Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Jurisprudência da Relação Criminal
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 - ACRL de 10-07-2018   Denúncia caluniosa e de falsidade de testemunho. Princípio in dubio pro reo.
Para que o tribunal lance mão do princípio in dubio pro reo, ou seja, faça prevalecer, nesta vertente, o princípio da inocência do arguido - art. 32o, 2, C. R. Port. -, torna-se necessário que o julgador se encontre em face de dúvidas irremovíveis, razoáveis e razoáveis, na apreciação e valoração das provas e na determinação dos factos provados, favorecendo o arguido, no sentido de não ter como provados os factos que lhe são imputados na acusação e que, a provarem-se, seriam fundamento para a aplicação de uma pena
Ante as dúvidas manifestadas e não resolvidas, impõe-se decidir favoravelmente ao arguido.No caso dos autos, a matéria de facto que se logrou apurar não deixa qualquer margem para dúvidas de que os arguidos praticaram os factos em causa e, consequentemente, preencheram com as suas condutas os tipos legais de crime em causa. Consequentemente, utilizou indevidamente o tribunal a quo o princípio in dubio pro reo posto que não existe qualquer situação (dúvida) que impusesse a sua aplicação.
Proc. 1301/13.3TDLSB.L2 5ª Secção
Desembargadores:  Carlos Espírito Santo - Cid Geraldo - -
Sumário elaborado por Susana Leandro
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Acordam, em conferência, os juízes da 5ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:

No âmbito do Processo Comum Singular supra id., que corre termos pela Comarca de Lisboa — Juízo Local Criminal de Lisboa —juiz 8, foram os arguidos JU..., JO..., NE... e SA..., com os demais sinais dos autos, absolvidos: o arguido JU... da autoria material dos crimes de denúncia caluniosa e de falsidade de testemunho de que vinha pronunciado; os arguidos JO..., NE... e SA... da autoria material dos crimes de falsidade de testemunho de que vinham pronunciados. Mais foi julgado totalmente improcedente o pedido de indemnização civil formulado por JOA... contra JU..., JO..., NE... e SA..., sendo os mesmos absolvidos do pedido.
Inconformado com o teor de tal decisão interpôs o assistente JOA... o presente recurso pedindo seja revogada a sentença recorrida e, alterada a decisão sobre matéria de facto no sentido propugnado pelo recorrente, condenados todos os arguidos pelos crimes pelos quais foram pronunciados e condenando-os no P.I.C. conforme pedido.
Apresentou para tal as seguintes conclusões:
1. Entre o juízo de probabilidade (próprio da fase de instrução) e o juízo de certeza (da fase de julgamento) não existe uma diferença essencial, pois a decisão do juiz que pronuncia, porque se constitui como um pré-juízo fundado na mesma teleologia, há-de basear-se já num juízo muito próximo do que preside à decisão do juiz que julga;
2. Revogando o despacho de não pronúncia, o Tribunal da Relação de Lisboa, por acórdão de 09.07.2015, ordenou a pronúncia de todos os arguidos, sendo o arguido S... pela autoria material, em concurso efectivo, dos crimes de denúncia caluniosa e falsidade de testemunho, previstos e puníveis, respectivamente, pelos artigos 365.°, n. 2 e 360.°, n. 1, do Código Penal e os demais arguidos pela autoria material de um crime de falsidade de testemunho;
3. Porém, o Tribunal a quo, ignorando o juízo de alta probabilidade de condenação dos arguidos contido naquele acórdão e oposição à decisão do tribunal superior, por sentença de 15.06.2016, decidiu absolver totalmente os arguidos;
4. Como bem se colhe da motivação probatória da sentença recorrida, na decisão sobre matéria de facto, o Tribunal a quo baseou-se, essencialmente, nas declarações dos arguidos e, em particular, nas declarações do caluniador, o arguido S..., apesar da afirmação inequívoca de que ele voluntária e conscientemente, mentiu para prejudicar o assistente (cfr. acórdão do Tribunal Relação);
5. Aliás, é isso mesmo que nos diz a experiência acumulada: em situações em que é posta em causa a legalidade da sua actuação, os agentes policiais, geralmente, mentem e não têm qualquer pejo em fazê-lo em documentos públicos e em tribunal;
6. Por incorrecta apreciação e valoração da prova produzida, o Tribunal a quo andou mal no julgamento dos factos descritos sob os n.°s 5, 6, 7, 8, 9, 10, 12, 24 e 31 do elenco de factos considerados provados e nas alíneas a) a m) do elenco de factos considerados não provados, que aqui se dispensa de reproduzir porque já o fez no corpo da motivação deste recurso;
7. As provas que impõem decisão diversa da recorrida são as declarações do assistente (que o Tribunal a quo menosprezou completamente) e os documentos que integram os autos, com destaque para participação do arguido S... ao CSM, contendo as imputações caluniosas ao assistente (fls. 12 a 16 da certidão com que foi instruída a denúncia apresentada e que deu origem a este processo), os autos de declarações dos aqui arguidos prestadas no âmbito do inquérito administrativo determinado pelo CSM (fls. 17 a 25), o registo fotográfico do local onde se encontravam os arguidos em acção de fiscalização (fotografias de fls. 57 a 62), o auto que formalizou a queixa pelo furto das chapas de matrícula (fls. 75) e a prova indirecta, como, desenvolvidamente, demostra na motivação deste recurso;
8. Aliás, mesmo as declarações dos arguidos, se devidamente apreciadas e avaliadas de harmonia com as regras da lógica, da razão e da experiência comum, reforçam a conclusão de que foram mal julgados os pontos da matéria de facto impugnada;
9. Ninguém com base nas regras da experiência e com sentido crítico acreditará que os arguidos SI... e S..., que no decurso de toda a acção de fiscalização destilaram fúria contra o aqui recorrente, iriam deixar passar a oportunidade de o fazer pagar uma pesada coima (de € 500,00 a € 2 500,00) e de o fazer cumprir a sanção de inibição de conduzir pela pretensa desobediência a uma ordem de paragem que lhe teriam dirigido;
10. Ordem de paragem que o arguido S... garantiu, primeiro, na participação feita na participação dirigida ao CSM, depois no depoimento prestado no âmbito do inquérito administrativo do CSM (documento junto com a denúncia) e, finalmente, na audiência de julgamento, que foi vista e percebida pelo assistente que, assim, lhe teria desobedecido, mas que nem o arguido SI... corroborou;
11. Se, realmente, tivesse havido uma ordem de paragem desobedecida, ninguém duvidará que os arguidos SI... e S..., seguramente, teriam levantado o respectivo auto de notícia da contra-ordenação, mas tal não aconteceu;
12. À falta de qualquer explicação lógica e razoável, a omissão só pode levar à conclusão de que a imputação da desobediência é uma falsidade do arguido S... que, voluntária e conscientemente, mentiu para prejudicar o assistente:
13. Essa conclusão probatória revela-se, inteiramente, razoável face a critérios lógicos do discernimento humano, ou, dizendo de outro modo, o juízo inferencial é lógico, razoável e fundamentado;
14. Sendo ponto inquestionável que o assistente, apenas, se identificou como juiz de direito já na parte final da intervenção dos arguidos e quando estes já se preparavam para abandonar o local, é óbvio que, também, não pode ser verdade outra imputação do arguido S... feita na participação ao CSM: que o assistente se identificou como magistrado em serviço no Conselho Superior da Magistratura e como sendo funcionário desse órgão colegial de excelência da magistratura portuguesa para tentar intimidar os agentes policiais que se encontravam a desempenhar as suas funções;
15. Se o assistente foi agressivo, provocador, ofensivo e intimidatório como afirmou o arguido S..., o que seria normal, o que seria de esperar, o que, legalmente, se impunha é que ele elaborasse um auto dando notícia das alegadas ofensas e intimidações e o remetesse ao Ministério Público para que este averiguasse eventual responsabilidade criminal do aqui assistente;
16. Não o fez, muito simplesmente, porque, mais uma vez, o arguido S... mentiu e por isso não foi capaz de concretizar qualquer ofensa que o assistente teria cometido, não diz que provocações lhes dirigiu nem menciona uma única agressão (física ou verbal);
17. A imputação do arguido S... é, totalmente, inverosímil e muito se estranha que o Tribunal a quo tenha acreditado que quatro militares da GNR teriam sido intimidados fisicamente por um quase sexagenário, um malfeitor em fuga após sinal de
paragem e que tanto medo teriam tido do Assistente ( ) que não levantaram o
auto por desobediência ao sinal de paragem (do acórdão do Tribunal da Relação) nem qualquer outro auto de notícia;
18. É ainda surpreendente na decisão do Tribunal a quo que tenha sido deturpado o depoimento do assistente, pois que, ao contrário do que fez constar da sentença, é falso que alguma vez tenha afirmado que, face ao documento emitido pela PSP, em seu poder, poderia circular com a viatura sem chapas de matrícula;
19. Não é qualquer dúvida que há-de levar o tribunal a decidir pro reo. Tem de ser uma dúvida razoável, objectiva, que impeça a convicção do tribunal;
20. Não tem nada de razoável, porque meramente subjectiva, a dúvida que o Tribunal a quo diz ter prevalecido quanto à falsidade das imputações feitas pelo arguido S...;
21. Mesmo menosprezando a palavra do assistente, a conclusão a que se chega, se não esquecermos a lógica, a razão e as regras da experiência comum, é a da falsidade das imputações do arguido S...;
22. Para isso transcrevemos algumas partes do depoimento prestado pelo arguido J... S... e pela arguida SA... RE... para sustentar a falsidade das imputações feitas ao Assistente: Depoimento do Sargento JS…
23. Depoimento da arguida SA..
24. Alterando-se a decisão sobre matéria de facto no sentido que propugna, ficam, inteiramente, preenchidos os elementos, quer objectivos, quer subjectivos, que integram a estrutura típica dos crimes de denúncia caluniosa e falsidade de testemunho, previstos e puníveis, respectivamente, pelos artigos 365.0, n. ° 2 e 360.°, n. 1, do Código Penal;
25. Constituiu-se o arguido S... autor material, em concurso efectivo, dos crimes de denúncia caluniosa e falsidade de testemunho, sendo os demais arguidos autores materiais do crime de falsidade de testemunho;
26. Ainda no pressuposto da alteração da decisão sobre matéria de facto no sentido que propugna, estarão verificados todos os pressupostos da responsabilidade civil aquiliana, constituindo-se os arguidos/demandados na obrigação de indemnizar o assistente/demandante pelos danos (não patrimoniais) que lhe causam.
27. Condenando-se os arguidos pelos crimes de que vêm pronunciados, deverá o Pedido de indemnização cível também ser dado como provado, atendendo designadamente aos depoimentos prestados quer pelo Assistente, quer pela testemunha arrolada, F.... O Assistente foi ouvido no dia 31 de Maio de 2016, (início da gravação 12:35:41 e fim às 13:12:29) e a testemunha foi ouvida no dia 01 de Junho de 2016 (início da gravação 15:19:03 e fim às 15:41:09).
A decisão recorrida violou, por errada interpretação e aplicação, entre outras, as normas dos artigos 127.° e 169.° do Código de Processo Penal, 365.°, n. 2 e 360.°, n. 1, do Código Penal e 483.° e 496.°, n. 1, do Código Civil.
Respondeu o MP, pugnando pela improcedência do recurso, tendo para tal formulado as seguintes conclusões:
1. O valor dos indícios não é igual ao valor da prova, relevando apenas os primeiros para que se deduza acusação ou se profira despacho de pronúncia com a segurança necessária, ou seja garantindo-se ao arguido um julgamento onde — a demonstrarem-se os factos — é mais provável que seja condenado do que absolvido;
2. A decisão do Tribunal da Relação de Lisboa, respeitante ao despacho de não pronúncia, não vincula por qualquer forma a decisão a tomar pelo Tribunal de Julgamento;
3. Tal decisão do Tribunal superior apenas definiu o objecto do processo —a discutir em julgamento — como o faz, normalmente, a acusação do M. P., mas não determinou que os factos, que ali se indiciaram, tivessem o valor de factos provados;
4. O tribunal a quo obedeceu, cabalmente, aos princípios da investigação e da imediação, que orientam a fase de julgamento e decidiu em conformidade com o princípio do in dubio pro reo;
5. Surgiu no espírito do julgador a dúvida, razoável, insanável e inultrapassável, quanto à verdade material dos factos dado que as versões dos arguidos e do assistente mereceram credibilidade e revelaram-se perfeitamente plausíveis;
6. O Tribunal a quo baseou-se em toda a prova carreada pelos autos em conjugação da prova produzida em sede de julgamento e não apenas nas declarações dos arguidos;
7. O tribunal recorrido não menosprezou as declarações do assistente, antes levou-as em conta, mas não lhe deu valor acrescido por terem sido proferidas por magistrado;
8. A prova foi apreciada pela Mm.a Juiz de forma livre, racional, objectiva e totalmente imparcial, verificando-se da sentença o processo lógico que fundamentou a decisão;
9. Não merece, assim, a decisão proferida qualquer reparo quanto aos factos dados como provados e não provados;
10. Não houve também da parte do Tribunal recorrido violação de qualquer regra de experiência comum;
11. A decisão recorrida não violou o disposto nos artigos 127.° e 169.° do C. P. Penal, entendendo o M. P. que o tribunal recorrido decidiu de acordo com a livre convicção que formou, através da imediação da prova, ao longo do julgamento e revelou manifesta imparcialidade na sentença que proferiu.
Responderam também os arguidos J... S..., SA... RE... e JO... SI..., no sentido da manutenção da sentença recorrida, tendo para tal apresentado as seguintes conclusões:
A) No anterior Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, entendeu-se ordenar a pronúncia dos Arguidos, para em sede de julgamento se poder aferir de forma segura uma eventual confirmação sobre a existência dos pressupostos integradores dos tipos de ilícitos pelos quais os Arguidos se encontravam a responder, nos presentes Autos, pois foi entendido que, do estado em que se encontravam os Autos, ressaltavam indícios sobre a prática dos ilícitos penais, ou seja, antes de toda a matéria dos Autos ser submetida ao crivo da imediação da prova.
B) No ponto 2.2 (ainda a fls. 758) o Assistente, procura alertar os Venerandos Desembargadores, enquanto seus pares, de que O Tribunal a quo, ou qualquer outro Tribunal, ter de ter presente que a palavra de um juiz, terá de ter, por princípio, credibilidade. E assim deve ser porque sobre um magistrado recaem especiais exigências de rigor, objectividade e verdade, quer quando julga, quer quando intervém na veste de testemunha ou declarante, tudo para fazer crer aos Venerandos Desembargadores que pelo facto de o Assistente ser Juiz Desembargador, é a pessoa que detém toda a verdade dos factos, e que os Arguidos, que se encontravam a desempenhar funções, e foram surpreendidos pela passagem de uma viatura Honda, Civic, a circular, sem matrículas colocadas, são os grandes prestadores de falsidade de testemunho e calúnia.
C) Atente-se no depoimento do Assistente na audiência de julgamento, em 31 de Maio de 2016, ou seja, passados quase 4 anos, da ocorrência dos factos, (e é muito idêntico ao depoimento prestado em 20.02.2014, a fls. 360, dos presentes Autos) (13a. gravação) quando a partir dos 07 minutos e 40 segundos, quando a instâncias da Senhora Juiz, prestou, o seguinte depoimento,:
_ (07m40s) Mma. Juíz: Portanto, passou por essa, por essa ... antes de entrar na rotunda apercebeu-se da presença do veículo da GNR, que estava lá imobilizado ... ?
Assistente: não. não vi ... não vi hahhh ... hahhhhh ... elementos da GNR ... GNR nenhuns, porque nem sequer podia ver.
- Mma. Juíz: Então?
_ (07m52s) Assistente: porque eles ... hahhh ... hahhh hahhhh o
posto da BP está afastado da rotunda, não é? Hahhh ... eu hahhhh se ...
se estivesse a olhar lá para o, para o ... pró ... pró ... sítio onde eles estariam colocados .... eu só soube isto posteriormente, no âmbito deste processo. - Mma. Juíz: mas do que resultou aqui parece que não era junto à BP que estariam, parece que seria ali junto de umas raias, uma raia já de acesso à rotunda ...
- (08m19s) Assistente: eu não posso dizer ... iss ...
- Mma. Juiz: não se apercebeu?
- Assistente: só sei o que depois vi aqui na investigação ... parece que fizeram um croqui até, do local...e ... e situavam os elementos, os arguidos não é? Os elementos da GNR, lá junto da BP, agora exatamente eu não sei ....
