I - O inquérito é da exclusiva titularidade do Ministério Público e só se permite a intervenção do juiz nos casos expressamente previstos na lei. O juiz de instrução é sobretudo um juiz de garantias e de liberdades, sem qualquer intervenção de tutela hierárquica ou se supervisão dos actos do Ministério Público.
II - Assim sendo, a apreciação da necessidade de actos de inquérito, quando não legalmente impostos, é da competência exclusiva do Ministério Público e o juiz de instrução não pode declarar, durante o inquérito, a invalidade de actos processuais presididos pelo Ministério Público, tendo em atenção o principio da autonomia deste consagrado no artigo 219°, n°s 1 e 2, da Constituição da República Portuguesa.
III - A lei impõe no artigo 308.° n° 3 do C.P.P. que na decisão instrutória o juiz proceda à apreciação da regularidade dos actos de inquérito, conhecendo em primeiro lugar das nulidades e das questões prévias de que possa conhecer, e por maioria de razão este dever se tem de considerar extensível à decisão de rejeição por inadmissibilidade legal a que se refere o artigo 287° n° 3 do C.P.P.
Proc. 684/14.2T9SXL.L1 3ª Secção
Desembargadores: João Lee Ferreira - Ana Paula Grandvaux - -
Sumário elaborado por Isabel Lima
_______
TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA
Processo 684/14.2T9SXL.L1
Acordam, em conferência no Tribunal da Relação de Lisboa,
1. A denunciante, T..., Ld.a; inconformada com o despacho proferido pelo magistrado-do Ministério Público findo o inquérito, requereu a admissão da intervenção nos autos na qualidade de assistente e a abertura de instrução concluindo que deverá ser reconhecida a nulidade processual por insuficiência de inquérito, realizados actos instrutórios que enumera e, a final, ser proferido despacho de pronúncia de pelo menos C... e M... pelo cometimento do crime de abuso de confiança qualificado, prévisto e punido nos artigos 205°, n° 1e n° 4, alínea d), 11° e 12° do Código Penal.
Após a distribuição, o Exm.° juiz da 2a Secção de Instrução Criminal da Instância Central de Almada da Comarca de Lisboa proferiu em 21/11/2016 o seguinte despacho (transcrição):
Por estar em tempo e devidamente representada por advogado, para o efeito ter legitimidade e ter pago a taxa de justiça devida, nos termos do disposto nos artigos 68°, n°l, al. a) e n°3, al. a), 70°, n°l, 519°, n•°1 do C.P.P. e 80, n°l, admito T... - Empresa Fabril de Tintas, Lda, a intervir nos autos na qualidade de assistente.
Findo o inquérito, o Ministério Público decidiu proferir despacho de arquivamento.
Não se conformando com tal despacho veio a queixosa T... - 'Empresa Fabril de Tintas, Lda constituir-se assistente e requerer a abertura da instrução nos termos do disposto no artigo 287°; n°l, al. b), do C.P.P..
Nos presentes autos não foi deduzida acusação desconhecendo-se os factos ,eventualmente praticados pelo, ou, pelos, agentes do crime e que tipo de ilícito eventualmente possam preencher.
Decorre do disposto no n°2 do artigo 287°, do C.P.P. que o requerimento de abertura da instrução não está sujeito a formalidades especiais, mas deve conter, em súmula, as razões de facto e de direito de discordância relativamente à acusação ou não acusação, bem como, sempre que disso for caso, a indicação dos actos de instrução que o requerente pretende que o juiz leve a cabo, dos meios de prova que não tenham sido considerados no inquérito e dos factos que, através de uns e de outros, se espera provar, sendo ainda aplicável.ao requerimento do assistente o disposto nas alíneas b) e c) do n°3 do artigo 283°.
Estabelecem as alíneas a) b) e c), do n° 3 do artigo 283°, do C.P.P. que a acusação, contém, sob pena de nulidade as indicações tendentes à identificação do arguido, a narração, ainda que sintética, dos factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança, incluindo, se possível, o lugar, o tempo, e a motivação da sua prática, o grau de participação que o agente neles teve e quaisquer circunstâncias relevantes para a determinação da sanção que lhe deve ser aplicada, bem como a indicação das disposições legais aplicáveis.
Assim, no caso de a instrução ser requerida pelo assistente por factos relativamente aos quais o M°. P°. se tiver abstido de acusar, o_seu requerimento deve' a par dos requisitos exigidos pelo n°2 do artigo 287°, do C.P.P., incluir os factos necessários a uma acusação, os quais são absolutamente necessários à realização dos fins da instrução, particularmente no tocante à elaboração da decisão instrutória (cfr. Maia Gonçalves, in CPP anotado, 1996, T Edição, página 455) sob pena de a instrução ser, a todos os títulos, inexequível.
