Acção Inibitória. Validade de cláusulas contratuais gerais à luz do Decreto-lei n° 446/85, de 25 de Outubro e alterações legislativas subsequentes. Contrato de manutenção e assistência a elevadores, na modalidade de Manutenção Completa. Cláusula penal. Limitação de responsabilidade da empresa. Sanção para a intervenção não autorizada no equipamento. Foro convencional. Publicação da sentença condenatória.
(Sumário elaborado pelo Relator).
Proc. 652/16.0T8SNT.L1 7ª Secção
Desembargadores: Luís Espírito Santo - Conceição Saavedra - -
Sumário elaborado por Susana Leandro
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Relator: Luis Espirito Santo
1ª Adjunta: Conceição Saavedra
2ª Adjunta: Cristina Coelho
Assunto: Acção Inibitória. Validade de cláusulas contratuais gerais à luz do Decreto-lei n° 446/85, de 25 de Outubro e alterações legislativas subsequentes. Contrato de manutenção e assistência a elevadores, na modalidade de Manutenção Completa. Cláusula penal. Limitação de responsabilidade da empresa. Sanção para a intervenção não autorizada no equipamento. Foro convencional. Publicação da sentença condenatória.
Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa ( 7ª Secção ).
I - RELATÓRIO.
Intentou Ministério Público, ao abrigo do disposto no artigo 26°, n° 1, alínea c), do Decreto-lei n° 446/85, de 25 de Outubro, acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra OT..., S.A., com sede na E....
Alegou essencialmente:
No clausulado contratual oferecido aos interessados, e que corresponde a um contrato de adesão, a Ré inclui as seguintes cláusulas cujo uso é proibido, nos termos do artigo 12° da Lei das Cláusulas Contratuais Gerais, sendo portanto nulas:
A cláusula n° 5.1.2 onde se refere: A OT... não se responsabiliza pelo funcionamento dos elevadores, quando verificar que quaisquer estranhos intervieram, tentativamente ou não, na resolução de avarias ou na reparação do equipamento. Sempre que tal se verifique, a OT... poderá cancelar de imediato as suas responsabilidades contratuais, ficando o cliente obrigado ao pagamento da totalidade das prestações do preço previstas até ao final do prazo contratado..
Esta cláusula contende com o disposto nos artigos 18°, alínea c), 19°, alínea c) e 15° da Lei das Cláusulas Contratuais Gerais.
Através dela a Ré logra excluir a sua responsabilidade por um eventual não cumprimento definitivo, mora ou cumprimento defeituoso da sua obrigação contratual de manutenção do elevador, mesmo que ocorra também da sua parte dolo ou culpa grave, desde que tenha ocorrido, concomitantemente, intervenção de terceiros na resolução de avarias ou reparação de equipamento.
A cláusula 5.1.10 do contrato em análise, estipula que A OT... não será responsável por danos que não sejam devidos a defeito de conservação, e, nomeadamente, não será responsável por danos resultantes da utilização indevida das chaves de emergência.
Esta cláusula contende com o disposto no artigo 18°, alíneas a), b), c) e d) da Lei das Cláusulas Contratuais Gerais, uma vez que exclui a responsabilidade da OT... por quaisquer danos causados à vida, à integridade moral ou física das pessoas, por danos patrimoniais extracontratuais, por não cumprimento definitivo, mora ou cumprimento defeituoso mesmo em caso de dolo e culpa grave, seu ou dos seus representantes, mesmo que estes lhe sejam imputáveis, desde que não relacionados com defeito de construção.
Dispõem a cláusula n° 5.5.2 do contrato em apreço que Independentemente do direito à indemnização por mora estipulado em 5.5.1, sempre que haja incumprimento do presente contrato por parte do cliente, e nomeadamente quando se verifique mora no pagamento de quaisquer quantias devidas à OT... por mais de 30 dias, poderá esta resolver o presente contrato, sendo-lhe devida uma indemnização por danos, no valor da totalidade das prestações do preço previstos até ao termo do prazo contratado para contratos com duração até cinco anos, no valor de 50/prct. das prestações do preço para contratos com a duração de 5 a 10 anos e no valor de 25/prct. do peço para contratos com a duração entre 10 a 20 anos.
