I. O artº97º do Código do Notariado (aprovado pelo Dec.-Lei nº207/95, de 14/8) não contém a indicação da sanção que corresponde ao comportamento nele tipificado, limitando-se a remeter para um eventual «crime de falsas declarações perante oficial público», sendo certo que essa designação não corresponde ao conteúdo de qualquer incriminação do CP ou de qualquer legislação extravagante.
II. Os artºs 359º e 360º do CP incriminam apenas comportamentos desenvolvidos no âmbito de processos judiciais (incluindo nestes as diferentes fases do processo de contra-ordenação), e não quaisquer falsas declarações perante oficial público. Por esta razão, não é possível interpretar o artº97º do Código do Notariado como remetendo para estas normas do CP.
III. Acresce que o Código do Notariado foi aprovado no uso de poderes próprios do Governo e não mediante uma autorização legislativa que legitimasse a alteração da pena aplicável a um comportamento já incriminado no anterior Código do Notariado. Nessa medida, era-lhe permitido manter a anterior incriminação mas não lhe era permitido alterar a respectiva punição – o que manifestamente sucedeu.
IV. Não pode, pois, deixar de se considerar que o artº97º do actual Código do Notariado viola o princípio da legalidade penal consagrado no artº29º, nºs 1 e 3 da Constituição, razão pela qual não pode ser aplicado (artº204º da CRP).
Nota: interposto recurso para o Tribunal Constitucional, este no acórdão nº379/2012, de 12-07-2012 (acessível
aqui) julgou inconstitucional a norma do artº97º do Código do Notariado, por violação do artº29º, nº1 da CRP.
Proc. 66/08.5JAPDL.L1 3ª Secção
Desembargadores: Carlos Almeida - Telo Lucas - -
Sumário elaborado por Ivone Matoso