Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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 - ACRL de 30-01-2018   Ação de interdição por anomalia psíquica. Tutor. Afastamento do critério de preferência do filho mais velho.
Na nomeação de tutor numa ação de interdição por anomalia psíquica deve imperiosamente o tribunal colocar, sempre, em primeiro lugar o interesse do própria interditado a uma eficaz proteção do seu património e ao restabelecimento, na medida do possível, do equilíbrio da sua situação pessoal.
O afastamento do critério da preferência estabelecido na al. d) do nº1 do art.143º, do CC para a nomeação como tutor, do filho mais velho do interditado, apenas pode ocorrer perante um demonstrado concreto conjunto de situações graves e relevantes que a isso aconselhem, pois só ponderosas razões, do ponto de vista fático e jurídico, poderão levar ao afastamento daquela ordem de preferência.
Não são quaisquer circunstâncias adicionais ou meras garantias dadas por outros filhos, que não o mais velho, que darão lugar à preterição da ordem preferencial legalmente estabelecida.
A lei exige, para a preterição da regra da preferência do filho mais velho, que as garantias dadas por outro filho mais novo sejam efetivamente maiores.
Qualquer alteração do tutor nomeado, ou seja, o afastamento da ordem de preferência estabelecida naquele preceito implica forçosamente a alegação e prova de factos que ponham em causa e descredibilizem a nomeação do filho mais velho da requerida fundada em argumentos jurídicos e suportada em factos que permitam atingir um tal resultado.
É que, substituir ou remover o tutor pressupõe que esteja demonstrado nos autos:
- ou a sua incapacidade para o cargo, por falta de cumprimento adequado dos deveres próprios do cargo;
- ou a revelação da sua inaptidão para o cargo;
- ou, ainda, a ocorrência de factos supervenientes à investidura do cargo que o coloquem em situação de impedimento da sua nomeação (cfr. Art. 1948°, ex vi do art. 1960º).
E deve ter lugar em sede própria, em ação em que se discutam tais questões e na qual o tutor nomeado possa exercer o seu direito ao contraditório, rebatendo os argumentos que visam a sua substituição ou remoção e apresentando os meios de prova correspondentes à sua defesa.
Proc. 6419/15.5T8LSB.L1 7ª Secção
Desembargadores:  José Capacete - Carlos Oliveira - -
Sumário elaborado por Susana Leandro
_______
Processo n° 6419/15.5T8LSB.L1
Recurso de Apelação Tribunal Recorrido:

SUMÁRIO:
(Elaborado pelo relator e da sua inteira responsabilidade - art. 663°, n° 7, do CPC)
1. Na nomeação de tutor numa ação de interdição por anomalia psíquica deve imperiosamente o tribunal colocar, sempre, em primeiro lugar o interesse do própria interditado a uma eficaz proteção do seu património e ao restabelecimento, na medida do possível, do equilíbrio da sua situação pessoal.
II. O afastamento do critério da preferência estabelecido na al. d) do n° 1 do art. 143°, do CC, para a nomeação como tutor, do filho mais velho do interditado, apenas pode ocorrer perante um demonstrado concreto conjunto de situações graves e relevantes que a isso aconselhem, pois só ponderosas razões, do ponto de vista fático e jurídico, poderão levar ao afastamento daquela ordem de preferência.
III. Não são quaisquer circunstâncias adicionais ou meras garantias dadas por outros filhos, que não o mais velho, que darão lugar à preterição da ordem preferencial legalmente estabelecida.
IV. A lei exige, para a preterição da regra da preferência do filho mais velho, que as garantias dadas por outro filho mais novo sejam efetivamente maiores.
V. Qualquer alteração do tutor nomeado, ou seja, o afastamento da ordem de preferência estabelecida naquele preceito implica forçosamente a alegação e prova de factos que ponham em causa e descredibilizem a nomeação do filho mais velho da requerida, fundada em argumentos jurídicos e suportada em factos que permitam atingir um tal resultado.
VI. É que, substituir ou remover o tutor pressupõe que esteja demonstrado nos autos:
ou a sua incapacidade para o cargo, por falta de cumprimento adequado dos deveres próprios do cargo;
ou a revelação da sua inaptidão para o cargo;
ou, ainda, a ocorrência de factos supervenientes à investidura do cargo que o coloquem em situação de impedimento da sua nomeação (cfr. art. 1948°, ex vi do art. 1960°).
VII. E deve ter lugar em sede própria, em ação em que se discutam tais questões e na qual o tutor nomeado possa exercer o seu direito ao contraditório, rebatendo os argumentos que visam a sua substituição ou remoção e apresentando os meios de prova correspondentes à sua defesa.

Acordam na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:
1 - RELATÓRIO:
MT...instaurou a presente ação especial de interdição por anomalia psíquica contra MJ..., alegando, em suma, que é filha da requerida, nascida em 2 de setembro de 1921, a se encontra incapaz de gerir a sua pessoa e os seus bens.