A cláusula 5.7.4 que Uma vez que a natureza, âmbito e duração dos serviços contratados é elemento conformante da dimensão da estrutura empresarial OT..., em caso de denúncia antecipada do presente contrato pelo CLIENTE, a OT... terá direito a uma indemnização por danos, que será imediatamente faturada, no valor da totalidade das prestações do preço previstas até ao termo do prazo contratado para contratos com duração até cinco anos, no valor de 50/prct. das prestações do preço para contratos com a duração de 5 a 10 anos e no valor de 25/prct. do preço para contratos com a duração entre 10 a 20 anos..
Estas cláusulas são nulas por contenderem com o princípio da boa fé e consagrarem cláusulas penais que poderão ser manifestamente desproporcionais aos danos a ressarcir, colidindo com o disposto nos artigo 15° e 19°, alínea c) da Lei das Cláusulas Contratuais Gerais.
A cláusula 5.2.6 do mencionado contrato estabelece que o cliente não promoverá quaisquer trabalhos na caixa, poço ou casa das máquinas, sem prévio conhecimento e autorização expressa da OT....
A cláusula 5.1.10 do contrato em análise, estipula que A OT... não será responsável por danos que não sejam devidos a defeito de conservação, e, nomeadamente, não será responsável por danos resultantes da utilização indevida das chaves de emergência.
Dispõe a cláusula 5.5.2 do contrato em apreço que Independentemente do direito à indemnização por mora estipulado em 5.5.1, sempre que haja incumprimento do presente contrato por parte do cliente, e nomeadamente quando se verifique mora no pagamento de quaisquer quantias devidas à OT... por mais de 30 dias, poderá esta resolver o presente contrato, sendo-lhe devida uma indemnização por danos, no valor da totalidade das prestações do preço previstos até ao termo do prazo contratado para contratos com duração até cinco anos, no valor de 50/prct. das prestações do preço para contratos com a duração de 5 a 10 anos e no valor de 25/prct. do peço para contratos com a duração entre 10 a 20 anos.
A cláusula 5.7.4 que Uma vez que a natureza, âmbito e duração dos serviços contratados é elemento conformante da dimensão da estrutura empresarial OT..., em caso de denúncia antecipada do presente contrato pelo CLIENTE, a OT... terá direito a uma indemnização por danos, que será imediatamente faturada, no valor da totalidade das prestações do preço previstas até ao termo do prazo contratado para contratos com duração até cinco anos, no valor de 50/prct. das prestações do preço para contratos com a duração de 5 a 10 anos e no valor de 25/prct. do preço para contratos com a duração entre 10 a 20 anos.
Dispõe a cláusula 5.6 que Na situação de eventual incumprimento imputável à OT... é expressamente aceite que a OT... apenas responderá até à concorrência do valor de três meses de faturação OT... do presente contrato, como máximo de indemnização a pagar ao cliente..
A mesma contende com o determinado no artigo 18°, alínea c) da Lei das Cláusulas Contratuais Gerais, constituindo uma cláusula claramente desequilibrada, colidindo com o disposto no artigo 15° do dito diploma legal.
Prevê a cláusula n° 5.9 OT... MANUTENÇÃO OM que Para todas as questões eventualmente emergentes da aplicação e/ou interpretação do presente contrato, serão competentes os foros da comarca de Lisboa ou de Sintra, com expressa renúncia a qualquer outros.
Esta cláusula é contrária ao estatuído na primeira parte do n° 1 do artigo 71° do Código de Processo Civil, enfermando de nulidade conforme artigo 95°, n° 1, desse Código e artigos 280° e 294° do Código Civil.
