I – São diferenciados os critérios legalmente prescritos para os casos de adoção conjunta ou plural - (n.º 1, do art.º 1 979) e de adoção singular ( n.º 2 do mesmo normativo) ;
II - Assim, nas situações de adoção conjunta, exige a Lei que as duas pessoas, casadas (e não separadas judicialmente de pessoas e bens, ou de facto) ou unidas de facto (cf. artigo 7 da Lei, n.º 7/2001, de 11 de Maio), independentemente do sexo (art. 2º da Lei, n.º 2/2016), permaneçam em tal situação há pelo menos 4 anos;
III- Idêntico requisito será de exigir nas situações de adoção singular, em que está em causa adoptante casado ou unido de facto, desde que o adoptante não seja filho do cônjuge ou de quem com ele conviva em união de facto.
IV - O que se justifica pois, de outra forma, a dispensa de tal requisito permitiria que que os cônjuges ou unidos de facto, através de adoções sucessivas, conseguissem realizar uma adoção conjunta sem a observância desse requisito respeitante à duração do seu casamento ou união de facto;
V - Porém, nas situações de adoção singular em que o adoptante é casado ou unido de facto, mas o adoptando é filho do cônjuge ou de com quem ele viva em união de facto, tal requisito não é exigível;
VI - Pois nestas situações, o objetivo é a procura de uma rápida integração desse filho na família constituída através do casamento ou da situação jurídica da união de facto.
VII- Inexistindo assim, nesta situação, que tutelar as cautelas ínsitas à consagração legal daquele prazo, nomeadamente o impedir adoções
irrefletidas, imponderadas ou precipitadas, fruto de uma menor maturação ou ponderação.
Proc. 258/18.9T8CSC.L1 2ª Secção
Desembargadores: Arlindo Crua - António Moreira - -
Sumário elaborado por Margarida Fernandes
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Apelação n°. 258/18.9T8CSC.L1
Recorrente(s)/Apelante(s): R...
Sumário
São diferenciados os critérios legalmente prescritos para os casos de adopção conjunta - ou plural - (n.º 1, do artº. 1979) e de adopção singular (o n.º 2, do mesmo normativo) ;
Assim, nas situações de adopção conjunta, exige a Lei que as duas pessoas, casadas (e não separadas judicialmente de pessoas e bens, ou de facto) ou unidas de facto (cf. Art.º 7.º da Lei, n.º 7/2001, de 11 de Maio), independentemente do sexo (art. 2.º da Lei, n.º 2/2016), permaneçam em tal situação há pelo menos 4 anos;
Idêntico requisito será de exigir nas situações de adopção singular, em que está em causa adoptante casado ou unido de facto, desde que o adoptando não seja filho do cônjuge ou de
quem com ele viva em união de facto;
O que se justifica pois, de outra forma, a dispensa de tal requisito permitiria que os cônjuges ou unidos de facto, através de adopções sucessivas, conseguissem realizar uma adopção conjunta sem a observância desse requisito respeitante à duração do seu casamento ou união de facto;
Porém, nas situações de adopção singular em que o adoptante é casado ou unido de facto, mas o adoptando é filho do cônjuge ou de quem com ele viva em união de facto, tal requisito não é exigível;
Pois nestas situações, o objectivo é a procura de uma rápida integração desse filho na família constituída através do casamento ou da situação jurídica da união de facto;
Inexistindo assim, nesta situação, que tutelar as cautelas ínsitas à consagração legal daquele prazo, nomeadamente o impedir adopções irreflectidas, imponderadas ou precipitadas, fruta de uma menor maturação ou reflexão.
Sumário elaborado pelo Relator - cf., n.º 7 do art.º 663.º, do Cód. de Processo Civil
ACORDAM os JUÍZES DESEMBARGADORES da 2ª SECÇÃO da RELAÇÃO de LISBOA o seguinte:
1- RELATÓRIO
1- R..., residente na Rua …, 19 Direito, 2750-097 Cascais, e S..., residente na mesma morada, intervindo na indicada qualidade de cônjuge e de co-interessada na pretensão do Requerente, veio instaurar processo tutelar de adopção plena de C..., nascido em 16/09/2008, filho de:
C..., já falecido;
• S...,
deduzindo o seguinte petitório:
- que seja decretada a adopção plena do menor C..., adquirindo assim a situação de filho do Requerente, integrando-se na sua família e sendo seu descendente e seu herdeiro ;
- que o menor passe igualmente a assumir os apelidos do Requerente.