Conclui pugnando para que a ação seja julgada procedente, por provada,
e, em consequência:
- seja decretada a interdição provisória da requerida, nos termos do art. 142° do CC, devendo ser nomeado tutor seu tutor provisório, FJ…
- seja decretada a interdição da requerida. Após a algo atribulada tramitação dos autos, no âmbito da qual:
- foram apresentados vários requerimentos, alguns deles, por vezes, além de irrelevantes, desnecessariamente extensos e prolixos;
- foram apresentados documentos, alguns sem qualquer interesse para a decisão da presente causa,
foi proferida sentença que:
a) decretou a interdição, por anomalia psíquica, da requerida MJ...;
b) fixou o começo da incapacidade da requerida em setembro a início de dezembro de 2014;
c) nomeou:
tutor da requerida, o seu filho mais velho, JJ...:
vogais do conselho de família:
• a requerente, com funções de protutora;
• EM..., que exercerá funções de protutor nos casos em que haja colisão de interesses entre a requerida e o tutor, e em que Maria T... tenha de exercer funções de tutora.
Inconformada com o assim decidido, a requerente interpôs recurso de apelação, concluindo assim as respetivas alegações:
1. 0 Tribunal a quo decidiu mal ao fazer uso da norma contida no Art. 143º, alínea d) nº 1 do Código Civil e ao bastar-se com: a) -As posições de todos (os filhos) são bem evidentes nas exposições que apresentaram nos autos e que nos levam a prescindir da audição do conselho de família, por manifesta utilidade; b) - três dos filhos serem da mesma opinião o tutor deve ser o filho mais velho e apenas uma, a requerente, pedir a sua nomeação como tutora para concluir, sem mais, não existirem fundamentos para considerar que algum dos outros filhos daria maiores garantias de bom desempenho do cargo.
2. Violou o artigo 7º da Lei nº 38/2004, onde é expresso que o deficiente tem o direito de decisão pessoal na definição e condução da sua vida, sendo certo que a interditanda decidiu, a 30.01.2012, de forma livre, consciente e esclarecida, a forma como e por quem queria ser assistida, caso viesse a perder autonomia, sendo inquestionável a lucidez e determinação da requerida ao expressar esta vontade, não havendo, assim, justificação para o Tribunal ter ignorado esta importante decisão da requerida sobre a sua vida.
3. Violou a norma contida no Artigo 139º do C.C. e também o disposto no Artigo 1931.º, nº 1, no qual, in fine, se realça a importância de escolher alguém que, efectivamente, preste cuidados e demonstre afeição pelo interditando.
4. Violou também o nº 2 do mesmo Artigo 1931º que demonstra que a vontade do menor e, por remissão do Art. 139º, também a do interditando, releva, devendo ser ouvido pelo Tribunal quanto à escolha do seu tutor, reconhecendo-se a sua autonomia e dignidade.
5. Igualmente foi ignorado o disposto no Art. 1935º, nº 1 do Código Civil.
6. O recurso adaptado às normas que regulam a incapacidade por menoridade, que é imposto pelo artigo 139º do Código Civil, implica que a tutela de maiores se exerça de modo a que seja dado espaço de realização à capacidade concreta do interdito.
7. Se, como no caso em apreço acontece, o adulto já não está em condições de manifestar a sua vontade livre esclarecida, não há como negar a relevância da sua vontade antecipadamente expressa.
8. A relevância da vontade antecipadamente expressa tem vindo a ser consagrada em diversas Convenções Internacionais outorgadas e ratificadas pelo Estado Português (Convenção de Oviedo - A vontade anteriormente manifestada no tocante a uma intervenção médica por um paciente que, no momento da intervenção, não se encontre em condições de expressar a sua vontade, será tomada em conta.; Convenção dos Direitos das Pessoas com Deficiência).
9. A Lei nº 25/2012 de 16.07.2012 constitui outro exemplo evidente do reconhecimento, na ordem jurídica portuguesa, da vontade antecipadamente expressa, consagrando a faculdade de tomar decisões de saúde para valerem em futura e eventual situação de incapacidade.
10. A Doutrina da Alternativa Menos Restritiva (consagrada na Recomendação do Comité de Ministros do Conselho da Europa (2014) 2) entre outros, estabelece os seguintes princípios: respeito pelos desejos e sentimentos da pessoa visada (princípio nº 9) e o direito a ser ouvido pessoalmente (princípio n.º 13).
11. Esta Recomendação destaca, de forma expressa, que as declarações de vontade antecipadas devem ser reconhecidas e reguladas de modo a assegurar a protecção dos interesses do indivíduo - futuramente - incapacitado (princípio n.º 2, parágrafo 7).
12. 0 Artigo 12º da Convenção dos Direitos das Pessoas com Deficiência vem reconhecer que o indivíduo com deficiência é um sujeito perante a lei, dotado de personalidade jurídica em pé de igualdade com os demais indivíduos, estipulando a preservação máxima da capacidade e a tomada de decisões participada, respeitando, como consagrado neste normativo, os direitos, vontade e preferências das pessoas.
13. Deste modo, a Convenção vem facilitar um afastamento dos modelos decisórios 'de substituição' no sentido de sistemas de apoio concebidos de forma individualizada (FRA, 2013: 9). Em suma, este documento consagra um conjunto de critérios que prometem transformar o modo de relacionamento entre a pessoa com deficiência e a sociedade em geral.