Conclui pedindo:
a) Serem declaradas nulas as cláusulas contratuais gerais n° 5.1.2, 5.1.10, 5.5.2, 5.6, 5.7.4 e 5.9 do Contrato OT... Manutenção OM.
b) Condenar-se a ré a abster-se de utilizar as cláusulas contratuais gerais n° 5.1.2, 5.1.20, 5.5.2, 5.6, 5.7.4 e 5.9 do Contrato OT... Manutenção OM.
c) Condenar-se a ré a abster-se de utilizar aquelas cláusulas em contratos que, de futuro, venha a celebrar, especificando-se na sentença o âmbito de tal proibição (artigo 30.°, n° 1, da LCCG).
d) Condenar-se a ré a dar publicidade à decisão e a comprovar nos autos essa publicidade, em prazo a determinar na sentença, requerendo-se que a mesma seja efetuada em anúncio a publicar em dois dos jornais diários de maior tiragem, editados em Lisboa e no Porto, durante 3 dias consecutivos, de tamanho não inferior a 1/4 de página.
e) Dar-se cumprimento ao disposto no artigo 34.° da Lei das Cláusulas Contratuais Gerais..
A Ré apresentou contestação.
Essencialmente alegou:
O contrato dos autos não é um contrato de adesão, não cabendo dentro do âmbito de aplicação do RJCCG.
Nenhuma das cláusulas indicadas pela A. é nula.
Conclui pela improcedência da presente acção.
Procedeu-se ao saneamento dos autos, conforme fls. 114.
Realizou-se audiência de julgamento.
Foi proferida sentença na qual a presente acção foi julgada
parcialmente procedente e, em consequência a ré foi condenada a abster-se de se prevalecer e utilizar as cláusulas contratuais gerais com os números 5.5.2, 5.7.4, 5.6, 5.9 e o segmento final da cláusula 5.1.2 (ficando o cliente obrigado ao pagamento da totalidade das prestações do preço previstas até final do prazo contratado) do contrato OT... MANUTENÇÃO OM, nos contratos que, de futuro, venha a celebrar com os seus clientes, absolvendo-a quanto ao demais peticionado. A Ré foi ainda condenada a dar publicidade a esta sentença no prazo de quinze dias após o seu trânsito em julgado, mediante publicação de anúncio em dois jornais diários de maior tiragem editado em Lisboa e no Porto, em três dias consecutivos, de tamanho correspondente a metade da página, comprovando-o nos autos. Ordenou o cumprimento do disposto no artigo 34.° do DL n° 446/85, de 25 de Outubro, remetendo-se ao gabinete do Direito Europeu certidão desta sentença para os efeitos a que se reporta a Portaria 1093/95, de 6 de Setembro (cfr. fls. 125 a 136).
O Réu apresentou recurso desta decisão, que foi admitido como de apelação (cfr. fls. 188).
Juntas as competentes alegações, a fls. 137 a 173, formulou o R. apelante as seguintes conclusões:
A) QUANTO ÀS CLÁUSULAS (AINDA) EM CAUSA: 5.6/5.9/E SANÇÃO CONTRATUAL INCERTA NAS CLS. 5.5.2/5.7.4/5.1.2 (2ª PARTE);
A1) Quanto à cl. 5.6 - temos que é incomparável com as demais em sentido contrário/ não representa o termo do Contrato/ pode ser aplicada várias vezes ao longo da vida do Contrato/ e, danos diferentes, só podem ter indemnizações diferentes (em poucas horas o cliente tem uma nova EMA, praticamente sem prejuízos);
A2) Quanto à cl. 5.9 - O CPC não a deixa praticar/ a OT... não a pratica (nem podia) / e os Senhores Juízes fiscalizam-na para que não se pratique nunca (daí o inusitado e a redundância do pedido, quanto a esta cláusula, desde o início e como assinalado na Contestação;
A3) E quanto à Sanção Contratual (incerta nas cis. 5.5.2; 5.7.4 e 5.1.2 (2' parte) - é o cerne da questão e o que afinal interessa e preocupa o A.:
A3.1) O Julgador a quo olvidou a ratio da sanção: aqui discutimos um contrato OM (Manutenção Completa) absolutamente diferente do Contrato OC (Manutenção Simples)/ na Manutenção Completa, há um investimento da OT..., na instalação, por conta do seu cliente e a custo zero para o mesmo, constituindo um stock contínuo de peças/meios humanos em formação contínua/ e expectativa de recuperar esse investimento ao longo de toda a vida do Contrato;
A3.2) Apesar da Jurisprudência em todas as instâncias ser tudo menos pacífica, o certo é que o Contrato dos Autos não é um mero contrato de adesão, aplicando-se-lhe, assim, o Direito das Obrigações e o sagrado Princípio da Liberdade Contratual, com as legais consequências.