Alegou, em suma, o seguinte:
. A mãe do menor, que o Requerente vida adoptar, é casada, desde 6 de maio de 2017, com o Requerente ;
. Por sua vez, o pai do Menor faleceu a 24 de Março de 2014, residindo o Menor com o Requerente e a sua Mãe desde Março de 2015 ;
• Pelo que o Menor está habilitado ao processo de adopção nos termos e para os efeitos do artigo 1980.º, n.º 1, al. b) do C.C. ;
. O Requerente tem mais de 60 anos, na medida em que nasceu em 14 de Novembro de 1954, o que à partida impediria a adopção do Menor nos termos do artigo 1979.º, n.º 3. do C.C. ;
. Contudo, sendo o Menor filho do respectivo cônjuge do Requerente, é aplicável o disposto no n.º 5 do artigo 1979.º, o qual afasta expressamente o limite de idade do adoptante (in casu o Requerente) ;
. Pretende o requerente adoptar plenamente o Menor, podendo fazê-lo, levando em consideração nessa sua decisão o superior interesse da criança, pelo qual nutre um imenso carinho e estima ;
. Constituindo com a mãe do Menor um casal muito unido, estável e com prática de vida quotidiana regida por valores em que integridade da família predomina seriamente ;
. Durante o período de mais de dois anos em que o Menor tem vivido na companhia do Requerente e da sua mãe, que se sente feliz e integrado numa verdadeira família, num lar harmonioso e feliz, cujo principal centro de atenções é o Menor;
. Sem prejuízo da necessidade de prestação do necessário consentimento perante o juiz que venha a ser designado para julgar a presente causa (crf. artigo 1982.º, n.º 1.º do C.C.), desde já se mencione ser a adopção requerida consentida pela mãe do Menor, por sua vez cônjuge do Requerente não separado judicialmente de pessoas e bens, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 1981.º, n.º 1.º, al. b) do C.C. ;
De acordo com o estatuído no artigo 1986.º, n.º 1 e n.º 2 do C.C., adquire assim o Menor a situação de filho do Requerente, integrando-se na sua família e sendo seu descendente e seu herdeiro, mantendo as relações familiares com a família do Pai e da Mãe ;
. Perdendo os apelidos de origem na família do Pai biológico (in caso Moura), adquirindo o apelido do Requerente, cfr. artigo 1988, n.º 1 do C.C..
Juntou 8 documentos, tendo a presente acção sido instaurada em 24/01/2018.
2 - Aberta vista ao Ministério Público, o Digno Magistrado do Ministério Público exarou, em 30/01/2018, a seguinte promoção:
Entendemos que o requerente não reúne os requisitos legais para adoptar atento o que dispõe o art° 1979 n° 1 do Cód Civil.
Com efeito, sendo o requerente casado com a mãe do menor verifica-se que tal casamento ocorreu há menos de 4 anos o que, em nosso entender, impede que venha neste momento adoptar o filho do cônjuge.
Tem aqui aplicação o disposto no n° 1 do art° 1979 do Cód Civil, - casamento há mais de 4 anos - da mesma forma que o legislador também admite que, tratando-se de uma adopção singular, o adoptante, sendo casado, possa ter apenas 25 anos de idade.
E, compreende-se que assim seja na medida em que visando a adopção realizar o interesse do menor, a estabilidade conjugal, aqui preenchida por um casamento de 4 ou mais anos, é sem dúvida alguma, um elemento da maior relevância para uma adequada integração do menor.
Em face do exposto somos de parecer que se deverá indeferir o pedido e determinar-se o arquivamento dos autos.
3 - Em 08/02/2018, foi proferida a seguinte DECISÃO:
Vem R... requerer a adopção do filho biológico do seu cônjuge alegando, entre outras coisas, que:
- está casado com a mãe do menor cuja adopção requer desde 06-05-2017;
- a sua mulher e o filho desta estão a viver consigo desde Março de 2015.
Aberta vista ao Digno Mº Pº veio o mesmo, através da douta promoção com a refª 111157393, pugnar pelo indeferimento liminar do pedido por falta do requisito legal previsto no artº 1979º nº 1 do Código Civil (CC) .
Os presentes autos deram entrada em juízo em 24-01-2018 o que significa que, aquando dessa instauração, o requerente estava casado com a mãe do menor cuja adopção pretende há apenas 8 meses e 18 dias.
Diz o artº 1979º nº 1 do CC que:
Podem adoptar duas pessoas casadas há mais de quatro anos e não separadas judicialmente de pessoas e bens ou de facto, se ambas tiverem mais de 25 anos.
Constata-se, assim, que falta um requisito legal que não é, neste momento, suprível.
Ainda que se contabilizasse o tempo de união de facto alegado pelo requerente, tendo a mesma tido o seu início em Março de 2015, à data da propositura da presente acção, o requerente e a mãe do menor, cuja adopção é aqui requerida, só estariam juntos há 2 anos e 10 meses.
De notar que a adopção do filho de cônjuge está previsto no nº 2 do artº 1979º do CC pelo que, em termos sistemáticos, tal previsão tem por pressuposto a verificação do disposto no nº 1 do mesmo artigo, sofrendo apenas a excepção prevista no nº 5 do mesmo preceito legal.
Dúvidas não restam, assim, que a presente acção não pode prosseguir por falta de um requisito legal fundamental à procedência da acção.
Face ao acima exposto indefiro liminarmente o pedido e, em consequência, declaro a instância extinta.
Custas a cargo do requerente.
R. e N. também com cópia do douto parecer que antecede.
4 - Inconformado com o decidido, o Recorrente interpôs recurso de apelação, em 22102/2018, por referência à decisão prolatada.
Apresentou, em conformidade, o Recorrente as seguintes CONCLUSÕES:
A. O presente recurso é interposta da sentença que, erradamente, indeferiu liminarmente o pedido de adoção plena do filho do cônjuge, uma vez que o Tribunal Recorrido entendeu que a ação não poderia prosseguir por falta do requisito temporal que se encontra explanado no nº. 1 do art. 1979º do CC (duração do tempo de casamento ou união de facto) ;
B. Ora, sucede que o Tribunal Recorrido fez uma aplicação errada do art. 1979º, pois aplicou não só o nº.2, mas também o nº. 1 do artigo 1979º do CC. ;
C. Note-se que a doutrina e a jurisprudência distinguem entre a doação plena conjunta e a adoção plena singular, distinção essa que o Tribunal Recorrido erradamente desconsiderou para estes efeitos ;
D. No caso sub júdice trata-se de uma adoção singular de filho do cônjuge, pelo que não deveria , portanto, o Tribunal Recorrido ter aplicado o nº. 1 do art. 1979 do CC.