A rejeição por inadmissibilidade legal da instrução inclui os casos em que aos factos não corresponde infracção criminal - falta de tipicidade - e aqueles em que exista um obstáculo que impeça o procedimento criminal ou a abertura da instrução, designadamente a falta de factos que possam conduzir a uma pronúncia (cfr Maia Gonçalves, in ob. cit. pág. 455 e Acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 08.10.2002, 06.11.2001, 18.03.2003 publicados in www.dgsi, pt).
No caso concreto, o assistente não obedece aos requisitos supra referidos.
Os factos elencados pela assistente são os constantes da queixa apresentada conforme se retira da análise dos artigos 3o e 4o do requerimento de abertura da instrução.
A acusação deve ser explícita e objectiva elencando os factos de forma precisa e clara a fim de que o arguido possa deles ter a perfeita percepção e conhecimento de forma a delinear a sua defesa.
Relativamente ao crime de abuso de confiança, estabelece o n° 1, do artigo 205°, do Código. Penal que quem ilegitimamente se apropriar de coisa móvel que lhe tenha sido entregue por título não translativo da propriedade é punido com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa.
Verifica -se que são seus elementos:
- A apropriaçáo ilegítima;
- que se trate de coisa móvel;
- entregue por título não translativo da propriedade.
Mostra-se necessário a existência do elemento subjectivo, a existência da especial intenção de apropriação e com isso obter benefício ilegítimo ou a propriedade de determinada coisa.
Cumpre aqui só salientar um elemento importante que permite distinguir este tipo legal do crime de furto. A apropriação da coisa sucede a uma anterior posse da coisa objecto do crime. Inicialmente o agente recebe legitimamente a coisa passando a possui-la a título precário ou temporário, só posteriormente é que vem alterar tal situação passando a dispor da coisa como seu proprietário fosse, fazendo-a entrar na sua esfera patrimonial.
Este tipo de crime exige a inversão do título da posse, ou seja no passar o agente a dispor da coisa com animo domini. O crime consuma-se quando o agente que recebe a coisa móvel por título não translativo da propriedade para lhe dar determinado destino dela se apropria, passando a agir animo domini, devendo porém entender-se que a inversão do título carece de ser demonstrada por actos objectivos, reveladores de que o agente já está a dispor da coisa como se sua fosse (neste sentido vide Maia Gonçalves, in Código Penal Português, Anotado e Comentado, 8a edição, 1995, pág. 709).
Quanto aos factos que integram o tipo objectivo do crime de abuso de confiança, crê-se que o requerimento de abertura de instrução cumpre os requisitos ao elencar os factos nos artigos 3o e 4o. No entanto, ao estender o requerimento de abertura de instrução por mais 74° artigos, não só fica claro que aos arguidos que indica, não pode ser assacada qualquer responsabilidade criminal como também não faz menção expressa ao elemento subjectivo do tipo.
Em nenhum lado está explicito de forma clara que os arguidos actuaram de forma livre, voluntária e consciente, com o propósito conseguido de se apropriarem de bens que sabiam não lhe pertencerem, bens esses que tinham sido previamente entregues, no âmbito de um contrato, pela assistente à empresa pela qual eram responsáveis.
Todo o contexto factual narrado no requerimento de abertura de instrução, aponta, salvo o devido respeito, para uma situação de incumprimento ou impossibilidade de cumprimento a ser resolvido em sede cível e daí que, talvez, não tenha a assistente chegado a alegar factos susceptíveis de preencherem o elemento subjectivo do crime, não tenha feito a imputação do elemento subjectivo à conduta dos arguidos, porque, de facto, não a há.
Quanto à falta dos elementos subjectivos do tipo de crime, decidiu o Acórdão do Fixação de
Jurisprudência n° 1/2015 de 20/11/2014, publicado o DR Io Série, n° 18, de 27 de Janeiro de 2015, fixaa seguinte jurisprudência:
A falta de descrição, na acusação, dos elementos subjectivos do crime, nomeadamente dos que
setraduzem no conhecimento, representação ou previsão de todas as circunstâncias da factualidade típica, na livre determinação do agente e na vontade de praticar o facto com o sentido do correspondente desvalor, não pode ser integrada, em julgamento, por recurso ao mecanismo previsto no art. 358. ° do Código de Processo Penal.
Conforme se escreveu no Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, datado de 27.01.2011:
O nosso processo penal tem uma estrutura basicamente acusatória, sendo o seu objecto definido, conforme exista ou não instrução, pela acusação, pelo requerimento para abertura da instrução e pelo despacho de pronúncia. E é este que delimita os poderes de cognição do Tribunal
com vista a assegurar uma defesa eficaz e um processo equitativo. Ora, sendo o dolo um facto, deve concluir-se que a sua consideração pelo juiz de instrução na decisão instrutória, quando não alegado
no requerimento e, portanto, quando não integrando o objecto do processo, traduzir-se-á na -nulidade prevista no artigo 309°, n°1.