I - In casu, ocorre uma errónea colagem do Julgador a quo ao Acórdão da primeira Acção Inibitória, a relativa ao Contrato OC, com cláusulas que apesar de terem a mesma numeração têm textos diferentes (sem olvidar a incongruência da decisão condenatória proferida pelo mesmo Julgador a quo, 4 dias depois da douta decisão recorrida, e num Contrato OC - Manutenção Simples);
II - Pode ser alterado/ derrogado/eliminado/ etc., ab initio, e durante a vida do Contrato, uma e mais vezes, assim o acordem as partes;
III - Pelo que, e face aos depoimentos transcritos, se deverá proceder à alteração da resposta dada ao facto Não Assente e faz toda a diferença, e pela positiva: O Contrato dos Autos serve de base negocial e é todo ele mutável, com as legais consequências, afastando-o da qualificação de mero contrato de adesão;
A3.3) Sem conceder, e ainda que o Contrato dos Autos fosse um mero contrato de adesão (apesar de, insista-se, a questão do ponto de vista jurisprudencial ser tudo menos pacífica):
I - São cláusulas relativamente proibidas (e não absolutamente), e o Legislador previu a sua existência; porquê? Exactamente para acautelar a inevitabilidade de situações como a dos Autos;
II - O cliente da OT..., no século XXI, já não é o o analfabeto, o distraído ou o mal informado, que precisa de ajuda; e, hoje em dia, as mais das vezes, está acompanhado por profissionais ou simplesmente consulta o Google, informando-se;
III - Recebe a proposta de Contrato;
IV - É-lhe explicado todo o Contrato;
V - Não o quer alterar (podendo fazê-lo e a todo o tempo);
VI - Sabe que contrata um período - de pelo menos 5 anos - em que
sem gastar um cêntimo (para além do preço da manutenção mensal) a OT... o serve - em Manutenção Completa - e coloca peças novas no(s) seu(s) elevador(es) ao longo de toda a vida do Contrato;
VII - E, naturalmente, que se incumprir e/ ou quiser mudar de EMA mais cedo (antes de o Contrato terminar e sem qualquer justa causa), tem de assegurar que a OT... recupere o investimento que fez - cfr. o elenco de peças da cl. 1.4 do Contrato dos Autos - para o servir do minuto zero ao minuto final e com a mesma qualidade, conforto e fiabilidade;
VIII - E a formula da cláusula penal, foi essa (o valor total ou percentual das prestações devidas até ao termo do Contrato consoante a duração contratada), podia ter sido outra, mas foi essa que, ele - cliente ¬de forma esclarecida, aceitou expressamente ao contratar;
IX - Logo, está à espera da sanção em que incorre, que aceitou expressamente ao contratar, e tem de a honrar;
A3.4) Assim, as cláusulas em questão, são válidas, não são abusivas, nem desproporcionadas, não se comparando com a cl. 5.6 na situação inversa como referido atrás, e vinculam as partes ao abrigo do sagrado Princípio da Liberdade Contratual (art. 405° do CC), com as legais consequências.
