Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Jurisprudência da Relação Cível
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 - ACRL de 12-07-2018   Processo tutelar cível. Alteração da regulação das responsabilidades parentais. Audição do menor.
O princípio da audição do menor constante em preceitos do direito interno e do direito internacional a que o Estado Português está vinculado, tem como pressuposto a consideração de que o menor deve ser ouvido nas decisões que lhe dizem respeito, pelo respeito pela sua personalidade.
Este princípio é extensivo ao incidente de alteração do regime das responsabilidades parentais.
A audição prévia do menor, tendo em conta a sua idade e grau de maturidade reveste natureza obrigatória, pelo que a não realização dessa audição, determina a nulidade da decisão.
(sumário elaborado pelo/a relator/a)
Proc. 390/08.7TMFUN-F.L1 1ª Secção
Desembargadores:  Ana Isabel Pessoa - Eurico Reis - -
Sumário elaborado por Susana Leandro
_______
Processo n° 390/08.7TMFUN-F.L1 Recurso de Apelação
Tribunal Recorrido: Tribunal da Comarca da Madeira, Funchal -
Juízo de Família e Menores -J3
Recorrente: LI...
Recorrido: MI...

Sumário:
I. O princípio da audição do menor constante em preceitos do direito interno e do direito internacional a que o Estado Português está vinculado, tem como pressuposto a consideração de que o menor deve ser ouvido nas decisões que lhe dizem respeito, pelo respeito pela sua personalidade.
Il. Este princípio é extensivo ao incidente de alteração do regime das responsabilidades parentais.
III. A audição prévia do menor, tendo em conta a sua idade e grau de maturidade reveste natureza obrigatória, pelo que a não realização dessa audição, determina a nulidade da decisão.

Acordam na 1ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa
I. RELATÓRIO.
MI..., residente na R…, 2530-890 Lourinhã, veio instaurar o presente processo tutelar cível para alteração da regulação das responsabilidades parentais a favor dos menores AF..., nascido em …, e JO..., nascido em …, contra LI..., residente no E…, 9050-000 Funchal.
Para o efeito alegou, em síntese, que deixou de residir na Região Autónoma da Madeira, encontrando-se a residir na Lourinhã, solicitando, em consequência, a alteração da regulação do exercício das responsabilidades parentais no que se reporta ao exercício das responsabilidades parentais e ao regime de visitas.

A Requerida apresentou alegações, impugnando a proposta apresentada pelo Requerente quanto ao regime de visitas, apresentando uma contraproposta, e peticionando a alteração do valor da pensão de alimentos, para o valor de € 175,00 (cento e setenta e cinco euros) por cada menor, e comparticipação do Requerente quanto às despesas escolares.

Em 23 de Maio de 2017, foi realizada conferência de pais, tendo sido possível a obtenção de acordo quanto à alteração do regime de regulação das responsabilidades parentais no que se reporta ao seu exercício e autorização de viagens.
Foi realizada a audição técnica especializada das partes.

Notificadas para o efeito, ambas as partes apresentaram alegações, mantendo, no essencial, a posição vertida nos respectivos articulados.

Foi realizada audiência de discussão e julgamento, vindo, no final a ser proferida sentença que procedeu à alteração do regime de exercício das responsabilidades parentais da seguinte forma:
I - Exercício das Responsabilidades Parentais e Residência
1- Os menores continuarão a residir habitualmente com a mãe, sendo que o exercício das responsabilidades parentais relativas aos actos da vida corrente das crianças caberá à mãe ou ao pai quando estiver temporariamente com os filhos, não devendo o pai contrariar as orientações educativas mais importantes da mãe.
2- O exercício das responsabilidades parentais relativamente aos actos de particular importância para a vida das crianças é exercido por ambos os progenitores, com excepção da escolha da educação
religiosa e de estabelecimento de ensino público ou privado, questões que ficarão a cargo da mãe.
3- Os progenitores autorizam a que os filhos possam viajar de férias, ainda que para o estrangeiro, com o outro progenitor, pelo período máximo de 20 dias, devendo o progenitor que efectuar a viagem informar o outro com pelo menos 30 dias de antecedência do destino, período de duração e formas de contactos, devendo garantir os contactos com o outro progenitor.
