A mudança de domicílio de um dos progenitores, bem como a mudança dos menores para estabelecimento de ensino na área desse novo domicílio (que dista cerca de 17 a 18 quilómetros do domicílio do outro progenitor e que não demora mais de 21 minutos a ser percorrida de carro) não corresponde a uma circunstância superveniente que justifique a necessidade de alteração do regime de residência alternada anteriormente fixado.
Proc. 7536/13.1TCLRS-C.L1 2ª Secção
Desembargadores: António Moreira - Lúcia de Sousa - -
Sumário elaborado por Susana Leandro
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Processo n° 7536/13.1TCLRS-C.L1 - Recurso de Apelação
Recorrente: H...
Recorrido: P...
Sumário:
A mudança de domicílio de um dos progenitores, bem como a mudança dos menores para estabelecimento de ensino na área desse novo domicílio (que dista cerca de 17 a 18 quilómetros do domicílio do outro progenitor e que não demora mais de 21 minutos a ser percorrida de carro) não corresponde a uma circunstância superveniente que justifique a necessidade de alteração do regime de residência alternada anteriormente fixado.
(Sumário elaborado ao abrigo do disposto no art.° 663°, n° 7, do Novo Código de Processo Civil)
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo assinados:
Em 13/4/2016 H... intentou contra P... acção para alteração do regime de exercício das responsabilidades parentais relativas aos menores R... Farela e A... Farela, pedindo que o regime de residência alternada fixado pela sentença homologatória de 1/10/2015 passe a regime de residência dos menores em casa do requerente, e alegando que a requerida mudou a sua residência para Algés, que dista cerca de trinta quilómetros da morada do requerente, o que impede que o regime em vigor funcione, já que dificulta a frequência de estabelecimento de ensino perto da residência de um dos progenitores, sendo que os menores não podem continuar em constantes deslocações da casa de um dos progenitores e da casa de outro, e sendo a terceira vez que a requerida muda de residência, no espaço de três anos.
Citada a requerida, veio opor-se à pretensão do requerente, invocando, em síntese, que o bem-estar dos menores não foi colocado em causa pela mudança da sua residência para Algés, estando em causa apenas um aumento de distância entre as residências dos progenitores de seis quilómetros, e concluindo que a pretensão do requerente assenta em motivações e interesses pessoais, e não para prover ao bem-estar dos menores.
Tendo sido relegada para momento ulterior a apreciação da pretensão do requerente, nos termos do disposto no art.° 42°, n° 1 e 4, do Regime Geral do Processo Tutelar Cível, para se tentar primeiro uma solução consensual, quer em sede de conferência de pais, quer em sede de mediação, e tendo-se em ambas frustrado tal solução, foi então proferida decisão nos termos do disposto no art.° 42°, n° 4, do Regime Geral do Processo Tutelar Cível, considerando desnecessária a alteração pedida pelo requerente e, em consequência, indeferindo a sua pretensão.
O requerente recorre desta decisão final, terminando a sua alegação com as seguintes conclusões, que aqui se reproduzem:
1. O pai e ora Recorrente, H..., não deu consentimento perante a ora Recorrida e mãe dos menores, de nome, P..., para que esta última alterasse e decidisse unilateralmente mudar de Colégio a ambos os menores a saber;
a. - a menor A..., ficou matriculada no Centro Hellen Keller, no
Restelo, onde ter-se-ia que pagar mensalmente a quantia de € 400,00;
b. - o menor R..., ficou matriculado numa Escola em Algés, perto
da nova residência da mãe e ora Recorrida.
2. Na realidade é a quarta vez que a ora Recorrida e mãe dos menores, P..., MUDA DE MORADA FISCAL/ADMINISTRATIVA, (não só por causa dos vários namorados que arranja, o que aqui não nos interessa), mas soube recentemente o ora Recorrente que actualmente reside a Recorrida na Rua do V… - Sintra, segundo o google maps são cerca de 40 km de distância da residência do ora Recorrente e pai dos menores, em Sacavém.
