1.Os prazos máximos de duração do inquérito não são peremptórios, pois não é possível demarcar o tempo e uma investigação.
2.As diligências praticadas para além desses pratios são ;vcílida.
3. Um excesso para além do que é razoável pode desencadear apenas responsabilidade disciplinar e um incidente de aceleração processual
Proc. 122/13.8TELSB-AG.L1 3ª Secção
Desembargadores: Maria Elisa Marques - Teresa Féria - -
Sumário elaborado por Isabel Lima
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Processo n° 122/ 13.8TELSB-AG.L1
Acordam, em Conferência, na 3.a Secção Criminal do tribunal da Relação de Lisboa:
1. Relatório
1.1. J... recorre da decisão certificada a fls. 932-935, datada de dia 23 de Novembro de 2015, que indeferiu o requerimento do ora Recorrente no sentido de que o inquérito fosse declarado extinto por caducidade e de que as medidas de coacção a que se encontra sujeito fossem declaradas cessadas por decurso do seu prazo máximo, retirando da respectiva motivação as seguintes conclusões (transcrição):
A. O Recorrente esteve sujeito, efectivamente, desde a sua detenção e durante todo o tempo da sua sujeição à medida de coacção prisão preventiva e à medida de coacção OPH à obrigação de não contactar com os demais arguidos e de não se ausentar para o estrangeiro.
B. Para os efeitos previstos na disposição legal citada do n° 1 do artigo 215°, deve considerar-se que o início da medida ou medidas de coacção a que está actualmente sujeito ocorreu no dia da sua detenção, em 21 de Novembro de 2014.
C. Aquando da prolação do despacho recorrido, verificava-se já o decurso do prazo de um ano, previsto no artigo 215° n° 1 do CPP, pelo que era imperativo que o Senhor juiz recorrido tivesse declarado a extinção de tal medida ou medidas por caducidade - da obrigação de não contactar com os seus co-arguidos e da obrigação de não se ausentar para o estrangeiro.
D. Não o tendo feito, violou o despacho recorrido o disposto nas normas citadas, do artigo 215° n°s 1 e 3 do CPP, aqui aplicáveis por força do disposto no artigo 218° n° 2 do mesmo diploma.
E. Tal medida ou medidas e, bem assim, o próprio termo de identidade e residência sempre se haverão de considerar igualmente extintas por se mostrar ultrapassado o prazo máximo de inquérito.
F. Os prazos de duração do inquérito e a fixação por lei da sua duração máxima constituem uma verdadeira garantia para os arguidos e não tem, por isso, uma mera função ordenadora do exercício pelo Ministério Público da acção penal na conduta administrativa em que se consubstancia a sua intervenção no inquérito.
G. O prazo legal, assume aqui uma natureza garantística, fazendo emergir para o arguido o direito subjetivo a, decorrido esse prazo, já não poder ser destinatário de uma decisão lesiva, e garantindo que somente dentro desse prazo o Ministério Público se encontra habilitado a intervir, no âmbito de um concreto inquérito, sobre a esfera jurídica do arguido.
H. Se o prazo legal, em procedimentos de iniciativa oficiosa, assumir a natureza de prazo máximo, tiver sido estabelecido como garantia do arguido - do cidadão - a obter uma definição da sua situação jurídica em cenários passíveis de conduzir a uma decisão com efeitos desfavoráveis (v.g., face à sua liberdade, honorabilidade, propriedade ou outros bens jusfundamentais), o decurso do prazo faz caducar o procedimento.
1. Trata-se do afloramento de um princípio geral consagrado no artigo 128°, n° 6, do Código do Procedimento Administrativo (CPA), passível de encontrar outras manifestações ilustrativas, desde logo ao nível do processo penal (v.g., prazo máximo de inquérito), por força do disposto no artigo 32° n° 2 da CRP.
J. As disposições ordinárias determinantes dos prazos do inquérito não são, evidentemente, meramente indicativas. Essas normas, limitadoras do arbítrio e impeditivas da insegurança e da incerteza jurídicas, são, por isso mesmo, elementos essenciais de garantia, de proteção e de defesa dos arguidos, que a eles, a todos eles, e a exercê-los eles têm absoluto direito, conforme o artigo 32°, número 1, da CRP, preceito que apareceria violado, caso fosse acolhida a invocação da natureza meramente indicativa das normas em causa. Como apareceriam violadas as disposições do número 2 desse mesmo artigo 32°, do artigo 6° da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e do número 2 do artigo 47° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, aplicáveis por força do artigo 8° da CRP.
K. Longe de serem meramente indicativos, tais prazos são por isso dispositivos, imperativos e obrigatórios, correspondendo ao seu esgotamento a caducidade do direito do estado a prosseguir este procedimento.
L. Neste sentido, aliás, foi recentemente, e muito doutamente, decidido por esse Venerando Tribunal da Relação - cf. Acórdão proferido no processo n°213/12.2TELSB-F.L1, relatado pela Exma. Senhora Juíza Desembargadora Margarida Vieira de Almeida:
M. Nos presentes autos, acresce ainda que o prazo em causa não resulta apenas da lei, foi fixado por decisões judiciais já transitadas em julgado, do e do Juiz, pelo que tal prazo ocorreu no passado dia 19 de Outubro de 2015.
N. Da consulta dos autos foi já possível concluir que o Ministério Público recolheu prova bastante de nenhum crime ter sido praticado, de o arguido não ter praticado crime algum.
O. Ou, ao menos, não recolheu prova bastante de algum crime ter sido praticado, de o arguido ter praticado qualquer crime.
P. Isso mesmo bem se evidencia, quanto ao crime de corrupção, no douto e exaustivo parecer da Professora Doutora Fernanda Paula Oliveira (que se junta como documento n° 4, e aqui se dá por integrado).
Q. Foi por essas razões que não foi deduzida acusação.
R. Quanto ao crime de corrupção genericamente imputado ao recorrente como de corrupção passiva para acto ilícito, até à data não foi apresentado um único facto juridicamente relevante.
S. O único facto - o único pretenso acto ilícito a esse respeito indicado - foi a aprovação pelo Conselho de Ministros do primeiro Governo presidido pelo ora recorrente, por força da cláusula de excepção da Resolução 102/2007 de 3 de Agosto que aprovou o Plano Regional de Ordenamento do Território do Algarve, mas a consideração de tal acto como ilícito, a qualquer título, ou como sendo passível de ter beneficiado indevidamente quem quer que seja, ou mesmo e tão apenas a sua imputação ao ora recorrente, não tem o mínimo fundamento.
T. Está, assim, exaustivamente demonstrado nos autos que, dos factos investigados neste inquérito, ou com eles relacionados nenhum crime de corrupção foi cometido e que o recorrente nenhum crime de corrupção cometeu. E o mesmo se pode dizer dos imputados crimes de fraude fiscal ou de branqueamento, por inexistir sequer qualquer elemento de prova passível de fundar qualquer suspeita sequer de rendimentos ou proveitos fraudulentamente obtidos, não declarados ou omitidos à administração fiscal pelo ora recorrente.
U. E o que resulta, de quanto se conhece dos autos, depois de mais de 30 meses de investigação formal neste inquérito, com recurso a todos os mais invasivos e intrusivos meios de investigação e de devassa, com a sujeição do arguido e de alguns dos seus co¬arguidos inclusivamente a prisão preventiva carcerária e domiciliária durante quase um ano, de todos os meios de prova e de obtenção de prova existentes e produzidos - desde depoimentos pessoais de arguidos e de testemunhas, passando pela documentação apreendida em Portugal e no estrangeiro, até às intercepções de conversas e comunicações telefónicas e vigilâncias realizadas.