E. O nº. 1 do art. 1979 refere-se única e exclusivamente à adoção conjunta ;
F. No nº. 2 do art. 1979 do CC não é feita qualquer referência ao requisito temporal da relação matrimonial, a qual contudo, considerando a união de facto existente, dura há mais de 4 anos ;
G. Pois ao contrário do que o Tribunal Recorrido entendeu, o nº. 1 e o nº. 2, em termos sistemáticos, referem-se a modalidades de adoção distintas, não se podendo confundir ;
H. Assim sendo, não tem a doação singular por pressuposto a verificação do nº. 1 do art. 1979 do CC. ;
I. O Recorrente e o adotando já têm uma ligação semelhante à da filiação, não sendo necessário que decorra um específico período temporal para que possa ser decretada a adoção ;
J. Deveria o Tribunal Recorrido ter atendido e aplicado apenas o nº. 2 e o nº. 3 do art. 1979 do CC. ;
K. Assim sendo, fez o Tribunal Recorrido uma interpretação distorcida do preceito legal do art. 1979, não respeitando o elemento teleológico da norma, nem o texto da norma e a intenção do legislador ;
L. Além do mais, deveria o Tribunal Recorrido ter atendido ao interesse superior da criança que vai, precisamente, no sentido de que a adoção seja decretada, para a relação que o menor tem com o Recorrente ser protegida constitucionalmente e para ambos beneficiarem de todos os direitos e deveres inerentes à filiação biológica ;
M. Assim, ao contrário do que considerou o Tribunal Recorrido mostram-se, portanto, verificados todos os requisitos legais para que o vínculo da adoção plena possa ser decretado.
Conclui, pelo provimento do recurso interposto e, em consequência, ser revogada a sentença recorrida, decretando-se a adoção plena.
Juntou um documento.
5 - Foram os autos com vista ao Digno Magistrado do Ministério Público, o qual exarou promoção datada de 26/02/2018, com o seguinte teor:
Visto.
Na sua petição inicial, designadamente no art° 5º, o requerente diz expressamente que reside com a mãe do menor e o menor desde Março de 2015.
Porém, vem agora o requerente, em sede de recurso, alegar que vive em união de facto com a mãe do menor e o menor desde o início de Fevereiro de 2014, facto que, pura e simplesmente omitiu ao tribunal na petição inicial.
Assim, atento o disposto no nº 6 do artº 1979º do Cód Civil, parece-nos, antes de mais, fundamental, esclarecer:
a)- em que data, em concreto, o requerente e a mãe do menor começaram a viver juntos e em condições análogas ás dos cônjuges e desde quanto o menor reside com o requerente;
b)- por que motivos e para que efeitos, firmaram a escritura pública do contrato de união estável com data de Novembro de 2014
Esclarecida esta questão e caso se conclua que afinal o requerente a mãe do menor iniciaram, efectivamente, união de facto em Fevereiro de 2014, mais Pr que se profira decisão, reconhecendo tal facto e designando data para audição do requerente e cônjuge a das testemunhas indicadas.
6 - Em 05/03/2018, foi proferido o seguinte DESPACHO:
Vista que antecede com a reFª 111648722:
Salvo o devido respeito mas não podemos sufragar a posição do Digno Magistrado do MP por dois motivos:
Em primeiro lugar, esta, como qualquer outra acção, deve vir logo instruída com todos os documentos, ou pelo menos com a alegação de todos os factos necessários a fundamentar o direito peticionado.
Em parte alguma da p.i. o requerente alegou que já vivia com a mãe do menor cuja adopção requer em união de facto desde o1-o2-2o1th sendo que só agora, para instruir o seu recurso, é que decidiu juntar documento que entende poder provar tal facto.
Temos, assim, por certo que o poder jurisdicional deste tribunal se esgotou com a prolação da decisão que assentou exclusivamente nos elementos que o requerente forneceu ao tribunal na sua p.i..
Aliás, a requerente apenas consegue impugnar a decisão judicial com a introdução em juízo de um novo facto que não fora alegado na peça e no momento próprios.
Mas mais grave ainda é o facto do Requerente vir agora, em se de recurso, alegar factos diferentes daquele que alegou na sua p.i..
Vejamos.
No art° 4º da sua p.i. o Requerente alega que o pai biológico do menor faleceu em 24-03-2014, juntando assento de óbito que o comprova, mas nas suas alegações de recurso diz que o mesmo faleceu 24-03-2013, podendo considerar-se haver lapso de escrita quanto ao ano do falecimento.
No entanto, o que já não pode ser tido como lapso de escrita é a discrepância entre o que o Requerente alegou na sua p.i. e o que vem agora alegar nas suas alegações de recurso.