D) No dia 22 de Outubro de 2012, passados aproximadamente quatro meses após os factos, o Assistente prestou declarações (fls. 110) no processo de averiguações que decorreu nos Serviços da Guarda Nacional Republicana, e então, com a memória muito lúcida, por se encontrar com pouco tempo decorrido entre os factos e aquele depoimento, declarou o seguinte:
Perguntado se observou alguma operação STOP junto da Rotunda, antes de ser mandado parar e se algum dos Agentes fez o sinal de paragem, referiu que observou uma viatura com Agentes no seu interior e nenhum deles fez qualquer sinal de paragem..
E) A disparidade daquilo que o Assistente viu na rotunda em 2012, e daquilo que se lembra atualmente, é desconcertante, mas, como se trata de um Juiz Desembargador, serão certamente verdadeiras ambas as versões, no entanto, V.as. Exas., Senhores Juízes Desembargadores, podem interpretar melhor e de forma autêntica, o significado desta disparidade aqui demonstrada.
F) a demonstração de que os Arguidos falavam verdade, se encontra no depoimento da Arguida SA... RE..., que, na primeira vez que entra num Tribunal, de tão nervosa que se encontrava, pouco ou nada conseguiu adiantar, pelo que se efetivamente os Arguidos tivessem combinado qualquer versão dos factos, igualmente a Arguida SA... RE..., levaria a lição estudada, e pouco ou nada lhe custaria debitar uma qualquer versão combinada dos factos.
G) Reitera-se que os Arguidos se encontravam a realizar uma operação de fiscalização de âmbito tributário, a veículos de mercadorias, pelo que se encontravam notoriamente impreparados para qualquer situação de contra-ordenações rodoviárias, razão pela qual o Assistente, socorrendo-se da omissão do levantamento de contra-ordenação por desobediência à ordem de paragem, faz dcstc facto a pedra angular da sua verdade e credibilidade.
H) Quanto à participação efetuada pelo Arguido S... e, dirigida ao Conselho Superior de Magistratura, tal deve-se ao facto de tal menção surgir no cartão profissional do Assistente, pelo que elaborada a participação, o Arguido S... entregou a mesma ao seu superior hierárquico, o qual procedeu ao envio daquela participação ao Conselho Superior da Magistratura, (fls. 11) isto é, o Arguido J... S..., fez o que lhe competia, participou os factos, quem remeteu a mesma, foram as hierarquias da Guarda Nacional Republicana, porquanto, sempre que se verifica uma situação com circunstâncias de ilícito criminal, é procedimento normal e habitual dar conhecimento dessa mesma ocorrência à respetiva entidade com competência para apreciar a conduta participada, pelo que o Arguido S..., elaborou a participação e, o seu superior hierárquico, dirigiu-a ao Conselho Superior da Magistratura, enquanto órgão superior de gestão e disciplina da magistratura judicial.
I) Toda a prova foi séria e corajosamente esquadrinhada pela Senhora Juiz, que de forma metódica e crítica, foi percebendo de que forma os acto se sucederam no tempo, quem os praticou, tudo com ponderada sensatez, conforme doutamente refletido na sentença, pelo que submetida a produção de prova à imediação! o Tribunal, melhor que ninguém, conseguiu ler as declarações prestadas pelos intervenientes processuais, tendo seguido o único caminho que sobrou após todos os depoimentos que foi o caminho da verdade, pelo que a prova material obtida em sede de julgamento, impossibilita a modificação da matéria de facto pretendida pelo Assistente.
É o seguinte o teor da sentença recorrida, na parte que ora releva:
2.1. Factos provados
Da discussão da causa, com relevância para a decisão, resultaram provados os seguintes factos:
1. O assistente é juiz …., actualmente a exercer funções no Tribunal da …..
2. Os arguidos são todos militares da Guarda Nacional Republicana, que na data dos factos em análise exerciam funções na Brigada … GNR.
3. No dia 9 de Julho de 2012, o assistente foi fiscalizado por uma brigada da GNR, composta pelos ora quatro arguidos, a qual era chefiada pelo arguido J... S....
4. Nessa data, cerca das 10h30, o assistente conduzia o veículo de marca Honda, modelo Civic, o qual não tinha apostas as respectivas chapas de matrícula (nem à frente nem atrás), as quais tinham sido furtadas, dirigindo-se o assistente para uma oficina, localizada em Loures.
5. Os arguidos integravam uma brigada de fiscalização da GNR em veículo caracterizado, que cerca das 10h30 estava localizada na rotunda existente junto às bombas de combustível da BP, tendo o veículo conduzido pelo assistente passado pela via onde se encontrava imobilizada a viatura da referida brigada de fiscalização, e pelo menos os arguidos JO... SI... e J... S....
6. A artéria por onde o assistente passou junto dos referidos arguidos é uma via muito movimentada.
7. Nessas circunstâncias de tempo e lugar, apercebendo-se que a aludida viatura circulava sem chapas de matrícula, o Guarda JO... SI... dirigiu uma ordem de paragem ao veículo conduzido pelo assistente.
8. Este, contudo, não imobilizou a viatura que conduzia, prosseguindo a sua marcha em direcção a Loures, sem alterar a velocidade a que circulava.
9. Perante a conduta do assistente, os quatro militares da GNR ora arguidos dirigiram-se para a viatura caracterizada da GNR, seguindo no encalço do veículo conduzido pelo assistente, tendo accionado os sinais sonoros e luminosos do veículo policial.
10. Quando ambos os veículos já circulavam pela Rua do Funchal, em direcção ao centro de Loures, o assistente, apercebendo-se da presença do veículo da GNR e de que tais sinais sonoros e luminosos lhe eram dirigidos, imobilizou a sua viatura.
11. Aquando da abordagem policial, o assistente, através de expressão de teor não concretamente apurado, questionou a necessidade de tal conduta policial, com recurso aos sinais luminosos e sonoros.
12. No decurso da acção de fiscalização, em momento não concretamente apurado, contrariamente à indicação que lhe foi dada pelo militar da GNR que o fiscalizava, o assistente saiu do interior da sua viatura.
13. No decurso dessa acção de fiscalização, assim que lhe foram solicitados, o assistente exibiu os seus documentos pessoais, bem como os da viatura.
14. Exibiu ainda uma declaração que lhe fora entregue pela PSP aquando da participação que fizera do furto das matrículas da viatura que conduzia, constando de tal documento, além do mais, o seguinte:
Declaração
Para os devidos efeitos se declara que, foi elaborado neste Departamento Policial um Auto de Denúncia com o NUIPC e NPP em epígrafe, por crimes contra a propriedade (furto de chapas de matrícula), em que o Denunciante JOA... (...) a comunicar que, desconhecido(s), através de método que desconhece e sem qualquer tipo de dano, subtraíram as chapas de matrícula que se encontravam apostas, no veículo de marca/modelo Honda Civic de cor preto, de matrícula …, que se encontrava devidamente estacionado (...), no período compreendido entre as 18h00 do dia 15.06.2012 e as 19h30 do dia 19.06.2012 (...).
15. No decurso desse período, compareceu ainda no local uma segunda viatura da GNR, com outros militares, que realizavam acção de fiscalização no mesmo local.
16. Os militares da GNR ora arguidos e os que entretanto compareceram no local, todos afectos à Brigada Fiscal, evidenciando algum desconhecimento acerca da conduta que deveriam adoptar perante aquele veículo que circulava sem as respectivas chapas de matrícula, consultaram legislação no local e, concluindo que se impunha a apreensão e remoção da viatura, solicitaram o auxílio da força policial local — PSP de Loures — que compareceu no local com uma patrulha de pelo menos dois agentes e um reboque.
17. Tendo a acção de fiscalização perdurado por período não concretamente apurado, mas nunca inferior a 45 minutos.
18. O assistente, agastado com a situação e o tempo que levava a fiscalização, quando já decorrera lapso temporal não concretamente apurado, mas certamente não inferior a 30 minutos, deslocou-se a um café para efectuar um telefonema, no que foi acompanhado pela Guarda SA... RE... e pelo Guarda P..., que integrava a patrulha do segundo veículo da GNR que esteve no local.
19. Ao regressar do referido estabelecimento comercial, o assistente identificou-se como juiz, exibindo para o efeito o seu cartão profissional, ainda em papel, e do qual constava, para além do nome, fotografia e categoria profissional, a menção Conselho Superior da Magistratura.
20. Ocasião em que solicitou a identificação de todos os militares da GNR ali presentes.
21. No dia 10 de Julho de 2012, o arguido J... S... elaborou e subscreveu uma participação dirigida ao Senhor Presidente do Conselho Superior da Magistratura, a qual foi enviada ao referido órgão, conforme determinado por esse arguido na participação, da qual consta, para além do mais, o seguinte:
Participação
Para os devidos efeitos participo a V. Ex.a o seguinte:
1. No dia 9 de julho do corrente ano, por volta das 10h45, no decorrer de uma ação de fiscalização efetuada na localidade de Loures, no local sito em frente às bombas de gasolina BP, junto ao nó de acesso à A8, pela patrulha chefiada pelo participante, foi detetada a circular na via pública uma viatura de cor preta, sem que a mesma tivesse afixadas as legalmente exigíveis e necessárias chapas com o respetivo número de matrícula.
2. Tendo tal situação sido detetada por elemento da referida patrulha, que se encontrava no local a proceder a atos de fiscalização, aleatórios, foi, pelo Guarda SI..., feito de imediato o respetivo e regulamentar sinal de paragem, de forma bastante percetível e visível ao condutor do veículo, utilizando-se ainda para o efeito como meio auxiliar, o sinal sonoro provocado pelo apito, em uso regulamentar nesta Guarda. Encontravam-se todos os agentes envolvidos devidamente identificados e sinalizados, ostentando faixas regulamentares identificadoras e refletoras (coletes) com os dizeres GNR.
3. Contudo, o condutor, demonstrando sinais visíveis de se ter apercebido do sinal efetuado pelo agente em causa, ignorou por completo tal ordem, chegando mesmo a olhar na direção dos elementos da patrulha que se encontravam no local, junto do agente que procedia à fiscalização e que efetuou a paragem ao condutor, tendo continuado a sua marcha em direção ao centro da cidade de Loures, desrespeitando, por completo, uma ordem legítima efetuada pelo elemento da GNR
(...).
4. Face a tais factos e ao comportamento adotado por um condutor de uma viatura que circulava na via pública sem ter afixadas, quer na parte traseira quer na parte dianteira, as exigíveis e necessárias chapas de identificação de matrícula, enquadrando-se estes numa potencial situação de cariz operacionalmente suspeita, foi, de imediato, encetado um seguimento à viatura, onde participaram o, agora participante acompanhado pelo Guarda SI... (...), Guarda RE... (...) e Guarda P… (...) militares que prestam serviço neste destacamento (...).
5. Junto ao km 83,5, na Rua do Funchal, em direção ao centro de Loures, volvidos cerca de 500 metros desde o local onde foi efetuado o primeiro sinal de paragem ao condutor e se iniciou o seguimento ao mesmo, foi utilizado o sinal sonoro da viatura caracterizada (sirene), de forma bem percetível e complementado com a raquete sinalizadora com o sinal STOP, ao condutor da viatura em causa, para que o mesmo encostasse e imobilizasse o veículo, num lugar considerado seguro, o que veio a acontecer junto aos semáforos ali existentes.
6. Na abordagem ao veículo em fuga foram tomadas as necessárias e exigíveis medidas de segurança, face a uma iminente e potencial situação suspeita, para que não houvesse por parte do indivíduo em causa qualquer tentativa de fuga, tendo sempre bem presente a estrita preocupação com a integridade física do participante, dos elementos da patrulha que o acompanhavam, de terceiros e do próprio condutor da viatura em causa.
7. Neste contexto, foi dada uma ordem ao condutor da viatura que permanecesse no interior da mesma, que desligasse o motor do veículo e que mostrasse os documentos do mesmo e os seus documentos de identificação.
8. O visado desligou o motor do veículo, tendo, contudo, saído do mesmo com os documentos na mão, contrariando as ordens que lhe tinham sido dadas pelo militar que efetuou a abordagem ao mesmo, manifestando uma visível indignação e agressividade no tom de voz utilizado, dizendo que aquilo era tudo um disparate, que a patrulha estava a fazer um grande festival e que nada daquilo era necessário, porque podia conduzir sem que o veículo possuísse qualquer matrícula porque estava autorizado pela PSP. O Indivíduo manteve-se sempre com este comportamento de indignação, exaltação e agressividade verbal para com os elementos da fiscalização que se encontravam no local, tendo estes mantido sempre a devida postura profissional e policial que a situação exigia, apelando sempre à calma do condutor.
9. No decorrer da referida ação policial, encontrando-se o Guarda SI... já com os documentos da viatura e de identificação do respetivo condutor na sua posse, foi pedido ao visado que abrisse o capô do veículo a fim de se poder confrontar o n.° de série constante no chassi da viatura com o número registado no respetivo livrete da viatura, ao que este acedeu após várias insistências e solicitações verbais efetuadas pelo agente em causa.
10. Verificou-se que o veículo em questão era um Honda, modelo Civic, de cor preta e que devia ostentar as correspondentes chapas de matrícula ..., viatura registada em nome de JOA... (...).
11. Após a verificação dos diversos documentos, foi explicado ao visado que não podia circular com o veículo na via pública sem as respetivas chapas de matrícula e que pelo facto iriam ser levantados auto de contraordenação e respetivos autos de apreensão do veículo e documentos.
12. O visado, que se veio a identificar como sendo JOA..., nascido a …, portador do cartão de cidadão n.° (....), com residência em (...), mantendo a mesma postura agressiva e de indignação, continuava a afirmar que podia circular com o mesmo, porque este tinha sido alvo de furto das respetivas matrículas o qual foi objeto de participação à PSP, no dia de junho do corrente ano, e como tal podia circular porque ia agora nesse momento à oficina para as colocar.
13. No decorrer da ação, o Sr. JO... diz que já está ali há muito tempo e que precisa de telefonar, mas que não tinha telemóvel, pelo que a Guarda RE... predispôs-se a acompanhá-lo ao restaurante 3 amigos, que ficava localizado no outro lado da rotunda, na preocupação de salvaguardar a integridade física do visado, devido à circulação de trânsito que se verificava no local, tendo este entrado sozinho no referido estabelecimento.
14. No momento em que o condutor regressa para junto do veículo, abre a carteira e identifica-se com um cartão do Conselho Superior da Magistratura, com o número …, identificando-se como Juiz, tendo, nessa qualidade, exigido a identificação de todos os Guardas que ali se encontravam.
15. Em ato contínuo é, de imediato, facultada, pelo participante e por todos os militares presentes na operação, a sua identificação militar.
16. Entretanto, chega junto do local outra viatura com quatro elementos desta Guarda, que fazia parte integrante da mesma patrulha, composta pelo Cabo P... (...), Guarda P... (...), Guarda B... (...) e Guarda F... (...), para solicitar ao Participante diretivas relativamente ao funcionamento do serviço, do qual era o Comandante, tendo nessa altura o visado exigido, novamente na qualidade de magistrado, em serviço no Conselho Superior da Magistratura, também a identificação daqueles, o que lhe foi facultado, um por um.
17. Nesta fase, foi solicitada a colaboração da PSP de Loures, para que tomasse providências relativamente ao reboque da viatura para o seu parque, visto esta ser a força policial da área e porque seria mais fácil a remoção da mesma da via pública, visto esta não poder continuar a circular naquelas condições.
18. Os elementos da PSP, logo que chegaram ao local, prontificaram-se, em estrita colaboração institucional e policial, a mandar rebocar a viatura para o seu parque e também a levantar os respetivos autos de contraordenação e apreensão, ao qual o Participante acedeu prontamente.
19. Na presença da PSP, o visado continuou a identificar-se como sendo Juiz, mantendo uma postura agressiva e de indignação, tentando intimidar os agentes policiais que se encontravam a desempenhar as suas funções, fazendo-se valer da sua identificação de magistrado, não informando, contudo, e em concreto, onde efetivamente exercia funções, mas reiterando que podia conduzir o veículo em causa porque estava autorizado pela PSP.
20. O elemento da PSP, Agente F…, levantou o correspondente Auto de Apreensão do veículo e seus documentos e o respetivo Auto de Contraordenação n.° …, tendo também elaborado uma Informação Interna, a relatar todo o sucedido, com o número de registo …LRS.