3. E foi este o facto concreto que o Tribunal a quo não considerou, nem teve em conta no superior interesse dos menores, ora em conflito com os interesses egoístas da ora Recorrida e mãe dos menores, a saber:
4. Devido não só à distância geográfica bem como e principalmente devido às horas de ponta na cidade de Lisboa, (em que o Tribunal de 1ª instância não refere na Douta Sentença), (o que põe em causa o superior interesse dos menores), e causa constrangimentos ao ora Recorrente ao nível do seu emprego, por pôr em causa a sua fonte de sustento e dos menores, uma vez que, pelo menos duas vezes ao dia, (sempre em horas de ponta), teria que ir levar e buscar os menores ao Colégio Hellen Keller e à Escola em Algés; nas horas em que o tráfego rodoviário se faz sentir de forma anómala, numa cidade cosmopolita de intensa actividade rodoviária.
5. POR ISSO: - o ora Recorrente, H..., pensando estar a fazer o que seria correcto e o que foi acordado entre ambos os ora progenitores, de semana de residência alternada, continuou com as matrículas dos menores, como seria normal e esperado, e matriculou-os no sítio onde mora, em Sacavém, a saber:
a. - a menor A..., no jardim de infância Nascer do Sol, em
Sacavém, pese embora o facto de, na semana alternada da mãe, a menor
frequentaria o Centro Escolar Hellen Keller, no Restelo;
b. - o menor R..., (como já frequenta o ensino obrigatório), (aqui com detalhes mais gravosos para o superior interesse dos menores), não pôde o ora Recorrente ter alternativa, pelo facto de a mãe e ora Recorrida ser Encarregada de Educação dos menores, no ano lectivo de 2016/2017, ficando assim tolhido na sua decisão, e desrespeitado, por só ter tido conhecimento da decisão da mãe dos menores após a matrícula destes na Escola de Algés e no Colégio Hellen Keller, no Restelo, (sem o consentimento e assentimento do ora Recorrente),
6. Apesar de tudo, o ora Recorrente, H..., esforçou-se por tentar conciliar-se com a ora Recorrida e mãe dos menores, P..., tendo arranjado (mana de ir levar e buscar o menor à Escola de ,.llzés. onde a mãe .sem o consentilnenio do pai o colocou.
7. O recorrente H..., para não pôr em risco a sua actividade profissional e consequentemente, a fonte de sustento dos menores e seu superior interesse, tem uma companheira de nome: Erika de Bruijne, (que por acaso, trabalha a cerca de 2 Kms de distância da Escola de Algés do menor R...), uma vez que o pai dos menores e ora Recorrente tem dificuldades nas deslocações, nas horas de ponta, em ir levar e buscar o menor, e só com esta ajuda seria possível.
8. A ora recorrida, P..., que foi Encarregada de Educação dos menores, no ano lectivo de 2016/2017, logo arranjou um modo de na Escola de Algés, que
o menor frequenta, proibir através de documentos escritos. deixando directrizes no sentido de:
a. - nas semanas de residência alternada do pai. proibia de levarem o Rafael, antes que este terminasse as actividades extracurriculares. por volta das 19 horas;
b. - Mais proibiu a actual companheira do Recorrente, Erika, de recolher o menor na Escola de Algés, (o que seria mais adequado uma vez que esta trabalha a cerca de 2 Kms de distância desta Escola).
9. O ano lectivo iniciou-se no dia 16.09.2016; a alteração do exercício das responsabilidades parentais foi intentada antes do início do ano lectivo de 2016/2017; a Conferência de Pais foi marcada para o dia 21.09.2016, pelas 10H15 minutos, onde a ora Recorrida, P..., apesar de ter sido regularmente citada, só compareceu por volta das 12H00, graças ao Ex.mo Magistrado Judicial e ao seu bom desempenho, que se interessou pela situação, e solicitou ao funcionário judicial para chamar telefonicamente a Sra. P..., que, entretanto, demonstrou interesse, mas pouco, porque:
10. Proposta a MEDIAÇÃO FAMILIAR, aceitou numa primeira fase e depois DESISTIU.
11. De qualquer modo: a relação entre os pais dos menores, no pós divórcio sempre foi de constantes conflitos.
12. Regra geral, as responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida dos filhos menores, são exercidas em conjunto por ambos os progenitores, (cfr. art.° 1906°, n° 1, la parte do Código Civil, (doravante designado pela sigla CC).