II - Direito de Convívio/Visitas
1- Nas férias da Páscoa, os menores passarão metade do período das férias, de forma alternada, com cada um dos pais, iniciando-se no ano de 2019 o primeiro período com o pai e o segundo período com a mãe, alternando-se nos anos seguintes.
2- Nas férias de Verão, os menores passarão o período de quinze dias, no mês de Agosto, de forma alternada, com cada um dos pais, iniciando-se no ano de 2018 o período do dia 1 ao dia 15 de Agosto com o pai e do dia 15 ao dia 31 de Agosto com a mãe, alternando-se nos anos seguintes.
3- Nas férias de Natal, os menores passarão um período de férias, de forma alternada, com cada um dos pais, iniciando-se no ano de 2018 o período desde o início das férias escolares até ao dia 26 de Dezembro com o pai e o período de 26 de Dezembro até ao fim das férias escolares com a mãe, alternando-se nos anos seguintes.
4- Para a execução do regime de férias, o pai deverá comunicar à mãe, com uma semana de antecedência, os dias e horas das viagens dos menores.
5- O pai poderá ainda estar com os menores sempre que quiser, mediante prévio contacto e acordo com a mãe, com pelo menos 48 horas de antecedência quando tais convívios ocorram na Região Autónoma da Madeira e com pelo menos quinze dias de antecedência quando seja pretensão do pai que os menores se desloquem a Portugal Continental, sem prejuízo dos horários escolares e períodos de descanso dos menores.
6- As viagens dos menores entre a Região Autónoma da Madeira e Portugal Continental serão custeadas pelo pai, obrigando-se a mãe a proceder ao levantamento do reembolso do subsídio de residente atribuído aos menores, devendo transferir tal quantia para a conta bancária do pai com o IBAN PT….
III - Alimentos
1 - As despesas medicamentosas, médicas, não cobertas pelo sistema de saúde ou seguros, e escolares (livros e material escolar) serão suportadas por ambos os pais, na proporção de metade para cada um, e pagas mediante a apresentação de recibo emitido em nome do respectivo menor.
2 - O recibo deverá ser apresentado, por correio electrónico, no prazo de trinta dias após a realização da despesa e pago no prazo de trinta dias após a sua apresentação.
3 - Mantem-se a pensão de alimentos de base fixa.
Inconformada, a Requerida interpôs o presente recurso de apelação, onde apresentou as seguintes conclusões:
1 - O progenitor, não passou com os filhos menores nenhum dia de natal, por decisão sua, porque optava por ir ao continente passar com a família.
2- se a título de mera hipótese, a mãe ainda e sempre pensando no superior interesse dos menores, admitisse a alternância do natal com o fim de ano, sempre proponha que os menores no ano em que eventualmente passassem o natal com o pai, regressassem à Madeira no início da tarde do dia 26 de dezembro, sendo certo que tal maximizava o equilíbrio de presença dos menores com ambos os progenitores se considerarmos, pelo menos com especial relevo para a época natalícia, os dias 24, 25 e 26, sendo este último dia feriado na Madeira.
3 - O pai, desde 2016, data em que foi residir para fora da- RAM, nunca pediu para estar no natal ou fim de ano com os filhos, ou para com eles passar o dia de aniversário destes.
4 - O pai é ateu.
5- Por força de tal circunstância, a celebração do Natal, não merecerá por parte do progenitor a importância que a mesma tem para os menores, com a sua convivência e prática religiosa que, é reforçada pela sua celebração junto da mãe.
6- O pai, por opção própria, mesmo nos anos em que vivia na Ilha da Madeira, nunca passou nenhum dia de aniversário com os filhos;
7 - O pai, não tem a obrigação de gozar as férias no mês de Agosto, havendo sim, uma orientação da entidade patronal para que pelo menos dez dias sejam gozados nesse mês;
8 - Logo daqui resulta que o pai pode tirar férias a partir do dia 7 de Agosto, pelo que os menores podiam passar com o pai as férias de verão com início no dia 7 de agosto;
9- O pai, tendo saído da RAM em Setembro de 2016, já regressou à Madeira em trabalho e, em nenhuma dessas vezes, por opção sua, procurou, esteve ou falou com os filhos.