V. A única possibilidade hoje legalmente prevista para a prorrogação de prazos de inquérito é a que encontra guarida, depois da reforma de 2007, no número 6 do artigo 89° do CPP, mas a decisão que declarou essa prorrogação, a prorrogação nesse sentido pretendida pelo titular do inquérito, foi julgada improcedente por douto I córdão de 24 de Setembro da 9' secção desse Tribunal da Relação.
W. Para além disso, e conforme previsto no artigo 107° n° 3, a prorrogação de tais prazos de inquérito, como de quaisquer outros prazos estabelecidos no código, só pode ter lugar sendo invocado e provado, nos termos previstos nessa norma, justo impedimento, o que o titular do inquérito não fez.
Termos em que se pede a Vossas Excelências na procedência deste recurso, se dignem determinar a prolação pelo titular do inquérito de despacho de arquivamento do presente inquérito, nos termos do artigo 277° n°s 1 e 2 do CPP;
Sem prescindir e subsidiariamente, face ao disposto no n° 1 do artigo 276° do CPP, se dignem declarar, por extinção do prazo judicialmente fixado para este inquérito e inexistência de justo impedimento do Ministério Público, e da sua invocação e justificação, a preclusão cio direito do Ministério Público prolongar este procedimento, ou a extinção por caducidade do direito de o Ministério Público aqui exercer a acção penal, com base nos elementos de prova obtidos até 19 de Outubro de 2015;
E em todo o caso, nos termos e por força do disposto no artigo 218° n° 2 do CPP e do disposto nos números 1 e 3 do artigo 215°, se dignem declarar extintas por caducidade as medidas de proibição de contactos com os demais arguidos e de proibição de se ausentar para o estrangeiro, efectivamente impostas ao arguido recorrente desde a data da sua detenção, em 21 de Novembro de 2014,
Justiça!
1.2. -O recurso foi admitido o recurso em cumprimento do determinado em sede de decisão de Reclamação - cf. douto despacho fls. 974 da presente certidão
1.3. - Respondeu oportunamente o Ministério Público na 1a Instância, concluindo como segue:
1. Considerando o teor das decisões das Reclamações de 18 de Março de 2016 e de 1 de Abril de 2016, bem como o teor do Acórdão da Relação de Lisboa 14 de Junho de 2016, por já ter sido proferida decisão em sede de recurso a respeito dessa questão, encontra-se excluída do objecto do presente recurso a apreciação da cessação da vigência das medidas de coacção aplicadas ao Recorrente por decurso do seu preço máximo.
2. Porque a decisão do decidiu valorar o decidido na reclamação e porque a segunda decisão proferida em sede de reclamação se insere na primeira, atenta a identidade do objecto, no presente recurso subsistirá tão só a apreciação da questão da exibição do inquérito por caducidade do decurso do preço de inquérito previsto no art.276°, n.° 1 do Cód. Processo Penai.
3. O art.276° do Cód. Processo Penal, sob pena de serem desconsiderados outros direitos fundamentais constitucionalmente garantidos, não pode ser interpretado isoladamente mas em articulação com todo o sistema processual penal, nele se incluindo necessariamente, além do Código Processo Penal e do Código Penal, a Constituição e o Estatuto do Ministério Público.
4. Através da análise conjunta dos acervos normativos descritos extrai-se, com manifesta clareza, que a acção penal não visa exclusivamente a protecção dos interesses do arguido, mas realizar a Justiça, entendida como um direito fundamental da sociedade e um dos pilares da democracia.
5. A prática de condutas susceptíveis de configurar crime atenta contra a vida em sociedade de um modo de tal forma gravoso que, em nome do interesse colectivo e com fundamento nos princípios que enformam o Estado de Direito, permite-se que na investigação de tais condutas e identificação dos seus responsáveis, transitoriamente, em alguma medida, o arguido veja alguns dos seus direitos limitados.
6. E tal será tão mais admissível quanto a gravidade dos crimes e das condutas em causa.
7. A interpretação das nomas constantes do art.276° do Cód. Processo Penal no sentido de que findo o decurso dos prazos aí estabelecidos, o inquérito terá de ser declarado extinto por caducidade viola, os princípios consagrados nos arts. 2°, 9°, alínea b), 202°, n.° 1 e 2 e 219°, n.°1 e 2 da CRP que impõem a garantia do Estado de Direito e dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, entre os quais se inclui a Justiça.
8. Tal interpretação do art.276° do Cód. Processo Penal exacerbaria, em desfavor de tais direitos que sustentam a própria sociedade, o interesse do arguido em lograr deixar de ser perseguido criminalmente com base num limite temporal que não visou, por parte do legislador e da Constituição, tal fim.
9. A interpretação conforme à Constituição será no sentido de que tais prazos não visam acautelar a paz jurídica do arguido mas orientar a acção penal e delimitar o prazo de vigência do segredo de justiça interno, sendo por essa razão que o legislador, deliberadamente, não cominou o decurso de tais prazos com a caducidade ou extinção do inquérito.
10. Para o termo do prazo máximo do inquérito, o legislador apenas consagrou como efeitos o limite da vigência do segredo de justiça interno, a obrigação do magistrado titular do inquérito de comunicar tal facto ao superior hierárquico imediato e a possibilidade deste último avocar o processo ou determinar, oficiosamente ou a requerimento do arguido ou do assistente, a aceleração processual nos termos do art.109° (arts. 89°, n.° 6 e 276°, n.° 6 a 8 do Cód. Processo Penal).
11. Se após o decurso do prazo estabelecido nesse preceito legal, o legislador não pretendesse a continuação do inquérito, não faria sentido consagrar a possibilidade do superior hierárquico do Ministério Público avocar o inquérito ou de requerer a sua aceleração processual.
12. Com a delimitação dos prazos máximos de inquérito, por força dos princípios constitucionais referidos, o legislador pretendeu que a hierarquia do Ministério Público, em nome da Justiça, tomasse conhecimento do estado da investigação e diligenciasse pelo seu desenvolvimento célere, tal como sucedeu no caso dos presentes autos, e não despoletar o seu arquivamento prematuro, abdicando do exercício da acção penal relativamente aos ilícitos em causa.
13. Ao próprio Recorrente repugna uma tal consequência - a de que a acção penal cesse relativamente aos crimes em causa - pois, apesar de requerer a extinção imediata do presente inquérito por decurso do prazo máximo defende que (...) Se o prazo de prescrição dos eventuais crimes em causa ainda não se esgotou, o Ministério Público poderá sempre abrir um novo inquérito, eventualmente aproveitando algo do anterior:
14. A continuação da investigação no processado actual será muito mais favorável ao arguido na medida em que num novo inquérito poderiam eventualmente correr novos prazos, designadamente relativamente ao segredo de justiça interno e medidas de coacção.
15. Caso pretendesse a extinção do inquérito com o termo destes prazos, tal consequência teria sido inserta pelo legislador no art.276° do Cód. Processo Penal ou, pelo menos, no capítulo referente às causas da extinção da responsabilidade criminal e do procedimento criminal constantes do Código Penal.
16. Do cotejo das disposições legais insertas no Título V do Código Penal, que tem por epígrafe a 'Extinção da Responsabilidade Criminal, apenas figuram como causas de tal extinção a prescrição, a morte do agente, a amnistia, o perdão genérico e o indulto, não figurando nesse elenco o decurso do prazo máximo do inquérito.
17. Tal consequência também não resulta das normas referentes ao arquivamento do inquérito, constantes do Capítulo III do Título II do Código de Processo Penal, sob a epígrafe “Do encerramento do inquérito.
18. Atendendo ao cuidado e minúcia que foi dada pelo legislador à regulação do encerramento do inquérito, obviamente com vista a obstar o arquivamento prematuro e arbitrário de inquéritos, em prejuízo da legalidade e do direito dos cidadãos a uma Justiça igualitária, caso assim tivesse sido entendido, o decurso do prazo máximo do inquérito integraria tais causas.