13. Consideram-se questões de particular importância para a vida dos filhos menores, entre outras:
a. - a matrícula em colégio privado ou mudança de colégio privado:
b. - mudança de residência dos menores para local distinto da do progenitor a quem /Orais confiados. (ct ..ac. Rel. Lisboa - proc. n.o 626/Q9. 7TMCRB.C1 que correu termos no Tribunal Família Menores de Coimbra).
14. Pugna-se, pois, pela nulidade da sentença judicial recorrida, nos termos e para os efeitos do art.° 615°, alíneas b), c) e d) do n° 1 do Código de Processo Civil.
15. O Sr. Dr. Juiz a quo não se pronunciou sobre questões para a boa Decisão com vista aos interesses dos menores, designadamente: - questões de particular importância para a vida dos filhos menores, entre outras:
a. - a matrícula erro colégio privado ou mudança de colégio privado;
b. - mudança de residência dos menores para local distinto da do progenitor a quere froranr confiados.
16. À excepção da prova documental carreada para os autos, não foi efectuado julgamento, e apenas foram ouvidas as partes em Conferência de Pais, pelo que não houve conjugação de provas documentais com provas testemunhais, pelo que
há claramente parcialidade no que tange à falta de prova produzida. reveladora de insuficiência e deficiência face à Ido irregular e nula sentença.
17. A douta sentença recorrida não atende aos interesses dos menores, nomeadamente no aproximar destes ao progenitor não guardião, conforme é jurisprudência corrente, violando desta forma o art.° 1906° do Código Civil e 180° da O.T.M. revogado.
18. Os menores, a manter-se o decidido, cada vez mais verão o aqui recorrente como pai ausente.
19. Deverá assim a sentença recorrida ser declarada nula, suprindo-se as nulidades
arguidas e ser a mesma substituída.
20. Temos como certo que: - apenas um vínculo seguro responde a um desenvolvimento de acordo com o superior interesse da criança, permitindo à criança a segurança necessária ao seu progressivo processo de autonomização, sendo todos os padrões inseguros prejudiciais, decorrentes de abandonos, cuidar negligente, conflitos parentais. etc..., (Ainsworth: Main & Cassidy).
21. Ora, no caso em apreço, existe um padrão de constantes conflitos parentais que não corresponde a tmz vínculo seguro que responda a unr desenvolvimento de acordo com o superior interesse da criança, permitindo à criança a segurança necessária ao .seu progressivo processo de autonomização.
22. (...) Assim, é de notar que a guarda conjunta ou mesmo alternada supõem que os desentendimentos entre os progenitores sejam eliminados ou minimizados, colocando os interesses da criança acima dos mesmos; pressupõe uma convivência estreita entre ambos mas progenitores e a possibilidade de tornada de decisões em comum. (Ac. Rel. Coimbra- proc. 530/07.3TBCVL-A.C1).
23. Aquando da guarda alternada é necessário que a mesma não se traduza em sucessivas metodologias educacionais, antes permaneça incólume o rumo de orientação traçado quanto ao projecto educativo. Se não estão garantidas estas (exigentes) condições, a criança será a maior parte das vezes o alvo indirecto do ressentimento dos pais e não raro vítima dos seus objectivos desviadanwnte egoístas. (Ac. Rel. Coimbra- proc. 530/07.3TBCVL-A.Cl).
24. É com base nestas considerações que deverá ser reapreciada a Douta sentença recorrida essencialmente no que toca aos pontos de discordância e objeções que o recorrente formulou face ao dito aresto.
A requerida apresentou contra-alegação, aí pugnando pela ausência de qualquer nulidade da decisão recorrida, bem como pela manutenção da mesma.