B) DOS DEMAIS OPERADORES NESTA ÁREA DE ACTIVIDADE MUITO ESPECÍFICA QUE PRATICAM CLÁUSULAS IGUAIS/REFLEXOS EVIDENTES DA PROCEDÊNCIA DESTA ACÇÃO
BI) Ficou provado que todos os operadores deste sector de actividade, muito específico, praticam cláusulas do mesmo tipo e conteúdo;
B2) Se nos contratos da concorrência, as mesmas se mantiverem, a OT... fica prejudicada e distorce-se o mercado (note-se, o mercado que é feito pelo conjunto dos mesmos consumidores que se visou proteger);
B3) Sem esta sanção contratual, os clientes da OT... saem sem qualquer sanção, e, não só a OT... perde uns milhares de euros de investimento, como os clientes - nas relações contratuais seguintes - ficam ancorados a cláusulas iguais (e, em alguns casos, até mais gravosas);
B4) Logo, e enquanto a questão não for definitivamente resolvida para todos os operadores, tal implica, só por si e também, a improcedência desta Acção.
C) DA PUBLICIDADE DA DECISÃO A PROFERIR
C1) Sem conceder, admitindo que esta Acção era julgada procedente (ainda que no seu âmbito agora mais restrito que já tem), a sua publicidade não é obrigatória (basta o seu registo, o qual cumpre - só por si - a sua função de consulta e publicidade);
C2) O A. sabe que, com ou sem publicidade, a OT... acata a decisão (tanto que nem requereu a proibição provisória, nem a fixação de uma sanção pecuniária compulsória, no âmbito da aplicação do RJCCG), sendo, obviamente, dispensável;
C3) E, em todo o caso, a publicidade tem um efeito devastador para
o apetecido ataque da concorrência à carteira da OT..., coisa que facilmente se depreende que vai acontecer indelevelmente (sobretudo num período de crise, em que se acena o preço e, estando os clientes da OT... livres para saírem a todo o momento sem sanção, assim o farão...);
C4) Seja como for, se o consumidor abstracto é o alvo de protecção nesta Acção (coisa que o consumidor do século XXI não precisa tanto, como o dos idos de 1985, mas enfim...), integrando-se esse consumidor no mercado, certamente que o importante é proteger o mercado em si mesmo considerado (onde estão todos os consumidores protegendos) e a publicidade desta Acção, obviamente, não cumpre esse desígnio: o mesmo consumidor, que se quis proteger prima facie, fica pior protegido num mercado que se acabou de viciar e distorcer.
Contra-alegou a A., pugnando pela improcedência do recurso.
Apresentou as seguintes conclusões:
Do efeito suspensivo do presente recurso,
1. Encontrando-se a execução da sentença suspensa até ao trânsito
em julgado da mesma, o que ainda não aconteceu face à interposição do presente recurso pela recorrente OT..., Lda., ao mesmo não deverá ser atribuído um efeito suspensivo, mas antes deverá ter um efeito meramente devolutivo, que decorre da regra geral prevista no n.° 1 do artigo 647.°, do Código de Processo Civil
Quanto à natureza do CONTRATO OT... MANUTENÇÃO OM, nos moldes sobreditos e aqui tidos como renovados,
2. A acção inibitória é uma acção de fiscalização em abstracto. Que se encontra a montante de qualquer celebração em concreto de um contrato com base naquele formulário. Pode inclusivamente nunca ter ainda sido
celebrado nenhum contrato com aquele formulário. E esse facto não obsta à propositura da acção inibitória.
3. A classificação de um contrato como de adesão para efeitos de acção inibitória tem, pois, de resultar exclusivamente da análise do próprio impresso/minuta, que é apresentado pelo proponente aos clientes em geral, apreciado e associado com as regras da experiência comum. Assim, como a análise desse contrato terá de se basear apenas no seu conteúdo.
4. os elementos caracterizadores das cláusulas contratuais gerais classicamente mencionados pelos vários autores com base no art° 1° n° 1 do DL 446/85 (que não fornece propriamente um conceito, mas uma descrição), a pré-formulação a generalidade e a rigidez, o elemento rigidez (ou imodificabilidade), tem de ser interpretado com algum cuidado e diferenciação quando estamos apenas perante o formulário (a montante de cada concreta relação contratual) - caso da acção inibitória - ou perante um concreto contrato já celebrado com aquele formulário.