19. Na ausência de qualquer cominação expressa, não pode atribuir-se ao decurso do prazo máximo de inquérito a consequência da sua extinção.
20. É no instituto da prescrição do procedimento criminal e das penas (arts.118° a 126° do Cód. Penal), e não no decurso do prazo máximo de inquérito, que se encontra consagrado o direito do arguido a alcançar a paz jurídica por via do decurso do tempo.
21. No caso vertente e considerando as penas dos ilícitos em causa, tais prazos ainda não decorreram pelo que não se verificam os pressupostos para a extinção do procedimento criminal com base na prescrição do procedimento criminal.
22. Não compete ao arguido determinar se já foi ou não recolhida prova bastante do não cometimento do crime ou da recolha de prova bastante do crime, nem concluir pela inexistência de indícios do crime.
23. No interesse da comunidade e com vista a contrabalançar os interesses do arguido, em nome da defesa do direito à justiça que assiste à comunidade, foi constitucionalmente consagrada a autonomia do Ministério Público (art.219° da CRP), decorrendo desse princípio a competência exclusiva do Ministério Público, no âmbito do inquérito, de determinar se foi ou não recolhida prova bastante da prática de crime e se existem outras diligências probatórias a realizar com vista à recolha de indícios do crime, pressupostos do arquivamento do inquérito nos termos do disposto no art.277°, n.° 1 e 2 do Cód. Processo Penal.
24. Nos presentes autos, tal momento ainda não chegou, existindo ainda diligências probatórias a realizar, conforme resulta abundantemente do cotejo dos autos.
25. Não tendo o prazo máximo de inquérito como consequência a extinção do inquérito e não se verificando os pressupostos previstos no art.277° do Cód. Processo Penal referentes ao seu arquivamento, nem tendo o Ministério Público tomado tal decisão, deverá o presente inquérito prosseguir os seus termos legais e manter-se a vigência de todas as medidas de coacção impostas ao arguido Recorrente.
26. Por todo o exposto o douto despacho a quo não merece qualquer reparo, não tendo violado qualquer norma, nomeadamente os arts.32° da CRP, 60 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e 47° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, devendo ser mantido nos seus precisos termos.
1.4. - O Exm.O Juiz manteve o despacho recorrido.
1.5. - Os autos foram remetidos a este tribunal em 17-08-2016, e distribuído como Urgente em 18.08.2016.
2. - Nesta instância, na oportunidade conferida pelo artigo 416.° do Código de Processo Penal', o Exmo. Procurador Geral Adjunto de turno foi de parecer de que deve ser negado provimento ao recurso. - cf. fls. 1208
2.1. - Em 22-08-2017, pela Exma. Desembargadora de turno foi ordenado o cumprimento do disposto no art.° 417 do CPP.
2.2. - Em 8-09.2016, o recorrente enviou requerimento - «resposta ao Parecer do Ministério Público arguindo «a nulidade do processamento deste recurso desde a resposta do Ministério Publico do Departamento Central de Investigação e acção penal (DCIAP) à motivação», por inexistir justificação ou possibilidade para reconhecer a este recurso carácter urgente, fazendo-o distribuir em pleno período de férias a turnos previamente e publicamente determinados.
Que a distribuição foi feita em violação da lei (do disposto no art. 103° n° 1 do CPP), mostra-se viciada de nulidade e violando, nomeadamente, o princípio do juiz natural e os direitos essenciais de defesa a um processo justo e equitativo.
E que dada a matéria em causa, a pressa na respectiva subida e na sua distribuição, pode levantar suspeitas sérias de manipulação, pelo Ministério Publico, da competência do Juiz (da Secção) a quem o recurso seria naturalmente distribuído.
2.3. - Em 13.09.2016, foram os autos conclusos com a informação de se suscitarem sérias dúvidas sobre se o processo tem natureza urgente para se proceder à liquidação da multa.
2.3. - Por esse motivo e visto o também alegado pelo recorrente foi solicitado à secção central que informasse o motivo pelo qual o processo tinha sido distribuído como urgente.
2.4. - Na sequência da informação prestada a fls. 1220, foi proferido o despacho fls. 1222, no qual, em suma, se considerou:
- inexistirem motivos para a distribuição do processo como urgente;
- ter-se tratado dc lapso e como tal ter a distribuição ocorrida em 18.08.2016, prematura e como tal irregular.
- que tal «vício deve ser suprido (cf. art. 220 al.b) n° 1 in fine do CPC ex-vi do art.° 4 do CPP) com a remessa dos autos à secção Central para baixa na espécie em que se encontra e carregamento na espécie competente, mantendo-se na mesma secção e relatora, o que se determina».
2.5.- Na sequência dessa notificação veio o J..., arguir a respetiva nulidade e a nulidade do processamento, maxime do acto de distribuição em 18 de Agosto, deste Recurso Penal, com os seguintes fundamentos (transcrição).
- Nulidade insanável por violação das regras legais relativas ao modo de determinar a composição do tribunal- artigo 119 a) do Código de Processo Penal (CPP)
1. Este Recurso foi distribuído em período de férias judiciais à Senhora Juíza Relatora de turno e a esta 3.ª secção, por ter sido erradamente processado (desde o despacho que determinou a sua subida a este Tribunal) como se tratasse de recurso em processo urgente.
2. Uma vez que se não trata de processo ou recurso urgente, inexistindo justificação ou possibilidade legal de reconhecer a este recurso tal carácter e nenhum despacho tendo sido proferido nesse sentido pelo titular do inquérito, pelo Senhor Juiz de Instrução ou pelo Senhor Juiz Desembargador Presidente do Tribunal da Relação, veio o ora reclamante arguir a nulidade do processamento do recurso desde a decisão do Juiz recorrido, que o mandou subir e remeter à Relação em período de férias judiciais, nomeadamente a nulidade da sua distribuição em 18 de Agosto - o que fez quando, notificado do Parecer do Ministério Público no Tribunal da Relação, tomou conhecimento do sucedido.
3. Dirigiu, assim, à Senhora Juíza Relatora requerimento de arguição de nulidade - para que ela a reconhecesse e, em consequência, determinasse a devolução do processo para nova distribuição, nos termos do artigo 213° n° 3 do Código de Processo Civil (CPC) - não já apenas entre os Senhores Juízes escalados para turnos de férias, mas entre todos os Senhores Juízes das secções criminais. E, prevenindo decisão diversa, requereu ainda fosse para tanto ordenada extração de certidão para o Senhor Juiz Presidente da Relação, uma vez que, nos termos do artigo 89° da Lei de Organização do Sistema Judiciário (LOSJ), a distribuição é presidida por juiz, a designar pelo presidente do tribunal, que decide as questões com aquela relacionadas - norma que, conjugada com a do artigo 213° do CPP, permite concluir, no modo de ver do reclamante que a competência para decidir estas questões cabe precisamente a esse juiz que o Senhor Presidente da Relação designar (ou tiver designado).
4. O recorrente entende que esta norma, embora diretamente prevista na LOSJ para os tribunais de primeira instância, é aplicável também aos tribunais superiores:
- por fazer todo o sentido que assim seja, dada a rigorosa analogia entre as questões suscitadas a este respeito nos Tribunais de 1a instância e as suscitadas nos Tribunais superiores;
- e face ao disposto no artigo 213° n°s 2 e 3 do CPC - que contém disposições especiais relativas aos Tribunais superiores aqui aplicáveis por força do artigo 4° do CPP, por estarmos perante um caso omisso, já que o CPP não define regras para a distribuição.
Tal norma prevê no seu n° 2 a designação mensal pelo Presidente do Juiz que há de intervir na distribuição e resolver dúvidas do secretário na classificação de algum acto do processo, quando a distribuição tenha de ser feita pelo funcionário, e no n° 3 que 9s erros verificados na distribuição têm como consequência que o processo seja distribuído novamente, aproveitando os vistos que tiver, exceto se o erro derivar da classificação do processo em determinada espécie, quando o deveria ter sido em espécie diferente, casos em que apenas é feita nova classificação do processo na espécie correta (cf. n° 3).