14. Em sintonia com o estabelecido nesta Convenção surge a Estratégia para o Idoso, plasmada na Resolução do Conselho de Ministros n° 63/2015, publicada no Diário da República, 1.º série - N.º 165 - 25 de agosto de 2015, e que refere no número II (medidas), nº 3, alínea 1) que o tutelado deve ser previamente ouvido sobre a designação do tutor, salvo se a situação de incapacidade não o permitir, e deve ser acolhida a sua indicação da pessoa a designar como tutor, a menos que se revele contrária aos seus interesses. Esta Resolução foi invocada pela ora recorrente no seu requerimento de 07.04.2017.
15. 0 conteúdo desta Estratégia é acolhido pelo Projeto de Lei nº 61/XIII/1. (PSD e CDS-PP) - que propõe a 66º Alteração ao Código Civil, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 47 344, de 25 de novembro de 1966, modificando o regime das incapacidades e seu suprimento, e adequação de um conjunto de legislação avulsa a este novo regime.
16. No que mais importa ao presente recurso, este Projeto de Lei prevê o seguinte: Artigo 150° A quem incumbe a tutela: 1 - A tutela defere-se pela ordem seguinte: a) À pessoa singular ou à pessoa colectiva previamente indicadas pelo tutelando, em documento autêntico ou autenticado(sublinhado nosso); E o nº 7 prevê: A não ser que a sua incapacidade o não permita, o tutelado deve ser previamente ouvido sobre a designação do tutor, devendo ser acolhida a indicação da pessoa que designe, a menos que tal designação se revele contrária aos seus interesses.
17. Ou seja, reconhece-se o Direito de a pessoa a interditar, escolher previamente, e também no decurso do processo, se a sua capacidade o permitir, quem irá exercer a sua tutela, como aliás está previsto no artigo 7º da Lei 38/2004 e também na RCM nº 63/2015, alínea l), nº 3, II.
18. O Tribunal a quo foi alheio a toda esta mudança de paradigma no que diz respeito à promoção da autonomia e da dignidade das pessoas com capacidade diminuída.
19. Permanecer agarrado à visão paternalista e patrimonialista plasmada nos Artigos 138º e seguintes do Código Civil, ou não aproveitar as janelas de oportunidade, como as contidas no Art. 143º, nº 2 ou no Art. 1931º do Código Civil, é injusto, violador dos Direitos Fundamentais (nomeadamente os previstos nos Artigos 13º e 26º da Constituição da República Portuguesa), das Convenções Internacionais ratificadas pelo Estado Português.
20. É ignorar as potencialidades do Direito (composto por Princípios, Valores e também normas) bem como a riqueza de hermenêutica jurídica.
21. É ignorar que a sociedade mudou e que as respostas jurídicas têm que acompanhar essas mudanças.
22. Enquanto a tão aguardada alteração dos Artigos do Código Civil que regulam as formas de suprimento da vontade, o que tornaria não só mais justa mas também mais fácil a aplicação do Direito, não acontece, cabe à ordem jurídica assegurar mecanismos jurídicos para a reintegração da pessoa incapaz como pleno sujeito na ordem jurídica e à Jurisprudência fazer uso dos mecanismos jurídicos já disponíveis e que acima se elencaram.
23. No caso concreto, tal não aconteceu. A sentença ignora, em absoluto, a vontade anteriormente expressa pela interditanda e baseia-se unicamente na opinião de 3 dos seus filhos mais velhos, algumas delas não isentas e outras baseadas em falsas acusações, conforme demonstrado.
24. E a requerida manifestou previamente a sua vontade, de forma clara, livre e esclarecida, conforme resulta do Instrumento Público lavrado a 30.01.2012 pela Notária I… (Doc. 6 junto à P.I.) com a presença, a pedido da declarante MJ..., de dois peritos médicos (Dra. RS… e Dra. IM…), com o seguinte conteúdo:
25. Que expressa e solenemente declara, para os devidos efeitos, que tem perfeita autonomia para viver sozinha e independente, e, assim, não quer que ninguém se instale na sua residência, em Lisboa, tal como se, futuramente, vier a perder autonomia ou capacidade de decisão, desde já esclarece que é sua vontade que nenhum dos seus filhos se instale em sua casa, em Lisboa.
26. Que é ainda sua vontade que seja a sua filha MT...a decidir eventuais tratamentos médicos bem como a tratar, enquanto for viva, de todos os assuntos de interesse pessoal dela, declarante, incluindo a gestão das suas contas bancárias.
27. Igualmente foi junta aos autos procuração da mesma data lavrada pela mesma Notária e com a presença dos mesmos peritos médicos, através da qual se conferem poderes à mesma filha MT…. para movimentar as suas contas bancárias e tratar de diversos assuntos de gestão da vida corrente (Doc. 10 do requerimento da ora recorrente, de 10.02.2017).