Pois que:
No artº 5º da sua p.i. o Requerente alegou o seguinte:
'Residindo o menor com o Requerente e a sua Mãe desde março de 2015. - sublinhado nosso
Mas no artº 9º das suas alegações de recurso o Requerente alegou o seguinte:
O Recorrente reside com o seu cônjuge e com o adoptante desde 01 de Fevereiro de 2014, tendo celebrado em 29 de novembro desse mesmo ano, no Rio de Janeiro - residência à época de família - uma escritura pública de contrato de união estável que produz efeitos desde 01-02 2014 - sublinhado nosso
Como se vê, não só o próprio Requerente alegou na sua p.i. que vivia em união de facto com a sua actual mulher e menor apenas desde Março de 2015 - o que nunca poderia permitir concluir-se por uma relação com mais de 4 anos conforme imposto pelo artº 1979º n° 1 Código Civil - como o Requerente vem agora desmentir o que alegara, colocando o início da união de facto em 01 de Fevereiro de 2014.
Com esta discrepância o Requerente incorre numa eventual litigância de má fé o que lhe valerá uma condenação em pesada muita se a situação não for cabalmente esclarecida.
Isto por um lado.
Por outro lado, e em segundo lugar, ainda que se entendesse que o Tribunal deveria considerar o novo facto ora alegado (mas em contradição directa com o que alegara no art°5° da sua p.i.), a verdade é que o mesmo continua a não permitir considerar-se reunidos os requisitos legais liminares necessários à análise deste processo.
Vejamos.
O requerente vem agora alegar (contra aquilo que alegou no art° 5° da sua p.i.) que vive em união de facto com a mãe do menor cuja adopção requerer desde 01-02
2o14.
No entanto, a presente acção deu entrada em juízo em 24-01-2018, ou seja, ainda não tinham decorridos 4 anos sobre o alegado início da união de facto.
Ora, o disposto no art° 1979° n° 1 do Código Civil é claro ao impor uma união que perdure há mais de quatro anos.
Assim, mesmo com a alegação deste novo facto e junção de documento que visa prová-lo, a verdade é que continua o requerente a não reunir os requisitos legais exigidos por lei aquando da propositura da presente acção.
Pelo que, em face do acima exposto, mantém-se a decisão decretada nos autos e indefere-se o doutamente promovido.
Notifique, devendo o Requerente informar se, em face deste despacho, mantém interesse no seu recurso e para esclarecer a discrepância entre a alegação que fez no art° 59 da p.i. e a alegação que fez no art° 9° das alegações de recurso sob pena de poder vir a ser condenado em pesada multa como litigante de má fé.
7 - O Requerente/Recorrente veio responder em 14/03/2018, aduzindo o seguinte: 1. Em primeiro lugar, cumpre esclarecer que houve, de facto, um lapso de escrita aquando da indicação da data do óbito de C..., pai biológico do Menor.
2. Não restam dúvidas de que se tratou de um lamentável lapso, uma vez que o Recorrente procedeu à junção da certidão de óbito à petição inicial, que comprova que o pai biológico do Menor faleceu a 24.03.2014 (Documento n.° 4 da Petição Inicial junto aquando da apresentação da mesma).
3. Relativamente à discrepância entre o que o Recorrente alega na Petição Inicial e nas suas alegações de recurso relativamente à data de início da sua união com a Mãe do Menor, cumpre esclarecer, a priori, que essa discrepância se deveu a uma interpretação equivoca dos mandatários da informação transmitida pelo Recorrente, pela qual, desde já, se penitenciam,
4. Asseverando que a data indicada nas alegações de recurso é a data correta, tal como resulta demonstrado pelo documento feito seguir com as referidas alegações.
5. Embora reconhecendo que a Petição Inicial deveria ter sido instruída com todos os documentos necessários e com a alegação de todos os factos tendentes a fundamentar o direito peticionado, para que dúvidas não surgissem sobre a causa de pedir,
6. Não podemos deixar de notar que a presente situação se trata de um processo de adopção, no qual se deve atender, em primeiro lugar e sobretudo, ao interesse superior da criança, preterindo formalidades em favor de materialidades, se tal for necessário.
7. Sendo esse o escopo final da adopção, cumpre ainda reforçar que o Requerente reunia todos os requisitos legais exigidos por lei à data da propositura da ação.
8. Como devidamente explanado nas alegações de recurso, o Recorrente entende que o artigo 1979,', n,° 1, do CC não se aplica ao caso sub judice, não se exigindo, por conseguinte, que a união de facto ou o casamento perdure há mais de quatro anos.
9. Trata-se de um requisito que não tem aplicabilidade ao caso concreto do Recorrente, uma vez que o adoptando é filho do cônjuge do Recorrente, sendo apenas o Recorrente que pretende adoptar o Menor.
10. Em face ao exposto, requer o Recorrente que V. Ex.a queira relevar os lapsos de escrita ocorridos, que apesar de não afetarem o preenchimento dos requisitos legais exigidos, contribuíram para uma difícil percepção da pretensão inicial deduzida.
11. Subsequentemente e ora indo devidamente justificados, mais se requer a sua não condenação em multa por litigância de má-fé, por a mesma nunca ter existido.
12. Mais aproveita o Recorrente para manifestar que mantém o interesse no recurso interposto, requerendo que este siga os trâmites legais aplicáveis ao caso sub judice, e venha a conhecer de apreciação pelos Venerandos Juízes Desembargadores do Tribunal da Relação de Lisboa,
13. Na medida em que a pretensão de salvaguardar os interesses do Menor são para o Recorrente imperativos, que o tem como filho mas pretendendo a regularização da sua relação.