Também por força desta norma, sempre se haveria de concluir caber ao juiz designado pelo Presidente do Tribunal presidir à distribuição e resolver questões como aquela aqui suscitada.
Solução que, de resto, parece ser a única que é conforme às regras gerais: se o vício respeita a acto em que intervêm ou a que preside determinado juiz, especialmente designado nos termos legais para o efeito, deverá ser a este que cabe resolver todas as questões atinentes.
Por outro lado, não obstante a violação das regras legais relativas ao modo de determinar a composição do tribunal - violação que determina a nulidade aqui em causa - ser efetivamente uma circunstância que obsta ao conhecimento do recurso pela Senhora Juíza Relatora a que foi distribuído, pelo Senhor Juiz Adjunto designado e pela Senhora Juíza Presidente da Secção, competente por inerência, não parece ao recorrente que se trate de questão subsumível - pelo menos, para já - na alínea a) do artigo 417° n° 6. E também não parece ser caso da competência do Presidente da Relação, uma vez que, mesmo que se considerasse existir a este respeito, da competência e forma de arguição destas nulidades nestes casos, uma lacuna também na lei processual civil, e se integrasse na previsão do artigo 205° n° 2 do CPC, por analogia, todas as questões relacionadas com a distribuição, essa analogia, a existir, é claramente menor e mais vaga do que aquela que se verifica entre as hipóteses previstas nas disposições citadas do artigo 213° do CPC e do artigo 89° da LOSJ.
De todo o modo,
5. A Senhora Juíza Relatora não ordenou a extração e remessa ao Senhor Presidente da Relação de qualquer certidão. Ela própria, como Juíza Relatora, reconheceu. no despacho sob reclamação. os factos determinantes da nulidade arguida, que imputou a lapso de uma sr.ª escrivã-adjunta da secção central, considerou evidente que devia ter sido distribuído como Recurso penal vulgar, e declarou a distribuição ocorrida em 18.08.2016 prematura e como tal irregular e que tal vício deve ser suprido.
6. Porém (e esse o erro de base do despacho), desconsiderou e desprezou a influência determinante que esse vicio teve sobre a própria composição da Conferência (do tribunal que deverá julgar este recurso.
Ignorou o facto de que, tendo sido erradamente e indevidamente feita em férias, a distribuicão do recurso não foi feita entre todos os juízes das secções criminais e por isso o julgamento do recurso foi objetivamente subtraído a todos os juízes das seccões criminais da Relação de Lisboa que em Setembro de 2016 tinham precedência sobre a Senhora Juíza Relatora e que no dia 18 de Agosto não estavam de turno - violando assim o disposto no artigo 216° n° 2 do CPC' .
7. E, assim, e de forma e em termos juridicamente errados, enquadrou o vício na parte final da alínea b) do artigo 210° 2 do CPC, como se o vício de que a distribuição enferma - ter sido prematura, ter sido feita no período de férias judiciais e, por isso, apenas entre juízes dos turnos constituídos para o efeito, quando o deveria ter sido fora desse período de férias, por todos os juízes das secções criminais - não passasse de uma irregularidade e não tivesse afetado a designação dos juízes que constituem a conferência (que compõem o tribunal) que haveria de de julgar o recurso,
Ora,
8. Salvo o muito respeito devido, é evidente que o erro afetou a designação dos juízes.
Basta considerar as regras da distribuição e as regras básicas da aritmética e estatística, e da experiência: se a distribuição não tivesse sido prematura (como a Senhora Juíza Relatora bem regista), se não tivesse sido feita no período de férias judiciais, erradamente, como se estivéssemos perante um processo urgente (como a Senhora Juíza Relatora bem reconhece), o Recurso teria com toda a probabilidade sido sorteado a outros Senhores Juízes Desembargadores e a outra Secção.
Por ser necessariamente e absolutamente certo que teria sido distribuído, de acordo com a precedência de cada um, entre muitos juízes que não foram considerados na distribuirão em férias; considerando todos juízes das secções criminais, e não apenas aqueles que estavam escalados para um dos dias do último período de férias do verão, para 18 de Agosto.
Por conseguinte,
9. Ainda que o artigo 210° do CPC fosse aplicável ao caso - que o não é -, sempre deveria ter sido aplicado o disposto na sua alínea a): quando afete a designacao do juiz, nas comarcas em que haja mais do que um, faz-se uma nova distribuição e dá-se baixa da anterior.
E essa é igualmente, como vimos, a consequência que se impõe perante a norma direta e especialmente aplicável, do artigo 213° n° 3 do mesmo CPC: quando tiver havido erro na distribuicão, o processo é distribuído novamente. aproveitando-se porém os vistos que já tiver,- mas se o erro derivar da classificação do processo, é este carregado ao mesmo relator na espécie devida, descarregando-se daquela em que estava indevidamente.
- Essa a regra geral que resulta da norma: quando tiver havido erro na distribuição. o processo é distribuído novamente.
- No mais, nos Tribunais Superiores (cf novamente nota 2), a excepção somente se verifica quando estiver apenas em causa erro que derive da classificação do processo, de o processo ser classificado em espécie errada, prevendo a lei que, nesses casos, seja carregado ao mesmo relator na espécie devida.
10. Não havia, pois, lugar à aplicação desse regime excepcional, erradamente aplicado na decisão sob reclamação porque o que se verificou no caso Eoi um erro na realização da distribuição - o recurso foi distribuído a juízes a quem por lei não podia e não devia ter sido distribuído, e não um erro de classificação de processos nas espécies existentes nas relações.
A classificação do processo estava, está e continuará a estar, aliás, corretíssima.
Não enferma de erro algum que seja ou tenha sido passível de justificar a aplicação ao caso do regime excepcional previsto na 2.ª parte do n 3 do artigo 213° do CPC.
Com efeito,
As espécies existentes nas Relações são as enunciadas logo no artigo 214 do CPC:
I. Apelações em processo comum ou especial; 2. a Recursos em processo penal; 3.a Conflitos e revisão de sentenças estrangeiras;
3 Aproveitando-se apenas, e muito compreensivelmente, os vistos - até porque o que está em causa, maxime nos processos penais, é o direito ao Juiz Natural ou Legal, não propriamente o direito ao Procurador.
4.a Causas de que a Relação conhece em 1a instância;
5.a Reclamação.
o que significa que, ao contrário do que o despacho parece ignorar, a norma não prevê a espécie processo urgente, nem a espécie processo não urgente, nem a espécie Recurso Penal vulgar - na distribuição de processos nas Relações essas ditas espécies não existem.
E não existem porque a distribuição dos processos urgentes' tem apenas duas ;especificidades: (i) ser efetuada também durante os períodos de férias judiciais; (ii) ser efetuada apenas entre os juízes de turno. Os demais processos, nomeadamente este recurso (os processos a que o despacho se refere como vulgares), são processos que não podendo ser considerados urgentes, por não estarem previstos no n° 2 do artigo 103° do CPP, não podem ser distribuídos durante o período de férias e cuja distribuição deve abranger necessariamente todos os juízes materialmente competentes - no caso, todos os juízes das secções criminais da Relação - e não apenas os juízes escalados para determinado turno de férias.