28. Contudo, tais documentos, não impugnados por qualquer dos intervenientes nos presentes autos, foram absolutamente ignorados na douta decisão a quo, quando havia que apurar todos os factos e proceder a todas as diligências de investigação tendentes à obtenção de decisão que colocasse os interesses da interditanda acima de tudo o mais, incluindo as opiniões baseadas em factos falsos ou opiniões não isentas de alguns dos seus filhos, ademais contrárias à sua vontade expressa.
29. Elucidativo, a este propósito, é o Acórdão da Relação do Porto de 2014: Além de, no processo de instituição de tutela, que é de jurisdição voluntária, o juiz poder investigar livremente os factos e não estar sujeito, nas providências a tomar, a critérios estritamente legais, antes devendo adoptar a que julgar, em concreto, mais conveniente, oportuna e eficaz, na escolha e nomeação do tutor, protutor e vogais do conselho de família sobrepõe-se a qualquer outro critério o do interesse superior dos menores. http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/7 3b18394bfb1113d80257c6f00412082?OpenDocument
Além de que a decisão constante neste Acórdão baseou-se efetivamente na escolha dos menores sobre o seu tutor, após terem sido ouvidos em tribunal, o que não aconteceu no caso concreto, uma vez que o Tribunal ignorou, de todo, a vontade expressa da interditanda.
30. Significa isto que, tendo em conta o superior interesse da requerida, cabia ao Tribunal a quo realizar todas as diligências probatórias que entendesse necessárias à prossecução de tal fim, sendo que o único
direito ou interesse próprio que está em causa na acção de interdição respeita ao requerido, que é o beneficiário do pedido.
31. 0 que não aconteceu.
32. Desde logo, não podia ignorar a vontade antecipadamente expressa pela requerida.
33. Significa também que lhe cabia interpretar o Direito no seu todo, não se cingindo ao disposto no Art. 143º, nº 1 d) do C.C., do qual, aliás, fez errada interpretação e aplicação, ignorando o disposto no Art. 1931º para o qual remete o Art. 139º.
34. Para os autos foi ainda carreada a seguinte informação, esclarecedora quanto à maior proximidade da interdita à sua filha MT…:
35. Artigo 11ºda P.I.: A Requerida e a Requerente sempre foram muito próximas indo a Requerida a casa da Requerente vários dias da semana para tomar refeições conjuntas (incluindo netos e genro), passando juntas todos os domingos, épocas festivas como o Natal e Páscoa, e parte das férias de Verão.
36. Artigo 12º da P.I.: Esta relação de grande cumplicidade entre a Requerida e a Requerente sempre existiu e pode ser observada por todos os familiares, quer irmãos quer tios, primos, vizinhos e médicos que acompanham a Requerida.
37. Artigo 13º da P.I.: Foi a Requerente e mais nenhum outro filho quem tem acompanhado a Requerida nas diversas deslocações às consultas de neurologia e outras consultas médicas.
38. Estas afirmações não são colocadas em causa pelos restantes irmãos sendo de realçar a seguinte afirmação do filho mais velho no seu requerimento de 08.03.2017: e) considera que, independentemente de quem for nomeado tutor, a irmã MT… deve ser uma das cuidadoras da sua mãe, sem exigir contrapartidas, pois tem o dever de retribuir todos os benefícios recebidos desde sempre por nossa mãe, uma vez que foi quem mais beneficiou dos nossos pais em todos os aspectos.
39. Não se questionando que tem sido a filha mais nova que sempre esteve mais próxima da sua mãe, lhe assegurou assistência e lhe tem vindo a acompanhar e a respeitar as suas rotinas e hábitos de vida, haveria ainda que ter em conta que uma pessoa com 96 anos e em estado muito débil (incluindo psicológico) não poder mudar de hábitos sem muito graves riscos para a saúde.
40. Ver a sua filha T... afastada das decisões sobre a gestão do seu dia-a-dia e, principalmente, dos cuidados de que carece cada vez de forma mais efectiva, seria certamente uma mudança radical na vida da requerida, que lhe infligiria instabilidade e sofrimento, e lhe agravaria o débil estado de saúde, contrária à sua vontade e aos seus interesses.
41. Sendo este um motivo de peso para que a tutela tivesse sido atribuída à sua filha T..., o que não aconteceu.
42. Por outro lado, na P.I. a ora recorrente demonstrou que o filho mais velho, não deve exercer o cargo de tutor de sua mãe:
43. Artigo 20º: Senão quando o seu filho JJ... aos dias 12 de Fevereiro de 2015, levou a Requerida á Caixa geral de depósitos a persuadiu a efectuar transferência bancária da conta que aquela detém na referida instituição bancária com o nº 0035…, no valor de € 40.000,00 (quarenta mil euros) para uma conta que JJ... é o único titular com o n.º 0035…(...).
44. Ficou também demonstrado que JJ...tem pressionado a requerida a coabitar com o seu filho E..., contra a vontade desta;
45. E que tem procurado impedir que a sua mãe utilize o seu dinheiro no seu conforto e bem-estar, por considerar que o dinheiro desta deve ser aplicado na conservação de imóveis.