5. Se estiver em causa uma acção inibitória, ao Autor caberá provar estas características da pré-formulação, generalidade e rigidez apenas em face do formulário. O contrário significaria criar aos consumidores um entrave impossível de transpor, que vai contra o objectivo da LCCG e da Directiva 93/13/CEE, transposta pelo DL 220/95, que é o de defesa dos seus direitos.
6. Joaquim de Sousa Ribeiro em: O problema do contrato as cláusulas contratuais gerais e o princípio da liberdade contratual, colecção: Teses, Almedina, Coimbra, 2003, e em: O regime dos contratos de adesão: algumas questões decorrentes da transposição da directiva sobre as cláusulas abusivas, em www.apdi.pt (biblioteca digital), defende que o disposto no art° 1° n° 3 do DL 446/89 sobre o ónus da prova se aplica apenas a acções em que está em causa um contrato concreto que foi celebrado com um formulário de adesão, já que nas acções inibitórias existe uma presunção geral de falta de negociação.
7. O clausulado designado de Contrato OT... Manutenção OM é composto por um conjunto de cláusulas fixas e pré-elaboradas pela recorrente OT..., Lda., as quais, pela sua tipologia e inserção formal, não foram objecto de uma negociação prévia individual,
8. Não é pelo simples facto de a recorrente OT..., Lda. admitir, avulsamente, no âmbito das condições contratuais específicas, que incluem as Condições Particulares, alterações pontuais, ou até frequentes, ao seu clausulado, que o mesmo deverá deixar de ser qualificado como um verdadeiro clausulado de adesão e, como tal, está sujeito ao Regime Jurídico das Cláusulas Contratuais Gerais.
Do escrutínio de validade das cláusulas 5.1.2, in fine, 5.5.2., 5.6, 5.7.4 e 5.9., pelas razões acima expostas e aqui tidas como repetidas,
9. No que concretamente diz respeito ao segmento final da cláusula 5.1.2 do CONTRATO OT... MANUTENÇÃO OM, o mesmo consubstancia uma cláusula penal desproporcionada face aos danos a ressarcir e desconsidera, nomeadamente, o momento em que os factos ocorreram, a gravidade, a culpa, a ilicitude e os danos emergentes da violação do contrato.
Como tal, tal segmento é nulo face ao disposto no artigo 19.°, alínea c), do aludido Regime Jurídico das Cláusulas Contratuais Gerais.
10. As cláusulas 5.5.2 e 5.7.4 são cláusulas penais indemnizatórias que são proibidas, nos termos do disposto no artigo 19.°, n.° 1, alínea c), do Regime Jurídico das Cláusulas Contratuais Gerais, porque são desproporcionadas aos danos a ressarcir, por acentuarem indemnizações invariáveis, sem se atender à concreta extensão dos danos, tudo em favor do predisponente.
11. A cláusula 5.6 é uma cláusula de limitação de responsabilidade contratual, a ser aplicada nos casos de incumprimento do contrato pela recorrente OT..., Lda., que por não estabelecer um critério que permita fazer um juízo de justa proporção entre a sua conduta da predisponente e os danos resultantes do seu incumprimento para o
aderente, viola o artigo 18.°, alínea c), do Regime Jurídico das Cláusulas Contratuais Gerais e, como tal, é absolutamente proibida.
12. A cláusula 5.9 é uma cláusula de foro que é proibida, nos termos do disposto no artigo 19.°, alínea g), do Regime Jurídico das Cláusulas Contratuais Gerais, face à jurisprudência firmada no aludido Acórdão Uniformizador de Jurisprudência n.° 12/2007 do Supremo Tribunal de Justiça, de 18-10-2007 e ao disposto nos artigos 71.°, n.° 1, e 104.°, alínea a), do Código de Processo Civil.