Assim, dá-se como assente que não pode o juiz de julgamento e, por paralelismo, também o
juiz de instrução, por força do disposto no artigo 309°, n° 1, do C.P.P., compor a acusação ou requerimento de abertura da instrução relativamente a factos quanto aos quais o M°. P°. arquivou, de forma a acrescentar-lhe elementos essenciais - no caso do acórdão - elementos subjectivos integradores da tipicidade - ao preenchimento do tipo de crime em causa.
Não é admissível a transformação de uma conduta atípica em conduta típica, e por maioria de razão, tal entendimento, aplica-se quer os autos estejam em sede de instrução quer em sede de audiência de julgamento.
A descrição dos factos que integram o tipo legal de crime imputado, quer o tipo objectivo, quer o tipo subjectivo, é, como já se referiu, fundamental, dada a circunstância de vigorar entre nós, em pleno, o princípio da legalidade e da estrutura acusatória do processo penal.
O Juiz de instrução não pode substituir-se ao assistente ou Ministério Público na alegação dos factos concretos e objectivos que preenchem os elementos do tipo. O Juiz não pode colocar na
acusação ou no requerimento de abertura da instrução, por sua própria iniciativa, os factos em falta
que são essenciais para o preenchimento de determinado tipo de crime.
Citando, o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, datado de 25.02.2015, disponível in www.dgsi.pt. que decidiu, pronunciando-se sobre a falta de enunciação dos factos consubstanciadores do elemento subjectivo do tipo de crime imputado ao arguido que:
Não é admissível a presunção do dolo com recurso à actualidade objectiva descrita na
acusação; a lei exige a narração ainda que sintética, dos factos - de todos os factos - que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena, não se contentando com subentendimentos ou factos implícitos.
O requerimento para abertura da instrução do assistente deve estruturar-se como uma acusação, dele tendo que constar a narração, ainda que sintética, dos concretos factos imputados ao arguido fundamentadorcs da aplicação de uma pena ou medida de segurança ou seja, os factos preenchedores do tipo, objectivo e subjectivo, do crime pelo qual pretende ver este pronunciado. (Cfr. Ac. do Tribunal da Relação de Coimbra de 29.04.2015, disponível in www.dgsi.pt).
Assim, atento o exposto, o Tribunal não dispõe de elementos que lhe permitam realizar os fins da Instrução, pelo que, por desrespeitar os requisitos legais, não se admite o requerimento de abertura da instrução formulado pela assistente nos termos do disposto nos artigos 283°, n°3, al. a), b) e c) 287°, n° 1, al. b), e n° 2, e 3, do C.P.P..
Notifique.
Oportunamente arquive e dê baixa.
A assistente interpôs recurso e das motivações extraiu as seguintes conclusões (transcrição) :
i.Vem o presente recurso interposto do despacho do Ex.mo Senhor Juiz de Instrução de 21-22-2016, notificado pelo ofício com a• referência 361163003 de 07-12-2016, dado nos autos supra referenciados pelo qual «não se admite o requerimento de abertura instrução formulado pela assistente».
ii.Com efeito, naquele seu requerimento de abertura de instrução a Assistente não apenas discutiu o mérito da decisão do Ministério Público de ter determinado o arquivamento do inquérito, mas, também, invocou nulidades e ilegalidades quanto à actuação do Ministério Público no inquérito e naquele despacho de arquivamento.
iii.Não obstante, na decisão sob recurso, nada se diz quanto às nulidades e ilegalidade invocadas pela Assistente no referido requerimento de abertura. de instrução, tendo, outrossim, o Ex.mo Senhor Juiz de Instrução limitado a decisão proferida à consideração de que, porque, na sua perspectiva, o Requerimento de abertura' de instrução, não teria dado cumprimento ao disposto no art. 287.° n.° 2 do CPP, na parte que determina a aplicação a este do disposto nas alineas b) e c) do n.° 3 do art. 283.° do CPP.
iv.Independentemente da resposta a dar a esta outra questão relativa ao cumprimento/incumprimento do disposto no n.° 2 do art. 287.° do CPP, na parte que determina a
aplicabilidade ao requerimento de abertura de instrução das alineas c) e d) do n.° 3 do art. 283.° do CPP, certo é que o Ex.mo Senhor' Juiz de Instrução não podia ter deixado de conhecer das ilegalidades e nulidades invocadas pela Assistente no requerimento de abertura de instrução que apresentou.
v.Não sendo os actos do Ministério Público passíveis de recurso no âmbito do inquérito, não podem deixar de ser judicialmente sindicáveis, nomeadamente junto do Juiz de Instrução.
vi.Destarte, não podia o Ex.mo Senhor Juiz de Instrução ter deixado de se pronunciar quanto aos vícios invocados pela Assistente quanto ao inquérito e quanto ao próprio despacho de arquivamento, e isto sob pena do próprio despacho proferido e ora sob recurso padecer também de nulidade de omissão de pronúncia, com tõdas as legais consequências, nos termos previstos no art. 379.° n.° 1 c) do CPP.