8 - Perante a informação prestada pelo Requerente, o Meritíssimo Juiz a quo, em 21/03/2018, proferiu o seguinte despacho:
Uma vez que o requerente mantém interesse no seu recurso e o Tribunal já se pronunciou acerca das diligências requeridas pelo M°P°, determino se notifique o M°P° das alegações de recurso e para, querendo, contra-alegar.
9 - 0 recurso foi admitido por despacho datado de 11/04/2018.
10 - Não foram apresentadas nos autos quaisquer contra-alegações.
11 - Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar, valorar, ajuizar e decidir.
II - ÂMBITO DO RECURSO DE APELAÇÃO
Prescrevem os nºs. 1 e 2, do arte. 639º do Cód. de Processo Civil, estatuindo acerca do ónus de alegar e formular conclusões, que:
1 - o recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão.
2 - Versando o recurso sobre matéria de direito, as conclusões devem indicar:
a) As normas jurídicas violadas;
b) O sentido com que, no entender do recorrente, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas;
c) Invocando-se erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que, no entendimento do recorrente, devia ter sido aplicada.
Por sua vez, na esteira do prescrito no nº. 4 do artº. 635º do mesmo diploma, o qual dispõe que nas conclusões da alegação, pode o recorrente restringir, expressa ou tacitamente, o objecto inicial do recurso, é pelas conclusões da alegação da Recorrente Apelante que se define o objecto e se delimita o âmbito do recurso, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.
Pelo que, na ponderação do objecto do recurso interposto pelo Recorrente Apelante, delimitado pelo teor das conclusões expostas, a apreciação a efectuar na presente sede consubstancia-se em aferir se decisão de indeferimento liminar do pedido (apelada) deve ser revogada e substituída por outra que determine o prosseguimento do presente processo tutelar cível.
O que implica, in casu, a análise das seguintes questões:
1) Do instituto da adopção ;
2) Dos requisitos referentes a quem pode adoptar;
3) Da distinção entre adopção conjunta e adopção singular
III - FUNDAMENTAÇÃO
A- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Os factos, as ocorrências e a dinâmica processual a considerar encontram-se expostos no precedente relatório.
B - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
A decisão (despacho) apelada considerou basicamente o seguinte:
O Requerente pretende a adopção do filho biológico da sua cônjuge ;
• Encontra-se casado com esta desde 06/05/2017 e vive em união de facto com a mesma (e filho adoptando) desde Março de 2015 ;
Os presentes autos foram instaurados em 24/01/2018 ;
O que significa não se encontrar preenchido o requisito legal fundamental á procedência da acção, inscrito no nº. 1, do artº. 1979º, do Cód. Civil, que exige que o casamento, ou a vivência em união de facto - cf., o nº. 6, do mesmo normativo -, se prolongue por período superior a quatro anos ;
• 0 que não sucede, mesmo na consideração do período de vivência em união de facto rectificado, situando o seu início em 01/02/2014;
Tal requisito legal não é suprível, sendo que a adopção de filho do cônjuge, apesar de prevista no nº. 2 do mesmo normativo, tem por pressuposto a verificação do prescrito no nº. 1 do mesmo normativo.
A apelação interposta efectua diferenciada leitura. Considera, resumidamente, que:
O requisito previsto no nº. 1 do artº 1979º não é aplicável à adopção plena singular, ajuizada no nº. 2 do mesmo normativo ;
Sendo que, in casu, trata-se de adopção singular de filho do cônjuge, aplicando-se apenas aquele nº. 1, em exclusivo, à adopção conjunta ;
- Pelo que, reportando-se a modalidades de adopções distintas, não se devem confundir, efectuando o Tribunal Recorrido errónea aplicação dos legais normativos ;
Pois preenchidos se encontram todos os requisitos legais para que o vínculo da adopção possa vir a ser decretado.
Analisemos.
- do instituto da adopção
Dispõe o artº. 1586º do Código Civil que,
a adopção é o vínculo que, à semelhança da filiação natural, mas independentemente dos laços do sangue, se estabelece legalmente entre duas pessoas nos termos dos art°s. 1973º e seguintes.
Este vínculo constitui-se por meio de sentença judicial proferida no âmbito de um processo próprio - o processo tutelar cível de adopção, com assento adjectivo no Regime Jurídico do Processo de Adopção, aprovado pela Lei n2. 143/2015, de 08/09.
Pela adopção o adoptado adquire a situação de filho do adotante e integra-se com os seus descendentes na família deste, extinguindo-se as relações familiares entre o adotado e os seus ascendentes e colaterais naturais, sem prejuízo do disposto quanto a impedimentos matrimoniais nos artigos 1602º a 1604° - cfr. Artº. 1986º-1 -, acrescentando o nº. 2 que se um dos cônjuges adopta o filho do outro mantêm-se as relações entre o adoptado e o cônjuge do adoptante e os respectivos parentes.
Quer dizer, a consequência primária da adopção plena é a de extinguir todos os vínculos familiares do adoptado e seus descendentes com a sua família natural e, em sua substituição, criar novos vínculos familiares entre o adoptado, e seus descendentes, e o adoptante, e sua família. O adoptado morre para a sua família natural e renasce para a família do adoptante, como se nascesse filho deste (...).