46. Pelo que, da análise dos requerimentos apresentados e dos documentos juntos nunca se poderia ter retirado a conclusão de que: Neste momento, cremos que não existem elementos que permitam afirmar que a requerente dá maiores garantias de bom desempenho do cargo e que levem ao afastamento do filho mais velho da requerida.
47. Dos autos consta não só a falta de idoneidade do filho mais velho para exercer o cargo de tutor, mas também as razões para considerar que a filha mais nova, MT…, ora recorrente, dá maiores garantias de bom desempenho do cargo: o que consta dos Artigos 11º a 12º da P.I., nomeadamente, e a vontade antecipadamente expressa pela requerida, conforme acima se demonstrou e que se sustenta em documentos autênticos juntos aos autos (declaração e procuração).
48. 0 Tribunal a quo fez assim uma errada interpretação dos factos trazidos aos autos, nomeadamente não atribuindo relevância ao alegado nos Artigos 9º e 20º-28º da P.I.;
49. Absteve-se de efectuar quaisquer diligências probatórias que permitissem confirmar ou contrariar os factos alegados pelos diversos intervenientes;
50. Deveria, nos termos do disposto no Art. 899º, nº I do C.P.C., considerar que não existiam elementos suficientes para decidir findo o exame da interditanda, não estando o juiz em condições de proferir imediatamente a sentença.
51. E, em conformidade, remeter os autos para os meios processuais comuns a fim de ser produzida prova..
52. Ignorou a vontade antecipadamente expressa pela interdita;
53. Fez errada interpretação das disposições contidas nos Arts. 143º, nº 1 d) e nº 2 e 1931º do Código Civil;
54. Absteve-se de interpretar o ordenamento jurídico no seu todo, nomeadamente a Convenção de Oviedo e a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.
55. Encontram-se assim reunidas as condições para que a decisão quo seja revogada e substituída por outra que nomeie a ora recorrente como tutora da sua mãe.
56. Ou, se assim se não se entender, deverá ser reconhecido que a sentença recorrida enferma da nulidade prevista na alínea d) do nº 1 do Art. 615º do C.P.C. porque devia ter apreciado e pronunciar-se sobre os diversos factos alegados pelos diversos intervenientes, factos graves que deveriam obstar à decisão de nomeação como tutor do filho mais velho e que não são sequer abordados na sentença, a decisão é nula.
57. 0 Tribunal deixa de se pronunciar sobre matéria cuja ponderação era indispensável à boa decisão da causa.
58. Assim, se entender o douto Tribunal da Relação que não tem elementos ou que não está em condições de revogar e substituir a decisão recorrida, deverá o Tribunal ad quem considerar nula a decisão e ordenar que seja analisada e produzida prova sobre os factos alegados, para, em conformidade com a mesma, decidir sobre a nomeação da pessoa mais adequada à defesa dos interesses da requerida.
Nestes termos, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a decisão recorrida, a qual deverá ser substituída por outra que nomeie a recorrente para o exercício das funções de tutora, ou declarar-se a sua nulidade, ordenando-se que os autos baixem à primeira instância a fim de ser apreciada a prova existente e produzida outra que se julgue necessária para decidir sobre a nomeação da pessoa mais adequada à defesa dos interesses da requerida.

O Ministério Público contra-alegou, formulando as seguintes conclusões:
1. (...);
2. (...);
3. (...)
4. (...) bem andou o Tribunal a quo em nomear como tutor o filho mais velho da interdita em obediência ao disposto no art.° 143 n.º 1 al d) do C.C. já que dos autos - onde é patente a existência de acentuado conflito entre a Apelante e os seus outros três irmãos, um dos quais nomeado tutor - até à data não resultam dos autos factos que permitam concluir que a Apelante dá maiores garantias para o desempenho daquele cargo não se justificando, por isso, a aplicação do nº 2 da mencionada norma legal.
5. Não se desconhece que o art.° 139.° do C.C. que rege sobre a capacidade do interdito e regime da interdição equipara o interdito ao menor ainda que tal equiparação deve fazer-se com as necessárias adaptações.
Mas não se pode ignorar a doutrina que ensina que o estatuto do interdito não tem regulamentação própria e, não obstante a existência da norma legal supra identificada, a menoridade, em razão, da idade apenas afecta a capacidade de exercício de direitos do menor que será suprida, em primeiro lugar pelos pais enquanto que a interdição atinge não apenas a capacidade de exercício do interdito mas também a sua capacidade de gozo.
6. Não faz assim qualquer sentido transpor, sem mais, para a interdição o regime constante os regimes constantes dos art.º 1928.º e do art.º 1931 n.º 2, ambos do C.C. pelas razões aduzidas em sede de contra-alegações e que, ora, se dão por reproduzidas para todos os efeitos legais.
7. Mas decisivamente releva que (...) o segmento da sentença que fixa a data do começo da incapacidade tem um valor meramente indiciário; é um mero princípio de prova, tem o valor, pois, de uma presunção judicial (...).
8. Tal significa que nada obsta a que noutra acção, por exemplo, se venha a impugnar, pelos meios legais, declaração negocial com fundamento na incapacidade acidental do declarante (cfr. art.º 257 do C.C.).