O Ministério Público apresentou igualmente contra-alegação, aí pugnando pela manutenção da decisão recorrida, por inexistência de qualquer alteração superveniente das circunstâncias que justificasse a alteração do regime de responsabilidades parentais, nos termos pretendidos pelo requerente.
O tribunal recorrido pronunciou-se sobre a nulidade arguida, nos termos do disposto no art.° 617°, n° 1, do Novo Código de Processo Civil, concluindo que inexiste a invocada falta de fundamentação, bem como qualquer omissão de pronúncia.
Sendo o objecto do recurso balizado pelas conclusões do apelante, nos termos preceituados pelos art.° 635°, n° 4, e 639°, n° 1, ambos do Novo Código de Processo Civil, as questões submetidas a recurso prendem-se com:
. A alteração da matéria de facto;
. A nulidade da decisão recorrida, por falta de fundamentação e omissão de pronúncia;
. A necessidade de alteração do regime de residência alternada.
Da economia da decisão recorrida decorre que foi aí considerada como provada a seguinte matéria de facto:
A) Em 1/10/2015 foi proferida sentença que homologou o acordo relativo à residência e ao exercício das responsabilidades parentais relativas aos menores R... Farela e A... Farela, filhos do requerente e da requerida, compreendendo os seguintes pontos (para além de outros que aqui não relevam):
. Os menores permanecerão à guarda de cada um dos progenitores em semanas alternadas;
. Durante o período escolar, a semana de cada progenitor começa à segunda-feira na hora de recolha dos menores na escola e termina à segunda-feira à hora de entrega dos menores na escola;
. No período de férias, a semana começa e acaba à segunda-feira de manhã com a entrega dos menores na residência do outro progenitor;
. As responsabilidades parentais quanto às questões de particular importância para a vida dos menores serão exercidas em conjunto por ambos os progenitores, entendendo-se por questões de particular importância: escolha da escola no ensino público/privado, actividades extracurriculares, opções religiosas, questões de saúde que possam colocar em risco a integridade física dos menores, alterações de residência e saídas para o estrangeiro;
• O exercício das responsabilidades parentais relativamente aos actos da vida corrente dos menores competirá ao progenitor com quem os menores se encontrarem;
• As partes estão de acordo em submeter a um regime de alternância o cargo de Encarregado de Educação dos menores. Assim sendo, no ano de 2015/2016 será o progenitor pai o Encarregado de Educação, cabendo semelhante direito à progenitora mãe no ano lectivo 2016/2017 e assim sucessivamente;
• As partes comprometem-se a dialogar, sempre que se revele necessário, sobre a escolha da escola que os menores deverão frequentar, sobre as actividades extracurriculares que devem frequentar.
B) Entre 1/10/2015 e 13/4/2016 a requerida decidiu alterar o seu domicílio, da Bobadela para Algés, continuando o requerente a manter o seu domicílio em Sacavém.
C) No ano lectivo 2016/2017 os menores passaram a frequentar estabelecimento de ensino próximo do domicílio da requerida, onde esta os matriculou.
D) Tal estabelecimento de ensino dista cerca de 17 a 18 quilómetros do domicílio do requerente, não demorando tal distância a ser percorrida, de carro, mais de 21 minutos.
Da alteração da matéria de facto
Decorre da conjugação dos art.° 635°, n° 4, 639°, n° 1 e 640°, n° 1 e 2, todos do Novo Código de Processo Civil, que quem impugna a decisão da matéria de facto deve, nas conclusões do recurso, especificar quais os pontos concretos da decisão em causa que estão errados e, ao menos no corpo das alegações, deve, sob pena de rejeição, identificar com precisão quais os elementos de prova que fundamentam essa pretensão, e qual a concreta decisão que deve ser tomada quanto aos pontos de facto em questão.