21. Nestes termos, face ao decorrer dos factos aqui relatados e à atitude tomada pelo Sr. JOA..., perante os órgãos de polícia criminal aqui mencionados, que se encontravam no exercício das suas funções policiais, em ações de controlo e fiscalização de viaturas e mercadorias, cujas atitudes destes perante o visado foram as mais corretas, diligentes e íntegras, apesar da sua atitude provocatória, intimidatória e ofensiva, levadas a cabo por um cidadão que se identificou como magistrado em serviço no Conselho Superior da Magistratura, dá-se conhecimento destes factos para que V. Exa. se digne a analisar e averiguar o relatado e a proceder em conformidade, caso assim entenda que se encontra reunida matéria suscetível de se enquadrar num ilícito disciplinar, por atos menos próprios praticados por um elemento que se identifica como sendo funcionário desse órgão colegial de excelência da magistratura portuguesa.
22. A presente participação foi elaborada em triplicado, sendo o original enviado ao Conselho Superior da Magistratura, o duplicado enviado ao escalão superior desta Guarda para efeitos de conhecimento do sucedido e ficando o triplicado neste Destacamento em arquivo.
22. A referida participação foi recebida no Conselho Superior da Magistratura no dia 11.07.2012.
23. Perante a referida participação, o Conselho Superior da Magistratura determinou a realização do inquérito administrativo, de que incumbiu um Sr. Inspector judicial.
24. No âmbito desse inquérito, todos os ora arguidos prestaram declarações na qualidade de testemunhas, sob juramento legal, tendo confirmado genericamente o teor daquela participação, que disseram conhecer.
25. Todavia, cada um dos arguidos prestou esclarecimentos adicionais.
26. Assim, o arguido J... S... esclareceu, para além do mais, o seguinte: A situação em causa, até ao momento em que a PSP removeu o veículo mencionado na participação, terá durando cerca de 50 minutos, o que apenas se deveu ao tratamento burocrático da questão, nomeadamente a consulta da legislação pertinente e as diligências tendentes à apreensão e remoção do veículo, nada tendo a ver com a postura adoptada pelo respectivo condutor.
Logo que o depoente e demais elementos policiais se abeiraram do veículo em causa, percebeu que havia uma atitude de não colaboração e desafio por parte do seu condutor: mandaram-no desligar o motor e não o fez de imediato; foi-lhe ordenado que pusesse as mãos no volante e também não acatou essa determinação; foi-lhe dito que permanecesse no interior do veículo e saiu do mesmo ao mesmo tempo que dizia que não havia necessidade de tão grande festival e que estava autorizado pela PSP a circular sem matrículas.
Entre o momento em que foi ordenado ao condutor que parasse e aquele em que acabou por parar, após seguimento do carro patrulha, aquele terá circulado cerca de 500-600 metros.
O depoente está convencido que o condutor do veículo viu os sinais de paragem que lhe foram efectuados, primeiro pelo Guarda M… da SI..., o qual também utilizou o apito, e depois pelo próprio depoente, que, gesticulando com o braço e dizendo encoste ali igualmente lhe ordenou que parasse.
27. O arguido JO... SI..., esclareceu, para além do mais, o seguinte: Foi o depoente que constatou que o veículo em causa não era portador de chapa de matrícula, pelo que de imediato fez ao respectivo condutor o respectivo sinal de paragem, apitando ao mesmo tempo. O veículo prosseguiu a sua marcha, não podendo garantir que o respectivo condutor se tivesse efectivamente apercebido do sinal de paragem. O depoente e demais elementos da GNR iniciaram então um seguimento ao veículo com o seu carro de patrulha caracterizado. Mal se acercaram do veículo cm causa o condutor parou de imediato não tendo havido indícios de tentativa de fuga. (...) Embora não possa dizer que o condutor em causa foi agressivo, de uma forma algo intimidatória, insurgiu-se contra a abordagem policial, dizendo, enquanto recolhia os documentos, não ser necessário tão grande festival e não sabem com quem se estão a meter. A postura do condutor do veículo também não foi a mais correcta ao sair do veículo, apesar de lhe ter sido ordenado pelo depoente que ficasse no interior do veículo, ordem que lhe foi dada por razões de segurança, pois circulavam outros veículos na faixa de rodagem. Quando o depoente lhe fez notar que lhe ordenara que não saísse do veículo, o condutor retorquiu desobediência, é?, como que a dar a entender que tinha ou tivera alguma ligação ao mundo da justiça ou polícias.
Perguntado sobre as razões pelas quais circulava sem chapa de matrícula, também não foi correcto ao responder estou autorizado pela PSP num tom superior, sendo evidente para o depoente que ninguém na PSP poderia autorizar tal coisa. O condutor exibiu depois um documento emitido pela PSP, do qual não decorria qualquer autorização nesse sentido.
Toda esta situação arrastou-se durante pelo menos 40 minutos, uma vez que, através da consulta da legislação, se constatou ser necessário proceder à apreensão e remoção do veículo, pelo que houve necessidade de contactar o quartel e, posteriormente, de contactar a PSP de Loures, a quem foi pedida colaboração no sentido de remover o veículo. (...)
Foi só depois de regressar do restaurante, onde foi telefonar, que o condutor se identificou como magistrado e pediu a identificação dos elementos da GNR presentes no local (...).
28. Tendo o arguido N... esclarecido, para além do mais, o seguinte: Depois de sair do carro, o condutor do veículo exaltou-se, dizendo que não tinha roubado nada, num tom agressivo, querendo o depoente com isto significar que, para além do tom de voz utilizado, o mesmo entrou no seu espaço (aproximou-se demasiadamente de si), numa postura de desafio.
Quando o condutor parou à entrada da rotunda o carro patrulha e os elementos da GNR presentes no local encontravam-se posicionados à esquerda do mesmo. Foi nesse momento que, apercebendo-se que o veículo não tinha matrículas, foi efectuado sinal de paragem ao seu condutor, acompanhado de sinal sonoro provocado por apito.
Embora não o possa garantir, presume que o condutor se apercebeu disso, uma vez que olhou para o local em que se encontravam os elementos da GNR, a cerca de 30-50 metros.
Toda esta situação terá demorado cerca de 30-40 minutos(...):
29. E a arguida SA... RE... esclareceu, para além do mais, o seguinte: Depois de ter sido iniciado o seguimento do veículo em causa o mesmo veio a deter-se cerca de 300-400 metros depois.
Notou que o condutor do veículo e causa se encontrava exaltado uma vez que o mesmo, depois de parar, apesar de lhe ter sido ordenado que permanecesse no interior do veículo, saiu de imediato do mesmo, dizendo que não era necessário tanto aparato, apesar de não se recordar das palavras exactas que foram utilizadas.
Foi a depoente que acompanhou a pessoa em causa a um restaurante próximo para fazer um telefonema, tendo sido nessa altura que o mesmo disse não sabem com quem é que se estão a meter, vocês vão-se arrepender.
Toda esta situação durou cerca de 30-40 minutos.
30. O aludido inquérito foi arquivado por deliberação de 18 de Setembro de 2012 do Conselho Permanente do Conselho Superior da Magistratura.
31. Nenhum dos arguidos elaborou qualquer auto por contra-ordenação relativo à desobediência do assistente à ordem de paragem que lhe foi dirigida, pelo menos, pelo Guarda SI....
32. Os arguidos actuaram sempre de forma livre, voluntária e consciente.
33. O demandante ficou muito incomodado com a participação do arguido J... S... ao Conselho Superior da Magistratura (CSM).
34. E sentiu-se enxovalhado com o comportamento dos demandados no inquérito administrativo que correu termos no CSM.
35. O demandante foi juiz no Tribunal de … durante vários anos, antes dos factos em análise.
36. Na sequência da participação criminal apresentada pelo assistente em 11.07.2012 perante os Serviços do Ministério Público junto do Tribunal da Comarca de …, a situação que ocorreu com o assistente e que envolveu os demandados, com respeito à ordem de paragem ao assistente e subsequentes desenvolvimentos, foram comentadas entre os funcionários do tribunal, magistrados e advogados.
37. O assistente ao saber que era objecto de conversas e foco de atenção devido aos factos supra referidos sentiu mal-estar.
Mais se provou que:
38. O arguido J... S... é militar da GNR há 28 anos, auferindo um salário mensal de 1.400,00.
39. Vive em casa arrendada com sua mulher, despendendo o casal com o pagamento da renda a quantia mensal de € 460,00.
40. Sua mulher encontra-se desempregada, recebendo a título de subsídio de desemprego a quantia mensal de 400,00.
41. O arguido tem dois filhos já adultos e financeiramente autónomos.
42. Como habilitações literárias o arguido possui o 9.° ano de escolaridade.
43. No certificado de registo criminal do arguido não se encontram averbadas quaisquer condenações.
44. O arguido JO... SI... é militar da GNR desde 2001, auferindo um salário mensal de € 1.100,00.
45. Vive em casa própria com sua mulher e dois filhos menores de 12 e 8 anos, despendendo o casal com o pagamento de empréstimo bancário contraído para aquisição de habitação própria a quantia mensal de € 300,00.
46. Sua mulher trabalha como auxiliar de acção educativa, auferindo um salário mensal de € 530,00.
47. Despende ainda o casal a quantia mensal de € 290,00 com o pagamento do colégio de um dos filhos.
48. Como habilitações literárias o arguido possui o 12.° ano de escolaridade.
49. No certificado de registo criminal do arguido não se encontram averbadas quaisquer condenações.
50. O arguido N... é militar da GNR desde 2005, auferindo um salário mensal de € 915,00.
51. Vive em casa arrendada com a filha de 5 anos, tendo a guarda partilhada da menor com a outra progenitora, despendendo com o pagamento da renda a quantia mensal de € 350,00.
52. Contribui para o sustento da filha menor, no período em que esta reside com a mãe, com a quantia mensal de € 150,00.
53. Como habilitações literárias o arguido possui o 12.° ano de escolaridade.
54. No certificado de registo criminal do arguido não se encontram averbadas quaisquer condenações.
55. A arguida SA... RE... é militar da GNR desde 2006, auferindo um salário mensal de € 870,00.
56. Vive sozinha em casa arrendada, despendendo com o pagamento da renda a quantia mensal de € 300,00.
57. Não tem filhos.
58. Como habilitações literárias a arguida possui o 12.° ano de escolaridade.
59. No certificado de registo criminal da arguida não se encontram averbadas quaisquer condenações.
2.2. Factos não provados
Com relevo para a decisão a proferir não se provaram os demais factos constantes da pronúncia, do articulado de pedido cível e das contestações, designadamente:
a) No dia 9.07.2012, na sequência do pedido de identificação formulado pelo assistente, o arguido J... S..., furioso, logo ameaçou o assistente que iria fazer com que este ficasse mal visto no seu Serviço.
b) Com a referida participação, quis o arguido J... S... que contra o assistente fosse instaurado procedimento disciplinar, apesar de estar bem ciente que as imputações aí feitas, de factos susceptíveis de constituírem ilícito disciplinar e um ilícito contra-ordenacional, eram falsas.
c) O arguido J... S... prestou depoimento como testemunha e, sob juramento legal, confirmou, na íntegra, o conteúdo daquela participação, apesar de bem ciente das falsidades nela contidas, assim faltando à verdade, agindo consciente da falsidade das suas afirmações.
d) Os arguidos JO... SI..., N... e SA... RE..., aquando da prestação de depoimento como testemunha no inquérito que correu termos no Conselho Superior da Magistratura, confirmaram o teor daquela participação apesar de saberem que a mesma continha várias mentiras, já que sabiam bem a falsidade das afirmações aí vertidas, que imputavam ao assistente falta disciplinar e ilícito contra-ordenacional, assim se prestando a secundar as falsidades vertidas em tal participação pelo arguido J... S....
e) Todos os arguidos sabiam perfeitamente que prestavam um testemunho que era falso, mas quiseram fazê-lo.
f) As imputações feitas na participação elaborada pelo sargento J... S..., nomeadamente o facto relativo à desobediência do assistente a uma ordem de paragem dada pelo Guarda SI... é falsa.
g) Assim como é falso que o assistente tenha mantido sempre unia &ilude de agressividade verbal no tom de voz utilizado em relação aos militares da GNR.
h) Assim como é falso que o assistente teve e manteve sempre uma atitude provocatória, intimidatória e ofensiva para com os ora arguidos.
i) No dia 9 de Julho de 2012, por volta das 10h45, os arguidos mantiveram o assistente detido por mais de uma hora sem que nada o justificasse.
j) Quando o assistente se identificou como juiz os arguidos pressentiram que teriam de responder pelos abusos cometidos, o que determinou a actuação do arguido J... S..., mentindo e inventando factos que pudessem conduzir à condenação do assistente e demandante, tentando prejudicá-lo no seu serviço.
k) Os arguidos e demandados aceitaram mentir para prejudicar o assistente e demandante.
I) Os militares da GNR não estavam na rotunda por onde o assistente e
demandante circulou com a sua viatura, na R…, mas a 50 metros, no posto da BP.
m) O assistente não se cruzou, sem podia ter-se cruzado, com os arguidos.
n) Em consequência directa e necessária das mentiras inventadas pelo demandado J... S... e corroboradas pelos demandados JO... SI..., N... e SA... RE..., o assistente e demandante sofreu problemas de saúde, ficou com o sistema nervoso alterado, insónias, dores de cabeça, com o relacionamento familiar à beira da ruptura.
o) A situação que ocorreu com o assistente e que envolveu os demandados, respeitante à queixa apresentada ao Conselho Superior da Magistratura foi comentada entre os funcionários do tribunal, magistrados e advogados.
13) Mesmo as pessoas que eram partes nos processos, testemunhas e
outros intervenientes chegaram a ouvir e a tecer comentários acerca desta situação, frequentemente sem ter conhecimento dos verdadeiros factos, apenas salientando que havia um magistrado que não respeitava a lei.
q) Estes rumores, comentários e outras considerações tecidas por pessoas
que trabalham no Tribunal, bem como por aqueles que por alguma razão lá se encontravam, deixou o assistente profundamente vexado, atingido na sua honra, por se poder colocar em causa o respeito pelo assistente à Lei.

Não se responde ao demais vertido nos mencionados articulados por se tratar de matéria irrelevante, conclusiva ou de direito ou por se reportar a declarações prestadas pelos arguidos em fase de inquérito criminal, sendo certo que não foi requerida a leitura ou confronto de tais declarações com observância das formalidades legais previstas no Código de Processo Penal e, por isso, mostram-se insusceptíveis de valoração.
2.3. Motivação da decisão de facto
Como é sabido, em processo penal não existe um verdadeiro ónus probatório, vigorando o princípio da aquisição da prova articulado com os princípios da investigação, da verdade material e da presunção de inocência, que impõem que o tribunal assente a sua decisão na análise crítica e conjugada da prova validamente produzida, independentemente de quem a ofereceu, que investigue e esclareça oficiosamente os factos relevantes para o cabal esclarecimento da matéria em apreço no processo, em busca da verdade material, e que em caso de dúvida que se mostre razoável e insanável decida em benefício do arguido.
Cumpre ainda realçar que foram ainda seleccionados factos que derivam das declarações prestadas voluntariamente pelos arguidos em audiência e que por isso foram considerados sem carecerem de qualquer comunicação, nos termos previstos no artigo 358.°, n.° 2 do Código de Processo Penal.
Tal como resulta do disposto no artigo 127.° do Código de Processo Penal, salvo quando a lei disponha diferentemente, a prova deve ser apreciada no seu conjunto, segundo as regras da experiência e a livre convicção do julgador, sendo certo que a livre apreciação da prova não se confunde, em momento algum, com a afirmação de uma convicção fundada na mera subjectividade do julgador. Ao invés, é ponto assente que a livre convicção terá sempre de assentar numa valoração racional e crítica da prova produzida e examinada em audiência, harmonizável com as regras da lógica, da razão, das máximas da experiência e dos conhecimentos científicos, permitindo objectivar a motivação da decisão tomada.
Com efeito, a convicção do tribunal é formada, para além dos dados objectivos fornecidos pelos documentos e outras provas constituídas, também pela análise conjugada das declarações e depoimentos, em função da razão de ciência de cada um dos intervenientes processuais, das certezas e, ainda, das lacunas, contradições, hesitações, inflexões de voz, (im)parcialidade, ansiedade, embaraço, serenidade, coerência de raciocínio e de atitude, coincidências e inverosimilhanças que, porventura, transpareçam em audiência dessas declarações e depoimentos, ou seja, a convicção é também formada pela linguagem silenciosa e do comportamento.