9. Ou seja, o instrumento público a que já se aludiu, subscrito pela interdita em momento em que face à data do início da incapacidade (de facto) fixada na sentença de interdição - início de Dezembro de 2014 - só por si não justifica, conforme pretende a Apelante, que não fosse aplicável o disposto no art.º 143 n.º 1 al d) do C.C.
10. Assim sendo, no segmento da sentença recorrida, o Tribunal a quo não violou as normas indicadas pela Apelante nem quaisquer outras.
11. Contrariamente ao invocado pela Apelante a sentença não padece de qualquer nulidade por omissão de pronúncia (...).
12. Por todo o exposto deve ser negado provimento ao recurso indeferindo-se a arguida nulidade da sentença e mantendo-se a sentença recorrida.
2 - ÂMBITO DO RECURSO:
Nos termos dos arts. 635°, n° 4 e 639°, n° 1, do CPC, é pelas conclusões da recorrente que se define o objeto e se delimita o âmbito do presente recurso, sem prejuízo das questões de que este tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objeto do recurso.
Assim, perante as conclusões da alegação da apelante, neste recurso importa decidir:
da nulidade da sentença recorrida;
se deve ser mantido como tutor da interditada, a pessoa nomeada na sentença recorrida, o seu filho mais velho, JJ..., ou, então, se deve antes ser nomeada para exercer tal cargo, a requerente, e aqui apelante, MT..., sua filha mais nova.
3 - FUNDAMENTAÇÃO:
3.1 - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO:
Da sentença recorrida resultam provados os seguintes factos:
1. A requerida nasceu em 2 de setembro de 1921;
2. A requerida apresenta ligeira surdez...
3. ...Veste-se a arranja-se sozinha, com supervisão...
4. ...0 contacto é superficial...
5. ...Mostra-se desorientada no tempo e parcialmente orientada no espaço...
6. ...A atenção é dispersa...
7. ...A memória a curto e a longo prazo encontram-se prejudicadas...
8. ...A linguagem é articulada mas simples...
9. ...0 discurso é pobre e baseado em temas do dia-a-dia...
10. ... Reações emocionais impulsivas...
11. ...Pensamento lento...
12. ...Sem juízo crítico...
13. ...A deterioração definitiva incapacitante e irreversível da requerida terá ocorrido se setembro a início de dezembro de 2014 provocada por agravamento da patologia gastroenterológica.

3.2 - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO:
3.2.1 - Da nulidade da sentença:
Considera a apelante que se encontram «reunidas as condições para que a decisão quo seja revogada e substituída por outra que nomeie a ora recorrente como tutora da sua mãe.
Ou, se assim se não se entender, deverá ser reconhecido que a sentença recorrida enferma da nulidade prevista na alínea d) do n° 1 do Art. 615° do C.P.C. porque devia ter apreciado e pronunciar-se sobre os diversos factos alegados pelos diversos intervenientes, factos graves que deveriam obstar à decisão de nomeação como tutor do filho mais velho e que não são sequer abordados na sentença, a decisão é nula.
O Tribunal deixa de se pronunciar sobre matéria cuja ponderação era indispensável à boa decisão da causa.
Assim, se entender o (...) Tribunal da Relação que não tem elementos ou que não está em condições de revogar e substituir a decisão recorrida, deverá o Tribunal ad quem considerar nula a decisão e ordenar que seja analisada e produzida prova sobre os factos alegados, para, em conformidade com a mesma, decidir sobre a nomeação da pessoa mais adequada à defesa dos interesses da requerida».
Parece, assim, que para a apelante a nulidade da sentença é uma questão a decidir em alternativa; ou seja, se este tribunal de recurso entender que não estão reunidas as condições para revogar a sentença recorrida na parte respeitante à nomeação do tutor da interditada, então, deve declará-la nula, uma vez que o tribunal a quo não se pronunciou sobre matéria de facto, sobre «factos graves», cuja ponderação era indispensável à boa decisão a causa.
Invocando-se a nulidade de uma sentença com fundamento em algum dos vícios taxativamente elencados nas diversas alíneas do n° 1 do art. 615° do CPC, é essa a primeira questão a resolver pelo tribunal de recurso.
No caso concreto, a sentença recorrida não padece da nulidade que a apelante lhe imputada, sendo, aliás, evidente o equívoco em que a mesma labora a respeito de tal questão.
Dispõe o art. 615°, n° 1, al. d), do CPC, que «é nula a sentença quando (...)
o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento».
À omissão de pronúncia reporta-se a primeira parte da norma.
A omissão de pronúncia, enquanto causa de nulidade de uma decisão judicial, traduz-se no incumprimento, por parte do julgador, do poder/dever consagrado no art. 608°, n° 2, do CPC, segundo o qual, «o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras».
A omissão de pronúncia pressupõe que o juiz deixa de apreciar alguma questão que lhe foi colocada pelas partes; ou seja, existe omissão de pronúncia, sempre que a causa do julgado não se identifique com a causa de pedir ou o julgado não coincida com o pedido.