10 - O pai não conhece nem nunca conheceu nenhum dos professores dos filhos, nem nunca se deslocou às respectivas escolas para inteirar-se da vida escolar dos menores.
11- Desde 13 de março de 2012 (data da alteração do acordo) até setembro de 2016 (data de saída do pai da Madeira), o pai não cumpriu com o regime de visitas, apesar de ter de se ausentar da Madeira, por motivos profissionais.
12 - A mãe, caso viesse a ser alterado o período de férias e os menores passassem a primeira quinzena de agosto com o pai, disponibilizava-se em deslocar-se ao continente português, onde estivessem os menores, para passar metade do dia de aniversário do filho Jo…, que é no dia 6 de agosto, tomando com ele uma refeição.
13- Na mesma linha seguida pela douta sentença ora em questão, será de elevada importância e de especial interesse para o menor, poder compartilhar o seu dia de aniversário, com ambos os progenitores.
14- Não podem ser, a mãe e os menores, penalizados pela alteração da vida profissional do pai. Mesmo que os menores tivessem de passar com o pai a primeira quinzena de agosto, nada poderia impedir que a mãe pudesse estar com o filho JO..., meio dia no seu dia de aniversário.
15- O menor JO..., tem um grupo de amigos da escola e das actividades extracurriculares, os quais compartilham entre si os respectivos aniversários, celebradas nas respectivas de morada.
16- Ao longo destes anos em que os progenitores estão separados, sempre teve de ser a progenitora a suportar os incumprimentos do pai (mesmo os que sejam por questões profissionais), a este bastava-lhe dizer que não ia buscar os filhos porque não podia, e lá tinha a mãe de refazer a sua vida, mudar de planos, alterar fins de semana, mudar férias e pedir ajuda aos familiares para conseguir ficar com os filhos.
17 - O pai na alteração requerida não requereu que fosse fixado qualquer regime relativamente ao dia de aniversário dos menores e dos próprios progenitores.
18- Os menores, AF... e JO..., completam neste ano, respectivamente 13 e 12 anos e não foram os mesmos inquiridos pelo tribunal;
19- Mesmo tendo sido realizada a ATE.
20- Parece até ser entendimento pacífico na doutrina, de que se impõe a inquirição dos menores, quando haja necessidade de regular as responsabilidades parentais.
21-Tal omissão, acarreta a nulidade da douta sentença ora recorrida, o que aqui se reclama.
O Requerente contra-alegou, formulando, por seu turno, as seguintes alegações:
I- A Douta Sentença recorrida, faz uma superior apreciação da prova Doutamente valorada na sua prolação.
II- O presente recurso não poderá ter efeito suspensivo nos termos invocados, dado não ter aqui aplicação a alínea b) do n.°3 do artigo 647.° do Código de Processo Civil e não existir prejuízo considerável da Requerida.
III- Prejuízo considerável que não é alegado ou provado, não se propondo igualmente à Requerida à prestação de caução.
IV- De facto, a ser concedido efeito suspensivo ao presente Recurso, serão as crianças quem sofrerá considerável prejuízo, dado terem conhecimento de que a primeira quinzena de Agosto seria passada com o pai.
V- Isto porque o mesmo adquiriu já os bilhetes para as necessárias viagens (não sendo os mesmos alteráveis), os quais encaminhou para a progenitora no dia 8 de Maio de 2018 e deu conhecimento às crianças das datas das ditas viagens quando com elas esteve na Região Autónoma.
VI- A Recorrente, como forma de impedir a realização das mesmas viagens e, desta forma, que as crianças privem com o pai, apresenta uma versão não sustentada nos documentos por si juntos.
VII- Não é feita prova de que o sr. Dr. MA... é marido da Requerida ou da suposta saída da Região Autónoma em férias.
VIII- Nem sequer do suposto planeamento das férias do pessoal do Cartório.
IX- Aliás, em momento algum do processo, mormente aquando do seu depoimento, a Requerida referiu que iria estar fora da Região Autónoma no seu período de férias.
X- Será igualmente o progenitor quem, face à despesa havida e à impossibilidade de troca dos mesmos bilhetes, acabará por ter também prejuízo financeiro, dada a impossibilidade de alterar datas e ou reembolso.
XI- Infinitamente inferior ao que resulta de as crianças não poderem estar consigo, mas prejuízo.