Do incumprimento do artigo 27.°, n.° 2, do Regime Jurídico das Cláusulas Contratuais Gerais, nos moldes supra referidos,
13. Atenta a faculdade prevista no aludido preceito legal, não existe qualquer ilegitimidade passiva, por preterição de litisconsórcio necessário passivo, se a acção inibitória for proposta apenas contra um determinado predisponente - como no caso dos presentes autos, e já não contra os restantes proponentes, ainda que comercializem contratos com cláusulas contratuais gerais idênticas.
Da publicitação da decisão judicial, tudo nos termos supra mencionados,
14. A publicidade da decisão que proíbe cláusulas em acção inibitória, mais do que conferir eficácia às sentenças, tem uma função cívica, informativa, dirigida à protecção dos consumidores e, como tal, não pode ser preterida, no caso em apreço.
15. Pelas razões acima expostas e aqui tidas como repetidas para os devidos efeitos legais, a decisão recorrida não é, em nosso entender, merecedora de qualquer crítica, devendo ser confirmada e mantida, na íntegra.
II - FACTOS PROVADOS.
Foi dado como provado, em 1ª instância, que:
1. A ré é uma sociedade por quotas que se encontra matriculada sob o n° 5... e com a sua constituição inscrita na Conservatória do Registo Comercial de Sintra e que tem por objecto a conservação, manutenção, a reparação, a montagem, o comércio e a importação de ascensores, escadas rolantes e quaisquer outros aparelhos de elevação e transporte, sendo ainda empreiteiro e fornecedor de obras públicas e industriais de construção civil.
2. No exercício da sua actividade a ré procede, para além do mais, à celebração de contratos de manutenção de elevadores.
3. Nessa actividade a ré utiliza um formulário denominado CONTRATO OT... MANUTENÇÃO OM destinado a ser apresentado a interessados que com ela pretendam contratar.
4. Esse formulário é constituído por uma primeira página, com espaços em branco, destinados à indicação dos dados da faturação, identificação do cliente e identificação do serviço local da OT... competente para a prestação do serviço.
5. Nas páginas seguintes do referido formulário consta um clausulado já impresso, previamente elaborado pela ré, correspondente às condições gerais do contrato OT... MANUTENÇÃO OM, ao qual se seguem as condições específicas do contrato.
6. O referido formulário denominado CONTRATO OT... MANUTENÇÃO OM, além dos campos em branco, constantes na mencionada primeira página e nas condições específicas do contrato quanto à duração do contrato, preço, descrição do equipamento e condições particulares, não contém quaisquer outros espaços livres para serem preenchidos pelos contratantes que em concreto se apresentem.
7. Dispõe a cláusula n° 5.1.2 daquele contrato que A OT... não se responsabiliza pelo funcionamento dos elevadores, quando verificar que quaisquer estranhos intervieram, tentativamente ou não, na resolução de avarias ou na reparação do equipamento. Sempre que tal se verifique, a OT... poderá cancelar de imediato as suas responsabilidades contratuais, ficando o cliente obrigado ao pagamento da totalidade das prestações do preço previstas até ao final do prazo contratado.
8. Nos termos da cláusula 5.2.6 do mencionado contrato o cliente não promoverá quaisquer trabalhos na caixa, poço ou casa das máquinas, sem prévio conhecimento e autorização expressa da OT....
9. A cláusula 5.1.10 do contrato em análise, estipula que A OT... não será responsável por danos que não sejam devidos a defeito de conservação, e, nomeadamente, não será responsável por danos resultantes da utilização indevida das chaves de emergência.
10. Dispõe a cláusula n° 5.5.2 do contrato em apreço que Independentemente do direito à indemnização por mora estipulado em 5.5.1, sempre que haja incumprimento do presente contrato por parte do cliente, e nomeadamente quando se verifique mora no pagamento de quaisquer quantias devidas à OT... por mais de 30 dias, poderá esta resolver o presente contrato, sendo-lhe devida uma indemnização por danos, no valor da totalidade das prestações do preço previstos até ao termo do prazo contratado para contratos com duração até cinco anos, no valor de 50/prct. das prestações do preço para contratos com a duração de 5 a 10 anos e no valor de 25/prct. do peço para contratos com a duração entre 10 a 20 anos.
