Proc. 5012/10.3TXLSB 5ª Secção
Desembargadores: Alda Tomé Casimiro - Cid Geraldo - -
Sumário elaborado por Ana Paula Vitorino
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Recurso Penal n° 5012/10.3TXLSB-M.LI
Recurso Independente em Separado - Processo n° 5012/10.3TXLSB-M - Tribunal de Execução das Penas de Lisboa - 1° Juízo
Acordam, em conferência, na 5a Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa,
Relatório
No âmbito do Processo com o n° 5012/10.3TXLSB-M que corre termos no 1° Juízo do Tribunal de Execução das Penas de Lisboa, foi ao recluso, (…), actualmente em cumprimento de pena,
feita a liquidação dessa mesma pena, com recusa de colocação em liberdade aos 5/6 pelos motivos constantes do respectivo despacho.
Não se conformando, o Ministério Público interpôs o presente recurso pedindo que se determine a aplicação ao caso do art. 63° n° 3 do Cód. Penal, com determinação do marco dos 5/6 da pena (para já, calculado em 18.09.2021, sem prejuízo da sua alteração, por motivos supervenientes) com todos os demais efeitos (ou seja, a libertação em tal data do arguido, em o consentindo, se o não for antes).
Para tanto, formula as conclusões que se transcrevem:
1. O arguido (…) está ininterruptamente preso desde o dia 03.04.2014, para cumprir penas de prisão em regime de sucessão: uma de 6 anos de prisão, aplicada no Processo 111/14.5JELSB; outra de 2 anos, 11 meses e 11 dias de prisão, remanescente resultante da revogação da Liberdade Condicional anteriormente concedida (saiu então em liberdade no dia 15.07.2013, até ser novamente preso no dia 03.04.2014);
2. A soma das penas em execução passa os 6 anos de prisão, concretamente é de 8 anos, 11 meses e 11 dias de prisão.
3. Porque passa os 6 anos de prisão, além dos marcos da Liberdade Condicional ope judicis da metade e dos 2/3 da pena, à soma das penas é ainda aplicável o marco do artigo 61' n° 4 do Código Penal, ou seja, o marco da Liberdade Condicional ope legis, aos 5/6 da soma das penas.
4. O arguido deve portanto poder beneficiar da liberdade condicional ope legis aos 5/6 das penas (calculada para 18.09.2021), naturalmente se antes não for libertado condicionalmente ope judicis - artigo 63°, n° 3 do C. Penal,
5. Tal entendimento em nada é beliscado pela norma do artigo 63° n° 4 que apenas exclui o remanescente resultante da revogação da Liberdade Condicional das operações de execução
das penas em sucessão, ou seja, o remanescente, uma vez iniciada a execução, não se interrompe, mas é cumprido ininterruptamente (sem prejuízo da Liberdade Condicional);
6. Esta exclusão não pode querer significar a retirada, ao condenado, do direito à Liberdade Condicional obrigatória, caso as penas passem os 6 anos de prisão, como decorre do artigo 64°, n° 3 do Código Penal, da natureza do instituto, dos fins das penas e da jurisprudência citada do STJ (aqui pelo menos quando à aplicação da Liberdade Condicional obrigatória em caso de remanescente isoladamente considerado);
7. A liberdade condicional obrigatória destina-se a acudir a períodos de reclusão demasiado longos geradores de situações de profunda desadaptação do recluso à comunidade, realidade criminologicamente comprovada;
8. A exclusão de qualquer marco da Liberdade Condicional, mesmo em caso de execução de penas sucessivas, apenas porque uma delas é um remanescente resultante da revogação de uma Liberdade Condicional, não parece ter sustento válido bastante, além de não atender a uma das finalidades das penas - a reintegração do agente na sociedade.
9. A douta decisão recorrida, no segmento em que considera inaplicável ao presente caso o marco dos 5/6 das penas em execução, não fez uma correcta leitura e interpretação das normas dos artigos 40°, n° 1, 61°, n° 4, 63°, n ° 3 e 64°,n° 2 e 3 do Código Penal, e que importam diversa leitura.
Não houve contra-alegações.
0 Mmo. Juiz a quo sustentou o despacho recorrido.
Nesta Relação, a Digna Procuradora-geral Adjunta apôs o competente visto. Efectuado o exame preliminar e colhidos os vistos legais, foram os autos à
conferência, cumprindo agora apreciar e decidir.
Fundamentação
A decisão impugnada é a seguinte:
0 recluso está ininterruptamente preso à ordem do proc. 111/14.5JELSB desde 03.04.2014 para cumprimento de 6 anos de prisão.
Tem ainda a cumprir o remanescente de 2 anos 11 meses e 11 dias (15.07.2013 a 26.06.2016), à ordem dos processos A, B e D mencionados a fls. 83.
Assim, são relevantes, para efeitos de concessão de liberdade condicional, as seguintes datas:
- Início de cumprimento das penas: 03.04.2014;
- Meio das penas: 23.09.2018;
- Dois terços das penas: 20.03.2020;
- Cinco sextos das penas: inaplicável. Com efeito, nenhuma das penas acima referidas consideradas individualmente é superior a 6 anos de prisão, pelo que não se impõe a colocação em liberdade aos cinco sextos prevista no art. 61° n° 4 do Código Penal.
Por outro lado, muito embora a soma das penas em cumprimento exceda in casu seis anos de prisão, a colocação em liberdade prevista no art. 63° n° 3 do Código Penal não se aplica aos casos, como o presente, em que a execução da pena resultar de revogação da liberdade condicional, - cfr. art. 63° n° 4 do Código Penal.