Consequentemente,
11. O erro verificado na distribuição deste recurso à Senhora Juíza Relatora, ao Senhor Juiz Adjunto e à 3.ª Secção (erro substancialmente confirmado, como vimos, no despacho reclamado) é causa da sua nulidade insanável nos termos da alínea a) do artigo 1 19° do CPP, por clara violação das regras legais relativas ao modo de determinar a cotnposicão do tribunal que haverá de julgar este recurso, nomeadamente das seguintes regras legais que a esse propósito haveriam de ter sido observadas e respeitadas:
- no artigo 54° do Decreto Lei 49/2014 que aprovou o Regime aplicável à Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais, que no seu n° 1 define a finalidade dos turnos de férias judiciais: assegurar o serviço a que se refere o disposto no n° 1 do artigo 36° da LOSJ;
- no artigo 36° da LOSJ, que dispõe para que exclusivamente servem os turnos, e prevê o suplemento remuneratório devido por esse serviço;
- no artigo 39° da LOSJ, que proíbe o desaforamento, para outro tribunal ou secção;
- no artigo 56° n° 2 da LOSJ, que define que a intervenção dos juízes de cada secção no julgamento se faz, nos termos da lei de processo, segundo a ordem de precedência - aplicável por remissão do artigo 74° n° 1) da LOSJ;
- no artigo 203° do CPC, que define como fim da distribuição repartir com igualdade o serviço judicial, pela secção, instância, tribunal ou juiz relator, com garantia de aleatoriedade do resultado - como resulta claramente do artigo 204 n° 1;
- no artigo 213° n° 3 do CPC, já antes invocado e transcrito, na parte em que, verificado erro na distribuição que não afete apenas a classificação do processo na respetiva espécie, manda proceder a nova distribuição;
- no artigo 216° n° 2 do CPC, que manda atender nos Tribunais superiores, quanto à distribuição dos processos, à ordem de precedência dos juízes, como se houvesse uma só secção;
- no artigo 103° n° 1 do CPP, que, fora dos casos previstos no respetivo n° 2, preceitua que os actos processuais se praticam nos dias úteis;
- e no artigo 32° n°s 1 e 9 da Constituição, por violação do direito fundamental de defesa ao Juiz legal ou natural.
Cabe ainda,
12. A propósito da qualificação do vício que afetou a distribuição como nulidade, e não mera irregularidade, citar aqui o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, proferido no Recurso Penal n° 1245/04:
Apesar de o artigo 210, n° 1, do CPCivil, estabelecer que a falta ou irregularidade da distribuição não produz nulidade de nenhum acto do processo, o CPPenal, dada até a matéria em jogo, é muito mais exigente.
Na verdade, dispõe o art 119, a) deste último diploma, que constitui nulidade insanável a violação das regras legais relativas ao modo de determinar a composição do Tribunal.
Ou seja, o processo enferma, ab initio, de nulidade insanável por ainda Tido ter sido encontrado o juiz com jurisdição sobre ele com observância das normas legais aplicáveis e que são as que regulam a distribuição.
Aliás,
13. Interpretadas no sentido de permitir concluir que a distribuição durante o período de férias e apenas pelos juízes de turno em determinado dia de recurso penal não urgente (não previsto no n° 2 do artigo 103° do CPP), não é causa de nulidade por violação das regras legais relativas ao modo de determinar a composição do Tribunal, mas apenas de mera irregularidade sanável com a reclassificação do processo como urgente, as normas do artigo 119° a) do CPP e dos artigos 205° n° 1, 210° e 213° do CPC deverão ser consideradas inconstitucionais, por violação das garantias de defesa, designadamente, do direito ao Juiz legal ou natural, garantias previstas no artigo 32°, n° 1 e especialmente n° 9, da Constituição.
Acresce que,
14. Ferido de nulidade está também o despacho reclamado e, desde logo, nos termos do artigo 119° a) do Cpp, pelas mesmas razões invocadas a respeito do próprio acto da distribuição - por violar por si próprio igualmente as regras legais citadas relativas ao modo de determinar a composição do Tribunal.
15. Além disso, a determinada baixa na espécie em que se encontra e o igualmente determinado carregamento na espécie competente não podem, sequer, ser validamente cumpridos, porque são absolutamente inúteis e como tal proibidos por lei - no artigo 130° do CPC, aqui igualmente aplicável por força do artigo 4° do CPP.
E que baixar rui espécie em que se encontra, significaria baixar o processo na espécie recurso ern processo penal; e canv,gamento na espécie competente significaria o carregamento nessa mesmíssima espécie recurso em processo penal. Sisi/é encargo esse, de barrar e cantar de novo, que a lei não permite.
Assim,
16. Se o primeiro erro do despacho residiu na desconsideração das consequências do vício da distribuição sobre a composição da conferência (do tribunal que julgará o recurso), e o segundo erro foi a errada qualificação desse vício como irregularidade, é o próprio despacho ainda que se mostra violado de nulidade insanável prevista, nos termos expostos, na alínea a) do artigo 119 do CPP, e de absoluta inutilidade.
Finalmente, cabe ainda dizer que,
17. Dada a matéria em causa, o objeto do recurso e até os sujeitos processuais, a pressa na respetiva subida e na sua distribuição, e a manutenção dos efeitos desta não obstante ser reconhecida a sua ilegalidade e intempestividade, por insistência no erro e por erros acrescidos (que, salvo o devido respeito, são erros manifestos), não pode deixar de levantar-se suspeitas sérias de manipulação quanto à composição da conferência (do tribunal) que irá julgar este recurso.
Isto mesmo, aliás, se invocou já na resposta ao Parecer do Ministério Público e aqui se reitera. Mas as suspeitas de manipulação estenderam-se entretanto ao Senhor Juiz que despachou este recurso em período de férias (no dia 16 de Agosto) - designadamente, face à entrevista que entendeu dar à SIC no dia 1 de Setembro, e que foi editada antes de 16 de Agosto (entrevista cujo teor se protesta juntar e cuja data de edição se protesta provar, se for entendido necessário).
termos em que, deverá vossa excelência
reparar as nulidades arguidas e em todo o caso remeter os autos de imediato à presidência da relação, para a presente reclamação e a arguição de nulidade que a precedeu ser apreciada e decidida pelo juiz para tanto designado pelo senhor presidente - ou, o que se requer subsidiariamente, por ele próprio - e para, consequentemente:
- ser declarada a nulidade da distribuição efectuada no dia 18 de agosto;
- ser declarada a nulidade do determinado no despacho reclamado;
- ser ordenada a realização de nova distribuição.
II
nulidade por omissão de pronúncia sobre a questão suscitada em II do requerimento de 8 de setembro - nos termos do artigo 379 c) do cpp quanto a esta nulidade, o reclamante reitera apenas o alegado no requerimento anterior,
requerendo seja a mesma reparada - pelo juiz a quem o recurso for distribuído e, em todo o caso (e sem prescindir), após decisão do antes requerido.
2.6. - A Exma Procuradora geral adjunta teve vista nos autos.
2.7. - Realizado o exame preliminar a que se reporta o n° 3 do art.° 417 do CPP, entendeu a relatora remeter a questão à conferência a fim de ser apreciada e decidida.
2.5. - Colhidos os vistos realizou-se a conferência.
II
Cumpre decidir.
A) - Como se vê do referido em o arguido Reclama do despacho fls. 1222, que, recorde-se, reconheceu assistir-lhe razão quanto a inexistir justificação para reconhecer ao processo natureza urgente fazendo-o distribuir em férias.
E nesse entendimento considerou-se no despacho reclamado que o vício de que enfermava constituía mera irregularidade a ser suprido com a remessa dos autos à secção Central para baixa na espécie em que se encontra e carregamento na espécie competente, mantendo-se na mesma secção e relatora.
Na perspectiva do arguido esse despacho está ferido de nulidade insanável, nos termos do art. 119 a) do CPP, «pelas mesmas razões invocadas a respeito do próprio acto da distribuição - por violar por si próprio igualmente as regras legais» relativas ao modo de determinar a composição do tribunal.