É esta, aliás, a posição defendida pela nossa jurisprudência segundo a qual:
«VI - Dos actos do Ministério Público levados a cabo no decurso do inquérito não cabe recurso, já que é uma modalidade de impugnação própria dos actos judiciais. Isto não significa, porém, que a legalidade de tais actos seja insindicável, pois os actos do inquérito são susceptíveis de reclamação hierárquica e (ou) sindicados, quanto à sua legalidade, pelo juiz de instrução, quando para tal seja solicitado.
VII - Enferma de nulidade, por omissão de pronúncia, o despacho judicial que decide rejeitar o requerimento para abertura de instrução e não conhece previamente de várias alegadas ilegalidades imputadas pelo requerente ao desenrolar do inquérito e ao próprio despacho de arquivamento do Ministério Público.» (sic Ac. do STJ, de 23-10-2003, dado em julgamento em Conferência, no processo n.° 03P3223).
Por outro lado:
viii. Mais do que isso - mais do que do necessário conhecimento das nulidades e ilegalidade invocada, sob pena de nulidade por omissão de pronúncia - não podia o Ex.mo Senhor Juiz de Instrução ter deixado de reconhecer que efectivamente se verificam as invocadas nulidades e
ilegalidade, nomeadamente a nulidade de insuficiência de inquérito, bem como a nulidade da decisão de arquivamento de contradição entre os fundamentos e a decisão.
ix. Verificam-se, efectivamente, as apontadas ilegalidades e nulidades, nomeadamente de insuficiência de inquérito, bastando, para assim concluir, por mero exemplo, ter em conta que o próprio Ministério Público chega mesmo a afirmar na decisão de arquivamento que outras diligências de inquérito eram possíveis, nomeadamente inquirições, mas que as não levou a cabo porque, num juízo de adivinhação, entendeu que o que resultaria das declarações, que não chegou a conhecer, seria 'idêntico ao que já antes teria sido dito por outras pessoas inquiridas no âmbito daquele inquérito, quando afirma: «Não se procedeu à inquirição das demais testemunhas indicadas por requerimento
de fls. 1254 a 1258 pela sociedade denunciante T... - Empresa Fabril de Tintas Lda. porquanto da inquirição apenas resultaria a confirmação da vasta provada já carreada para os autos (...)» (sic despacho de arquivamento).
x.Ocorre igualmente nulidade da decisão de arquivamento, por contradição entre os fundamentos e a decisão, como a Assistente deixou circunstanciadamente invocado no seu requerimento de abertura de instrução.
Paralelamente:
xi. Também pelas razões de facto e direito que a Assistente deixou detalhadamente invocadas no seu requerimento de abertura de instrução, ocorreu vício processual, cominado em nulidade, no âmbito do inquérito, em virtude da omissão da prática de acto a que o Ministério Público estava legalmente obrigado, qual seja o acto de constituição dos visados na investigação como arguidos, desde logo, os administradores da sociedade visada na queixa apresentada e inquérito efectuado, o que igualmente não poderia ter deixado de ser apreciado pelo Ex.mo Senhor Juiz de Instrução e por esse reconhecido - com idênticas consequências de nulidade da decisão por omissão de pronúncia.
xii. Considerando, também, o que foi invocado pela Assistente no seu requerimento de
abertura de instrução, não podia o Juiz de Instrução ter deixado de apreciar e confirmar o vício de
. falta de prática dos actos de investigação também elencados naquele requerimento de abertura de instrução, no âmbito do inquérito, e daí ter concluído pela nulidade de insuficiência de inquérito invocada.
Por outro lado:
xiii. O despacho ora sob recurso decidiu que mão se admite o requerimento de abertura
instrução formulado pela assistente», para o efeito invocando que «Em lado nenhum lado está
. explicito de forma clara que os arguidos actuaram de forma livre, voluntária e consciente, com o propósito conseguido de se apropriarem de bens que sabiam não lhes pertencer, bens esses que
tinham sido previamente entregues, no âmbito de um contraio, pela assistente à empresa pela qual eram responsáveis.», concluindo a final que a decisão de não admitir a requerida instrução é proferida
nos termos do disposto nos artigos 283.°, n.° 3, al. a), b) e c))287.°, n.° 1, e n.°2, e 3, do CPP.».