Define-se assim a adopção como a inserção num ambiente familiar, de forma definitiva e com aquisição do vínculo jurídico próprio da filiação, segundo as normas legais em vigor, de uma criança cujos pais morreram, são desconhecidos, não querem assumir o desempenho das suas funções parentais ou são pelo Tribunal considerados incapazes de as desempenhar.
Pelo que, presentemente, este instituto é cada vez menos encarado como um meio de proteger uma criança (...), sendo antes uma forma de dar uma família a uma criança que dela carece, devendo o instituto ser perspectivado como um recurso dos vários que integram uma política integrada de protecção à infância e juventude.
Relativamente aos requisitos ou condições necessários para que o Tribunal possa
constituir o vínculo da adopção, podem enunciar-se como requisitos gerais e especiais.
Assim, no que à economia dos autos interessa 5, são requisitos gerais para a
constituição do vínculo da adopção:
a) que a mesma apresente reais vantagens para o adoptando;
b) que os motivos sejam legítimos;
c) que não constitua um sacrifício injusto para o (s) outro (s) filho (s) dos adoptantes;
d) que exista uma razoável suposição de que entre o adoptante e o adoptando se estabeleça um vínculo semelhante ao da filiação, cfr. Rtº. 1974º-1;
e) que o adoptando tenha convivido com o adoptante, aos cuidados deste, durante um prazo suficiente para se poder avaliar da conveniência da constituição do vínculo, arte. 1974º-2;
f) que o adoptando tenha sido confiado, judicial ou administrativamente, ao adoptante, artº. 1980º-1, ou seja filho do seu cônjuge;
g) que o adoptando tenha menos de 15 anos à data da entrada da petição inicial ou, a titulo excepcional, menos de 18, se for filho do outro cônjuge, ou se tiver sido confiado aos adoptantes ainda antes de perfazer 15 anos, mas em qualquer dos casos, apenas se ainda não for emancipado, artº. 1980-2.
São requisitos especiais ou privativos da adopção, plural ou conjunta (não aplicável in casu, conforme melhor justificaremos), os seguintes:
1. O casamento de duas pessoas há mais de 4 anos ;
2. Com idades superiores a 25 anos, desde que
3. Não se encontrem separadas judicialmente de pessoas e bens ou de facto - cfr., artº. 1979º-1.
Por sua vez, são requisitos especiais ou privativos da adopção singular (aplicável in casu), os seguintes:
1. a idade superior a 30 anos;
2. ou a idade superior a 25 anos, se o adoptando for filho do cônjuge do adoptante - cf., artº. 1979º, nº. 2.
- Dos requisitos referentes a quem pode adoptar e da distinção entre adopção conjunta e adopção singular
Sob a epígrafe de quem pode adoptar, prescreve o artº. 1979º que:
1 - Podem adotar duas pessoas casadas há mais de quatro anos e não separadas judicialmente de pessoas e bens ou de facto, se ambas tiverem mais de 25 anos.
2 - Pode ainda adotar quem tiver mais de 30 anos ou, se o adotando for filho do cônjuge do adotante, mais de 25 anos.
3 - Só pode adotar quem não tiver mais de 60 anos à data em que a criança lhe tenha sido confiada, mediante confiança administrativa ou medida de promoção e proteção de confiança com vista a futura adoção, sendo que a partir dos 50 anos a diferença de idades entre o adotante e o adotando não pode ser superior a 50 anos.
4 - Pode, no entanto, a diferença de idades ser superior a 50 anos quando, a título excecional, motivos ponderosos e atento o superior interesse do adotando o justifiquem, nomeadamente por se tratar de uma fratria em que relativamente apenas a algum ou alguns dos irmãos se verifique uma diferença de idades superior àquela.
5 - O disposto no n.º 3 não se aplica quando o adoptando for filho do cônjuge do adoptante.
6 - Releva para efeito da contagem do prazo do nº 1 o tempo de vivência em união de facto imediatamente anterior à celebração do casamento.
Ora, conforme enunciámos, a problemática in casu consiste em aferir se o requisito enunciado no nº. 1 do artº. 1979º, ou seja, a necessidade de casamento se prolongar por mais de 4 anos, inexistindo separação judicial de pessoas e bens ou de facto ', previsto para as situações de adopção conjunta ou plural, é igualmente aplicável às situações enunciadas no nº. 2 do mesmo normativo, ou seja, nos casos de adopção singular e, dentro desta, nas situações específicas de adopção de filho do cônjuge do adoptante.
Refere João de Castro Mendes que nas situações de adopção por casal, ou seja, adopção conjunta, requer-se que os adoptantes sejam casados há mais de cinco anos e não estejam separados judicialmente de pessoas e bens ou de facto (arte. 1979º, nº. 1), o que se justifica pela necessidade e vantagem de integrar o adoptando numa família estável. Note-se que a adopção singular de filho do cônjuge do adoptante dispensa esta duração de casamento (artº. 1979º, nº. 2, 2ª parte), dado que, nesta hipótese, procura-se uma rápida integração desse filho na família constituída através do casamento (sublinhado e realce nosso).
Na conjugação do legalmente definido, o regime será então o seguinte: para a adopção singular requer-se que o adoptante dê garantias de maturidade e, por isso, exige-se normalmente que ele tenha trinta e cinco anos (artº. 1979º, nº. 2, 1ª parte) ; para a adopção conjunta admite-se uma idade mais baixa do adoptante (vinte e cinco anos), mas exige-se, em contrapartida, uma certa estabilidade no casamento e, por isso, requer-se que esse matrimónio já tenha completado cinco anos. Este regime não parece levantar dúvidas, excepto talvez para o caso de adopção singular por adoptante casado relativamente a menor que não é filho do seu cônjuge (se for aplica-se o artº. 1979º, nº. 2 2ª parte).