A respeito do disposto no referido n° 1 do art.° 640° do Novo Código de Processo Civil, refere Abrantes Geraldes (in Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 2013, pág. 126 a 129):
a) Em quaisquer circunstâncias, o recorrente deve indicar sempre os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões;
b) Quando a impugnação se fundar em meios de prova constantes do processo ou que nele tenham sido registados, o recorrente deve especificar aqueles que, em seu entender, determinam uma decisão diversa quanto a cada um dos factos;
c) ( ..)
d) O recorrente deixará expressa a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, como corolário da motivação apresentada, tendo em conta a apreciação crítica dos meios de prova produzidos, exigência nova que vem na linha do reforço do ónus de alegação, por forma a obviar à interposição de recursos de pendor genérico ou incongruente, também sob pena de rejeição total ou parcial da impugnação da decisão da matéria de facto.
E, mais adiante, afirma a rejeição, total ou parcial, do recurso respeitante à impugnação da decisão da matéria de facto , designadamente quando se verifique a falta de especificação, nas conclusões, dos concretos pontos de facto que o recorrente considera incorrectamente julgados, bem como quando se verifique a `falta de posição expressa sobre o resultado pretendido relativamente a cada segmento da impugnação, concluindo que a observância dos requisitos acima elencados visa impedir que a impugnação da decisão da matéria de facto se transforme numa mera manifestação de inconsequente inconformismo.
Por outro lado, e impondo-se a especificação dos pontos concretos da decisão que estão erradamente julgados, bem como da concreta decisão que deve ser tomada quanto aos factos em questão, há-de a mesma reportar-se ao conjunto de factos que assumem relevo para o conhecimento da pretensão manifestada pelo impugnante. Ou seja, aqueles factos que se poderão considerar como integrantes da causa de pedir, quer tenham resultado da alegação das partes, quer resultem da instrução da causa (segundo o art.° 21° do Regime Geral do Processo Tutelar Cível).
Assim, e quanto aos factos que apenas foram introduzidos na causa em sede de recurso, está excluída a possibilidade dessa alegação inovatória apenas nesta instância, tendo presente que o sistema português de recursos é o de reponderação e não o de reexame, (por toda a doutrina vd. Armindo Ribeiro Mendes, Recursos em Processo Civil, Reforma de 2007, Coimbra Editora, 2009, pág. 81).
Pelo que, revertendo tudo o acima exposto ao caso concreto da alegação de recurso do requerente, logo se constata não haver que considerar os factos alegados apenas em sede de recurso pelo mesmo, e que não constam da decisão recorrida nem foram objecto de alegação pelas partes, prévia a essa decisão.
Do mesmo modo que não há que efectuar qualquer alteração à matéria de facto considerada pelo tribunal recorrido para proferir a decisão ora sob recurso, na medida em que o requerente não cuidou de cumprir o referido ónus de especificação a que aludem as al. a) e c) do n° 1 do art.° 640° do Novo Código de Processo Civil, designadamente indicando nas conclusões os concretos pontos da matéria de facto que o tribunal recorrido não considerou como provados, apesar de constarem da alegação das partes ou da instrução da causa, e ainda que por mera remissão para as peças processuais correspondentes.
Assim, improcedem nesta parte as conclusões do requerente sobre a consideração de matéria de facto distinta daquela acima elencada.
Das nulidades da decisão recorrida
Segundo as al. b) e d) do n° 1 do art.° 615° do Novo Código de Processo Civil, uma decisão judicial é nula quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, ou quando deixe de conhecer questão que devia ser apreciada.
Todavia, a decisão judicial com fundamentação escassa ou deficiente não é nula.
É que, segundo Miguel Teixeira de Sousa (Estudos sobre o Processo Civil, pág. 221), esta causa de nulidade verifica-se quando o tribunal julga procedente ou improcedente um pedido (e, por isso, não comete, nesse âmbito, qualquer omissão de pronúncia), mas não especifica quais os fundamentos de facto ou de direito que foram relevantes para essa decisão. Nesta hipótese, o tribunal viola o dever de motivação ou fundamentação das decisões judiciais (art° 208° n° 1 do CRP; art° 158° n° 1). E mais refere que o dever de fundamentação restringe-se às decisões proferidas sobre um pedido controvertido ou sobre uma dúvida suscitada no processo (...) e apenas a ausência de qualquer fundamentação conduz à nulidade da decisão (...); a fundamentação insuficiente ou deficiente não constitui causa de nulidade da decisão, embora justifique a sua impugnação mediante recurso, se este for admissível.