As quais decorrem, no essencial, da circunstância da distribuição ter afectado «a designação dos ~ `~os tZ.ii~~~.oor recair juízes», por iair «apenas entre juízes dos turnos constituídos para o efeito, quando o deveria ter sido fora desse período de férias, por todos os juízes das secções criminais».
Que «a distribuição dos processos urgentes tem apenas duas especificidades: (i) ser efetuada também durante os períodos de férias judiciais; (ii) ser efetuada apenas entre os juízes de turno. Os demais processos, nomeadamente este recurso (os processos a que o despacho se refere como vulgares), são processos que não podendo ser considerados urgentes, por não estarem previstos no n° 2 do artigo 103° do CPP, não podem ser distribuídos durante o período de férias e cuja distribuição deve abranger necessariamente todos os juízes materialmente competentes - no caso, todos os juízes das secções criminais da Relação - e não apenas os juízes escalados para determinado turno de férias».
Por aqui haverá, pois, que começar.
Preliminarmente deve-se, desde já, notar não indicar o arguido qual o fundamento em que se arrima para afirmar tão convictamente ser a distribuição durante os períodos de férias judiciais efectuada apenas entre os juízes de turno constituídos para o efeito.
E não o indica porque, efectivamente, não existe.
A distribuição neste tribunal é integralmente efectuada por meios electrónicos, atendendo-se à ordem de precedência dos todos os juízes (independentemente das secções criminais a pertençam), sendo a escolha do relator feita aleatoriamente esteja ou não de turno ou em férias. - art.° 216 do CPC
E por isso que a argumentação expendida pelo arguido não merece acolhimento, pois assentar no pressuposto errado de que a distribuição teria recaído «apenas entre juízes dos turnos constituídos para o efeito», quando como já se disse, a distribuição abrange o universo dos juízes das secções criminais nos termos antes referidos estejam ou não escalados para turno de férias.
E do que vem exposto decorre que não se está perante um caso de erro na designação dos juizes.
Não ocorre, pois, a invocada violação do dispoto no art°. 216 do CPC.
Como diz o arguido «a classificação do processo estava, e está e continuará a estar correctíssima» - como recurso penal - única espécie existente na Relação (art.° 214 do CPC) e é essa espécie que efectivamente consta da capa do processo da 1a instância.
Quando no despacho reclamado se fala em remeter os autos à secção Central para baixa na espécie em que se encontra e carregamento na espécie competente`, teve-se em mente não a linguagem jurídica mas a que comummente se utiliza na gestão interna dos processos.
Essa diferença justifica-se pela própria natureza das coisas - o próprio arguido reconhece que quando o processo tem natureza célere, melhor dizendo, urgente, nos termos do disposto no n°2 do art. 103 do CPP, os prazos correm inclusivamente em férias. Por esse motivo foi tramitado e despachado em férias por Colega, essa sim, de turno, o que não acontece com os demais: os ditos comuns/vulgares - como meio de divisão interna e igualitário do serviço.
Tal despacho não violou nenhum dos preceitos legais invocados máxime o principio do juiz natural - art.° 32 n° 9 da CRP - que visa proibir a possibilidade de criação de tribunais ad /ioc ou a possibilidade arbitrária ou discricionária de se determinar o juiz competente, pois, como se disse já, e repete-se, foi integralmente respeitado o princípio da aleatoriedade.
Acresce que o despacho reclamado não de modo algum põe em causa os direitos essenciais de defesa a um processo justo e equitativo.
De registar que a situação sub iudice é totalmente diversa daquela outra que vem mencionada no acórdão da Relação de Coimbra proferido no recurso penal n° 1245/04, citado pelo arguido, pois que neste os autos eram distribuídos «de acordo com um sistema de rotatividade de juízes», o que nada tem ver, como vimos, com a situação ora em apreço.
Dizer, por fim, que não se vislumbra dos autos que tivesse havido alguma dúvida por parte do distribuidor no tocante à distribuição do processo, pelo que não se vê que o juiz que, nessa data, presidiu à distribuição tivesse que resolver qualquer questão com ela atinente e menos ainda para a peticionada remessa dos autos à presidência da Relação para os fins pretendidos.
Face a todo o exposto, concluímos pela improcedência da arguida nulidade insanável.
Assinale-se por último que é manifestamente destituído de sentido, a invocada «nulidade por omissão de pronúncia sobe a questão suscitada em II do requerimento de 8 de Setembro - nos termos do art.°. 379° c) do CPP» [«Se digne em qualquer caso ordenar ao Ministério Público que dê integral conhecimento ao recorrente e a vossa excelência do conteúdo de todas as comunicações hierárquicas com o senhor director do DCIAP, e a notificação do recorrente para completar o recurso com os elementos ou informações que assim obtive»»].
Em primeiro lugar porque tal questão extrapola, claramente, a questão que prévia da nulidade da distribuição, que se situa a montante do recurso.
E em segundo lugar porque aquela questão deveria ter sido levantada na motivação do recurso interposto e não na resposta ao parecer do MP. Nesta altura equivale a uma ampliação da motivação, sem fundamento legal, uma vez que o objecto do recurso fica definido pelas conclusões da motivação, nos termos do disposto no art° 412°, n° 1, do CPP, como é entendimento pacífico.
B) Já acima explicitamos as razões pelas quais se não coloca sequer, no caso, a nulidade da distribuição, pelo que não ocorrendo impedimento ao conhecimento do recurso, passa-se, agora, a conhecer do seu objecto.
E neste ponto cabe importa enfatizar que não tendo a questão antes mencionada sido abordada no recurso interposto, está fora do objecto do presente recurso.
Também se tem por excluída do objecto do recurso a questão da apreciação da cessação da vigência das medidas de coacção aplicadas ao recorrente por decurso do prazo máximo.
Neste aspecto ter-se-á em conta o seguinte:
a) O presente recurso foi interposto em 4.1.2016, e admitido na sequência do ordenado pelo Sr. Presidente deste TRL em 8.7.2016. - cf. certidão fls. 179 destes autos e decisões de reclamação datadas de 18.3.2016 e 7.6.2016, respectivamente a fls. 972 a 982 e 936 a 944 desta certidão.
b) Entretanto foi interposto recurso do despacho proferido em 26.1.2016, para este no qual o Recorrente declarava conformar-se parcialmente com a decisão recorrida sobre as medidas de coacção, na parte relativa à medida de coacção de proibição de contactos com outros arguidos, impugnava o decidido relativamente à proibição de se ausentar para o estrangeiro por considerar estar ultrapassado o prazo máximo de vigência dessa medida de coacção e invocava o justo impedimento para recorrer relativamente ao decurso do prazo de inquérito previsto no art.276° do Cód. Processo Penal por não lhe ter sido facultada a comunicação prevista no art.276°, n.° 6 do Cód. Processo Penal, enviada pelo titular do inquérito ao superior hierárquico e da resposta que fora dada ao despacho do superior hierárquico de 11 de Novembro e de urna reunião de trabalho em 18 de Dezembro de 2015.
c) Tal recurso foi decidido por douto acórdão deste TRL em 14.6.2016, portanto posterior àquele que nos ocupa, que a respeito da questão da extinção por caducidade da medida de coacção de proibição do arguido se ausentar para o estrangeiro considerou que (...) a contagem do prado máximo de uma dada medida de coacção, quando esta sucede a uma outra, só cumulam os dois períodos de decurso de tempo nos casos em que essas medidas são a prisão preventiva e a obrigação de permanência na habitação, em todos os outros casos de vigência sucessiva de diferentes medidas coactivas, designadamente no caso dos autos em que à medida de obrigação de permanência na habitação se sucede a medida de proibição de imposição de condutas os respectivos pratos não são cumuláveis, antes são contados independentemente. (..) Assim, o prazo da medida de proibição de ausência do território nacional sem prévia autori- zação a que foi sujeito o recorrente só se iniciou em 16.10.2015. E atendendo a que foi declarada a especial complexidade dos autos por despacho de 04/07/2014, sendo imputados ao arguido factos integradores de crimes de fraude fiscal qualificada, branqueamento de capitais e corrupção, o prazo máximo respectivo é de um ano, por força do estabelecido no artigo 215°, n.° 1, alínea a) e n.° 3 do Cód. Processo Penal, não se mostrando, por isso, esgotado. - cf. fls. 952 a 973 da presente certidão.