Deste modo, acrescenta, paralelamente à instituição de duas modalidades de adopção plena quanto aos adoptantes - a adopção conjunta e a adopção singular (art.º 1979º, nº.s 1 e 2) -, a lei define, bem compreensivelmente aliás, diferentes exigências e requisitos que se apresentam como exclusivos de cada uma daquelas modalidades dessa adopção. Deste modo, relativamente à adopção singular de um menor estranho ao casal, requer-se sempre que o adoptante tenha trinta e cinco anos (artº. 1979º, nº. 2) ; quando a adopção é conjunta, é exigível, além da idade de vinte e cinco anos dos adoptantes, que os cônjuges estejam casados há mais de cinco anos e não estejam separados de pessoas e bens ou de facto (artº. 1979º, nº. 1 (...).
Mais duvidosa é a exigência da duração do casamento estabelecida no artº. 1979º, nº. 1, na hipótese de adopção singular, por adoptante casado, de menor que não é filho do seu cônjuge. Parecem relevar aqui as mesmas razões de estabilidade matrimonial que justificam a exigência determinada, quanto à duração do casamento, no artº. 1979º, nº. 1, ao que também acresce que a dispensa desse requisito permitiria que os cônjuges, através de adopções sucessivas (admitidas, na situação específica, pelo artº. 1975º, 2ª parte), conseguissem realizar uma adopção conjunta sem a observância desse requisito respeitante à duração do seu casamento. Portanto, também quanto à adopção singular por adoptante casado de menor que não é filho do seu cônjuge se deve exigir que o seu casamento dure há, pelo menos, cinco anos e não esteja separado de pessoas e bens ou de facto (sublinhado nosso).
Perfilhando idêntico entendimento, refere Pereira Coelho, após efectuar clara destrinça entre as situações de adopção conjunta e de adopção singular, que nesta, estando em causa a adopção de filho do cônjuge do adoptante, não é necessário o decurso de qualquer prazo de duração do casamento, pois há lugar a uma só adopção, feita pelo cônjuge do progenitor. Nesta situação, não urge testar a estabilidade do casamento pelo decurso de qualquer prazo, sendo certo que a adopção de filho do outro cônjuge é factor de unidade familiar, que dará ao casamento, presumivelmente, maior estabilidade e solidez.
Em idêntico sentido perfilha-se a opinião vazada por Helena Bolieiro e Paulo Guerra, ao referenciarem que nos casos de adopção plural ou conjunta terão de estar casados ou a viver em união de facto - cf. artigo 7º da Lei nº. 7/2001, de 11 de Maio - há mais de 4 anos, e não estarem separados de pessoas e bens ou de facto (para os casados), devendo ambos ter mais de 25 anos, condições estas que devem estar preenchidas no momento que os candidatos apresentam a sua declaração de vontade junto do OSS.
E, se se tratar de uma adopção singular de pessoa casada, afigura-se-nos que também aqui se impõe que esteja casada há mais de 4 anos, citando Pereira Coelho e Guilherme de Oliveira, o que determina a exigência de duração de um matrimónio de quatro anos para um adoptante singular.
Todavia, resulta que assim já não será na situação em que o adoptando seja filho do cônjuge do adoptante, ao admitirem expressamente que um unido de facto pode adoptar o filho do seu companheiro desde que viva em tal situação há mais de 2 anos, não havendo limite máximo etário
Ora, ao admitirem tal possibilidade, apenas exigindo o prazo de dois anos para a constituição da situação jurídica de união de facto - cf., nº. 2, do artº. 1º, da Lei nº. 7/2001 -, por maioria de razão estando-se perante situação de casamento decorre não ser exígivel nas situações de adopção singular de filho do cônjuge do adoptante, o preenchimento do requisito previsto para o nº. 1 do artº. 1979º, ou seja, a duração do casamento por prazo superior a 4 anos.
Perfilhando idêntico entendimento revela-se o aduzido por Ana Paula de Azevedo Oliveira Anunciação, ao defender que o legislador alterou a duração do casamento de cinco para quatro anos, no caso de adoção plena ser pedida por um casal unido pelo matrimónio. O motivo prende-se com o facto de ser necessário impedir adoções precipitadas ou irrefletidas. No entanto, entre cinco e quatro anos não haverá diferença significativa para se evitar esta situação, pelo que este requisito não será aquele de maior importância.
Relativamente à adoção singular não existirá qualquer exigência quanto à vida familiar, mantendo-se somente o requisito da idade (sublinhado nosso).
Navegando em idênticas águas, confira-se, ainda, o referenciado por Guilherme de Oliveira 18, mencionando que, extinta a dicotomia entre adopção plena e adopção restrita, presentemente a diferenciação a ponderar é entre a adoção poder ser conjunta ou singular, conforme é feita por um casal [por duas pessoas casadas (art. 1979.º, n.º 1, CCiv) ou que vivam em união de facto (art. 7.º da Lei n.º 7/2001), independentemente do sexo (art. 2.º da Lei n.9 2/2016)] ou por uma só pessoa, casada ou não casada (art. 1975.º, 1976.º, 1979.º, n.º 2).