Sobre a questão da nulidade da decisão judicial por omissão de pronúncia, refere Lebre de Freitas (in Código de Processo Civil Anotado, volume II): Devendo o juiz conhecer de todas as questões que lhe estão submetidas, isto é, de todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e excepções invocadas e todas as excepções de que oficiosamente lhe caiba conhecer (art 660°/2), o não conhecimento do pedido, causa de pedir ou excepção cujo conhecimento não esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outra questão constitui nulidade (...).
E no acórdão deste Tribunal da Relação de Lisboa de 6/11/2012 (relatado por Ana Resende e disponível em www.dgsi.pt), referiu-se que as questões que o juiz deve conhecer se reportam às pretensões formuladas, não estando obrigado a apreciar todos os argumentos ou fundamentos que as partes indiquem para fazer valer o seu ponto de vista, sendo certo que, quanto ao enquadramento legal, não está o mesmo sujeito às razões jurídicas invocadas pelas partes, pois o julgador é livre na interpretação e aplicação do direito (...), mais se referindo, em nota de rodapé, que o conhecimento duma questão pode ser feito com uma tomada de posição direta sobre a mesma, mas também muitas vezes resulta da apreciação de outras com ela conexionadas, por a incluírem ou excluírem, sendo assim decidida de forma implícita, advindo da apreciação global da pretensão formulada em juízo, o respetivo afastamento.
Revertendo tais considerações ao caso concreto dos autos, constata-se que o requerente peticionou a alteração do regime da residência alternada dos menores, pretendendo que os mesmos passem a residir apenas com o mesmo, e invocando que a mudança do domicílio da requerida, bem como a escolha feita pela mesma dos estabelecimentos de ensino para o ano lectivo 2016/2017 impede que o regime de exercício das responsabilidades parentais dos menores funcione como ficou estipulado.
Do art.° 42°, n° 4, do Regime Geral do Processo Tutelar Cível decorre a possibilidade do tribunal indeferir a pretensão de alteração do regime de exercício das responsabilidades parentais quando considerar desnecessária a alteração pretendida por um dos progenitores.
Resulta da decisão recorrida que o tribunal recorrido ponderou o alcance dessa mudança de domicílio, bem como a escolha em questão do estabelecimento de ensino a frequentar pelos menores, afirmando que essas circunstâncias não eram impeditivas do funcionamento do regime acordado pelos progenitores e assim fixado por sentença, quanto à residência dos menores.
E, nessa conformidade, concluiu que inexiste qualquer alteração superveniente das circunstâncias que fundaram a referida escolha consensual desse regime da residência alternada, decidindo pela desnecessidade de alteração do mesmo, e assim indeferindo a pretensão do requerente.
Ou seja, está fundamentada, de facto e de direito, a decisão recorrida, que manteve o regime do exercício das responsabilidades parentais relativas aos menores nos termos em que a mesma foi fixada em 1/10/2015, tendo sido conhecida a pretensão do requerente, nos termos em que a mesma foi colocada.
Em consequência, improcede a arguição de nulidades em questão.
Da necessidade de alteração do regime de residência alternada
Na decisão recorrida ficou assim sustentada a desnecessidade de alteração do regime de residência alternada fixado em 1/10/2015:
Ora, in casu, analisada a argumentação do requerente, a factualidade apurada, com especial destaque para a reduzida distância (de não mais de 17 km) entre a escola dos menores e a residência do requerente (que se percorre de carro em não mais de 21 minutos), e a escassa relevância, em termos de distância, da mudança do local de residência da requerida, da Bobadela para Algés, ambas dentro da grande Lisboa e distando não mais de 20 km, segundo é facto notório, bastando consultar um mapa, temos de concluir que não se verifica qualquer alteração relevante das circunstâncias e que é desnecessária a alteração pretendida pelo requerente.