d) E acrescentou que a aplicação de tal medida de coacção não obliterava princípio ou garantia constitucional algum e também não violava as normas e princípios supranacionais invocadas, pelo que, nesta questão improcedeu o recurso.
e) E mais adiante a respeito da aí suscitada questão da verificação dos pressupostos do justo impedimento e consequente prorrogação do prazo de recurso, realçou-se que (...) em causa não está, ao contrário do que poderia resultar das conclusões do recurso ora em apreciação, o conhecimento da problemática da natureza do prado de inquérito, do esgotamento deste e suas consequências ( ..)
f) Mais se entendeu estar a apreciação daquela questão prejudicada pelo facto de ter sido proferida decisão em Reclamação pelo Exmo. Vice-Presidente do no sentido de baixarem os autos para que fosse dado cumprimento ao estabelecido nos artigos 140°, n.° 1 e 154° do Código de Processo Civil «pois, a não ser assim, manifestamente se estaria a admitir a possibilidade de prolação de decisões contraditórias entre si».
Assim sendo, apenas importa, agora, indagar se ocorreu a extinção do inquérito por caducidade do decurso do prazo previsto no art.276° do Cód. Processo Penal.
Vejamos, então, o despacho em apreço:
« Fls. 23760 a 23764, com referência ai/s. 23732 a 23737 - Veio o arguido J..., a douto punho, requerer que se declare extinto, por caducidade, o presente inquérito e, bem assim, que se declare extintas as medidas de coacção vigentes impostas ao mesmo, nos termos e com os fundamentos constantes do seu requerimento que aqui se dá por reproduzido.
o detentor da acção penal pronuncia-se nos termos e com os f andamentos constantes da douta promoção que infra se transcreve:
«Requerimento do arguido José Sócrates Pinto de Sousa - caducidade do inquérito e cessaçào das medidas de coacção o arguido JOSÉ PINTO DE SOUSA veio, afolhas 23732, apresentar requerimento no qual alega, em síntese, o seguinte:
a) O prazo fixado para o presente inquérito terminou no dia 19 de Outubro de 2015;
b) O requerente entende que o Ministério Público recolheu prova bastante de que o arguido não praticou crime algum ou, ao menos, não recolheu prova bastante de que algum crime tenha sido praticado ou de que o arguido tenha praticado qualquer crime;
e) As disposições ordinárias determinantes dos pra. os do inquérito não são meramente indicativas, mas são sim limitadoras do arbítrio e impeditivas da insegurança e incertetia jurídica e são, por isso, elementos essenciais de garantia, protecção e de defesa dos arguidos, visando assegurar o direito do arguido a ver a sua causa decidida com celeridade e a ver-se restituído à sua pa jurídica;
d) Os pratios da lei são, por isso, imperativos e obrigatórios; corre pondendo o seu esgotamento à caducidade do direito do Estado a prosseguir este procedimento.
Com base no exposto, requer o arguido que:
- Se declare extinto, por caducidade, o presente inquérito;
- Se declarem extintas as medidas de coacção que ainda impendem sobre si.
Contrariamente ao sufragado pelo arguido, constitui entendimento unânime da doutrina e jurisprudência que o prazo de duração do inquérito tem natureza meramente ordenadora e não peremptória.
Conforme salienta Germano Marques da Silva (citado no Código de Processo Penal-Comentários e Notas hrciticas, Coimbra Editora, 2009, anotação ao art.276°, pág. 691) a duração do inquérito, embora fixada por lei na sua dição máxima, não constitui uma garantia para o crido ou para o ofendido.
A prossecução da acção penal implica investigar a existência de um crime, determinar os seus agentes e a sua responsabilidade, assim como a recolha das provas, em ordem à decisão sobre a acusação (art.262°, n.° 1 do Cód. Processo Penal).
Ou seja, a realização da Justi'a a que o cidadão tem constitucionalmente direito, tem como corolário que o Ministério Público, no exercício da sua autonomia, apenas profira decisão de arquivar ou de acusar quando, em consciência, esteja convicto de que não existem outras diligências probatórias a reali. ar ou de que a prova já recolhida é suficiente para formular tal, juízo.
O exercício da acção penal, atribuído ao Ministério Público, não se tradu. assim, no exercício de um direito, integrado na actividade administrativa do Estado, mas sim num poder/ dever, integrado na função jurisdicional, tal como decorre da obrigatoriedade de denúncia e do estatuto conferido ao Ministério Público, arts. 242° e 243° e 48° e seguintes do Cod. Processo Penal.
O exercício da acção penal não se encontra assim, si jeito a uma regra de caducidade, encontrando-se apenas limitado pela subsistência da pretensão punitiva do Estado, traduzida nas regras de prescrição do procedimento criminal.
A pretensão do arguido a uma decisão célere, que se considera legítima, tem de ser ponderada à luz e no confronto com outros direitos que a investigação prossegue, no respeito pelos princípios que enformam o Estado de Direito.
Concretamente, tal anseio do arguido tem de ser limitado pelo direito à justiça. também ele constitucionalmente protegido (art.202°, n.° 2 da CRP) e que, no âmbito das frações que lhe estão estatuariamente acometidas, tem como consequência a obrigação do Ministério Público de prosseguir da acção penal, que visa, em última instância, a protecção da sociedade enquanto bem comum.
Assim sendo, conforme se refere na decisão hierárquica, proferida nos autos, de folhas 23522 e seguintes, que se seguiu à comunicação nos termos do disposto no art.276, n. ° 6 do Cód. Processo Penal, a fmalidade do inquérito e a missão do Ministério Público, enquanto detentor da acção penal, não se compadece com a elaboração de despacho final, e consequente encerramento do inquérito, sem ter sido analisada, de forma objectiva, a prova relevante e sem ter sido feita a sua ponderação, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 262° do CPP.
Isso significa que a ra. oabilidade da duração do inquérito deve ser aferida no contexto da investigação em concreto, variando de acordo com os interesses a conciliar; com a complexidade dos factos e sua extensão no tempo e com a nature. a das diligências de investigação a realçar. Além disso, tem de tomar em consideração o tempo que entidades externas à investigação demoram a tratier aos autos os elementos solicitados pela investigação.
Por essa ratão, ao estabelecer os prazos de inquérito, definidos no art. 276° do Cód. Processo Penal, o legislador não cominou a sua violação com nenhuma outra consequência que não a da possibilidade de intervenção hierárquica, dentro da estrutura do Ministério Público.
Do mesmo modo, no art.277° do Cód. Processo Penal, relativo ao arquivamento do inquérito, não consta qualquer norma que determine o arquivamento ou a caducidade do inquérito por decurso do seu pratio de duração máxima.
Pelo exposto, carece de fundamento legal o entendimento expresso pelo requerente no sentido de que o disposto no art. 276°-l do CPP implica que, uma ver decorrido o prazo normal do inquérito, deva o inquérito ser declarado extinto e que, em consequência, sejam também declaradas extintas as medidas de coacção aplicadas ao arguido.
Aliás, o próprio requerente não apresente qualquer fundamento para a diminuição das medidas de coacção, que é sempre suportada no acautelamento dos perigos relevantes em sede processual, no caso o perigo de perturbação da recolha e conservação da prova, que se não alterou desde a última definição processual das medidas de coacção.
Em consequência, determinamos se remetam os autos ao TCIC, para apreciação e decisão, promovendo-se que o requerido pelo arguido seja objecto de indeferimento.» (sic).