Não obstante:
xiv. Dispõe o art. 287.° n.° do CPP, além do mais, ser aplicável ao requerimento de abertura de instrução o que vem disposto nas alíneas b) e c) do n.° 3 do art. 283.° do CPPT, c, por sua vez,
prevêem as alíneas b) e e) do n.° 3 do art. 283.° do CPP:
« b) A narração, ainda que sintética, dos factos que fundamentam a aplicação ao arguido de
uma pena ou de uma medida de segurança, incluindo, se possível, o lugar, o tempo e a motivação da
sua prática, o grau de participação que o agente neles teve e quaisquer circunstâncias relevantes para
a determinação da sanção que lhe deve ser aplicada; c) A indicação das disposições legais aplicáveis;».
xv. Analisando o requerimento de abertura de instruçau apresentado, logo se conclui que,
contrariamente ao decidido, a Assistente fez neste a descrição, ainda que sucinta, dos factos que
fundamentam a sujeição dos arguidos que para o efeito identificou a julgamento, descrevendo o modo e grau de participação destes nos factos ocorridos, bem como indicou as disposições legais aplicáveis.
xvi. Com efeito, contrariamente ao que se lê na decisão recorrida, analisado o requerimento de abertura de instrução não pode deixar de concluir-se que a Assistente cumpriu os ónus que sobre esta impendiam na prática daquele acto processual, e, além do mais, é certo que deixou «explicito de forma clara que os arguidos actuaram de forma livre, voluntária e consciente, com o propósito conseguido de se apropriarem de bens que sabiam não lhes pertencer, bens esses que tinham sido previamente entregues, no âmbito de um contrato, pela assistente à empresa pela qual eram responsáveis.».
xvii. Para assim concluir Basta ver o que se deixou vertido nos arts. 3.0, 4.0, 15.° a 19.°, 20.° a 22.°, 24.° a 27.°, 32.°, 34.° a 37.°, 43.° a 44.0, 47.° a 50.° e 51.° a 52.° do requerimento de abertura de instrução (ou, pelo menos, o que se deixou vertido nos artigos arts. 3.0, 4.0, 15.° a 19.°, 20.° a 22.°, 24.° a 21°, 32.°, 44.°, 50.° e 51,° do requerimento de abertura de instrução).
xviii. Ao assim não entender, o Ex.mo Senhor Juiz de Instrução incorreu em vício de erro de julgamento, a implicar a revogação da decisão proferida e a sua substituição por outra que não padeça de tal vício.
O Ministério Público, por intermédio do Exm.° procurador-adjunto, formulou resposta concluindo que deve ser concedido parcial provimento ao recurso e substituído o despacho recorrido por um outro que se pronuncie sobre o segmento do requerimento em que a assistente suscita nulidades e irregularidades ocorridas no inquérito.
O processo deu entrada neste Tribunal da Relação de Lisboa em 16 de Março de 2017. No momento processual a que se reporta o artigo 416° do Código de Processo Penal, a Exm.a procuradora-geral adjunta apôs Visto.
Realizada a conferência, cumpre apreciar e decidir.
2. Tendo em conta o teor das conclusões do recurso, as questões a resolver consistem em saber, em primeiro lugar, se o despacho recorrido enferma de nulidade processual por omissão de pronúncia e, em segundo, se se verifica fundamento para a rejeição liminar do requerimento por inadmissibilidade legal da instância.
Recorde-se que no requerimento inicial de abertura da instrução, a assistente afirmou além do mais, o seguinte (transcrição parcial):
Logo na sequência da audição da testemunha «J…, director financeiro da sociedade denunciada», deveria o MP ter determinado a constituição dos identificados administradores como arguidos, por dos elementos probatórios resultantes daquela diligência de inquirição terem resultados indícios de que os referidos administradores praticaram actos (por acção ou omissão) passíveis de constituir a prática do crime de abuso de confiança,
42. ou, pelo menos, não pode deixar de concluir-se que, daquele depoimento, resultaram indícios suficientes para suspeitar que aqueles administradores da sociedade denunciada praticaram tais actos passíveis de subsunção à prática daquele crime.
43. E que, naquele depoimento, como afirma o próprio MP, afirmou, além do mais, aquela testemunha «J..., director financeiro da sociedade denunciada»:
a) Que 4...1 após a venda de bens os valores daí resultantes eram depositados numa conta bancária titulada pela sociedade denunciada para posteriormente serem entregues à sociedade denunciante [..]»;
b) Que «[...] a sociedade denunciada começou a ser objecto de penhoras por parte dos credores e do Instituto de Segurança Social tendo as contas bancárias da sociedade denunciante sido penhoradas no âmbito''de processos de execução e, dessa forma, a sociedade denunciada viu-se impossibilitada de efectuar os pagamentos aos fornecedores. [...];
c) Que «[...] aquando das penhoras foi explicado aos credores e ao Instituto de Segurança Social que os valores monetários existentes nessas contas bancárias não eram propriedade da sociedade denunciada sendo que todavia tais quantias foram ainda assim penhoradas porquanto o titular das referidas contas bancárias era apenas a sociedade denunciada [...];
d) Que «[...] a movimentação das contas bancárias da sociedade denunciada eram efectuadas pelos dois administradores, nomeadamente os Srs. C… e M…, e que as mesmas foram sendo gradualmente penhoradas pelos credores durante o ano de 2014, a última conta bancária foi penhorada pelo Instituto de Segurança Social. [...]».