XII- Não comprova a Requerida a sua alegação, construção sagaz, mas infundada.
XIII- Sendo assim inadmissível, face à norma ínsita no artigo 641.° do C.P.C. e ao alegado e provado, o efeito pretendido, uma vez que não estamos perante prejuízo considerável, tão somente uma hábil e ardilosa tentativa de, mais uma vez, impedir as crianças de estarem com o pai e a família paterna no período desejado.
XIV- Inexiste erro de Julgamento de Facto e de Direito;
XV- A versão apresentada, distante da realidade, prende-se apenas com o passado, à qual testemunhas e a própria Requerida continuam amarradas, recusando-se a permitir a alteração face à ocorrência de profunda alteração na vida do progenitor e, desta forma, pretendendo impedir as crianças de estarem com o pai e a família paterna, de forma equilibrada, mitigando a distância.
XVI- Aparentemente todas as testemunhas acham que as crianças devem estar mais tempo com o pai e com a família paterna, no continente, mas depois acabam por recusar tal.
XVII- As crianças foram ouvidas, cumprindo-se o legalmente exigido, mormente a Convenção Europeia dos Direitos das Crianças e a legislação nacional no tocante à matéria;
XVIII- Foram-no perante técnica especialmente qualificada e tendo em conta todas as regras exigíveis.
XIX- Aliás, em momento algum a Requerida questionou o teor das informações recolhidas nos relatórios em causa, nomeadamente no que diz respeito às informações prestadas pelas crianças.
XX- Ou requereu a inquirição das mesmas.
XXI- Cujos depoimentos foram tidos em conta e consideração na Douta decisão, respeitando-se assim a CEDC.
XXII- Mais, ao procurar evitar a todo o custo o contacto do progenitor com as crianças nos moldes requeridos e fixados, principalmente após ter conhecimento da emissão dos bilhetes, a Requerida vem colocar em causa o superior interesse das crianças.
XXIII- Aliás, a Requerida em todo o seu recurso, parece olvidar todo o processo, todos os depoimentos, a prova, a audição técnica especializada e, mais do que isso, as crianças.
XXIV- Bem como todo o percurso exegético efectuado e bem explicado na douta decisão e que levou à mesma.
XXV- As conclusões apresentadas, as quais, com o devido respeito, parecem limitar-se ao passado quando o objecto da lide é o definir um melhor futuro para as crianças, terão que improceder por falta de fundamento.
Concluiu que não poderá ser admitido o Douto Recurso interposto com o efeito suspensivo pretendido pela Requerida, por legalmente inadmissível, entrando de imediato em vigor o regime resultante da sentença recorrida e improcedendo o mesmo igualmente no que respeito aos demais fundamentos invocados e pugnou pela manutenção da decisão recorrida.

A Exma. Magistrado do Ministério Público respondeu ao recurso, concluindo que:
1. O regime de visitas deve ser perspectivado em função do crescimento psicológico e afectivo dos menores, da satisfação do seu interesse real e para a indispensável preservação das, suas referências parentais, numa tentativa de manter latente a relação familiar do filho com o progenitor desprovido da guarda.
2. No caso concreto, dada a distância geográfica do centro de vida de cada um dos progenitores, o interesse dos menores impõe e justifica que se fixe um regime de visitas de Natal, Fim-de-Ano, Páscoa e Verão alternados.
3. Em sede de audiência técnica especializada, foi aferido por técnico especializado a capacidade de discernimento dos menores, e os mesmos tiveram o direito de exprimir livremente a sua opinião sobre as questões que lhes respeitam, designadamente todas as que dizem respeito ao exercício das responsabilidades parentais (visitas);
4. No decurso da audiência de discussão e julgamento a recorrente não requereu a audição dos menores, nem arguiu qualquer vício, pelo que a nulidade ficou sanada, sendo manifesta a extemporaneidade da sua arguição apenas nas alegações de recurso;
5. Uma nova audição dos menores introduziria um factor de desprotecção na sua vida, pois seriam obrigados a falar novamente sobre os tais factos, geradores de activação emocional para os mesmos
Concluiu que deve ser recusada procedência ao presente recurso, confirmando-se o acerto e a justeza da decisão recorrida que para todos os seus efeitos deve ser mantida, assim se renovando e reforçando a justiça que o caso merece
II. Objecto do recurso
Sendo o objeto do recurso definido pelas conclusões das alegações, impõe-se conhecer das questões colocadas pelo Apelante e as que forem de conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras - arts. 635° e 639° do novo C.P.C. - salientando-se, no entanto, que o tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito - art.° 5°, n°3 do mesmo diploma.