Deste modo, o art. 7.º da Lei n.º 7/2001 reconhece a todas as pessoas que vivam em união de facto o direito de adoção em condições análogas às previstas no artigo 1979.º do Código Civil. Não se opõe a lei, portanto, à adoção singular da criança por um dos sujeitos da união de facto, assim como nada obsta a que um deles adote o filho do outro, nos termos gerais, sendo que a adoção singular, como o nome indica, é pretendida por uma só pessoa, e tenderá a constituir uma família monoparental.
Acrescenta, relativamente á capacidade dos adoptantes, de que cuidamos in casu, que em face do direito atual não poderão, pois, adotar duas pessoas casadas ou que vivam em união de facto há menos de 4 anos, mesmo que ambas tenham mais de 30 anos de idade. Cremos, até, que o decurso do referido prazo de 4 anos continua a ser exigível no caso de adoção singular feita por adotante casado ou que viva em união de facto (salvo se o adotando for filho do cônjuge do adotante ou de quem com ele viva em união de facto), até porque, proibindo a lei a adoção conjunta sem que o casamento ou a união de facto tenha durado 4 anos, mal se entendia que as pessoas pudessem tornear a proibição através de duas adoções singulares. Note-se, porém, que a lei atual prevê expressamente que se possa somar o tempo de união de facto imediatamente anterior ao casamento dos adotantes (art. 1979.º, n.º 6) (realce e sublinhado nossos).
Do exposto, resulta, no que concerne ao requisito de quem pode adoptar, nos quadros do artº. 1979º, e na ponderação da argumentação exposta, o seguinte:
. são diferenciados os critérios legalmente prescritos para os casos de adopção
conjunta (o n°. 1, do artº. 1979º) e de adopção singular (o nº. 2, do mesmo
normativo) ;
. assim, nas situações de adopção conjunta, exige a lei que as duas pessoas, casadas (e não separadas judicialmente de pessoas e bens, ou de facto) ou unidas de facto, permaneçam em tal situação há pelo menos 4 anos ;
. idêntico requisito será de exigir nas situações de adopção singular, em que está em causa adoptante casado ou unido de facto, desde que o adoptando não sela filho do côniuge ou de quem com ele viva em união de facto ;
• o que se justifica pois, de outra forma, a dispensa de tal requisito permitiria que os cônjuges ou unidos de facto, através de adopções sucessivas, conseguissem realizar uma adopção conjunta sem a observância desse requisito respeitante à duração do seu casamento ou união de facto ;
. porém, nas situações de adopção singular em que o adoptante é casado ou unido de facto, mas o adoptando é filho do cônjuge ou de quem com ele viva em união de facto, tal requisito não é exigível ;
. pois nestas situações, o objectivo é a procura de uma rápida integração desse filho na família constituída através do casamento ou da situação jurídica da união de facto ;
. inexistindo assim, nesta situação, que tutelar as cautelas ínsitas à consagração legal daquele prazo, nomeadamente o impedir adopções irreflectidas, imponderadas ou precipitadas, fruta de uma menor maturação ou reflexão.
Ora, revertendo ao caso concreto o entendimento exposto, constata-se que o Requerente, ora Apelante, pretende adoptar o filho menor da sua cônjuge (com quem antecedentemente terá vivido em união de facto, e independentemente do período desta vivência, aparentemente ainda em controvérsia).
Donde decorre que os requisitos a ponderar, relativamente à capacidade de adoptara são os enunciados nos nºs. 2 e 5, do transcrito artº. 1979º, sendo-lhe inaplicável os requisitos prescritos no nº. 1, do mesmo normativo.
Pelo que a decisão apelada, ao considerar a falta de um requisito legal fundamental à procedência da acção, indeferindo liminarmente o pedido, não pode subsistir, antes impondo clara revogação, o que se decide e determina, na procedência da presente apelação.
E, consequentemente, deverá a mesma ser substituída por outra que, no ordenar dos ulteriores termos processuais, e caso nenhum outro vício, omissão ou diligência em falta obste, deverá determinar as audições legalmente prescritas no artigo 54º do Regime Jurídico do Processo de Adopção - aprovado pela Lei nº. 143/2015, de 08/09.
Nos quadros do artº. 527º, nºs. 1 e 2, do Cód. de Processo Civil, obtendo o Apelante procedência no recurso interposto, e inexistindo decaimento a ponderar, não são devidas custas.
IV. DECISÃO
Destarte e por todo o exposto, acordam os Juízes desta 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa em:
a) Julgar procedente o recurso de apelação interposto pelo Apelante/Requerente R... ;
b) Em consequência, revoga-se a decisão (despacho) recorrida/apelada, a qual é substituída por outra que, no ordenar dos ulteriores termos processuais, e caso nenhum outro vício, omissão ou diligência em falta obste, deverá determinar as audições legalmente prescritas no artigo 54º do Regime Jurídico do Processo de Adopção - aprovado pela Lei nº. 143/2015, de 08/09 ;
Nos quadros do arte. 527º, nºs. 1 e 2, do Cód. de Processo Civil, obtendo o Apelante procedência no recurso interposto, e inexistindo decaimento a ponderar, não são devidas custas.
Lisboa, 17 de Maio de 2018
Arlindo Crua - Relator
António Moreira - Adjunto
Lúcia Sousa - 2ª Adjunta (Presidente)