Por outro lado, a alteração pretendida pelo requerente foi pedida quando estavam decorridos apenas seis meses sobre a fixação (e por acordo) do regime de regulação das responsabilidades parentais em vigor, e da alegação do requerente não resulta qualquer incumprimento de tal regime, por ambos os progenitores, nem sequer qualquer facto concreto é alegado que permita concluir pela efetiva verificação da abstratamente e genérica alega instabilidade dos menores, por mudarem, à semana, da casa da mãe para a casa do pai.
Ora, tal pretensa instabilidade já tinha sido prevista e querida pelas partes, seis meses antes, quando acordaram na residência alternada dos menores, pelo que, também este 'facto não constitui alteração superveniente das circunstâncias.
Por outro lado, quer a distância entre a escola dos menores e a casa do pai, quer a distância, entre a casa inicial da mãe e a sua atual casa, tem reduzida relevância, por em nenhum dos casos se tratar de distâncias não superiores a 20 a 25 Km (consoante o percurso) e, portanto, nunca levando, em circunstâncias normais, mais de 20 a 30 minutos.
O que na realidade se passa, é o requerente pretender, agora (escassos seis meses decorridos), tentar mudar um regime ao qual deu o seu consentimento, eventualmente por ter mudado de ideias ou taticamente, então, ter dado um consentimento, para mais tarde vir tentar alterar, diga-se injustificadamente, a situação ajustada.
Por último, nenhum facto concreto, o requerente alega que permita concluir que os menores ficariam muito melhores a residir só consigo e não só com a mãe, ou não como estão, sendo certo que, com o regime em vigor (de residência alternada, com ambos os progenitores), as crianças têm seguramente a vantagem de poderem manter uma relação de grande proximidade, tanto com o pai como com a mãe e de ambos os progenitores poderem participar quotidianamente na educação dos filhos.
Em resumo, da factualidade alegada e apurada se não se retira a manutenção da existência de qualquer alteração superveniente das circunstâncias, que imponha a alteração do regime de regulação das responsabilidades parentais em vigor, sendo claramente desnecessária e injustificada.
Dispõe o n° 1 do art.° 42° do Regime Geral do Processo Tutelar Cível que quando o acordo ou a decisão final não sejam cumpridos por ambos os pais, ou por terceira pessoa a quem a criança haja sido confiada, ou quando circunstâncias supervenientes tornem necessário alterar o que estiver estabelecido, qualquer um daqueles ou o Ministério Público podem requerer ao tribunal, que no momento for territorialmente competente, nova regulação do exercício das responsabilidades parentais.
Não se estando perante um caso em que a decisão relativa ao exercício do regime das responsabilidades parentais relativas aos menores Rafael e Alicia esteja a ser incumprida por ambos os progenitores (já que apenas está em causa a invocação de uma situação em que a requerida terá tomado uma decisão sem o acordo prévio do requerente, em questão de particular importância para a vida dos menores), torna-se então necessário verificar a existência de circunstâncias supervenientes que justifiquem a necessidade de alteração do regime anteriormente fixado.
Da conjugação do art.° 40 do Regime Geral do Processo Tutelar Cível com o art.° 1906° do Código Civil, aplicável ex vi art.° 1912° do Código Civil, decorre que, na regulação do exercício das responsabilidades parentais, o tribunal determinará a residência do filho e os direitos de visita de acordo com o interesse deste, tendo em atenção todas as circunstâncias relevantes, designadamente o eventual acordo dos pais e a disponibilidade manifestada por cada um deles para promover relações habituais do filho com o outro, e sendo a decisão tomada sempre de harmonia com o interesse do menor, incluindo o de manter uma relação de grande proximidade com os dois progenitores, promovendo e aceitando acordos ou tomando decisões que favoreçam amplas oportunidades de contacto com ambos e de partilha de responsabilidades entre eles.