Cumpre decidir:
Os presentes autos encontram-se em fase de inquérito e, cfr. estatuí o n° 1 do art° 262° do CPP, este compreende o conjunto de diligências que visam investigar a existência de um crime, determinar os seus agentes e a responsabilidade deles e descobrir e recolher as provas, em ordem à decisão sobre a acusação. (sic.).
Atento o disposto nos art. vs 263°, n° 1 e 267° do CPP, compete ao MP, na qualidade de titular da acção penal, dirigir o inquérito.
Assim, compreendendo o inquérito um conjunto de diligências que visam investigar a existência de um crime, cabe ao MP - dominus da investigação, a sua direcção, a recolha e selecção de prova, auxiliado pelo OPC.
Em suma, é àquela entidade que, de acordo com a estratégia definida para a investigação em concreto, que compete determinar o modo e o tempo das diligências a realizar.
Como é bom de ver, não tem cabimento nas competências do JIC, atenta a redacção do are: ° 268° do CPP, a possibilidade de, em fase de inquérito, face ao conjunto de diligências que visam investigar, determinar os seus agentes, determinar a responsabilidade deles, descobrir e recolher provas e/ou determinar ou limitar o objecto dos autos.
Perfilhamos o entendimento sancionado pelo M.° P.° de que constitui entendimento unânime da doutrina e jurisprudência que o prazo de duração do inquérito tem natureza meramente ordenadora e não peremptória.
Aliás, concorda-se, na íntegra com a douta promoção do detentor da accão penal supra transcrita, à qual me arrimo por ilustrar com suficiência de argumentos o entendimento que partilhamos e que aqui damos por reproduzida, não por falta de ponderação própria da questão, mas por simples economia processual (remissão admitida pelo próprio Tribunal Constitucional - vidé Ac. TC de 30/07/2003, proferido no P.° 485/03, publicado no DA Série de 04/02/2004 e pela própria Relação de Lisboa, vidé Ac. I RL de 13/10/2004, proferido no P.° 5558/04-3), indeferindo-se, consequentemente, o requerido.
Notifique.»
Delimitado que está pois, nos termos acima enunciados, o objecto do recurso, cabe desde já dizer que a única questão a dirimir se mostra suficiente e devidamente equacionada na douta decisão recorrida bem como na resposta apresentada pelo Ministério Público junto da 1.a Instância.
Sufragando-se por isso o entendimento e considerações ali expêndidas, acrescentamos, ainda, no mesmo sentido o Acórdão do TC de 29 de Maio de 2008 [Relator Carlos Fernandes Cadilha] Processo n.° 11/08, onde a determinado passo se lê: « O artigo 276.° do CPP determina, na verdade, a fixação de pratos de duração máxima do inquérito, de acordo com a situação do dardo, o tipo legal de crime e a complexidade da respectiva investigação, podendo o Procurador-Geral da República determinar, oficiosamente ou a requerimento do arguido ou do assistente, a apação do regime de aceleração processual, nos termos do artigo 109. °, quando tenham sido ultrapassados esses prazos. Todavia, a única consequência que decorre do incumprimento desses prazos, ou daqueles que forem fixados em aplicação do mecanismo previsto no artigo 109°, é a agora estabelecida no artigo 89°, n.° 6, do CPP, na redacção da Lei n.° 47/2007, de 27 de Agosto (que se entende ser imediatamente aplicável), que se traduz na possibilidade de levantamento do segredo de justiça, a requerimento do arguido, do assistente ou do ofendido.
Nada permite, por outro lado, concluir que a ausência de libelo acusatório, no termo do prazo máximo definido para a duração do inquérito, representa a inexistência de indícios da prática de crime, já que esse prazo é meramente ordenador e a sua ultrapassagem, para além da consequência processual há pouco mencionada, não tem quaisquer efeitos preclusivos. »
E na jurisprudência das Relações pode ver-se, entre o mais recentes, o Acórdão da Relação de Coimbra, 26 de Outubro de 2016, onde se escreve: «o CPP, no seu art° 276°, 1, não atribui uma qualquer natureza ao prazo que aí estabelece para o encerramento do inquérito. Em primeiro lugar, não estamos perante o estabelecimento de um prazo para o exercício de um direito, mas antes, perante o estabelecimento de um prazo para o exercício de um poder-dever vinculado do titular da acção penal, no caso.
Daí poder retirar-se que estamos perante norma programática que mais não pretende do que fixar ao agente titular desse poder funcional um prazo para o encerramento do inquérito, sob pena de eventual responsabilidade disciplinar. Como dk Maia Gonçalves, em anotação a este artigo do CPP, «os prazos máximos de duração do inquérito não são peremptórios, pois não é possível demarcar o tempo e uma investigação. As diligências praticadas para além desses pratios são ;vcílida.~. Porém, um excesso para além do que é razoável pode desencadear responsabilidade disciplinar e um incidente de aceleração processual».
E é precisamente neste instituto de aceleração processual que vamos encontrar uma resposta decisiva à questão que nos ocupa, dentro do referido espírito unitário do sistema. Com efèito, a norma do art° 108°, 1, CPP, estatui que «quando tiverem sido excedidos os prazos previstos na lei para a duração de cada fase do processo, podem o MP, o arguido, o assistente ou as partes civis requerer a aceleração processual.»
Daqui se retira uma conclusão óbvia: - o prazo que estudamos não é de caducidade, pois que, de outro modo, a ter-se verificado, estaríamos perante um caso de preclusão do direito (no caso do poder-dever respectivo), pelo seu não exercício no prazo legalmente assinado. Mas, a assim ser, existiria contradição intrínseca do sistema processual penal, já que a norma do art° 108°, 1 do CPP permitiria o prosseguimento do processo não obstante o poder-dever de formular a acusação se ter extinguido, por ter caducado. Como poderia a lei permitir a formulação de uma acusação já depois de o prazo legalmente estabelecido para tal se mostrar precludido? E as normas dos art°s 109°, 5 e 6 do CPP, são claras na atribuição de uma responsabilidade meramente disciplinar ao causador desses atrasos, sempre que injustificados.
Ao permitir a aceleração processual, mesmo após se mostrarem excedidos os pra'os de duração de cada uma das fases processuais, a lei está a atribuir aos pratios fixados uma natureza meramente ordenatória, funcional e referencial, retirando-lhes, deste modo, qualquer nature.,a preclrusiva do poder-dever em análise.
A mesma naturetia ordenatória- funcional terão os prados para a prática dos actos da secretaria (art° 105°, CPP), para o encerramento da instrução (arí° 306°, CPP,, para a leitura da sentença (ar( 373°, CPP), entre outros.
Não se compreenderia a atribuição de natureza peremptória a esses prazos processuais, conhecida que é a crescente complexidade dos processos e, em especial, a própria naturefza cia matéria em causa, que integra o próprio `múnus' do Estado, em termos de exercício do seu poder soberano de perseguir e reprimir o crime.
Como muito bem acentua o Ex.mo PGA, no douto parecer que elaborou, a certeza e a segurança jurídicas, e a definição do estatuto dos arguidos, serão alcançados mediante a aplicação ao caso dos prazos de prescrição do procedimento criminal. »
II- DECISÃO.
Nestes termos e com tais fundamentos decide-se:
a) - Manter a decisão reclamada conforme exposto em A) supra.
b) - Negar provimento ao recurso interposto pelo arguido, mantendo-se, o
despacho recorrido na parte em que indeferiu a requerida declaração de
extinção, por caducidade, do inquérito.
Custas pelo arguido com taxa de justiça que se fixa em 6 (seis) UC.
(Elaborado e integralmente revisto pela relatora),
Maria Elisa Marques
Teresa Féria
Lisboa, 22 de Fevereiro de 2017