No que concerne à prova documental incorporada nos autos, importa salientar que a mesma pode ser valorada para a formação da convicção do tribunal ainda que não tenha sido debatida ou formalmente examinada em audiência, porquanto se trata de prova acessível a todos os sujeitos processuais e, desse modo, mostra-se assegurado o princípio do contraditório. Todavia, não poderão ser valoradas as declarações prestadas em sede de inquérito criminal pelos arguidos, assistente ou outras testemunhas, porquanto nenhum dos sujeitos processuais lançou mão dos mecanismos legais para tal, previstos nos artigos 356.0 e 357.0 do Código de Processo Penal.
Assim, considerando tudo quanto se deixou exposto, o tribunal firmou a sua convicção na análise crítica e conjugada de toda a prova documental constante dos autos e susceptível de valoração, com especial relevo para a participação elaborada pelo arguido J... S... (fls. 12-16), as declarações prestadas pelos arguidos em sede de inquérito administrativo que correu termos no CSM (fls. 17-19, 20-21, 22-23 e 24-25), a participação criminal apresentada pelo assistente contra os arguidos no Tribunal de … (fls. 26-30), registo fotográfico do local onde ocorreu a acção de fiscalização (fls. 57 a 62), a denúncia do assistente por furto das chapas de matrícula (fls. 75), declaração emitida pela PSP na sequência da apresentação de tal denúncia (fls. 112), a cópia dos autos por contra-ordenação e de apreensão do veículo do assistente, elaborados pela PSP (fls. 155 a 158), o relatório final e deliberação do Conselho Permanente do Conselho Superior da Magistratura (CSM) no inquérito instaurado na sequência da participação do arguido J... S... (fls. 357-358 e 386-389), e ainda os CRC dos arguidos (fls. 673, 674, 675 e 676).
Tal prova documental foi ainda conjugada com o teor das declarações dos arguidos e do assistente e, bem assim, com os depoimentos de P..., militar da GNR que integrava a segunda brigada que acorreu ao local onde estava imobilizado o veículo do assistente, R..., agente da PSP que também esteve presente no local onde decorria a fiscalização, e F..., mulher do assistente.
Os arguidos J... S..., JO... SI... e N... prestaram declarações de modo sereno, apresentando a sua versão dos factos e a forma como os mesmos se desenrolaram no tempo e no espaço, explicitando os referidos militares o concreto local onde estava imobilizado o veículo caracterizado da GNR em que aquela patrulha se fazia transportar, localizando a viatura no separador central da via de trânsito que vinha de Lisboa, mais concretamente sobre a raia marcada no pavimento, o que foi concretizado com recurso à segunda fotografia de fls. 59.
Para além disso, o arguido J... S... elucidou acerca da conduta adoptada pelo Guarda SI... quanto à ordem de paragem que foi dirigida ao veículo conduzido pelo assistente quando este passou pela referida via, vindo de Lisboa, o qual não imobilizou a viatura, seguindo o seu percurso, em frente, em direcção ao centro de Loures, pela Rua do Funchal. Neste conspecto, o arguido J... S... asseverou de forma coerente e encadeada a ordem de paragem que foi dirigida pelo arguido JO... SI... ao condutor da viatura, fazendo o sinal regulamentar com a mão e fazendo ainda uso do apito, afirmando que ficou convicto de que o condutor tinha visto tal ordem, pois vinha devagar, acrescentando ainda que quando a viatura passou junto de si disse encoste aí se faz favor, asseverando que o condutor olhou para si e não parou, continuando a sua marcha.
Para além disso, o arguido apresentou a sua versão dos factos quanto ao comportamento adoptado pelo assistente aquando da abordagem ao mesmo, já na Rua do Funchal, explicando que este ficou desagradado com a forma como tal abordagem foi efectuada (com sinais sonoros e de luzes) o que apelidou de festival, esclarecendo que o condutor da viatura saiu do veículo contra indicação expressa do militar que o fiscalizava, concretizando ainda o que quis dizer quando escreveu na participação que o ora assistente adoptara uma postura agressiva, designadamente verbal, e uma atitude provocatória, intimidatória e ofensiva, o que relacionou com a postura assumida pelo assistente na interacção com os militares da GNR que o fiscalizavam, quer desrespeitando as ordens que lhe dirigiam (como foi o caso de sair da viatura contra indicação expressa do militar que o fiscalizava), quer a forma altiva como falou para os militares, nomeadamente quando lhes a pediu a identificação.
Relativamente à menção feita na participação ao facto de se tratar de magistrado em serviço no Conselho Superior da Magistratura, desde logo resultou claro para este tribunal — nomeadamente em face das declarações do arguido e do próprio teor da participação, em que o arguido refere que o assistente nunca informou, em concreto, onde exercia funções — que tal referência resultou apenas do facto de no cartão profissional exibido pelo assistente na data da fiscalização ressaltar, com destaque, a referência a esse órgão, responsável pela emissão do cartão, o que associado a uma redacção menos conseguida do arguido poderia criar a ideia de que o arguido afirmava que o assistente se identificara como magistrado em serviço no Conselho Superior da Magistratura, o que não se verificou, nem tão pouco foi esse o alcance de tal expressão na participação, considerando a contextualização dos factos agora enunciada.
O arguido JO... SI..., cujas declarações se mostraram claras e serenas, explicou com rigor e encadeamento lógico a ordem de paragem que dirigiu ao veículo conduzido pelo ora assistente, viatura que circulava sem qualquer chapa de matrícula, o que motivou a sua decisão de o mandar parar a fim de ser fiscalizado. O arguido explicou a sucessão de acontecimentos, concretizando a forma como proferiu tal ordem de paragem, levantando o braço e fazendo uso do apito, esclarecendo que o veículo não parou, seguindo a sua marcha à mesma velocidade, que era reduzida. Instado a esclarecer por que motivo não elaborou um auto de contra-ordenação por desobediência à ordem de paragem, de forma sincera o arguido elucidou que considerando a forma como o veículo circulava — mantendo a mesma velocidade, não encetando qualquer manobra de fuga — pensou que poderia não ter visto a ordem.
Perante tal dúvida, entendeu o arguido que a mesma deveria sem considerada em benefício do infractor, razão pela qual não autuou o condutor pelo desrespeito a tal ordem de paragem. Tais declarações do arguido JO... SI... mostram-se plausíveis e coadunam-se com o quadro de normalidade, não se suscitando reservas quanto à sua genuinidade, mostrando-se de igual modo coincidentes com o relatado pelo mesmo, enquanto testemunha, no âmbito do inquérito que correu termos no CSM.
Já no que tange à suposta segunda ordem de paragem dirigida pelo arguido J... S..., a que o mesmo alude nas declarações que prestou no CSM e que referiu em sede de audiência de julgamento, o Guarda SI... esclareceu não se ter apercebido de qualquer outra acção por parte dos militares ali presentes, o que, contudo, não invalida que a mesma pudesse ter ocorrido. Certo é que com a segurança que se impõe nesta fase de julgamento, ficou demonstrada a ordem de paragem proferida pelo Guarda SI..., única, aliás, que é mencionada na participação elaborada pelo Sargento S... e que delimita o objecto do processo quanto ao crime de denúncia caluniosa.
O arguido N..., por seu turno, explicou o concreto local onde estava posicionado, numa outra via de acesso à mesma rotunda e, por isso, mais afastado dos arguidos S... e SI.... Contudo, asseverou ter-se apercebido do sinal de paragem dirigido ao veículo Honda Civic, pois que ouviu o apito dirigido a essa viatura, não logrando, contudo, garantir quem foi o autor de tal ordem, se o Guarda SI... ou o Sargento S....
No tocante à conduta adoptada pelo assistente aquando da abordagem dos militares da GNR, as declarações dos arguidos JO... SI... e N... mostram-se, no essencial, coincidentes, no que respeita ao desagrado logo evidenciado pelo assistente pela forma como decorreu a abordagem (com aparato sonoro e luminoso) e a intenção manifestada em sair do veículo, o que fez, apesar de ordem expressa em contrário que lhe foi dirigida.
Já a arguida SA... RE... evidenciou bastante nervosismo no decurso das suas declarações iniciais, tendo optado por não prestar mais declarações — direito que lhe assiste e que não poderá ser valorado pelo tribunal numa perspectiva negativa ou positiva — sendo que a final, já mais calma, esclareceu apenas que no momento em que acompanhou o assistente ao restaurante estava ao telemóvel, pelo que nem entrou no referido estabelecimento.
O assistente, por seu turno, prestou declarações de forma serena e encadeada, relatando a sua percepção dos factos, asseverando que apenas se apercebeu da presença do veículo da GNR no momento em que foi abordado na Rua do Funchal, reconhecendo que perante essa abordagem perguntou se era necessário todo aquele aparato, sendo que após lhe ser solicitado pelo Guarda SI... a sua documentação pessoal e do veículo fez menção de sair do mesmo, o que lhe foi negado de forma que considerou autoritária. Apesar disso, cerca de 10 a 15 minutos depois acabou por sair da viatura, contra ordem expressa do militar que o fiscalizava — fruto do calor que se fazia sentir — ocasião em que foi repreendido pelo Guarda SI..., que lhe disse, de dedo em riste o senhor acabou de cometer um crime de desobediência, ao que ripostou mas que desobediência?. Descreveu ainda o assistente a conduta adoptada pelos militares da GNR presentes, tendo entretanto chegado outra viatura da mesma força policial, ficando com a clara percepção que não sabiam bem o que fazer, pois consultavam legislação. Esclareceu ainda que após dizer que queria ir fazer um telefonema ao café (uma vez que não tinha telemóvel) isso foi-lhe negado pelo Guarda SI..., que só consentiu nessa conduta alguns minutos depois, na sequência de nova insistência do assistente, ocasião em que se deslocou ale a um café próximo, acompanhado pela Guarda RE... e um outro militar da GNR, esclarecendo ainda que só após regressar do café se identificou como juiz e solicitou a identificação aos militares da GNR, ao aperceber-se que estes iriam ausentar-se do local, uma vez que a apreensão do veículo ia ser tramitada pelos agentes da PSP que, entretanto, acorreram ao local. Elucidou ainda o assistente acerca dos sentimentos então vivenciados e, em particular, após tomar conhecimento da participação feita ao Conselho Superior da Magistratura e das declarações aí prestadas pelos arguidos, tendo nessa matéria relevado igualmente o testemunho de F..., mulher do assistente, que descreveu de forma serena a alteração de comportamento que observou em seu marido na sequência desses factos, em particular ao nível da dinâmica familiar.
Considerou-se ainda o depoimento prestado por P..., militar da GNR que integrava a segunda patrulha que esteve no local onde se imobilizou o veículo do assistente, tendo a referida testemunha descrito com desenvoltura os factos que percepcionou, explicando que quando chegou ao local o assistente estava exaltado, gesticulando muito, andando de um lado para o outro e falando alto —esclarecendo ainda que no pouco contacto que manteve com o mesmo — o qual ocorreu no momento em que o acompanhou ao café juntamente com a Guarda RE... — o assistente, num tom de voz elevado disse vocês não sabem com quem se estão a meter, conduta que qualificou como verbalmente agressiva.
Finalmente, sopesou-se o testemunho de R..., agente da PSP que acorreu ao local na sequência de solicitação efectuada pela brigada da GNR, que de modo coerente descreveu os factos a que assistiu, relatando que o condutor da viatura a apreender estava enervado e agastado com a situação, discordando da decisão do seu colega em proceder ao levantamento do auto por contra-ordenação decorrente do facto de circular com um veículo sem chapas de matrículas, o qual o ora assistente se recusou a assinar, recusando-se de igual modo a ser nomeado fiel depositário da viatura, apesar de ter assinado o auto de apreensão da mesma. Tais declarações foram prestadas de forma muito serena e segura, e mostram-se parcialmente corroboradas pelos elementos documentais carreados para os autos (resultando de fls. 155 que o auto de contra-ordenação não se mostra assinado pelo ora assistente, aí se encontrando vertida a recusa de assinatura do mesmo), e até pelas próprias declarações do assistente, que reconheceu não ter ficado contente com a situação, apesar de asseverar que não se exaltou.
Sendo esta a prova produzida, verifica-se da análise conjugada da mesma a existência de duas versões no que tange à existência de uma ordem de paragem dirigida ao ora assistente: os arguidos JO... SI..., J... S... e N... garantem que tal ordem de paragem foi dada por JO... SI..., com observância das formalidades legalmente previstas — levantar da mão e fazendo uso do apito — o assistente assevera que não existiu ordem nenhuma, afirmando que não viu onde estava parada a patrulha da GNR, sendo que apenas se apercebeu da viatura policial aquando da abordagem efectuada na Rua do Funchal.
Importa desde já referir que a circunstância de o assistente não ter visto o local onde estava imobilizado o veículo da GNR em missão de fiscalização não invalida que o mesmo ali estivesse, assim como os militares ora arguidos. Com efeito, as declarações seguras dos arguidos quanto ao local onde estava a decorrer a acção de fiscalização —com os militares dispostos por várias artérias de acesso/saída da rotunda existente junto ao posto de combustível a BP, nos moldes que explicaram em audiência com recurso à segunda fotografia de fls. 59 — mostraram-se suficientemente credíveis para dar como provado esse facto.
Tal ordem de paragem proferida pelo Guarda SI... era legítima, considerando a operação de fiscalização que estava a ser levada a cabo por aqueles militares, o que legitimava a fiscalização de veículos que circulassem naquela via e vias adjacentes, ademais considerando as concretas características evidenciadas pela viatura conduzida pelo assistente. Com efeito, não se pode olvidar que tal viatura não envergava as respectivas chapas de matrícula, facto que naturalmente criaria reservas a qualquer agente policial médio de que poderia estar em causa uma situação de índole criminal, considerando que frequentemente são usados veículos sem matrícula na prática de crimes, designadamente de furto e roubo, de molde a dificultar a identificação dos seus autores.
Esse raciocínio, contudo, não invalida totalmente as declarações do assistente nessa matéria. Aliás, da conjugação dessas declarações do assistente com as do arguido JO... SI..., admite-se como possível que o assistente não se tenha apercebido de tal ordem de paragem, dúvida, aliás, que terá assaltado o responsável por tal ordem e que determinou que o mesmo não procedesse à elaboração do correspondente auto de contra-ordenação, como bem explicou nas declarações que prestou em audiência.
Já no que concerne à suposta ordem de paragem que também teria sido proferida pelo arguido J... S..., subsistiu a dúvida quanto à sua ocorrência, pois que se por um lado o referido arguido garante de forma convicta que o fez, certo é que o arguido JO... SI... não se apercebeu da mesma, sendo que estava a alguns metros de distância do Sargento S.... Neste conspecto, cumpre realçar que se entende que da mera circunstância de o arguido J... S... não ter autuado o assistente por desobediência à sua ordem de paragem não é possível concluir, sem mais, que tal ordem não existiu. Com efeito, a única conclusão que se afigura segura é a seguinte: se o referido militar proferiu tal ordem e não elaborou o respectivo auto, não observou os deveres funcionais que se lhe impunham enquanto militar da GNR que presencia uma contra-ordenação estradai, o que poderá implicar, eventualmente responsabilidade disciplinar. Mas ainda que tal omissão pudesse ser considerada como um indício da inexistência daquela segunda ordem de paragem — pois que quanto à ocorrência da primeira, proferida pelo Guarda SI..., nenhuma dúvida se colocou quanto à sua verificação — entende-se que a mesma, por si só, não configura prova indirecta suficientemente consistente para, com a segurança que se impõe em matéria penal, demonstrar que da não elaboração desse auto por contra-ordenação resulte a inexistência dessa ordem de paragem e, consequentemente, a falsidade do declarado pelo arguido J... S... aquando da sua inquirição como testemunha no inquérito que correu termos no Conselho Superior da Magistratura. E importa realçar este ponto, pois que no que tange ao imputado crime de denúncia caluniosa o seu objecto reconduz-se ao teor da participação constante de fls. 12 a 16, na qual o arguido J... S... relata que a ordem de paragem foi efectuada pelo Guarda SI....
Já no que concerne ao vertido em tal participação pelo Sargento S... quanto ao facto de o condutor ter demonstrado sinais visíveis de se ter apercebido do sinal efectuado pelo agente em causa ignorando por completo tal ordem, chegando mesmo a olhar na direcção dos elementos da patrulha, como já se deixou exposto tal declaração resulta da convicção do próprio participante, como reiterou nas declarações prestadas a fls. 24-25 e mesmo em audiência de julgamento, não tendo ficado demonstrado com a segurança exigida nesta sede criminal que essa convicção não tivesse qualquer base de sustentação, apenas evidenciando uma percepção diversa daquela que foi criada noutro militar aí presente, não sendo possível asseverar que tal afirmação do arguido J... S... era falsa, tanto mais que pelo menos uma ordem de paragem ocorreu efectivamente, o que se revelou determinante para a decisão quanto aos factos dados como não provados relativos a tal matéria.