Ponderando as conclusões de recurso, impõe-se apreciar se se verifico a nulidade decorrente da omissão da audição dos menores, e no caso de se concluir pela improcedência da mesma, averiguar da existência de erro do julgamento da matéria de facto e da correção do regime das responsabilidades parentais alterado na decisão recorrida.
III. Fundamentação
III. Fundamentação de facto.
Na 1a instância foram considerados provados os seguintes factos:
1- AF... nasceu em 11 de Junho de 2005 e é filho de MI... e LI....
2- JO... nasceu em 6 de Agosto de 2006 e é filho de MI... e LI....
3- Por sentença proferida em 10 de Julho de 2008, foi homologado o seguinte acordo de regulação das responsabilidades parentais:
GUARDA:
Os menores ficam confiados à guarda e cuidados da mãe, que exercerá o poder paternal.
REGIME DE VISITAS:
O pai poderá estar na companhia dos seus filhos todas as
terças-feiras e quintas-feiras, devendo ir buscar os filhos à escola, até às 18:30 horas e devendo entregá-los na casa da mãe, pelas 21:00 horas. -
O pai poderá estar na companhia dos seus filhos um sábado e
um domingo de 15 em 15 dias, devendo ir buscar os filhos a casa da progenitora, a partir das 10:00 horas e, devendo entregá-los até às 19:00 horas do mesmo dia, no mesmo local, até que o filho JO... complete 3 anos de idade e a iniciar no próximo fim de semana com o pai a exercer o seu direito de visitas aos filhos. -
NATAL, FIM DE ANO E PÁSCOA:
Cada um dos progenitores tem o direito a passar com o filho
menor, de forma alternada, as vésperas de Natal, os dias de Natal, bem como as vésperas de Ano Novo, os dias de Ano Novo e o Domingo de Páscoa de cada ano, iniciando-se este ano de 2008, a véspera de Natal, a véspera de Ano Novo e o Domingo de Páscoa de 2009 com a mãe e o dia de Natal e o dia de Ano Novo com o pai, em termos a combinar entre os progenitores. -
FÉRIAS:
Nas férias de verão, o pai poderá estar quinze dias na companhia dos seus filhos, designadamente na segunda quinzena do mês de Agosto de cada ano, pernoitando os menores diariamente em casa da progenitora, atendendo à sua tenra idade, tudo em termos a combinar entre os progenitores. -
A partir do ano de 2009, no período de férias de verão, o pai
poderá estar quinze dias seguidos na companhia dos seus filhos, pernoitando os menores na sua casa e, em termos a combinar entre os progenitores. -
PRESTAÇÃO ALIMENTÍCIA:
O pai contribuirá com a quantia mensal de 250€ a titulo de
alimentos devidos aos dois filhos, sendo 125€ para cada filho, a depositar na conta bancária da requerente n° … da CGD, até ao dia 8 de cada mês, a partir do mês de Agosto do corrente ano.
A actualização da pensão de alimentos será feita anualmente
de acordo com o índice de inflacção a ser publicado pelo I.N.E., relativamente ao ano anterior e na mesma proporção, a iniciar no próximo mês de Janeiro de 2009.
DESPESAS EXTRAS:
As despesas médicas e medicamentosas relativas aos filhos
menores, e não cobertas pelo sistema de saúde ou seguros, serão suportadas em partes iguais por ambos os progenitores. -
As despesas escolares, bem como a propina escolar com a creche dos filhos, serão suportadas na totalidade pela progenitora. -
4- Na datá de homologação do acordo o requerente auferia o vencimento base mensal de € 1.100,00 (mil e cem euros) e a requerida uma quantia mensal variável entre € 1.500,00 (mil e quinhentos euros) e € 2.000,00 (dois mil euros).