Assim, é nula, por vício de petitionem brevis, a decisão em que o julgador invoca, como razão de decidir, um título, uma causa ou facto jurídico, essencialmente diverso daquele que a parte colocou na base (causa de pedir) das suas conclusões (pedido).
Contudo, uma coisa é a causa de pedir e outra são os motivos ou as razões de que a parte se serve para fundamentar essa mesma causa petendi, sendo certo que, na prática, nem sempre é fácil distinguir uma coisa da outra.
Quer a jurisprudência, quer a doutrina, vêm unanimemente distinguindo, por um lado, questões e, por outro, razões ou argumentos, para concluírem no sentido de que só a falta de apreciação das primeiras, quer dizer, das questões, integra a nulidade prevista na 1ª parte da al. d) do n° 1 do art. 615° do CPC, mas já não a simples falta de discussão das razões ou argumentos invocados para concluir sobre as questões.
Perante isto, não se vislumbra que o juiz a quo tenha deixado de se pronunciar sobre qualquer questão que devesse apreciar, pois:
decretou a interdição da requerida, conforme era pretensão da apelante no requerimento com que introduziu em juízo a presente ação;
fixou o início da incapacidade da requerida, ainda que não indicando uma data concreta;
nomeou tutor da interditada;
nomeou os vogais do conselho de família, especificando, inclusivamente, os casos em que estes poderiam vir a exercer funções de tutor e protutor, ou seja, nos casos de colisão de interesses entre o tutor nomeado e a requerida.
Esclareceu, de forma clara, em sede de fundamentação de direito, a razão pela qual nomeou tutor da requerida, o seu filho mais velho, JJ....
Carece, pois, de todo e qualquer fundamento, a imputação à sentença recorrida, da nulidade da que alude a 1a parte da ai. d) do n° 1 do art. 615° do CPC.
O que sucede é tão-só que a apelante discorda da decisão do tribunal a quo, na parte em que nomeou tutor da requerida, aquele seu filho mais velho, por entender que deveria ter sido ela própria, a nomeada para o exercício de tal cargo.
Vejamos, então, se ocorreu erro de julgamento do tribunal a quo ao nomear tutor da interditada, o seu filho mais velho, JJ..., por tal nomeação dever recair sobre a própria apelante.

3.2.2 - Do tutor da interditada:
ituído um regime de incapacidade análogo ao da menoridade, constituindo a tutela o meio de suprimento da incapacidade do interdito.
Dispõe o art. 139° do Código Civil que «sem prejuízo do disposto nos artigos seguintes, o interdito é equiparado ao menor, sendo-lhe aplicáveis, com as necessárias adaptações, as disposições que regulam a incapacidade por menoridade e fixam os meios de suprir o poder paternal».
Decorre desta solução normativa que os órgãos da tutela são, além do tutor, o conselho de família e o protutor.
A ordem de preferência para a nomeação do tutor encontra-se expressamente definida no art. 143°:
1. A tutela é deferida pela ordem seguinte:
a) Ao cônjuge do interdito, salvo se estiver separado judicialmente de pessoas e bens ou separado de facto por culpa sua, ou se for por outra causa legalmente incapaz;
b) À pessoa designada pelos pais ou pelo progenitor que exercer o poder paternal, em testamento ou documento autêntico ou autenticado;
c) A qualquer dos progenitores do interdito que, de acordo com o interesse deste, o tribunal designar;
d) Aos filhos maiores, preferindo o mais velho, salvo se o tribunal, ouvido o conselho de família, entender que algum dos outros dá maiores garantias de bom desempenho do cargo.
2. Quando não seja possível ou razões ponderosas desaconselham o deferimento da tutela nos termos do número anterior, cabe ao tribunal designar tutor, ouvido o conselho de família.
No caso concreto, a preferência legalmente estabelecida aponta no sentido da nomeação, como tutor da interditada, o seu filho mais velho, JJ....
Foi exatamente o que fez o tribunal a quo!
A transcrita al. d) do n° 1 do art. 143° só permite a preterição do filho mais velho, verificadas que se mostrem duas circunstâncias:
a) No caso de o tribunal assim o entender, uma vez ouvido o Conselho de Família;
b) Se dessa circunstância resultar que algum dos outros filhos dá maiores garantias de bom desempenho do cargo.
O tribunal a quo entendeu não existirem nos autos elementos que permitam afirmar que a requerente, filha mais nova da interditada, dá mais garantias de bom desempenho do cargo do que o seu irmão mais velho, importando recordar que a requerida tem quatro filhos, sendo que:
- Três deles são de opinião de que deve ser nomeado tutor, o filho mais velho;
- Só a requerente considera dever ser ela própria a nomeada.
Sendo certo que no domínio em que ora nos encontramos é imperioso colocar, sempre, em primeiro lugar o interesse da própria interditada a uma eficaz proteção do seu património e ao restabelecimento, na medida do possível, do equilíbrio da sua situação pessoal, o afastamento do critério da preferência estabelecido na al. d) do n° 1 do art. 143°, para a nomeação do tutor, apenas pode ocorrer perante um demonstrado concreto conjunto de situações graves e relevantes que a isso aconselhem.