Por outro lado, e no que concerne às restantes imputações constantes de tal participação, designadamente as atinentes à pretensa agressividade verbal, postura agressiva e de indignação, atitude provocatória, intimidatória e ofensiva, em sede de audiência de julgamento os arguidos que prestaram declarações e, bem assim, as testemunhas P... e R..., descreveram as condutas que entenderam ser passíveis de enquadramento em tais conceitos genéricos. É certo que não ficou demonstrado que o assistente tivesse dirigido aos ora arguidos todas as condutas/expressões que lhe eram imputadas em tal participação, mas na realidade o próprio assistente reconhece ter ficado desagradado com a forma como a abordagem policial foi feita, reconhecendo ter saído da sua viatura contra ordem expressa do militar que o fiscalizava, considerando ainda que face ao documento que possuía, emitido pela PSP, poderia circular com a viatura sem chapas de matrícula.
Ora, perante tudo quanto se deixou exposto, em particular a existência de versões seguras e antagónicas dos arguidos e do assistente quanto à postura assumida por este último no decurso da acção de fiscalização, versões essas que se apresentaram igualmente plausíveis, sendo em parte coincidentes quanto a alguns factos objectivos referentes à conduta adoptada pelo assistente, e perante a ausência de outros elementos de prova seguros e credíveis que reforçassem alguma das versões, não foi possível ao tribunal ultrapassar o estado de incerteza verificado quanto à realidade histórica efectivamente ocorrida, permanecendo a dúvida quanto à concreta conduta adoptada por cada um dos envolvidos nesse dia 9.07.2012 após a ordem de paragem dirigida ao assistente pelo Guarda SI....
Como ensina Germano Marques da Silva (Curso de Processo Penal, I, Verbo, 1994, p. 73), a dúvida sobre a responsabilidade é a razão de ser do processo. O processo nasce porque uma dúvida está na sua base e uma certeza deveria ser o seu fim. Dados, porém, os limites do conhecimento humano, sucede frequentemente que a dúvida inicial permanece dúvida a final, malgrado todo o esforço para a superar. Em tal situação, o princípio político-jurídico da presunção de inocência imporá a absolvição do acusado já que a condenação significaria a consagração de um ónus da prova a seu cargo, baseado na prévia admissão da sua responsabilidade, ou seja, o princípio contrário ao da presunção de inocência.
Em face do que se deixou exposto, sendo a dúvida a que se chegou razoável e insanável, impunha-se que tal estado de incerteza fosse valorado em benefício do arguido, em homenagem ao princípio in dublo pro reo, dando-se como não provado que o vertido em tal participação ao Conselho Superior da Magistratura configurasse uma falsidade, ou que o arguido J... S... tivesse agido com o propósito de lançar sobre o assistente a suspeita da prática de uma infracção contra-ordenacional ou disciplinar, o que determinou a decisão do tribunal quanto aos demais factos dados como não provados, sendo certo que os imputados aos arguidos relativos aos crimes de falsidade de testemunho se mostravam intimamente conexionados com os relativos aos do crime de denúncia caluniosa.
Quanto à demais matéria fáctica dada como não provada, designadamente a atinente ao pedido cível, a mesma resultou da ausência de prova susceptível de persuadir o tribunal a decidir de forma diversa.
Finalmente, a restante factualidade apurada acerca das condições pessoais e de vida dos arguidos resultaram das declarações dos próprios, que não suscitaram dúvidas quanto à sua veracidade e não foram infirmadas por outros elementos probatórios, e ainda do teor dos CRC de fls. 673 a 676.
3. Enquadramento Jurídico-Penal
3.1. Do crime de denúncia caluniosa
Ao arguido J... S... é imputada a autoria material de 1 (um) crime de denúncia caluniosa, p. e p. pelo artigo 365.°, n.° 2 do Código Penal.
De acordo com o preceituado no n.° 1 do mencionado artigo Quem, por qualquer meio, perante autoridade ou publicamente, com consciência da falsidade da imputação, denunciar ou lançar sobre determinada pessoa a suspeita de prática de crime, com intenção de que contra ela se instaure procedimento, é punido com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa, acrescentando o n.° 2 que se a conduta consistir na falsa imputação de contra-ordenação ou falta disciplinar, o agente é punido com pena de prisão até um ano ou com pena de multa até 120 dias.
O bem jurídico protegido com a incriminação é o interesse individual, concretamente a honra e o bom nome de quem seja o ofendido, ainda que, reflexamente se tutelem também os valores de realização da justiça, nomeadamente a eficácia, a autoridade e legitimação que desta emanam.
De tal previsão resulta claramente que a tal tipo legal acresce um elemento subjectivo específico, constituído por um dolo específico, traduzido na intenção de que seja instaurado procedimento contra o visado com base em imputações que o denunciante tenha a consciência de serem falsas.
Seguindo de perto o vertido no acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 20.11.2013 (processo 755/10.4TACHV.P1, disponível em www.dgsi.pt), verifica-se que os elementos típicos do crime de denúncia caluniosa são os seguintes:
a) Conduta típica: Denunciar ou lançar suspeita por qualquer meio;
b) Sujeito passivo: Outra pessoa (determinada ou identificável);
c) Objecto da conduta: Imputação de factos, ainda que sob a forma de suspeita, idóneos a provocarem procedimento criminal, contra-ordenacional ou disciplinar;
d) Destinatário da acção: autoridade e/ou círculo indeterminado de pessoas (ou seja, denúncia a uma autoridade ou suspeita feita publicamente);
e) Elemento subjectivo: Dolo qualificado por duas exigências: a consciência da falsidade da imputação e a intenção de que contra outrem se instaure procedimento.
Ora, no caso que nos ocupa, considerando a factualidade dada como provada e não provada, verifica-se que não se encontram preenchidos em toda a sua extensão os elementos típicos do crime em análise, porquanto não resultou demonstrado que a participação efectuada pelo arguido J... S..., dirigida ao Conselho Superior da Magistratura, encerrasse em si factos falsos (note-se que na sua maioria não são imputados factos, mas sim juízos de valor e apreciações subjectivas da actuação do visado), nem tão pouco ficou demonstrado o exigido dolo qualificado supra enunciado, pelas razões já aduzidas em sede de motivação da decisão de facto.
Em face do exposto, resta concluir pela absolvição do arguido, o que se decide.
3.2. Do crime de falsidade de testemunho
A todos os arguidos era ainda imputada a autoria material de 1 (um) crime de falsidade de testemunho, p. e p. pelo artigo 360.°, n.° 1 do Código Penal.
Estatui o mencionado preceito legal que quem, como testemunha, perito, técnico, tradutor ou intérprete, perante tribunal ou funcionário competente para receber como meio de prova, depoimento, relatório, informação ou tradução, prestar depoimento, apresentar relatório, der informações ou fizer traduções falsos, é punido com pena de prisão de 6 meses a 3 anos ou com pena de multa não inferior a 60 dias.
O bem jurídico aqui em causa é a cabal realização da Justiça, a qual assentará, necessariamente numa informação probatória verdadeira.
Assim, o tipo objectivo de ilícito pressupõe a falsidade de uma declaração prestada perante autoridade judiciária ou funcionário incumbido de receber determinado meio de prova.
Trata-se de um crime de perigo abstracto, não carecendo o preenchimento do respectivo tipo de ilícito que o testemunho falso afecte efectivamente a obtenção da verdade material por parte do Tribunal, nem sequer que ocorra um perigo concreto de tal vir a ocorrer. Com efeito, o fundamento do ilícito é logo a própria declaração falsa, independentemente da consideração da sua efectiva influência na decisão .
Representa ainda um crime de mera actividade, porquanto o facto ilícito típico se esgota na prestação do falso testemunho, não sendo necessária a verificação de qualquer resultado dele derivado.
São elementos objectivos do tipo deste crime legal:
a) A prestação de depoimento falso por parte de quem esteja investido na posição de testemunha, perito, técnico, tradutor ou intérprete. Trata-se, por isso, de um crime específico.
b) Ser o depoimento efectuado perante tribunal ou funcionário competente para o receber como meio de prova.
Porém, não basta a verificação do elemento objectivo supra enunciado. Tratando-se de um crime doloso, impõe-se ainda a prova da consciência da falsidade da declaração e a intenção deliberada em faltar à verdade quanto a tal facto.
Todavia, nem toda a declaração falsa prestada por uma testemunha preenche o tipo de ilícito em causa. Com efeito, a falsidade só releva na medida em que o declarante se encontre sujeito a um dever processual de verdade e de completude. Assim, a testemunha deve declarar apenas factos de que tenha conhecimento directo, encontrando-se fora do referido âmbito os seus juízos de valor e as suposições.
Por outro lado, a exigência da verdade existe apenas relativamente à declaração que se reporte ao objecto do processo.
Por fim, importa que a declaração seja feita perante quem tem competência para ouvir a declaração.
Ademais, a declaração tem de ser falsa.
Neste ponto, como ensina MEDINA DE SEIÇA, para se aferir da falsidade de uma declaração é necessário ter um termo de comparação: uma declaração é falsa quando aquilo que se declara (conteúdo da declaração) diverge daquilo sobre o qual se declara (objecto da declaração). E, por se adoptar a teoria objectiva da falsidade, basta que a declaração esteja em desconformidade com o acontecimento real para se preencher o elemento objectivo em causa.
Nesta matéria tem a doutrina preconizado a denominada teoria objectiva, nos termos da qual a falsidade da declaração reside na contradição entre o declarado e a realidade, ou seja, tem que existir contradição entre aquilo que se declara e aquilo sobre o qual se declara (a realidade ou verdade histórica).
Só a contradição entre o conteúdo da declaração e a verdade objectiva dos factos aos quais a declaração se reporta constitui falsidade.
A este propósito, decidiu o Tribunal da Relação do Porto em acórdão proferido em 05.07.2006 (processo 0546988, disponível em www.dgsi.pt) que a divergência entre os depoimentos prestados em dois momentos processuais distintos (Inquérito e Audiência de Julgamento) não é suficiente para que o Tribunal possa — sem fixar na matéria de facto o ocorrido — escolher a fase processual em que o arguido prestou o depoimento falso, e consumou o crime, pois o elemento típico central do crime sob punição reside na falsidade do depoimento, a aferir pela sua desconformidade com o acontecimento real a que se reporta (concepção objectiva). Desta concepção decorre que a consumação existe sempre que o depoimento diverge da realidade objectiva.
Nesta sede, levanta-se uma questão de decisivo interesse prático que tem dividido a jurisprudência.
Assim, para uma corrente jurisprudencial, a falsidade da declaração basta-se com a prova que a testemunha, em dois momentos distintos do processo, fez depoimentos contraditórios, ainda que não se venha a provar qual dos depoimentos corresponde à realidade ou verdade histórica.
Para esta tese, existindo duas declarações contraditórias entre si no mesmo processo, uma delas é falsa. Assim, não importa saber para o preenchimento do tipo qual é o depoimento falso.
Pelo contrário, para outros, o preenchimento do tipo apenas se verifica quando se apurou qual dos depoimentos corresponde à realidade história, uma vez que só assim se consegue descortinar qual dos depoimentos é efectivamente falso.
Esta tese, a qual se sufraga, é preconizada, designadamente, no acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 10.01.2005 (processo n.° 1682/04-2, disponível em www.dgsi.pt), onde se sustenta que é sempre imperioso que se demonstre o contrário daquilo que foi declarado e, mais que isso, que o declarante conhecia o contrário daquilo que declarou.
Os citados acórdãos exigem, pois, para o preenchimento do tipo de ilícito ora em causa que se prove a realidade histórica e objectiva dos factos, da qual a testemunha tinha consciência e sobre a qual prestou depoimento falso. Assim sendo, apenas estando assente a verdade objectiva é que se pode saber se o depoimento prestado é, de facto, falso.
Com efeito, na medida em que o tipo de ilícito implica a comparação entre a declaração prestada e a verdade histórica, só apurando-se a verdade objectiva dos factos conseguimos saber se e quando a testemunha mentiu, prestando a declaração contrária ou desconforme com a realidade histórica.
Revertendo o enquadramento legal enunciado para o caso em apreço e tendo presente os factos dados como provados e não provados desde logo ressalta — até em face do já exposto quanto ao crime de denúncia caluniosa — que não se mostram verificados os elementos típicos do crime de falsidade de testemunho, porquanto nem sequer ficou demonstrado que os ora arguidos tivessem faltado à verdade aquando da prestação de declarações, como testemunhas, no âmbito do inquérito que correu termos no Conselho Superior da Magistratura na sequência da participação apresentada pelo Sargento S..., pelo que resta concluir pela absolvição dos arguidos, o que se decide.
4. Pedido de Indemnização Civil
O assistente e demandante deduziu pedido de indemnização civil, pugnando pela condenação de J... S... no pagamento da quantia de € 10.000,00 (dez mil euros) e de JO... SI..., N... e SA... RE... no pagamento da quantia de € 1.500,00 (mil e quinhentos euros), alicerçando a sua pretensão indemnizatória nos danos não patrimoniais sofridos na decorrência das condutas delituosas que os demandados adoptaram e que se encontram e análise nestes autos.
Atento o disposto nos artigos 129.° do Código Penal e 71.° do Código de Processo Penal, a indemnização a fixar no âmbito do processo penal assume, a natureza de indemnização de perdas e danos decorrentes da prática de um crime. Por conseguinte, o apuramento do seu quantitativo e respectivos pressupostos legais ancoram-se no estatuído pela lei civil (arts. 483.° e seguintes do Código Civil).
Ora, conforme resulta do disposto no artigo 377.°, n.° 1, do Código de Processo Penal, A sentença, ainda que absolutória, condena o arguido em indemnização civil sempre que o pedido respectivo vier a revelar-se fundado (...).
A constituição do direito à indemnização pressupõe a demonstração de que o agente (in casu, os arguidos) praticou um facto voluntário, ilícito e culposo, violador do direito de outrem ou de disposição legal, causador de um dano. Importará ainda demonstrar a existência de nexo de causalidade entre o facto e o dano, por forma a que o primeiro seja condição adequada à produção do segundo.
O pedido de indemnização fundado na prática de crime cuida tão só de indemnizar o lesado pelos danos decorrentes da prática de crime, exigindo-se que o facto gerador da responsabilidade seja constitutivo do tipo legal daquele, excluindo-se a possibilidade de, em processo penal, ser arbitrada indemnização fundada em responsabilidade civil puramente contratual.
Ora, no caso em apreço, considerando que nenhuma responsabilidade criminal poderá ser assacada aos arguidos, que vão absolvidos dos crimes de que estavam pronunciados, não tendo ficado demonstrada a prática pelos mesmos de qualquer facto voluntário, ilícito e culposo que pudesse justificar a sua condenação em sede cível, improcede in totum a pretensão indemnizatória formulada pelo demandante.
5. Decisão
Por tudo quanto se deixou exposto, julgo a pronúncia improcedente e, em
consequência:
a) Absolvo JU... da autoria material dos crimes de denúncia caluniosa e de falsidade de testemunho de que vinha pronunciado;
b) Absolvo JO..., NE... e SA... da autoria material dos crimes de falsidade de testemunho de que vinham pronunciados;
c) Julgo totalmente improcedente o pedido de indemnização civil formulado por JOA... contra JU..., JO..., NE... e SA..., absolvendo os demandados do pedido;
O Digno PGA junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido da procedência do recurso, nos seguintes termos:
5. Emitindo parecer nos termos do art°. 416°, do CPP CPP, discorda-se da posição do Ministério Público na 1a instância e dos arguidos, pelo que entendemos dever ser revogada a sentença recorrida:
Deste modo, e em sustentação do recurso do assistente, sempre se dirá que, da análise dos elementos dos autos e, confrontando o teor da motivação do recurso do assistente com a decisão recorrida, bem como com as respostas do Ministério Público e dos arguidos, não podemos deixar de aderir inteiramente à fundamentação daquela motivação.
Com efeito, do teor da motivação do recurso resultam demonstrados os fundamentos da impugnação da decisão, de forma clara, detalhada e suficiente, bem como aí é feita uma correcta a apreciação dos factos provados e não provados e uma correcta a interpretação do Direito aplicável, enfermando a decisão dos erros apontados à decisão recorrida e, em nosso entender, ainda dos vícios que indicaremos.