5- Por sentença proferida em 4 de Dezembro de 2009, foi homologado o seguinte acordo de alteração da regulação do exercício das responsabilidades parentais, no que se reporta a visitas:
VISITAS:
O pai fica com o direito a passar com os seus dois filhos menores um fim de semana, de 15 em 15 dias, devendo o progenitor ir buscar os filhos pelas 19:30 horas de sexta-feira no final das sessões de terapia da fala ou na residência da progenitora, caso não haja sessão de terapia da fala e devendo entregar os menores na residência da progenitora, pelas 19:00 horas, de domingo.
FÉRIAS:
O pai fica com o direito a passar com os seus dois filhos menores a segunda quinzena do mês de Agosto de cada ano.
6- Por sentença proferida em 13 de Março de 2012, foi homologado o seguinte acordo de alteração da regulação do exercício das responsabilidades parentais, no que se reporta a visitas e alimentos:
1. VISITAS:
O pai poderá estar na companhia dos seus filhos todas as
terças-feiras e quintas-feiras, devendo ele, ou mediante prévia indicação à mãe dos menores, de pessoa da sua confiança, ir buscá-los à escola onde se encontrarem, até às 18:30 horas e, devendo entregá-los na casa da mãe ou dos pais desta até às 21:00 horas.
Relativamente aos próximos anos escolares, caso se verifique
alguma alteração nos respectivos horários escolares das crianças, o progenitor irá buscá-los no final das actividades escolares. -
2. ALIMENTOS:
O pai contribuirá com a quantia mensal acordada a titulo de
alimentos devidos aos dois filhos menores, acrescidos de €20,00 mensais, a depositar na conta bancária da progenitora com o MB n° ... do BES, até ao dia 8 de cada mês, a partir do próximo mês de Abril. -
3. No restante, mantém-se o já acordado.
7- Em Setembro de 2016, o requerente deixou de residir na Região Autónoma da Madeira, passando a residir no concelho da Lourinha.
8- O requerente exerce as funções de gestor de mercado para a S. Group, auferindo mensalmente um valor que varia entre os € 1.400,00 (mil e quatrocentos euros) e os € 1.700,00 (mil e setecentos euros).
9- Reside com a esposa e a filha de ambos numa moradia de tipologia T5, dispondo os menores de quarto de dormir para ambos.
10- Quando se encontrava na Região Autónoma da Madeira, o requerente, por motivos profissionais, passava longos períodos de tempo fora da região, o que o impedia de cumprir o regime de visitas aos menores.
11- A requerida exerce a actividade de … auferindo mensalmente um valor que varia entre os € 1.500,00 (mil e quinhentos euros) e os € 2.000,00 (dois mil euros).
12- Reside com os pais, transitoriamente, prevendo passar a residir em casa própria com empréstimo bancário que rondará um valor mensal entre os € 700,00 (setecentos euros) e os € 800,00 (oitocentos euros).
13- Os menores manifestaram receptividade quanto à convivência com o pai e com o seu núcleo familiar, ainda que tal receptividade tenha sido mais eloquente e expressiva por parte do menor JO....
14- Do mesmo modo, ambos se mostraram expectantes quanto à eventualidade de conhecerem outras tradições e costumes diferentes na época de Natal, embora tal interesse fosse mais claro por parte do menor JO....
15- Os menores indiciaram sentimentos de gratificação com as comemorações dos seus aniversários junto da mãe e respectiva família materna, contudo mostraram curiosidade quanto à possibilidade de vivenciarem outro tipo de experiências festivas no aniversário.
16- Nos períodos de convívio dos menores com o pai, estes deslocam-se a Idanha-a-Nova para conviver com os avós paternos e família alargada, e efectuam passeios/férias noutras zonas geográficas do país.
17- A comunicação dos pais sobre assuntos relacionados com os filhos é efectuada mediante mensagens enviadas por correio electrónico.
Na decisão não foram considerados quaisquer outros factos provados ou não provados com interesse para a boa decisão da causa.
III. Os factos e o direito.
Antes de entrarmos na apreciação da impugnação da matéria de facto, importa que apreciemos uma outra questão suscitada pela Apelante. Esta vem arguir a nulidade decorrente da falta de audição dos menores.
A audição dos menores, na perspectiva da Apelante, reveste o carácter de diligência probatória que o tribunal deveria ter ordenado.