44.° Isto é: daquele depoimento resulta claro que os administradores em causa sabiam da penhora das contas, sabiam que os valores ali penhorados não eram da propriedade da sociedade denunciada, sabiam que com tais penhoras se estava a destinar tais valores ao pagamento de dívidas da denunéiada que não perante a Assistente e, ainda assim, não apenas não reagiram judicialmente contra tais actos de penhora, como se abstiveram de dar conta à Assistente, como era sua obrigação, de que valor pecuniários que era desta e que estava entregues à sociedade denunciada como mera fiel depositária, estavam a ser apreendidds em processo de execução instaurado contra a sociedade denunciada para serem usados para pagar passivo desta, de modo a que fosse possível à Assistente reagir judicialmente contra esses ilegais actos de apreensão de património que era desta.
' - 'Assim, da uele depoimento resultam, senão indícios da prática de crime pelos identificados ad- iiriistradores, elo í`fiénos suspeitas fartes de que estes quiseram que aquelas quáltias fossem utilizadas para pagar passivo da sociedade denunciada que não perante a Assistente, dito de outro modo, quiseram dar àquelas quantias destino ou fim diverso daquele que era devido, em benefício do património dá' sociedade denunciada, o que é manifesto corresponder a apropriação para os efeitos do disposto no art. 205.° do CP.
SEM PRESCINDIR
46.°Se não naquele morMhTO, ao menos' no decorrer do depoimento qkk veio' a ser prestados por aqueles administradores, resulta manifesto que não podiam os mesmos, nessa altura, ter sido constituídos arguidos ao abrigo do art. 59.° do CPP.
47. E que, quanto a «C..., administrador da sociedade denunciada Mestre M... S.A., nomeadamente ligado ao controle financeiro do grupo», afirma ao MP ter resultado do seu depoimento:
a) Que «[...] no início de 2014, devido a acentuadas dificuldades financeiras da empresa, a sociedade denunciada foi objecto de diversas penhoras nas constas bancárias pelos creddores e pelo Estiado e Instituto de Segurança Social, situação que pfovocou a impossibilidade da empresa movimentas as constas bancárias; •'
b) Que «[...] após a venda da mercadoria, e aquando do recebimento do preço de venda que era féita habitualmente através de multibanco, o dinheiro ficava indisponível e seguidamente era retirado da conta por via das penhoras que eram feitas sem o prévio conhecimento da empresa, esclarecendo ainda que estes montantes não reverteram em Benefício de ninguém da empresa
c) Que «Em consequência de tal facto não era possível à empresa fazer uma gestão normal de tesouraria, o que, consequentemente, originou que os pagamentos que deveriam ser feitos no âmbito dos contratos não foram efectuados [...]»;
d) Que «[...] com o agravamento da situação a sociedade denunciada apresentou-se a um plano especial de revitalização, com o n° 1952/15.1T8BRR-A, que correu termos na Comarca de Lisboa/Barreiro, cujo plano de recuperação não foi aprovado pela maioria dos credores, incluindo a sociedade L… Lda. e, assim, a sociedade denunciada foi declarada insolvente através do processo, n°'268/13.2TYLSB e que correu termos no J3 da Secção de Comércio do Tribunal de Lisboa. [...]»;
e) Qne «[.-.] aquando dã declaração de insõlvê!sliam em stock diversas mercadõrias desconhecendo se seriam mercadorias à consignação, sendo que foi nomeado administrador de insolvência.».
48.°Já quanto a «M..., administrador da sociedade denunciada conjuntamente com Carlos Fortunas», afirma o MP ter resultado do respectivo depoimento:
a) Que «[...] a gestão financeira era feita por J... [...]»;
b) Que «[...] era do seu conhecimento da existência da falta de pagamentos a diversos fornecedores em consequência dos problemas financeiros por falta de liquidez. [...]»;
c) Que «[...] as contas bancárias foram penhoradas e por esse motivo não foram liquidados os valores em dívida aos fornecedores. [...]»;
d) Que «Relativamente às queixas-crimes [...] desconhece se se os bens fornecidos pelas sociedade denunciantes foram vendidos, sendo que é do seu conhecimento que existe material que não foi vendido e que foi entregue posteriormente ao administrador de insolvência aquando da declaração de insolvência.».
Isto é:_
49.Se não antes, ao menos aquando do depoimento que foi prestado por aqueles identificados administradores, resultavam indícios suficientes para se suspeitar que estes praticaram os factos (por acção e omissão) que consubstanciava a prática do crime de abuso de confiança p. e p. pelo art. 205.° do CP,
50. pois que daqueles depoimentos resulta claro que estes sabiam da penhora das contas, sabiam que os valores ali penhorados não eram da propriedade da sociedade denunciada, sabiam que com tais penhoras se estava a destinar tais valores ao pagamento de dívidas da denunciada que não perante a Assistente e, ainda assim, não apenas não reagiram judicialmente contra tais actos de penhora, como se abstiveram de dar conta à Assistente, como era sua obrigação, de que valor pecuniários que era desta e que estava entregues à sociedade denunciada como mera fiel depositária, estavam a ser apreendidos em processo de execução instaurado contra a sociedade denunciada para serem usados para pagar passivo desta.