- Termo das penas: 14.03.2023.
0 despacho de sustentação tem o seguinte teor:
Nos termos e para os efeitos do disposto no art. 414° n° 4 do C. P. Penal, entendo ser de manter nos seus precisos termos e pelos fundamentos aí referidos o despacho sob recurso.
Com efeito, como decorre do art. 61°, n° 4, do C. Penal, o condenado em pena superior a 6 anos de prisão é obrigatoriamente colocado em liberdade condicional, se assim o consentir, quando atingir o marco dos 5/6 da pena. É assim na pena única e também nas penas sucessivas, cuja soma exceda 6 anos de prisão, aqui por força do n° 3 do art. 63° do C. P.
Todavia, quando as penas parcelares, como é o caso não excedam os 6 anos de prisão (nem autonomamente nem somadas por via de cômputo sucessivo), não há lugar ao cálculo dos 5/6. Ou seja, nesses casos em que só adicionando os remanescente resultantes da revogação de liberdade condicional haveria lugar a 5/6, tal marco é inaplicável por força do n° 4 do citado preceito legal que remete para o n° 3 e pelo próprio n° 3 quando refere se dela não tiver antes aproveitado. Resulta, a nosso ver, da conjugação dos dois preceitos, que o remanescente não conta para efeitos de se alcançarem os 5/6 que estão previstos no n° 3 e que se reporta às penas parcelares que devem ser cumpridas sucessivamente e que não resultem de revogação de liberdade condicional, pois, essas mostram-se excluídas, quer pelo n° 3 (na expressão acima sublinhada), quer expressamente por força do n° 4, não havendo lugar à sua equação/soma por via do n° 3 do art. 63° do C. P. (julgamos ser também este o entendimento dos ACSTJ, de 14.08.2009 e 10.12.2015, proc.s 490/09.6YFLSB, 3 Secção, Habeas Corpus; 7164/10.3TXLSB, 3 Secção. Habeas Corpus; e Pinto de Albuquerque, in Comentário do Código Penal, em anotação ao artigo).
Apreciando...
De acordo com a jurisprudência fixada pelo Acórdão do Plenário das Secções do STJ de 19.10.1995 (in D.R., série I-A, de 28.12.1995), o âmbito do recurso define-se pelas conclusões que o recorrente extrai da respectiva motivação, sem prejuízo, contudo, das questões de conhecimento oficioso.
Em causa está saber se quando a soma das penas em cumprimento exceda 6 anos de prisão, mas esse excesso se dever a uma revogação da liberdade condicional, a colocação em liberdade aos 5/6 da pena prevista no art. 63° n° 3 do Cód. Penal, tem lugar.
Preceitua o n° 4 do art. 61° do Cód. Penal que sem prejuízo do disposto nos números anteriores, o condenado a pena de prisão superior a seis anos é colocado em liberdade condicional logo que houver cumprido cinco sextos da pena.
E, nos termos do n° 3 do art. 63° do mesmo Código se a soma das penas que devam ser cumpridas sucessivamente exceder seis anos de prisão, o tribunal coloca o condenado em liberdade condicional, se dela não tiver antes aproveitado, logo que se encontrarem cumpridos cinco sextos da soma das penas, mas, acrescenta o n° 4 seguinte que o disposto nos números anteriores não é aplicável ao caso em que a execução da pena resultar de revogação da liberdade condicionar.
No caso em análise, o recluso está ininterruptamente preso desde 3.04.2014, para cumprir penas de prisão em regime de sucessão: uma de 6 anos de prisão e outra de 2 anos, 11 meses e 11 dias de prisão, esta última sendo remanescente resultante da revogação de liberdade condicional anteriormente concedida.
Ora, embora a soma das penas a cumprir sucessivamente exceda os 6 anos de prisão, este excesso só existe porque uma das penas resulta da revogação de liberdade condicional anteriormente concedida.
Da leitura dos preceitos supra citados, temos que resulta claro do n° 4 do art. 63° do Cód. Penal que a previsão do n° 3 não se aplica quando a execução da pena resultar de revogação da liberdade condicional, como é o caso dos autos.
Por outro lado, o n° 3 do art. 64° do Cód. Penal nada acrescenta à interpretação que fizemos. Com efeito, o art. 64° citado refere-se à revogação da liberdade condicional, pelo que o n° 3, ao estipular que relativamente à pena de prisão que vier a ser cumprida (após a revogação) pode ter lugar a concessão de nova liberdade condicional nos termos do artigo 61°' apenas quer significar que, com referência ao remanescente a cumprir, pode ainda o recluso beneficiar de liberdade condicional, se essa libertação for compatível com as necessidades de prevenção.
Assim, secundamos o Tribunal recorrido quando afirma que muito embora a soma das penas em cumprimento exceda in casu seis anos de prisão, a colocação em liberdade prevista no art. 63° n° 3 do Código Penal não se aplica aos casos, como o presente, em que a execução da pena resultar de revogação da liberdade condicional, - cfr. art. 63° n° 4 do Código Penaf'.
Acrescentamos apenas que a finalidade das penas (a reintegração do agente na sociedade) não leva a interpretação diferente. É que sendo a letra da lei inequívoca, como
supra explanámos, não faz sentido recorrer a outras regras interpretativas,
Decisão
Pelo exposto, acordam em julgar improcedente o recurso e confirmam a decisão recorrida.
Sem custas dada a isenção do recorrente.
Lisboa, 28.06.2016