E se respeita o superior interesse dos menores Rafael e Alicia a fixação de um regime de residência alternada, nos termos acordados pelos seus progenitores e aceites pelo tribunal em 1/10/2015, para que se possa afirmar que esse regime de residência alternada deixou de respeitar o superior interesse desses menores, torna-se necessária a verificação de uma alteração do modus vivendi destes que prejudique o seu desenvolvimento físico, psíquico, social e moral. E, designadamente, porque a possibilidade de poderem contactar na mesma medida com cada um dos progenitores (decorrente desse regime de residência alternada), acarreta para os menores situações de choque, stress ou traumatismos de alguma espécie, designadamente pela distância e/ou tempo que despendem a concretizar essa alternância, não compensada pela possibilidade de estarem afectiva e fisicamente próximos de ambos os progenitores.
Dito de outra forma, a verificação de uma mudança do domicílio da requerida, da Bobadela para Algés, só imporia a alteração do regime em causa na medida em que, por força dessa mudança, deixasse de estar respeitado o interesse dos menores, subjacente à determinação desse regime da residência alternada.
Todavia, da factualidade apurada decorre que, mesmo tendo os menores passado a frequentar estabelecimento de ensino próximo da área desse novo domicílio da requerida, os mesmos estão a uma distância de menos de 20 quilómetros do domicílio do requerente (em Sacavém), não demorando a mesma mais de 21 minutos a ser percorrida de veículo automóvel.
Por outro lado, constata-se que as localidades em questão (Algés e Sacavém) se encontram às portas de Lisboa, pertencendo a freguesias que fazem fronteira com freguesias do concelho de Lisboa
E é facto público e notório que, no interior deste concelho de Lisboa, há períodos do dia em que se demora cerca de uma hora a atravessar o mesmo em veículo automóvel.
Que é o mesmo que afirmar que a circular dentro da cidade de Lisboa se perde, por vezes, mais tempo que a circular entre localidades dos seus concelhos limítrofes (no caso concreto, Oeiras e Loures).
Servem tais considerações para concluir que a distância a que passou a estar, das escolas frequentadas pelos menores, o domicílio do requerente, em nada afecta o bem-estar dos mesmos, o seu desenvolvimento ou a formação da sua personalidade, na medida em que o tempo que podem ter de despender em viagem de ida e volta, em cada um dos cinco dias da semana em que estão a residir com o requerente, é compensado pela possibilidade de têm de conviver com o mesmo, alternadamente com a requerida.
E, por isso, é que o regime da residência alternada fixado em 1/10/2015 continua a ser aquele que melhor se adequa aos interesses dos menores, no ano lectivo 2016/2017, apesar do afastamento geográfico das residências alternadas, relativamente ao ano lectivo anterior, e que, se pode acarretar ao requerente um acréscimo de esforços para proporcionar transporte aos menores, do e para o estabelecimento de ensino frequentado por cada um deles (acréscimo de esforços que bem cabe na sua responsabilidade como progenitor), em nada afecta os mesmos menores.
O que equivale a afirmar que a mudança de domicílio da requerida (bem como a mudança dos menores para estabelecimento de ensino na área desse novo domicílio) não corresponde a uma circunstância superveniente que justifique a necessidade de alteração do regime de residência alternada anteriormente fixado.
É certo que o requerente convoca a escolha unilateral de estabelecimento de ensino pela requerida como uma das circunstâncias que deve conduzir à alteração do regime de residência alternada fixado, invocando que foi violado o acordado quanto ao exercício das responsabilidades parentais em questões de particular importância, assim inviabilizando a manutenção da residência alternada.
Mas sem qualquer fundamento, já que essa circunstância, se podia motivar o requerente a lançar mão do procedimento a que alude o art.° 41° do Regime Geral do Processo Tutelar Cível, invocando o incumprimento pela requerida do regime acordado pelos progenitores e aceite pelo tribunal, com vista a obter as diligências necessárias para o cumprimento coercivo do mesmo, não corresponde à existência de circunstâncias supervenientes que justifiquem a necessidade de alteração do regime anteriormente fixado, tal como acima referido.
Pelo que, na improcedência das conclusões do requerente, não há que fazer qualquer censura à decisão recorrida.
DECISÃO
Em face do exposto julga-se improcedente o recurso, mantendo-se a decisão recorrida.
Custas pelo recorrente.
Lisboa, 15 de Março de 2018
António Moreira
Lúcia Sousa
Magda Geraldes