E, mais do que isso, daqueles depoimento resulta claro ue a sociedade denu cia geria
os valores que sabia serem da propriedade da Assistente como se de bem seu se tratasse, não apenas quando permitiu que estes foram utilizados para garantir ou pagar obrigações suas, mas ainda porque os considerava na gestão financeira e na gestão de tesouraria que fazia.
52.°E que, como se disse, porque aqueles valores não eram propriedade da sociedade denunciada, cabendo-lhe a obrigação de guarda dos mesmos (art. 1187.° a) do Cód. Civil), tais quantias não fazem parte da tesouraria da sociedade denunciante, nem aí poderiam ser considerados para efeito de saber da liquidez desta.
Destarte:
Ao assim proceder, não promovendo a constituição daqueles administradores da sociedade
demandada como arguidos, o MP violou a lei, deixando de praticar actos de inquérito obrigatórios, assim determinando a insuficiência de inquérito, com a consequente nulidade processual, nos termos do disposto no art. 120° n° 2 d) do CPP, o que expressamente se argui para todos os legais efeitos.
Face às afirmações feitas constar do despacho de arquivamento, resulta claro que, ao abrigo dos deveres de investigação que impendem sobre o MP no âmbito do inquérito, incumbia-lhe diligenciar pela obtenção de informações, e meios probatórios, relativamente aos indícios que ali recolheu.
55.Como lhe incumbia diligenciar pela obtenção de informações, e meios probatórios, de factos adicionais com manifesto relevo para a descoberta da verdade, essenciais à compreensão dos factos ocorridos e seu enquadramento.
56.Veja-se, aliás, que, impressivamente, o MP no inquérito levado a cabo se limitou a ouvir como testemunhas administradores da sociedade denunciada, isto é, as pessoas que potencialmente poderiam ter intervindo na prátia dos actos ou omissões que estavam sob investigação,
57.e, com excepção deste, ouviu apenas o director financeiro e o Revisor Oficial de Contas suplente.
58.Isto é, de relevo, ouviu potenciais arguidos e o director financeiro, e, após tais audições, entendeu ter levado a cabo diligências suficientes porque os dois potenciais arguidos que prestaram É.
60.°Parecem, no mínimo, insuficientes as diligências levadas a cabo, .
61.°Sendo certo que o que por aqueles foi declarado leva exactamente à conclusão oposta. Assim;
62.°Desde logo, impunha-se diligenciar pela obtenção de informações e elementos probatórios respeitantes às seguintes circunstâncias:
a) Identificação dos processos de execução em que foram feitas penhoras e identificação de quem sejam os exequentes;
b) Identificação concreta das penhoras efectuadas, com identificação das contas
penhoradas e valor penhorado, bem como a data em que essas penhoras ocorreram;
c) Certidão de eventual alegada informação dada nesses processos pela sociedade denunciada de que esses valores penhorados não eram da propriedade da sociedade denunciada;
d) Informação quanto ao destino dado às quantias penhoras no âmbito de cada um desses processos;
Assim, impunha-se, pois, ao MP diligenciar pela audição do ROC efectivo da sociedade denunciada,
73.Nomeadamente no sentido de confirmar se efectivamente a sociedade demandada geriu as quantias pecuniárias da Assistente e mercadorias fornecidas por esta como se de bens próprios se tratasse, também do ponto de vista contabilístico.
74.Ora, por tudo quanto vem exposto, resulta claro que o MP não desenvolveu no âmbito do inquérito diligências que se mostravam necessárias à formulação de um juízo final no âmbito deste, e que lhe permitisse decidir pela formulação de acusação por todos os factos que, pelo menos indiciariamente, estavam ao seu alcance.
Isto posto:
75. As diligências referidas, eram, como é bom de ver, essenciais à descoberta da verdade material e boa decisão a proferir no termo do inquérito,
76.pelo que se encontrava o MP, no âmbito dos seus poderes/deveres investigatórios, obrigado à sua prática.
Estabelece o art. 262.° n.° 1 do CPP que «O inquérito compreende o conjunto de diligências
que visam investigar a existência de um crime, determinar os seus agentes e a responsabilidade deles e descobrir e recolher as provas, em ordem à decisão sobre a acusação.».
78.Com efeito, tendo o MP deixado de praticar aqueles actos supra referidos a que estava lobrigado, por se mostrarem essenciais à descoberta da verdade material e por serem essenciais a uma
decisão que pusesse termo ao inquérito,
79.incorreu em vício, cominado de nulidade, correspondente a insuficiência de inquérito, nos termos do disposto no art. 120.° n.°1 d) do CPP - o que expressamente se argui. (...)