A)- Relativamente ao alegado erro de julgamento, resulta por demais evidente que a sentença recorrida valoriza essencialmente as declarações dos arguidos e, como se refere na motivação em particular do arguido J... S....
Ora, tais declarações, sendo embora consideradas como um meio de prova, devem ser devidamente sopesadas com o seu interesse no resultado do processo, um interesse que não pode ser mais directo quanto à sua absolvição. Daí que as declarações dos arguidos não podem ter o mesmo valor processual e material que outros meios de prova.
Com efeito, tais declarações teriam que ter sido devidamente ponderadas e valoradas em conformidade com o relato das declarações do assistente o qual evidencia solidez, coerência e concordância com as regras da experiência, o que não aconteceu no caso em apreço. Para evitar repetições desnecessárias, destacamos o quanto o assistente refere nos pontos 8°, 10°, 11 ° a 14°, 16°, 17°, 19° a 21 ° das conclusões do seu recurso.
Contudo, sem prescindir de referir que causa até perplexidade que a decisão recorrida ignore o absurdo de que estes arguidos, militares da GNR, afirmem que se tenham sentido intimidados pelo assistente, sexagenário, sendo certo que se tal intimidação tivesse sido em razão do estatuto profissional deste, o conhecimento deste facto pelos arguidos só veio a ocorrer muito depois do momento em que afirmam terem-se sentido intimidados. Assim, só podiam ter-se sentido intimidados fisicamente!
E também causa a mesma perplexidade, que a decisão recorrida ignore que na participação ao Conselho Superior da Magistratura, o arguido J... S... impute um crime de desobediência ao assistente, por este não ter parado a viatura à ordem de paragem, quando os outros co-arguidos referem/aceitam que o assistente não tenha percebido tal ordem, até porque manteve os mesmos modos e velocidade de circulação e ter referido que não se tinha apercebido de qualquer ordem de paragem.
Deste modo, aderimos inteiramente à conclusão de ter havido erro de julgamento.
Posto isto, entendemos ainda:
B)- Perante a clareza da fundamentação da motivação forçoso se torna concluir que a sentença incorreu em erro de direito na apreciação das normas legais aí referidas ao proferir decisão de absolvição dos arguidos da prática dos crimes de falsas declarações, tal como também incorreu em erro de direito ao proferir decisão de absolvição da prática do crime de denúncia caluniosa.
C)- No que concerne à impugnação de matéria de facto, resulta do próprio texto da sentença, de per si ou em conjugação com as regras da experiência, a existência de vícios da decisão a que se reporta o n°. 2 do art°. 410° do CPP.
Na verdade, quando na sentença recorrida se dá como provado o texto do escrito, sendo o arguido J... S... o seu autor e se dá como não provados os factos n'os, b), c), d), f), g) e) e f), para concluir pela não verificação dos crimes de falsas declarações e denúncia caluniosa, não poderá deixar de concluir-se ter a sentença incorrido no vício de contradição entre a fundamentação e a decisão e no vício de erro notório na apreciação da prova, por flagrante violação das regras da experiência comum - art°. 410°, n. 2, al. b).
D)-Ainda quanto à absolvição do arguido da prática do crime de denúncia caluniosa:
Da leitura dos factos provados na sentença, explicados na sua fundamentação, resultam provados todos os elementos objectivos do crime em apreço e, ainda, do elemento subjectivo, o seu segmento cognitivo - veja-se o escrito nos factos provados nos. 21 e 32.
A sentença apenas não considerou provado o segmento volitivo do dolo.
Ora, no caso em apreço, o que resulta das regras da experiência é precisamente o contrário daquilo que se conclui na sentença. É que nenhuma dúvida razoável se coloca de que o arguido teve a intenção de conseguir que contra o
assistente se instaurasse procedimento, ou qualquer dúvida que o arguido representou que, com a sua conduta, iria necessariamente ser instaurado procedimento contra o assistente.
Para aferir o que são as regras da experiência, requisito da apreciação da prova a que alude o art°. 127° do CPP, há-de ter-se em consideração o juízo do cidadão médio sobre o facto. Com efeito, para o cidadão médio destinatário do escrito em apreço que tomasse conhecimento do seu teor concluiria, necessária e inequivocamente, que o autor do que aí se relata, iria ser castigado. Não restariam dúvidas a qualquer um de que, quem agisse do modo descrito no escrito, praticando aqueles factos, ou tendo aquele comportamento, seria necessariamente castigado por quem exerce poderes disciplinares.
Com efeito, ao cidadão médio não são exigidos conhecimentos de direito nem é necessário sequer que saibam exactamente a definição do tipo falta disciplinar que está a ser imputado. O juízo do cidadão médio trata-se, e é, um juízo de senso comum, a partir da informação mediana sobre os factos.
O erro notório na apreciação da prova, vício da decisão previsto no art. 410°, n. 2, alo c), do CPP, verifica-se quando no texto da decisão recorrida se dá por provado, ou não provado, um facto que contraria com toda a evidência, segundo o ponto de vista de um homem de formação média, a lógica mais elementar e as regras da experiência comum. - Acórdão do STJ de 02.02.2011.
Assim, a prova da intenção do agente não depende de prova da motivação mas há-de retirar-se da sua conduta e de todo o circunstancialismo que a envolveu.
Deste modo as razões apresentadas na sentença não são razoáveis vão contra a lógica das coisas e da vida e contra as presunções naturais, contrariando, flagrantemente as regras da experiência, incorrendo a sentença do vício de erro notório na apreciação da prova, previsto no art°. 410°, n° 2, alínea c), do CPP.
6. Afigura-se-nos nada obstar ao conhecimento do recurso.
7. Em conclusão:
Pelo exposto, subscrevem-se os fundamentos da motivação do recurso do assistente e, com os aditamentos apresentados, pugna-se pela sua procedência e a subsequente revogação da decisão recorrida, nos precisos termos daquela motivação.
Colhidos os vistos legais, realizou-se a conferência.
O objecto do recurso, delimitado pelas conclusões, é: a reapreciação da matéria de facto impugnada; se havia lugar à aplicação do princípio in dubio pro reo; saber se os arguidos cometeram os crimes de denuncia caluniosa e de falsas declarações, pelos quais vêm pronunciados; a procedência ou não dos pedidos de indemnização civil.
Antes de mais, temos de discordar do assistente quando praticamente faz coincidir o despacho de pronúncia com uma condenação antecipada dos arguidos, o que não faz qualquer sentido, pois estaria aberto o caminho para a dispensa da fase de julgamento onde, consabidamente, ante a contraditoriedade, a imediação e a oralidade se produz a prova decisiva para a condenação ou a absolvição dos arguidos, sendo que aqueloutro despacho se limita a determinar o prosseguimento dos autos em face de uma análise da prova até então produzida que conclui que é muito mais elevada a probabilidade de condenação dos arguidos do que a sua absolvição.
Posto isto, passemos à análise da matéria de facto impugnada pelo assistente:
Entende o senhor Juiz …., que as suas declarações prestadas em audiência, aliadas à prova documental carreada para os autos, e o recurso às regras da experiência comum, impunham decisão diversa da decidida em 1a
instância, relativamente aos pontos de facto nos. 5 a 10, 12, 24 e 31 do elenco dos factos dados como provados e bem assim dos constantes das als. a) a m) dos factos dados como não provados.
Vejamos:
Ouvidas as declarações e depoimentos prestados em audiência e escalpelizada o acervo documental constante dos autos, sem deixar de atentar às regras da experiência comum, como postula o art. 127°, do C. P. Pen., extrai-se que:
Não se mostra provado que o assistente tenha passado pela via onde se encontrava imobilizada a viatura da GNR, junto à qual se encontravam os arguidos SI... e S.... Efectivamente, mesmo dando de barato que o assistente se tenha cruzado com algum veículo da GNR, este nunca poderia ser aquele junto ao qual se encontravam os arguidos, que supostamente lhe teriam dado ordem de paragem, pois é o próprio arguido P... (que integrava a brigada da GNR fiscalizadora) que afirmou que, na mencionada rotunda, se encontravam a cerca de 30 a 50 metros da via por onde circulava o assistente, encontrando-se junto ao posto de abastecimento de combustível da BP, o que é corroborado pelo relatório fotográfico de fls. 57 a 62.
Assim sendo, não se poderá ter como provado que o assistente passou junto dos arguidos.
Por outro lado, nenhuma prova existe que contrarie que o arguido SI... não tenha dado ordem de paragem ao assistente; que este não tenha imobilizado a viatura; que os quatro arguidos não tenham seguido no seu encalço, tendo accionado os sinais sonoros e luminosos do veículo em que seguiam; e que o assistente não tenha imobilizado a sua viatura, já na Rua do Funchal, quando se apercebeu que tal sinalização lhe era dirigida. Acresce que também não restam dúvidas de que o assistente saiu do veículo, contrariando ordem do arguido SI.... Outrossim, encontra-se provado que no âmbito do inquérito que correu termos no CSM todos os ora arguidos prestaram declarações na qualidade de testemunhas, sob juramento legal, tendo confirmado genericamente o teor da participação elaborada pelo arguido S..., que disseram conhecer. Finalmente, resulta também pacífico que nenhum dos arguidos elaborou qualquer auto por contra-ordenação relativo a pretensa desobediência do assistente a ordem de paragem, pelo menos, pelo guarda SI.... Tais asserções resultam indubitáveis, quer das declarações do assistente e dos arguidos, quer da documentação junta ou da sua ausência.
Relativamente à matéria de facto dada como não provada, resulta da prova produzida que:
O arguido J... S..., na sequência de pedido de identificação formulado pelo assistente, ameaçou este que iria fazer com que o mesmo ficasse mal visto no seu serviço, o que se denota evidente ante o declarado pelo assistente (que só se identificou como juiz cerca de uma hora depois do início da acção de fiscalização) conjugado com a participação efectuada por aquele ao CSM e o seu teor.
Na mencionada participação encontra-se expresso pelo arguido S... desejar procedimento disciplinar contra o assistente, apesar de ter consciência da falsidade das suas imputações, como adiante escalpelizaremos.
Os restantes arguidos, atenta a sua participação e percepção directa dos factos, bem sabiam que as afirmações do arguido S... na participação ao CSM não eram verdadeiras e, mesmo assim, sob juramento, corroboraram, enquanto testemunhas, que o S... estava a dizer a verdade (embora com algumas correcções), o que fizeram de modo livre, deliberado e consciente, o que abrange quer a percepção pelo assistente da ordem de paragem dada pelo arguido SI..., quer no que tange ao comportamento do assistente durante a fiscalização — atitude provocatória, intimidatória e ofensiva para com os arguidos -. Assim sendo, resulta óbvio que os arguidos aceitaram mentir para prejudicar o assistente, designadamente, em termos profissionais.
Já quanto à detenção do assistente, nenhuma prova existe nesse sentido, dado que existe unanimidade de todos os intervenientes de que nenhuma declaração foi proferida nesse sentido, apontando antes a factualidade apurada para uma mera atitude dos agentes fiscalizadores em não permitir que o assistente abandonasse o local enquanto a sua actividade não estivesse terminada, tendo em conta o apuramento da incursão do assistente em actividade contra-ordenacional e a sua concretização, assim como a competência do OPC competente para o levantamento do auto e a sua presença para notificação e pertinentes assinaturas.
Embora não sejamos tão radicais como o Digno PGA que entende padecer a sentença recorrida de contradição insanável entre a fundamentação e a decisão e de erro notório na apreciação da prova, consideramos que é manifesto o erro de julgamento da sentença sob censura nos diversos pontos de facto em causa.
Efectivamente, reanalisada a prova produzida, podem-se reconstituir os factos relevantes da forma que segue:
O assistente, vindo da direcção de Lisboa, ao volante de um Honda Civic, sem chapas de matrícula, entrou numa rotunda onde, a cerca de 30 a 50 metros do local por onde circulava, se encontrava montada uma operação de fiscalização da GNR, concretamente, junto a um posto de abastecimento de combustíveis da BP (lado oposto da rotunda por onde circulava o Honda). Ao aperceber-se de que o Honda não dispunha de matrículas, o arguido SI... emitiu ordem de paragem daquele, quer por sinalética, quer por aviso sonoro. Sucede que o assistente, quer pela distância a que foi dada a ordem de paragem, quer porque naturalmente seguisse com atenção ao trânsito intenso que se verificava, não se apercebeu daquela ordem. Como tal, prosseguiu a sua marcha, sem qualquer alteração da velocidade que imprimia ao veículo (não superior a 40 Km/h, ou realização de qualquer manobra que indiciasse tentativa de iludir os agentes da GNR ou fugir-lhes. Tanto assim, que cerca de 600 metros adiante, na Rua do Funchal, o assistente, apercebeu-se de que estava a receber ordem de paragem pela GNR (utilização de sinais sonoros e luminosos) e imediatamente, imobilizou o veículo. Em face de tal alarido, o assistente manifestou o seu desagrado por tal, que não se pode confundir com agressividade. Após, cumpriu tudo o que lhe foi determinado (identificação, exibição dos documentos da viatura, abertura do capôt e manutenção no interior do automóvel. Apenas veio a desrespeitar esta última determinação cerca de 15 a 30 minutos depois, por não suportar o calor que sentia dentro do veículo. Nunca se identificou como juiz, e bem, por entender que não tinha de o fazer ante uma normal operação de fiscalização por parte da GNR. Cerca de uma hora após o início da operação de fiscalização e porque se apercebeu que os agentes da GNR se iriam ausentar e transferir o caso para a PSP, é que o assistente se decide identificar como juiz e exigir a identificação dos agentes da GNR intervenientes.
Daqui resulta que a pretensa intimidação, agressividade, provocação ou ofensividade não façam qualquer sentido. Na verdade, ditam as regras da experiência comum que um cidadão que não se pretende prevalecer do seu estatuto profissional (e, como tal, não se identifica como juiz) não invoque quaisquer outros argumentos para intimidar os agentes da GNR. Por outro lado, manda o senso comum que não se considere possível que alguém com perto de sessenta anos, sozinho, logre intimidar ou ser agressivo perante um grupo de, pelo menos, quatro agentes da GNR, muito mais novos e, pelas regras da experiência, mais pujantes fisicamente e presumivelmente armados. De resto, é o próprio arguido SI... que afirma que o assistente não teve uma atitude agressiva ou de intimidação, no que é secundado pelo agenta da GNR P... e pelo agente da PSP R....
Logo, a identificação como juiz de direito por parte do assistente, cerca de uma hora depois do início da acção de fiscalização e o pedido de identificação dos agentes nada tenha de intimidatório, tanto mais que aqueles se aprestavam para passar a continuidade da actuação para a PSP. Ou seja, se os arguidos se sentiram intimidados não o foi em resultado de qualquer conduta do assistente durante a fiscalização, mas tão-só porque se aperceberam de que ao serem identificados e que o identificante era juiz sentiram que da sua incorrecta actuação poderiam advir consequências disciplinares ou criminais. Daí também que o arguido S... tenha afirmado que o assistente é que iria ficar mal visto no seu serviço o que concretizou com a participação ao CSM.
De todo o modo, importa realçar determinadas afirmações dos arguidos quer no processo no CSM, quer em julgamento.
Assim:
O agente SI... disse não poder garantir que o condutor se tivesse apercebido do sinal de paragem, que aquele parou de imediato, não havendo indícios de fuga.
O agente P... afirmou que o assistente entrou no seu espaço, numa postura de desafio, sem concretizar o que tal significava. Disse ainda que o sinal de paragem foi dado a cerca de 30 a 50 metros do local por onde circulava o assistente.
Todos os arguidos, com excepção do S..., afirmaram que o assistente se identificou como juiz e não como funcionário ao serviço do CSM.
Não foi levantado qualquer auto por desobediência ou ofensa aos agentes da GNR.
Nenhum dos arguidos logrou concretizar qualquer acto de provocação, agressividade, intimidação ou ofensa aos agentes da GNR, por parte do assistente (para além da saída do veículo contra ordem do arguido P..., que aquele justificou com o calor que sentia) limitando-se a manter um discurso generalista e conclusivo.
Ora, com o devido respeito, a Mma juiz a quo não se deveria ter refugiado no princípio in dubio pro reo para formular a decisão de facto.