Vejamos.
O princípio da audição do menor constante em preceitos do direito interno e do direito internacional a que o Estado Português está vinculado, tem como pressuposto a consideração de que o menor deve ser ouvido nas decisões que lhe dizem respeito, por deferência pela sua personalidade; traduz-se na concretização do direito à palavra e à expressão da sua vontade, no direito à participação ativa nos processos que lhe digam respeito e de ver essa opinião tomada em consideração e resulta de uma cultura da Criança enquanto sujeito de direitos.
O actual artigo 1901° n°s 1 e 2 do CC, na redacção introduzida pela Lei 61/2008, de 21.10. impõe a audição das crianças e jovens na decisão das questões que lhes digam respeito, em caso de pais casados e que não cheguem a acordo sobre questões de particularidade importância relativas à vida dos filhos, suprimindo o limite dos 14 anos como idade mínima para o fazer.
É também entendimento pacífico na doutrina, decorrente da lei, de regulamentos da União Europeia e de convenções internacionais vinculantes do Estado Português que, nos casos em que haja necessidade de regular o exercício de responsabilidades parentais, se impõe a audição prévia da criança, tendo em conta a sua idade e grau de maturidade. - cf. art° 4° al.c) do Regime Geral do Processo Tutelar Cível, aprovado pela Lei n.° 141/2015, de 08.09., preceito inspirado no artigo 3° da Convenção Europeia Sobre o Exercício dos Direitos das Crianças, aprovada por Resolução da Assembleia da República n.° 7/2014, publicada no Diário da República, 1.° série, N.° 18 de 27 de janeiro de 2014
Estabelece-se nesse preceito o princípio da audição e participação da criança, procurando expressar-se e concretizar-se a forma e condições em que a mesma é realizada, não se estabelecendo qualquer limite de idade para a sua audição, sendo esta obrigatória sempre que manifeste capacidade de compreensão
dos assuntos em discussão, tendo em atenção a sua idade e maturidade.
Esta audição será obrigatória relativamente a todas as decisões que lhe digam respeito e será preferencialmente realizada com o apoio da assessoria técnica do tribunal, sendo garantido, salvo recusa fundamentada do juiz, o acompanhamento por adulto da sua escolha, sempre que nisso manifeste interesseI.
A mesma audição é imposta pelo artigo 24° n°2 da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (aprovada em protocolo anexo ao Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, tal como resultou do Tratado de Lisboa) e pelo artigo 12° n°2 da Convenção de Nova Iorque sobre os Direitos da Criança.
No mesmo sentido, o Regulamento (CE) n° 2201/2003 do Conselho, de 27 de Novembro, relativo à competência, reconhecimento e execução de decisões em matéria matrimonial e de responsabilidade parental, que suprimiu pela primeira vez o exequatur, com base no princípio da confiança mútua, permite a dispensa do processo de revisão e confirmação de sentença estrangeira, desde que a decisão sobre o direito de visita ou relativa ao retorno da criança em casos de rapto parental, tenha sido antecedida da audição do menor.
A audição e participação da criança nos processos judiciais em que sejam intervenientes, de acordo com a sua idade e maturidade é, pois, relevante enquanto condição essencial para o reconhecimento e execução de decisões relativas ao direito de convívio da criança com os seus progenitores, ou relativas à deslocação ou retenção ilícita de crianças (artigos 23°, al. b), 41°, n.° 3, al. c) e 42°, n.° 2, al. a) do mesmo Regulamento.
A forma e o modo como se deverá realizar a audição encontram-se reguladas expressamente no artigo 5° do mesmo diploma e pressupõem a adequada preparação técnica dos profissionais nela envolvidos, a respectiva realização com discrição, em termos adaptados ao específico fim processual visado, e a sua concretizada em clima de confiança, adaptado às circunstâncias pessoais do menor e, em particular, à sua idade, devendo ser levada a cabo pelo juiz, podendo o Ministério Público ou os Advogados formular perguntas adicionais.
No âmbito da regulação do exercício das responsabilidades parentais, o artigo 35° do referido regime impõe a audição da criança com idade superior a 12 anos, ou com idade inferior, com capacidade para compreender os assuntos em discussão, tendo em atenção a sua idade e maturidade, audição a realizar nos termos do disposto na ai. c) do n.° do artigo 4° e no artigo 5°.
