição legal estabelece que, quando não deverem subir imediatamente, os recursos sobem e são instruídos e julgados conjuntamente com o recurso interposto da decisão que tiver posto termo à causa.
A situação sub judice é atípica, pois não se enquadra em qualquer uma das previstas taxativamente no n.º 2.
Vejamos então se a subida diferida do recurso o torna absolutamente inútil e, como tal, se deve subir imediatamente.
A jurisprudência e a doutrina têm entendido que a absoluta inutilidade dos recursos se verifica quando da sua retenção resulta a inexistência, no processo, de qualquer eficácia, na hipótese do seu provimento, ou seja, em situações em que, ainda que a decisão do tribunal superior seja favorável ao recorrente, não possa este aproveitar-se dessa decisão, aqui se incluindo os casos em que a retenção produza um resultado oposto ao efeito jurídico que o recorrente quis alcançar com a interposição do recurso, não se abarcando, consequentemente e por outro lado, os casos em que o provimento do recurso possa conduzir à inutilização ou reformulação de actos processuais entretanto praticados. Neste sentido, Ac. n.º 2008/93, do Tribunal Constitucional.
Como é referido no Ac. n.º 474/94 do Tribunal Constitucional de 28/06/1994, em que foi relator, Armindo Ribeiro Mendes, “fazendo a lei processual penal subir imediatamente apenas os recursos cuja utilidade se perderia em absoluto se a subida fosse diferida, obvia-se a que a tramitação normal do processo seja afectada por constantes envios do processo à segunda instância para apreciação de decisões interlocutórias e, por outro lado, pode vir a evitar-se o conhecimento de muitos destes recursos que podem ficar prejudicados no seu conhecimento pelo sentido da decisão final” (neste mesmo sentido vejam-se os acórdãos do Tribunal Constitucional n.ºs 964/96, 1205/96 e 104/98, in Base de dados jurisprudencial do site do site do Tribunal Constitucional).
Sendo assim, como é, a subida imediata há-de verificar-se nos casos em que, para além dos expressamente indicados no art.º 407º, n.º 2 Código de Processo Penal, a retenção do recurso o torne absolutamente inútil (n.º 1 do preceito).
“Mas isso só ocorre quando a eficácia do despacho de que se recorre produz um resultado irreversível oposto ao efeito jurídico pretendido, não abrangendo os casos em que a procedência do recurso acarrete a inutilização dos actos processuais praticados.
Uma coisa é a inutilização do recurso, outra será a inutilização dos actos processuais entretanto praticados, em caso de provimento daquele. Só a primeira situação é consagrada no n.º 2 do artigo 407.º” (Proc. n.º 8901/2004- www.dgsi.pt).
O recurso cuja retenção o torna absolutamente inútil é aquele que, seja qual for a solução que o tribunal superior lhe der, será completamente inútil no momento da apreciação diferida; quando, ainda que favorável ao recorrente, já nada lhe aproveita, por a demora na sua apreciação tornar irreversíveis os efeitos da decisão impugnada. Só deverá subir imediatamente o recurso cuja retenção lhe retirar qualquer eficácia, não se podendo confundir inutilidade absoluta do recurso com a eventual necessidade de repetição de diligências ou mesmo de anulação do processado, inclusive o próprio julgamento.
No caso sub judice, a não subida imediata do recurso e o eventual resultado favorável à recorrente resultante de decisão posterior pode ter repercussão no processo, ou seja, o recurso mantém eficácia, apesar da subida deferida, pois a recorrente ainda pode tirar benefícios da sua procedência.
Por outro lado, em sede de audiência de julgamento, o tribunal, oficiosamente ou a requerimento, determina a produção de todos os meios de prova cujo conhecimento se lhe afigure necessário à descoberta da verdade e à boa decisão da causa, nos termos do art. 340° do CPP, fase processual essa que se desconhece se já terminou ou sequer se já se iniciou.
É verdade que o conhecimento posterior do recurso e a sua eventual procedência podem dar azo a que tenham de repetir-se actos entretanto realizados, como pode acontecer, por exemplo, no caso de entretanto se realizar a audiência de julgamento e de os arguidos virem a ser condenados. Mas isso é uma consequência normal do conhecimento posterior de todos os recursos com subida diferida.
O legislador não desconhecia ao consagrar o regime parcimonioso de recursos, tentando a concordância prática de interesses antagónicos. Esse risco afigura-se como inerente à própria ponderação das exigências de celeridade processual, que é, também, um valor constitucional, sendo direito do arguido o de ser julgado “no mais curto prazo compatível com as garantias de defesa – n.º 2 do art. 32.º da CRP. E um alargamento das situações de recurso com subida imediata terá sempre como efeito a diminuição da celeridade processual.
Ora, no caso, a subida deferida do recurso e a sua posterior apreciação não tornam absolutamente inútil os efeitos da decisão impugnada. Com efeito, caso a decisão do recurso venha a ser favorável à arguida, mesmo depois da realização da audiência de julgamento e da prolação da sentença, tal decisão continua a ter utilidade, pois há sempre a possibilidade de, uma vez admitida a toda a prova da contestação, se repetir a audiência de julgamento e ser proferida uma nova decisão.
Assim sendo, entende-se não ser de aplicar o disposto no artº 407º, nº 1, do C.P.P., pelo que o recurso em causa deverá subir no termos do nº 3 do indicado artº 407º do C.P.P..
Deste modo, decide-se que o recurso tem subida deferida e, em consequência, não se conhece do objecto do mesmo.
2. Face ao exposto, não se conhece do recurso e determina-se que o mesmo suba apenas com o recurso que eventualmente venha a ser interposto da decisão que ponha termo à causa. Sem tributação. Notifique.
(Elaborado e revisto pelo relator - vd. art.º 94 º n.º 2 do C.P.Penal)
Lisboa, 12 de Março de 2010
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(Fernando Estrela, relator)