Para que o tribunal lance mão do princípio in dubio pro reo, ou seja, faça prevalecer, nesta vertente, o princípio da inocência do arguido — art. 32°, 2, C. R. Port. -, torna-se necessário que o julgador se encontre em face de dúvidas irremovíveis, razoáveis e razoáveis, na apreciação e valoração das provas e na determinação dos factos provados, favorecendo o arguido, no sentido de não ter como provados os factos que lhe são imputados na acusação e que, a provarem-se, seriam fundamento para a aplicação de uma pena —cfr. Acs. RL, de 3-5-05, Proc. n° 6600/2004-5; de 15-2-09, Proc. n° 2777/2008-9; de 25-11-08, Proc. n° 8904/2008-5; e do STJ, de 25¬3-09, Proc. n° 09P0486; de 30-4-08, Proc. n0 07P3331; e de 17-4¬08, Proc. n0 08P823, in www.dgsi.pt. Destarte, ante as dúvidas manifestadas e não resolvidas, impõe-se decidir favoravelmente ao arguido.
No caso em apreço, inexistem quaisquer dúvidas irremovíveis ou razoáveis que legitimassem a sua invocação pelo tribunal a quo.
Efectivamente, ficou demostrado que logo após o assistente se ter identificado como juiz e ter exigido a identificação dos agentes da GNR intervenientes na acção de fiscalização se dirigiu àquele e disse você é que vai ficar mal visto no seu serviço, o que concretizou com a participação ao CSM onde expressamente afirma que pretende procedimento disciplinar contra o assistente. E, neste particular, contrariamente ao que o arguido sustenta, não releva se teve qualquer apoio dos seus superiores hierárquicos, posto que a participação foi elaborada exclusivamente por si.
No que se refere à veracidade ou não do afirmado pelo arguido S... na participação ao CSM, importa relevar a seguinte matéria de facto:
Contrariamente ao que disse o denunciante, o arguido SI... afirmou não poder garantir que o assistente se tenha apercebido da ordem de paragem, que este parou imediatamente quando se inteirou da intenção da GNR, e que não houve indícios de fuga.
O agente N... afirmou que a ordem de paragem foi dada a cerca de 30 a 50 metros do local onde circulava o assistente, o que é corroborado pela supra aludida reportagem fotográfica.
O assistente, só cerca de uma hora depois do início da acção de fiscalização se identificou como juiz (e não como funcionário ao serviço do CSM), pelo que qualquer suposta intimidação dos agentes não poderá ter sido causada pelo seu estatuto profissional.
Intimidação que também não faz sentido, ante as regras da experiência comum, pois, um quase sexagenário, não teria quaisquer hipóteses de fisicamente ombrear com quatro elementos da GNR, mais novos e supostamente armados.
Não foi levantado qualquer auto de notícia por desobediência ou qualquer outra pretensa actuação criminosa ou contra-ordenacional por parte do assistente.
Atenta a distância a que se encontrava do assistente (que naturalmente seguiria atento ao trânsito intenso que se verificava), a ordem de paragem que lhe terá sido dada não foi observada pelo assistente (como admite o agente SI...), pelo que o arguido S... mente ao dizer que o assistente desobedeceu deliberada e conscientemente a tal ordem, pois demonstrou sinais visíveis (?) de se ter apercebido do sinal e ainda que o assistente se pôs em fuga (o que não é confirmado pelo agente SI..., conjugado com os restantes meios de prova).
Mente ainda ao CSM e em audiência o arguido S... ao afirmar, relativamente ao assistente, que ele próprio lhe ordenou que parasse, tendo dito que aquele olhou para ele, pelo que lhe disse encoste aí, o que o assistente terá entendido perfeitamente, não o tendo feito deliberadamente (apesar de continuar a circular à mesma velocidade, sem indícios de que pretendesse fugir e tendo imobilizado imediatamente o veículo, assim que se apercebeu da ordem de paragem dada cerca de 600 metros mais à frente).
Acresce que o assistente obedeceu a todas as ordens que lhe foram sendo transmitidas pelos agentes da GNR fiscalizadores, designadamente: forneceu os seus elementos de identificação e do veículo, a declaração passada pela PSP, abriu o capôt da viatura para verificação do chassis, manteve-se no interior daquela, só tendo saído para o exterior mais tarde porque não aguentava o calor e não abandonou o local e, quando o fez, dirigiu aos agentes o correspondente pedido, tendo então sido acompanhado.
Todos os declarantes são unânimes em dizer que o assistente se identificou como juiz e não como funcionário ao serviço do CSM.
Abra-se qui um parenteses para frisar que o ressabiamento entre o arguido S... e o ora assistente é de tal ordem que, mesmo em plena audiência de julgamento, aquele trata a julgadora como meretíssima juíza e o assistente como sr. JO..., apesar de ter pleno conhecimento do seu estatuto profissional.
Apesar da cena Hollywwodesca o assistente manifestou naturalmente desagrado pela mesma dizendo somente isto é um festival,' o que naturalmente não relecte qualquer atitude ofensiva, intimidatória, de provocação ou agressão.
Ora, como a final da participação ao CSM o arguido S... refere, a sua intenção é a instauração de procedimento disciplinar contra o assistente (funcionário do CSM) porque, como aduz:
Foi feito regulamentar sinal de paragem, de forma bastante perceptível ao condutor do veículo...;
O condutor, demonstrando sinais visíveis de se ter apercebido do sinal efectuado pelo agente em causa, ignorou por completo tal ordem, chegando mesmo a olhar na direcção dos elementos da patrulha... tendo continuado a sua marcha em direcção ao centro da cidade de Loures, desrespeitando por completo uma ordem legítima efectuada pelo elemento da GNR,
Na abordagem ao veículo em fuga;
O indivíduo manteve-se sempre com este comportamento de indignação, exaltação e agressividade verbal para com os elementos da fiscalização;
Mantendo a mesma postura agressiva... tentando intimidar os agentes policiais... fazendo-se valer da sua identificação de magistrado, não informando, contudo e em concreto, onde efectivamente exercia funções;
Apesar da sua atitude provocatória, intimidativa e ofensiva, levadas a cabo por um cidadão que se identificou como magistrado em serviço no Conselho Superior da Magistratura
Se encontra matéria susceptível de enquadrar um ilícito
Mais adiante, a fls. 24, ouvido na qualidade de testemunha no inquérito do CSM, o arguido S... declarou confirmar inteiramente o teor da participação.
Ora, em face do supra aludido, dúvidas não restam de que o arguido S... mentiu despudoradamente na participação que dirigiu ao CSM, bem como nas declaração prestadas no inquérito que se seguiu, imputando ao assistente a prática de um crime de desobediência que bem sabia este não ter cometido, com o intuito, por mero revanchismo, de que contra este fosse instaurado procedimento disciplinar.
Já quanto aos restantes arguidos, pese embora determinadas rectificações factuais no sentido da aproximação da verdade material, o certo é que confirmaram, sob juramento, na qualidade de testemunhas no processo que correu termos no CSM, os factos constantes do teor da participação do arguido S..., que bem sabiam não ser verdadeiros.
Relativamente à matéria de facto impugnada, em face do supra exposto, deve a mesma ser alterada da forma que segue: Factos dados como provados:
N° 5 — Os arguidos integravam uma brigada de fiscalização da GNR em veículo caracterizado, que cerca das 10.30 horas estava localizada na rotunda existente junto às bombas de combustível da BP;
Nº 6 — A artéria por onde o assistente passou é uma via muito movimentada.
Os factos dados como provados sob os nos. 7, 8, 9, 10, 12, 24 e 31, devem manter-se nos precisos termos descritos na 1ª instância.
Consequentemente, deve passar-se a considerar não provado que:
O veículo conduzido pelo assistente passou pela via onde se encontrava imobilizada a viatura da referida brigada de fiscalização, e pelo menos os arguidos JO... SI... e J... S...
O assistente passou junto dos referidos arguidos.
Factos dados como não provados:
Devem passar a dar-se como provado os factos constantes das als. a) a h) e j) a m).
Relativamente ao facto invocado na al. i), pelos motivos anteriormente aduzidos, entendemos que o assistente não chegou a ser formalmente detido, tendo sido tão-só exigida a sua presença até ao final da actividade fiscalizadora, atentos os fins supra mencionados, devendo-se manter tal al. como não provada.
Ante o exposto, resultam provados os crimes pelos quais os arguidos vinham pronunciados.
Afirmou o tribunal recorrido que ante as versões antagónicas reproduzidas nos autos, não logrou ultrapassar a dúvida e, como tal, beneficiou os arguidos, por força do princípio in dubio pro reo.
Ora, para que o tribunal lance mão do princípio in dubio pro reo, ou seja, faça prevalecer, nesta vertente, o princípio da inocência do arguido — art. 32º, 2, C. R. Port. -, torna-se necessário que o julgador se encontre em face de dúvidas irremovíveis, razoáveis e razoáveis, na apreciação e valoração das provas e na determinação dos factos provados, favorecendo o arguido, no sentido de não ter como provados os factos que lhe são imputados na acusação e que, a provarem-se, seriam fundamento para a aplicação de uma pena — cfr. Acs. RL, de 3-5-05, Proc. no 6600/2004-5; de 15-2-09, Proc. n° 2777/2008-9; de 25-11-08, Proc. n° 8904/2008-5; e do STJ, de 25-3-09, Proc. no 09P0486; de 30-4¬08, Proc. n° 07P3331; e de 17-4-08, Proc. n° 08P823, in www.dgsi.pt.
Destarte, ante as dúvidas manifestadas e não resolvidas, impõe-se decidir favoravelmente ao arguido. Sucede que no caso dos autos, a matéria de facto que se logrou apurar não deixa qualquer margem para dúvidas de que os arguidos praticaram os factos em causa e, consequentemente, preencheram com as suas condutas os tipos legais de crime em causa, como infra se demonstrará. Consequentemente, utilizou indevidamente o tribunal a quo o princípio in dubio pro reo posto que não existe qualquer situação (dúvida) que impusesse a sua aplicação.
Assim, aproveitando o expendido na sentença recorrida, dir-se-á que:
De acordo com o preceituado no n.o 1 do mencionado artigo Quem, por qualquer meio, perante autoridade ou publicamente, com consciência da falsidade da imputação, denunciar ou lançar sobre determinada pessoa a suspeita de prática de crime, com intenção de que contra ela se instaure procedimento, é punido com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa, acrescentando o n.o 2 que se a conduta consistir na falsa imputação de contra-ordenação ou falta disciplinar, o agente é punido com pena de prisão até um ano ou com pena de multa até 120 dias.
O bem jurídico protegido com a incriminação é o interesse individual, concretamente a honra e o bom nome de quem seja o ofendido, ainda que, reflexamente se tutelem também os valores de realização da justiça, nomeadamente a eficácia, a autoridade e legitimação que desta emanam.
De tal previsão resulta claramente que a tal tipo legal acresce um elemento subjectivo específico, constituído por um dolo especifico, traduzido na intenção de que seja instaurado procedimento contra o visado com base em imputações que o denunciante tenha a consciência de serem falsas.
Seguindo de perto o vertido no acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 20.11.2013 (processo 755/10.4TAON.P1, disponível em www.dgsi.pt), verifica-se que os elementos típicos do crime de denúncia caluniosa são os seguintes:
a) Conduta típica: Denunciar ou lançar suspeita por qualquer meio;
b) Sujeito pdssivo: Outra pessoa (determinada ou identificável);
c) Objecto da conduta: Imputação de factos, ainda que sob
a forma de suspeita, idóneos a provocarem procedimento criminal, contra-ordenacional ou disciplinar;
d) Destinatário da acção: autoridade e/ou círculo indeterminado de pessoas (ou seja, denúncia a uma autoridade ou suspeita feita publicamente);
e) Elemento subjectivo: Dolo qualificado por duas exigências: a consciência da falsidade da imputação e a intenção de que contra outrem se instaure procedimento.
Vertendo ao caso concreto, considerando a factualidade ora dada como provada e não provada, mostram-se preenchidos os elementos típicos do crime em análise, porquanto resultou provado que o arguido J... S... (como, de resto, já tinha ameaçado no final da acção de fiscalização e depois de ter sido identificado pelo assistente, disse-lhe que aquele ia ficar mal visto no serviço) daí que, consequentemente tenha apresentado participação do ora assistente no Conselho Superior da Magistratura, de onde fez constar de forma deliberada e consciente, factos que sabia não corresponderem à verdade (desobediência à ordem de paragem, atitude intimidatória, agressiva e provocatória para com os agentes da autoridade), com o intuito expresso de que fosse instaurado procedimento disciplinar contra o ora assistente, assim procurando denegrir a sua honra e bom nome pessoal e profissional.
Quanto ao crime de falsidade de testemunho:
A todos os arguidos vem ainda imputada a autoria material de 1 (um) crime de falsidade de testemunho, p. e p. pelo artigo 360.°, n.o 1 do Código Penal.
Estatui o mencionado preceito legal que quem, como testemunha, perito, técnico, tradutor ou intérprete, perante tribunal ou funcionário competente para receber como meio de prova, depoimento, relatório, informação ou tradução, prestar depoimento, apresentar relatório, der informações ou fizer traduções falsos, é punido com pena de prisão de 6 meses a 3 anos ou com pena de multa não inferior a 60 dias.
O bem jurídico aqui em causa é a cabal realização da Justiça, a qual assentará, necessariamente numa informação probatória verdadeira.
Assim, o tipo objectivo de ilícito pressupõe a falsidade de uma declaração prestada perante autoridade judiciária ou funcionário incumbido de receber determinado meio de prova.
Trata-se de um crime de perigo abstracto, não carecendo o preenchimento do respectivo tipo de ilícito que o testemunho falso afecte efectivamente a obtenção da verdade material por parte do Tribunal, nem sequer que ocorra um perigo concreto de tal vir a ocorrer. Com efeito, o fundamento do ilícito é logo a própria declaração falsa, independentemente da consideração da sua efectiva influência na decisão .
Representa ainda um crime de mera actividade, porquanto o facto ilícito típico se esgota na prestação do falso testemunho, não sendo necessária a verificação de qualquer resultado dele derivado.
São elementos objectivos do tipo deste crime legal:
a) A prestação de depoimento falso por parte de quem esteja investido na posição de testemunha, perito, técnico, tradutor ou intérprete. Trata-se, por isso, de um crime específico.
b) Ser o depoimento efectuado perante tribunal ou funcionário competente para o receber como meio de prova.
Porém, não basta a verificação do elemento objectivo supra enunciado. Tratando-se de um crime doloso, impõe-se ainda a prova da consciência da falsidade da declaração e a intenção deliberada em faltar à verdade quanto a tal facto.
Todavia, nem toda a declaração falsa prestada por uma testemunha preenche o tipo de ilícito em causa. Com efeito, a falsidade só releva na medida em que o declarante se encontre sujeito a um dever processual de verdade e de completude. Assim, a testemunha deve declarar apenas factos de que tenha conhecimento directo, encontrando-se fora do referido âmbito os seus juízos de valor e as suposições.
Por outro lado, a exigência da verdade existe apenas relativamente à declaração que se reporte ao objecto do processo.
Por fim, importa que a declaração seja feita perante quem tem competência para ouvir a declaração.
Ademais, a declaração tem de ser falsa.
Neste ponto, como ensina MEDINA DE SEIÇA, para se aferir da falsidade de uma declaração é necessário ter um termo de comparação: uma declaração é falsa quando aquilo que se declara (conteúdo da declaração) diverge daquilo sobre o qual se declara (objecto da declaração). E, por se adoptar a teoria objectiva da falsidade, basta que a declaração esteja em desconformidade com o acontecimento real para se preencher o elemento objectivo em causa.
Nesta matéria tem a doutrina preconizado a denominada teoria objectiva, nos termos da qual a falsidade da declaração reside na contradição entre o declarado e a realidade, ou seja, tem que existir contradição entre aquilo que se declara e aquilo sobre o qual se declara (a realidade ou verdade histórica).
Só a contradição entre o conteúdo da declaração e a verdade objectiva dos factos aos quais a declaração se reporta constitui falsidade.
A este propósito, decidiu o Tribunal da Relação do Porto em acórdão proferido em 05.07.2006 (processo 0546988, disponível em www.dgsi.pt) que a divergência entre os depoimentos prestados em dois momentos processuais distintos (Inquérito e Audiência de Julgamento) não é suficiente para que o Tribunal possa - sem fixar na matéria de facto o ocorrido - escolher a fase processual em que o arguido prestou o depoimento falso, e consumou o crime, pois o elemento típico central do crime sob punição reside na falsidade do depoimento, a aferir pela sua desconformidade com o acontecimento real a que se reporta (concepção objectiva). Desta concepção decorre que a consumação existe sempre que o depoimento diverge da realidade objectiva':
Nesta sede, levanta-se uma questão de decisivo interesse prático que tem dividido a jurisprudência.