Como sabemos, o inquérito é da exclusiva titularidade do Ministério Público e só se permite a intervenção do juiz nos casos expressamente previstos na lei. O juiz de instrução é sobretudo um juiz de garantias e de liberdades, sem qualquer intervenção de tutela hierárquica ou se supervisão dos actos do Ministério Público.
Assim sendo, a apreciação da necessidade de actos de inquérito, quando não legalmente impostos, é da competência exclusiva do Ministério Público e o juiz de instrução não pode declarar, durante o inquérito, a invalidade de actos processuais presididos pelo Ministério Público, tendo em atenção o principio da autonomia deste consagrado no artigo 219°, n°s 1 e 2, da Constituição da República Portuguesa.
Após ter sido encerrado o inquérito, pode iniciar-se uma fase do processo sob a direcção de um juiz, a quem compete fiscalizar a legalidade dos actos praticados no decurso do inquérito, apreciar da sua admissibilidade e suficiência para a decisão instrutória, determinar e realizar as diligências que considerar úteis para a descoberta da verdade, assim se garantindo a tutela jurisdicional efectiva, por referencia aos artigos 20° n° 1 e 202° n° 2 da Constituição da República Portuguesa.
Como escreveu Germano Marques da Silva, a garantia de fiscalização judicial da decisão de arquivamento constitui uma consequência da consagração da reserva de jurisdição na aplicação da lei penal e do princípio da legalidade da acção penal e consequente
indisponibilidade do processo e do' seu objecto pelo Ministério Público.
A lei impõe no artigo 308° n° 3 do, C.P.P. qw na decisão instrutória o juiz proceda à
apreciação da regularidade dos actos de inquérito, conhecendo em primeiro lugar das nulidades e das questões prévias de que possa conhecer , e por maioria de razão este dever se tem de considerar extensível à decisão de rejeição por inadmissibilidade legal a que se refere o artigo 287° n° 3'40 C.P.P.
Na requerimento de abertura de instrução destes autos, a sociedade assistente apresentou argumentos e formulou pretensão de ver declarada invalidade processual por insuficiência do inquérito, mas o Exm.° juiz proferiu decisão de rejeição liminar sem que tivesse
havido qualquer apreciação prévia desses argumentos e decisão sobre a verificação da nulidade.
O acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 23-10-2003 incidiu sobre uma situação de rejeição do requerimento de abertura de instrução com omissão de pronúncia quanto à arguição de nulidade ocorrida no inquérito. Aí se escreveu o seguinte, com que concordamos:
«(...) se a legalidade dos actos de inquérito é sindicável pelo juiz de instrução; se tal sindicância constitui, afinal, um direito do assistente; se o assistente imputou à actuação do Ministério Público actos tidos por ilegais; se, enfim, é de ter como extensível ao despacho que se pronuncia sobre o requerimento de abertura de instrução, o comando do n.° 3, do artigo 308.° do Código de Processo Penal, importava que o despacho recorrido tivesse conhecido (previamente) das invocadas nulidades e (ou) ilegalidades imputadas à actuação do Ministério Público (...).
Assim não o tendo feito, o despacho recorrido deixou de pronunciar-se sobre questões que devia conhecer, pelo que, nos termos do disposto no artigo 379.°, n.° 1, c) em conjugação com aquele artigo 308.°, n.° 3, do Código de Processo Penal, enferma de nulidade. (Relator Pereira Madeira, processo 03P3223, in www.dgsi.pt )
Impõe-se sublinhar que a decisão de rejeição liminar da abertura de instrução põe termo ao procedimento e afecta de uma forma irreversível a possibilidade de o assistente aceder ao Tribunal para defesa dos seus direitos e interesses em processo-crime.
O especial relevo do direito do assistente a uma intervenção jurisdicional sobre a legalidade do despacho de encerramento do inquérito tem de conduzir ao entendimento de que se encontra inquinado de nulidade insanável o despacho judicial que rejeite a abertura de instrução sem que previamente aprecie e decida sobre a arguição de invalidades processuais ocorridas durante o inquérito.
Sem por ora cuidar de saber se o assistente tem razão nos seus argumentos e se efectivamente ocorreu qualquer nulidade por insuficiência do inquérito, é indispensável que seja garantido o direito do assistente a ver essa questão apreciada por um juiz de instrução.
Em conclusão, a decisão recorrida não pode subsistir, assim ficando prejudicada a apreciação dos restantes fundamentos do recurso.
3. Pelos fundamentos expostos, acordam os juízes do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar procedente o recurso da assistente e em declarar a nulidade do despacho recorrido que deve ser substituído por outro que se pronuncie sobre a arguição de nulidades e irregularidades ocorridas no inquérito e, consoante a decisão nesse âmbito, aprecie e decida sobre a admissibilidade da instrução.
Sem tributação.
Lisboa, 19 de Abril de 2017.
Texto elaborado em computador e revisto pelos juizes desembargadores que o subscrevem.
João Lee Ferreira
Ana Paula Grandvaux