Tendo em conta o já estatuído no citado artigo 4°, al. c), não pode entender-se a exigência prevista no artigo 35° senão no sentido de ser obrigatória a audição da criança com idade superior a 12 anos, irrelevando a sua capacidade para compreender os assuntos em discussão, elementos que apenas assumem relevância relativamente a crianças de idade inferior, ressalvadas, obviamente as situações em que
o superior interesse da criança desaconselhe a sua audição.
Os preceitos que acabam de citar-se são aplicávéis ao procedimento de alteração da regulação do exercício das responsabilidades parentais.
No caso em apreço não se procedeu à audição dos menores que reveste carácter obrigatório (alínea c) do art° 4° e 35° do diploma legal citado, quer no que diz respeito ao menor AF..., que tinha, já na altura em que foi proferida a decisão recorrida, 12 anos, quer ao menor JO..., que contava então 11 anos de idade, mas que resulta do teor do relatório junto a folhas 64 e seguintes, ter já capacidade para perceber o que se discute.
E desde já se refira que não se afigura curial a audição de apenas um dos irmãos, numa matéria que diz respeito aos dois, apenas por um deles não ter ainda perfeito os 12 anos de idade.
No caso dos autos, a audição dos menores reveste a maior importância, pois estão em causa datas da maior relevância para a vida e a rotina dos menores.
Desde logo está em causa o local onde o menor JO... passará a data do seu aniversário, se com a mãe, na Região Autónoma da Madeira, como até aqui, se com o pai, no continente.
Do mesmo modo, a alteração do regime de visitas ao pai nas demais férias poderá pôr em causa actividades em que os menores possam ter interesse em participar, designadamente de carácter religioso, como resulta dos autos, que mantém.
Enfim, a alteração da residência do pai para um local distante daquele em que sempre viveram com a mãe representa uma modificação muito importante na vida dos menores, principalmente nos respectivos tempos livres de aulas, afigurando-se da maior importância auscultar o que os mesmos têm a dizer sobre o que tal mudança poderá/irá representar nas suas vidas.
Aliás, ciente de tal importância, a Mma. Juiz a quo diversas vezes fez referêricia às referências constantes nos autos, daquilo que será a vontade dos menores.
Sem querer pôr em causa as diligências levadas a cabo pelos técnicos que contactaram com os menores, afigura-se que numa matéria tão relevante, não pode a audição dos menores ser delegada.
Ler o que os menores terão dito a técnicos com intervenção no processo não é ouvir os mesmos - não concede ao Tribunal todos os poderes de averiguação, todos os elementos que da audição presencial podem advir, designadamente acerca das razões e eventuais objecções que os mesmos tenham a expor relativamente aos pontos em discussão.
Tem de ser levada a efeito pelo Tribunal, nos termos previstos no citado artigo 5°, para que possa o Tribunal assegurar-se, de forma imediata e direta, primeiro de que os menores percebem bem o que está em causa, segundo, que sem qualquer constrangimento, expressaram a sua real vontade acerca dos assuntos que estão em discussão.
A inobservância desta formalidade que tem reflexo na decisão da causa, determina a nulidade da decisão, pelo que se impõe a sua anulação para que se proceda à audição dos menores e após deve ser proferida nova decisão, onde deverá ser tido em conta o resultado da diligência ora ordenada, ficando prejudicado o conhecimento das demais questões suscitadas.
Tal diligência deverá ser levada a cabo no mais curto espaço de tempo possível, ainda a tempo das férias que se avizinham, por forma a que possa ser salvaguardar-se a solução que melhor acautelará o superior interesse dos menores.
Para tanto poderão Requerente e Requerida, se assim o entenderem, prescindir do prazo de recurso, para que os autos possam desde já ser remetidos ao Tribunal Recorrido.
IV. Deliberação_
Pelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal em julgar procedente o recurso e em anular a sentença recorrida, determinando-se, que se proceda à audição dos menores, após o que se proferirá nova sentença.
Custas pela parte vencida a final.
Registe e notifique.

Lisboa, 2018-07-12
(Ana Pessoa)
(Eurico José Marques dos Reis)
(Ana Maria Fernandes Grácio)