Só ponderosas razões, do ponto de vista fático e jurídico poderão levar ao afastamento daquela ordem de preferência.
Não serão, obviamente, quaisquer circunstâncias adicionais ou meras garantias dadas por outros filhos que não o mais velho, que darão lugar à preterição da ordem preferencial legalmente estabelecida.
A lei exige, para a preterição da regra da preferência do filho mais velho, que as garantias dadas por outro filho mais novo sejam efetivamente maiores.
Trata-se de uma exigência que está em sintonia com o também citado n° 2 do art. 143°.
Esta é uma ação especial cujo objetivo primordial consiste na declaração de interdição da pessoa identificada no requerimento inicial, ou seja, a requerida MJ..., com a consequente e imprescindível nomeação de tutor.
Ora, esse objetivo foi, inequivocamente, alcançado.
Consequentemente, qualquer alteração do tutor nomeado, ou seja, o afastamento da ordem de preferência estabelecida na al. d) do n° 1 do art. 143° implica forçosamente a alegação e prova de factos que ponham em causa e descredibilizem a nomeação do filho mais velho da requerida, fundada em argumentos jurídicos e suportada em factos que permitam atingir um tal resultado.
É que, substituir ou remover o tutor pressupõe que esteja demonstrado nos autos:
ou a sua incapacidade para o cargo, por falta de cumprimento adequado dos deveres próprios do cargo;
ou a revelação da sua inaptidão para o cargo;
ou, ainda, a ocorrência de factos supervenientes à investidura do cargo que o coloquem em situação de impedimento da sua nomeação (cfr. art. 1948°, ex vido art. 1960°).
E deve ter lugar em sede própria, em ação em que se discutam tais questões e na qual o tutor nomeado possa exercer o seu direito ao contraditório, rebatendo os argumentos que visam a sua substituição ou remoção e apresentando os meios de prova correspondentes à sua defesa.
No momento processual em que, nestes autos, foi nomeado tutor o filho mais velho da requerida, não estava ainda sequer nomeado o conselho de família que, assim, não poderia, obviamente ser ouvido.
Bem andou, por isso, o juiz a quo, em nomear tutor da interditada o seu filho mais velho.
Sempre se dirá, no entanto, que devendo a vontade do interditando, salvo se razões ponderosas o desaconselharem nas circunstâncias de cada caso concreto, ser elemento relevante a ponderar pelo tribunal na designação do tutor, a verdade é que, no caso concreto, não configura uma expressa manifestação de vontade da requerida no sentido de que a sua filha mais nova, a aqui apelante, seja nomeada sua tutora, o teor do instrumento por aquela outorgado em 30 de janeiro de 2012, e que constitui o documento de fls. 29-30, onde declara, «para os devidos efeitos, que tem perfeita autonomia para viver sozinha e independente, e, assim, não quer que instale na sua residência, em Lisboa, tal como se, futuramente, vier a perder autonomia ou capacidade de decisão, desde já esclarece que é sua vontade que nenhum dos seus filhos se instale em sua casa, em Lisboa.
Que é ainda sua vontade que seja a filha MT...a decidir eventuais tratamentos médicos bem como a tratar, enquanto for viva, de todos os assuntos de interesse pessoal dela, declarante, incluindo a gestão das suas contas bancárias».
Numa matéria tão sensível e delicada como esta, uma tal declaração, só por si, não seria suficiente para afastar a regra da preferência estabelecida na
al. d) do n° 1 do art. 143°, e, consequentemente, afastar o filho mais velho do exercício da tutela.
Assim como não o é só por si, a circunstância de no dia 12 de fevereiro de 2015 ter ocorrido a transferência de € 40.000,00, de uma conta bancária da requerida para uma conta bancária do seu filho mais velho, JJ..., posteriormente nomeado seu tutor na sentença recorrida.
É que, desde logo, em lado algum está demonstrado o exato contexto em que ocorreu tal transferência, ou seja, nomeadamente, qual o objetivo com que a mesma foi efetuada, e qual o destino que foi dado ao dinheiro.
Tudo isto, sendo certo, reitera-se, que três dos quatro filhos da interditada são de opinião que a tutela da sua mãe deve ser exercida pelo filho mais velho, aquele que efetivamente veio a ser nomeado na sentença recorrida, JJ....
Tudo isto, ainda, sendo igualmente certo, e reiterando o que acima se disse, que a apelante não deixa de ter ao seu dispor, mas em sede própria, os mecanismos processuais que a lei lhe faculta com vista à remoção/substituição do cargo de tutor, demonstrados que sejam, claro está, os pressupostos que a lei substantiva define para o efeito.
A sentença recorrida não merece, pois, censura, devendo ser confirmada.
4 - DECISÃO:
Por todo o exposto, acordam os juízes desta 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa, em julgar a apelação improcedente e, em consequência, confirmar a sentença recorrida.
Custas pela apelante.
Lisboa, 30 de janeiro de 2018
José Capacete
Carlos Oliveira
Maria Amélia Ribeiro