Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Jurisprudência da Relação Criminal
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 - ACRL de 08-09-2010   Crime de ofensa a pessoa colectiva, organismo ou serviço (artº 187º CP)– elementos típicos e inexistência de causa justificativa.
I. A incriminação prevista no artº 187º do CP é distinta e não pode ser confundida com a da «difamação» ou da «injúria» (artºs 180º e 181º do CP). O bem jurídico protegido não é a «honra», mas, antes, um bem jurídico heterogéneo que engloba a tutela da credibilidade, prestígio e confiança, cujo núcleo essencial se prende com a ideia de «bom nome».
II. Embora as pessoas colectivas também sejam titulares de honra e possam ser vítimas de crimes de difamação, no artº 187º tutela-se as ofensas à «credibilidade, prestígio e confiança» da pessoa colectiva, valores que, em bom rigor, não se incluem no bem jurídico protegido pela difamação e pela injúria, mas antes no «bom nome» da entidade abstracta.
III.O tipo objectivo do crime previsto no artº 187º do CP preenche-se com a afirmação ou divulgação de “factos inverídicos”, capazes de ofender a credibilidade, o prestígio ou a confiança, não abarcando a imputação de «juízos de valor» ofensivos, como sucede nos crimes de difamação e injúrias.
IV.A expressão de que os professores em manifestação lhe fazem “ lembrar os hooligans quando há uma disputa futebolística em causa”, reporta-se a um juízo de valor sobre a manifestação em causa, assemelhando o dissídio que então se verificava entre os professores e o Ministério da Educação a uma disputa futebolística em que os professores, ao manifestarem-se, se comportavam de modo violento, destrutivo e sem regras. Embora possa discordar-se deste modo de emitir opinião e até rejeitar-se a justeza da comparação feita, o certo é que a mesma se inscreve claramente no plano dos “juízos de valor” e estes, ainda que ofensivos da credibilidade, prestígio e confiança, não beneficiam da protecção penal do preceito incriminador ao abrigo do qual foi formulada a acusação.
V. Ao contrário, a afirmação que os autocarros em que os professores se deslocaram foram “alugados pelo partido X” assume um cariz eminentemente factual: a de que o aluguer daqueles autocarros foi pago pelo partido X. Esta afirmação é, em si, apta a ofender a credibilidade, prestígio e confiança que são devidos à associação sindical, na medida em que esta associação tem a obrigação de prosseguir uma actuação independente face aos partidos políticos, encontrando-se proibida de ser por eles financiada, e ainda porque resulta indiciariamente demonstrado que o facto afirmado é inverídico.
VI.Aquela afirmação, ao divulgar um facto inverídico, mostra-se ofensiva da credibilidade, do prestígio e da confiança daquela associação, pondo em causa, perante os associados, os professores em geral e a opinião pública, a autonomia da mencionada associação e a sua independência institucional e económica face às organizações partidárias.
VII. No caso dos crimes cometidos através da imprensa, o artº 30º da Lei nº2/99, determina a punição nos termos gerais da «publicação de textos ou imagens através da imprensa que ofenda bens jurídicos penalmente protegidos”. Assim, integrando o conceito de “imprensa”, para efeitos daquela lei, “todas as reproduções impressas de textos ou imagens disponíveis ao público, quaisquer que sejam os processos de impressão e reprodução e o modo de distribuição utilizado” (artº 9º, nº1), é manifesto que o crime a que se reporta o artº 187º do CP, pode ser cometido por meio de palavras escritas num artigo jornalístico publicado num jornal impresso.
VIII. Resultando dos autos que a afirmação que o arguido fez constar do escrito publicado, ofensiva do bom nome da assistente, não corresponde à verdade, sendo certo que, ao proferi-la, nada indiciava que tivesse fundamento para a reputar verdadeira (uma vez que se fundou numa mera suposição, sem qualquer outra base ou fundamento factual) não pode, neste contexto, invocar-se a liberdade de expressão ou de informação para considerar a conduta justificada. Assim sendo, a factualidade indiciariamente apurada autoriza o enquadramento jurídico-penal da conduta do arguido no âmbito do crime de ofensa a pessoa colectiva previsto no artº 30º, nº1 da Lei de Imprensa e 187º do CP, com a agravação prevista no artº 183º, nº2, deste diploma.
Proc. 4962/08.1TDLSB.L1 3ª Secção
Desembargadores:  Maria José Costa Pinto - Teresa Féria - -
Sumário elaborado por Ivone Matoso