Assim, para uma corrente jurisprudencial, a falsidade da declaração basta-se com a prova que a testemunha, em dois momentos distintos do processo, fez depoimentos contraditórios, ainda que não se venha a provar qual dos depoimentos corresponde à realidade ou verdade histórica.
Para esta tese, existindo duas declarações contraditórias entre si no mesmo processo, uma delas é falsa. Assim, não importa saber para o preenchimento do tipo qual é o depoimento falso.
Pelo contrário, para outros, o preenchimento do tipo apenas se verifica quando se apurou qual dos depoimentos corresponde à realidade história, uma vez que só assim se consegue descortinar qual dos depoimentos é efectivamente falso.
Esta tese, a qual se sufraga, é preconizada, designadamente, no acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 10.01.2005 (processo n.o 1682/04-2, disponível em www.dgsi.pt), onde se sustenta que é sempre imperioso que se demonstre o contrário daquilo que foi declarado e, mais que isso, que o declarante conhecia o contrário daquilo que declarou.
Os citados acórdãos exigem, pois, para o preenchimento do tipo de ilícito ora em causa que se prove a realidade histórica e objectiva dos factos, da qual a testemunha tinha consciência e sobre a qual prestou depoimento falso. Assim sendo, apenas estando assente a verdade objectiva é que se pode saber se o depoimento prestado é, de facto, falso.
Com efeito, na medida em que o tipo de ilícito implica a comparação entre a declaração prestada e a verdade histórica, só apurando-se a verdade objectiva dos factos conseguimos saber se e quando a testemunha mentiu, prestando a declaração contrária ou desconforme com a realidade histórica.
In casu, todos os arguidos prestaram declarações no processo de inquérito que correu termos no Conselho Superior da Magistratura e todos eles, sob juramento, disseram que confirmavam na íntegra o conteúdo da participação elaborada pelo J... S..., que afirmaram conhecer, apesar de saberem que ela continha factos inverídicos e, mesmo assim, quiseram deliberada e voluntariamente secundar as falsidades ali vertidas pelo sargento S..., com as correcções de pormenor supra assinaladas.
Como tal, devem todos os arguidos ser condenados pelo crime de falsidade de testemunho pelo qual vêm pronunciados.
Refira-se, a propósito de algo que vem afirmado na resposta ao recurso, que não assume qualquer relevo quem é que sugeriu ou, mesmo, colaborou (o que está por demonstrar) que fosse elaborada a participação, uma vez que a mesma foi dirigida e encontra-se assinada em nome pessoal do sargento-ajudante J... S.... De resto, se se tratasse de uma questão que envolvesse a GNR enquanto instituição, certamente que esta usaria os canais próprios do relacionamento institucional com o CSM e viria certamente subscrita por um oficial general.
Nos termos do acórdão STJ n0 4/2016 — DR, série I, de 22-2¬16, em face das condenações a que ora se procede incumbe ao tribunal ad quem proceder à determinação da espécie e medida da pena.
Ambos os crimes em apreço são abstractamente puníveis com penas de prisão ou de multa. Ora, privilegiando a lei penal as penas não privativas da liberdade — art. 70°, C. pen. — e tendo em conta a acidentalidade dos ilícitos, o bom comportamento posterior aos factos por parte dos arguidos, bem a sua a sua inserção familiar e profissional, de resto, possuidores de cadastros com louvores e menções honrosas, entende-se que a aplicação de meras penas de multa satisfaz de forma suficiente e adequada as finalidades da punição.
As finalidades da aplicação de uma pena residem primordialmente na tutela dos bens jurídicos e, na medida do possível, na reinserção do agente na comunidade e que, neste quadro conceptual, o processo de determinação da pena concreta seguirá a seguinte metodologia: a partir da moldura penal abstracta procurar-se-á encontrar uma sub-moldura para o caso concreto, que terá como limite superior a medida óptima de tutela de bens jurídicos e das expectativas comunitárias e, como limite inferior, o quantum abaixo do qual já não é comunitariamente suportável a fixação da pena sem pôr irremediavelmente em causa a sua função tutelar. Dentro dessa moldura de prevenção actuarão, de seguida, as considerações extraídas das exigências de prevenção especial de socialização. Quanto à culpa, compete-lhe estabelecer o limite inultrapassável da medida da pena a estabelecer (cfr. Figueiredo Dias, Direito Penal Português — As consequências jurídicas do crime, Parte Geral, II, Aequitas, Editorial Notícias, 1993, pp. 227 e segs.). Destarte, a medida da pena há-de ser dada primordialmente pela medida da necessidade de tutela dos bens jurídicos face ao caso concreto. É, assim, a prevenção geral positiva e não a culpa que fornece um «espaço de liberdade ou de indeterminação», uma «moldura de prevenção» (ponto óptimo e o ponto ainda comunitariamente suportável de medida de tutela dos bens jurídicos). A culpa, além de constituir o referido limite máximo de medida da pena, teria como função a proibição de excesso: constituiria um limite inultrapassável de todas e quaisquer considerações preventivas. Dentro dos limites referidos e permitidos pela prevenção geral positiva, actuam os pontos de vista de prevenção especial de socialização que vão determinar, em último termo, a medida da pena, devendo esta, evitar a quebra da inserção social do agente e servir a sua reintegração (Figueiredo Dias, ob. e loc. cit., pgs. 221-225).
A medida da pena a determinar no âmbito da moldura de prevenção - onde actuam as mencionadas considerações de socialização -, tem, assim, como limite máximo a culpa do agente e, como limite mínimo, a pena que, perante as circunstâncias concretas do caso relevantes, se mostra ainda comunitariamente suportável à luz da necessidade de tutela dos bens jurídicos e da estabilização das expectativas comunitárias na validade da norma violada ou reafirmação contra-fáctica da norma (prevenção geral de integração).
Temos, assim, que a medida da pena se determina em função da necessidade de protecção dos bens jurídicos (prevenção geral) e de reintegração do agente na sociedade (prevenção especial), tendo por limite a medida da culpa expressa — arts. 400, 1 e 2 e 71°, C. Pen..
Efectivamente, dispõe expressamente aquele art. 71.°, n.°1, que a determinação da medida da pena é feita «em função da culpa do agente e das exigências de prevenção», devendo-se atender, nos termos do n.°2 do cit. art. a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor do agente ou contra ele, nomeadamente, as elencadas nas suas diversas alíneas.
Na determinação da medida concreta das penas importa realçar o elevado grau de ilicitude das condutas (mais intensa por parte do arguido J... S...) traduzida na gravidade das imputações com cariz disciplinar, contra-ordenacional e, mesmo, criminal elencadas na participação, dirigidas ao órgão de gestão e disciplina da magistratura judicial portuguesa, pretendendo os arguidos prejudicar séria e gravemente a carreira profissional do assistente, bem como a sua honra e bom nome no meio judiciário e mediatamente ante o público em geral. Por outro lado, actuaram os arguidos com dolo intenso (directo). Relativamente ao modo de actuação importa considerar que fiscalização por parte dos arguidos e outros agentes redundou num espectáculo vexatório para o assistente, atento o número de viaturas e agentes envolvidos, em pleno dia de semana, com trânsito intenso, em plena cidade de L…, tendo durado mais de uma hora, com consequente retenção do ofendido no local, sem liberdade de deslocação a não ser sob custódia e debaixo de uma incorrecção de tratamento, que não é certamente o legal e estatutariamente devido a todo o cidadão. Para além da publicitação da situação da ocorrência na cidade de L… e nos meios forenses em particular, com o inerente falatório, as consequências só não foram mais gravosas porque o processo administrativo do CSM redundou em arquivamento. Consequentemente, as necessidades de prevenção geral antolham-se deveras elevadas mormente num momento em que o comportamento e a imagem dos agentes das forças policiais se encontra deveras escrutinada mediante os casos que a comunicação social vem dando notícia, por motivos menos abonatórios para aqueles, dos quais respigamos os atinentes ao julgamento de agentes da PSP por situações ocorridas na Cova da Moura (Amadora) e em Guimarães (agressão a adeptos do Benfica), com
evidente desprestígio para as instituições a que pertencem. Por outro lado, as necessidades de prevenção especial afiguram-se pouco relevantes uma vez que todos os arguidos são de modesta condição económica, são indivíduos social, familiar e profissionalmente integrados, com uma boa folha de serviços, quase todos com bastantes anos ao serviço da GNR, não tendo antecedentes criminais e mantendo bom comportamento posterior aos factos. Sublinhe-se finalmente que a operação de fiscalização foi perfeitamente justificada em face da circulação por parte do assistente sem chapas de matrícula na viatura.
Assim, tendo em conta o supra expresso e ainda o disposto no art. 47°, 2, C. Pen., entendemos suficientes e adequadas a imposição das seguintes penas:
Arguido JU...:
- Pelo crime de denúncia caluniosa p. e p. pelo art. 365°, 2, C. Pen., a pena de 100 (cem) dias de multa, à taxa diária de 6 €;
- Pelo crime de falsidade de testemunho p. e p. pelo art. 360°, 1, C. Pen., a pena de 90 (noventa) dias de multa, à taxa diária de 6 €.
Operando o cúmulo jurídico, nos termos do art. 770, C. Pen., tendo em conta os supra apurados factos e personalidade do agente, condena-se este arguido na pena única de 150 (cento e cinquenta) dias de multa, à taxa diária de 6 €, no montante de 900 €.
Arguidos JO..., NE... e SA..., pela prática, cada um deles, de um crime de falsidade de testemunho p. e p.
pelo art. 3600, 1, C. Pen., a pena de 80 (oitenta) dias de multa, à taxa diária de 6 €, no montante de 480 €.
Quanto aos pedidos de indemnização civil:
Como se refere acertadamente na sentença revidenda: o assistente e demandante deduziu pedido de indemnização civil, pugnando pela condenação de J... S... no pagamento da quantia de € 10.000,00 (dez mil euros) e de JO... SI..., N... e SA... RE... no pagamento da quantia de € 1.500,00 (mil e quinhentos euros), alicerçando a sua pretensão indemnizatória nos danos não patrimoniais sofridos na decorrência das condutas delituosas que os demandados adoptaram e que se encontram e análise nestes autos.
Atento o disposto nos artigos 129.0 do Código Penal e 71.0 do Código de Processo Penal, a indemnização a fixar no âmbito do processo penal assume, a natureza de indemnização de perdas e danos decorrentes da prática de um crime. Por conseguinte, o apuramento do seu quantitativo e respectivos pressupostos legais ancoram-se no estatuído pela lei civil (arts. 483.0 e seguintes do Código Civil).
Ora, conforme resulta do disposto no artigo 377.0, n.o 1, do Código de Processo Penal, 'A sentença, ainda que absolutória, condena o arguido em indemnização civil sempre que o pedido respectivo vier a revelar-se fundado
A constituição do direito à indemnização pressupõe a demonstração de que o agente (in casu, os arguidos) praticou um facto voluntário, ilícito e culposo, violador do direito de outrem ou de disposição legal, causador de um dano. Importará ainda demonstrar a existência de nexo de causalidade entre o facto e o dano, por forma a que o primeiro seja condição adequada à produção do segundo.
O pedido de indemnização fundado na prática de crime cuida tão só de indemnizar o lesado pelos danos decorrentes da prática de crime, exigindo-se que o facto gerador da responsabilidade seja constitutivo do tipo legal daquele, excluindo-se a possibilidade de, em processo penal, ser arbitrada indemnização fundada em responsabilidade civil puramente contratual.
De acordo com o art. 71°, C. P. Pen. (princípio da adesão), o pedido de indemnização civil deve, por regra, ser deduzido em processo penal, quando se funde na prática de um crime.
Ora, por força daquele princípio da adesão do pedido de indemnização civil fundado na prática de um crime, a causa de pedir na acção cível conexa com a criminal é sempre a responsabilidade civil extracontratual, aquiliana (vd. Ac STJ, n° 7/99, DR, I-A, de 3-8¬99), daí que, embora não se demonstre a a culpa do lesante, a responsabilidade objectiva pelo risco revela-se sucedânea e decorrentemente subsidiária daquela, pelo que não tenha que ser necessariamente invocada ab initio, sem prejuízo de vir a ser considerada subsidiariamente, quer na ia instância, quer em sede de recurso.
Ora, a absolvição dos demandados dos pedidos de indemnização civil formulados pelo assistente/demandante teve em linha de conta que a factualidade que o tribunal a quo apurou não integrava a prática pelos demandados de qualquer crime, não decorrendo daí quaisquer perdas e danos pretensamente naquele fundados, pelo que não se mostrariam preenchidos os pressupostos aqui exigidos para que se efectivasse a responsabilidade civil.
Sucede que, mediante a alteração da matéria de facto provada e não provada operada neste tribunal ad quem, ficou demonstrada a responsabilidade criminal de todos os arguidos/demandados e, bem assim, por consequência, a existência de danos na esfera jurídico civil do demandante.
Efectivamente, por causa do descrito comportamento dos arguidos, resulta à saciedade, da prova documental produzida, das convincentes declarações do demandante e do depoimento da sua esposa, F..., que:
m demandante ficou muito incomodado com a participação do arguido J... S... do Conselho Superior da Magistratura;
E sentiu-se enxovalhado com o comportamento dos demandados no inquérito administrativo que correu termos no CSM;
m demandante foi juiz no Tribunal de … durante vários anos, antes dos factos em análise;
Na sequência da participação criminal apresentada pelo assistente em 11.07.2012 perante os Serviços do Ministério Público junto do Tribunal da Comarca de …, a situação que ocorreu com o assistente e que envolveu os demandados, com respeito à ordem de paragem ao assistente e subsequentes desenvolvimentos, foram comentadas entre os funcionários do tribunal, magistrados e advogados;
m assistente ao saber que era objecto de conversas e foco de atenção devido aos factos supra referidos sentiu mal-estar.
Estão, assim, verificados os pressupostos da responsabilidade civil aquiliana — factos ilícitos, culposos, provocação de danos não patrimoniais ao lesado e nexo de causalidade entre aqueles factos e estes danos — arts. 483°, 1, 496°, 1 e 4, 494° e 562° a 566°, todos do C. Civ..
Entende-se, assim, adequado fixar os seguintes valores indemnizatórios devidos pelos demandados ao demandante:
5.000 € pelo demandado J... S...:
1.000 € pelos restantes demandados.
As indemnizações civis não poderão apresentar valores mais elevados uma vez que o demandante ao não impugnar, como poderia, os factos dados como não provados pelo tribunal a quo sob as als. n) a q) — vd. art. 412°, 3, a), C. P. Pen. -, impediu este tribunal de os reapreciar.

Pelo exposto:
Acordam, em conferência, os juízes da 5a Secção do tribunal da Relação de Lisboa em julgar parcialmente procedente o recurso e consequentemente:
Altera-se a matéria de facto provada e não provada nos precisos termos supra expressos;
Condena-se o arguido JU...:
- Pelo crime de denúncia caluniosa p. e p. pelo art. 365°, 2, C. Pen., a pena de 100 (cem) dias de multa, à taxa diária de 6 €;
- Pelo crime de falsidade de testemunho p. e p. pelo art. 360°, 1, C. Pen., a pena de 90 (noventa) dias de multa, à taxa diária de 6 €.
Operando o cúmulo jurídico, nos termos do art. 770, C. Pen., tendo em conta os supra apurados factos e personalidade do agente, condena-se este arguido na pena única de 150 (cento e cinquenta) dias de multa, à taxa diária de 6 €, no montante de 900 €.
Condenam-se os arguidos JO..., NE... e SA..., pela prática, cada um deles, de um crime de falsidade de testemunho p. e p. pelo art. 360°, 1, C. Pen., a pena de 80 (oitenta) dias de multa, à taxa diária de 6 €, no montante de 480 €.
Julgam-se os pedidos de indemnização civil parcialmente provados e procedentes e, em consequência, condenam-se os demandados a pagar ao demandante as seguintes quantias a título de indemnização civil por danos não patrimoniais, acrescidas de juros moratórios vincendos à taxa de 4/prct. a contar da presente data:
JU...: 5.000 € (cinco mil euros);
JO..., NE... e SA..., cada um deles: 1.000 € (mil euros).
Não é devida taxa de justiça criminal.
Custas dos pedidos cíveis por demandante e demandados na proporção dos decaimentos.
Após trânsito, comunique ao Comando Geral da Guarda Nacional Republicana.
Lisboa, 10-7-18
Carlos Espírito Santo
Cid Geraldo