11. E a cláusula 5.7.4 que Uma vez que a natureza, âmbito e duração dos serviços contratados é elemento conformante da dimensão da estrutura empresarial OT..., em caso de denúncia antecipada do presente contrato pelo CLIENTE, a OT... terá direito a uma indemnização por danos, que será imediatamente faturada, no valor da totalidade das prestações do preço previstas até ao termo do prazo contratado para contratos com duração até cinco anos, no valor de 50/prct. das prestações do preço para contratos com a duração de 5 a 10 anos e no valor de 25/prct. do preço para contratos com a duração entre 10 a 20 anos.
12. Dispõe a cláusula 5.6 que Na situação de eventual incumprimento imputável à OT... é expressamente aceite que a OT... apenas responderá até à concorrência do valor de três meses de faturação OT... do presente contrato, como máximo de indemnização a pagar ao cliente.
13. Prevê a cláusula n° 5.9 OT... MANUTENÇÃO OM que Para todas as questões eventualmente emergentes da aplicação e/ou interpretação do presente contrato, serão competentes os foros da comarca de Lisboa ou de Sintra, com expressa renúncia a qualquer outros.
14. O contrato dos autos é um contrato de manutenção completa que não pode ser celebrado por períodos inferiores a 5 anos.
15. O contrato utilizado pela ré é composto por uma folha única, em papel contínuo, no formato A4 desdobrável e na 1ª página contêm a identidade dos contraentes, nas páginas intermédias as condições gerais e na última página as condições contratuais específicas que incluem as condições particulares.
16. Sempre que um potencial cliente surge, quer por prospeção, quer porque contactou diretamente a ré, cabe ao técnico comercial da zona visitá-lo, verificar das suas necessidades em termos dos serviços a prestar, explicar-lhe os diferentes serviços a praticar (em termos de conservação simples, completa, vantagens e desvantagens respetivas, preços, durações, penalidades, obrigações recíprocas), o potencial cliente pode sugerir alterações pontuais que, sendo aceites pela ré, passam para as condições particulares, preparar o contrato escolhido, com as alterações propostas e aceites, entregá-lo ao cliente (em mão e em duas vias originais), recolher o contrato assinado e integrá-lo na rota de assistência pelo prazo contratado.
17. Depois de assinado, o contrato pode ser pontualmente alterado em termos do seu clausulado.
18. A ré aceitou a alteração das cláusulas em contratos OM dos clientes CO (Portimão) - cláusula 5.3.1 e 5.6 ¬SE (Lisboa) - cláusulas 5.8.1.3, 5.8.2.2, 5.1.2, 5.7.3, 5.3.1, 5.3.4 e 5.9 - BA (Lisboa) - cláusulas 5.2.1, 5.5, 5.6, 5.7.3, 5.8, 5.7.4 e 5.10 - SS - cláusulas 5.1.6, 5.7.3 e 5.7.4 - FU (Lisboa) - cláusula 5.7.4 ¬CC (Lisboa) ¬cláusulas 1.4, 5.3.1, 5.1.2, 5.5.2 e 5.7.4 - CE (Porto Salvo) - cláusulas 5.3.1 e 5.3.3 – CH (S. Domingos de Rana) cláusulas 5.3.1, 5.4, 5.5.2 e 5.6 - CP (Barcarena) - cláusulas 5.1.4, 5.3.3, 5.3.4, 5.9 e 5.10 - CRP (Barcarena) - cláusulas 5.1.4, 5.3.3, 5.3.4, 5.9 e 5.10.
19. A ré tem cerca de 28.000 clientes, 30.000 contratos ativos, 594 trabalhadores, sede em Sintra e 19 delegações espalhadas pelo país e advogados externos, em Lisboa.
20. Há outros operadores que se dedicam à manutenção de elevadores com cláusulas idênticas.
III - QUESTÕES JURÍDICAS ESSENCIAIS.
São as seguintes as questões jurídicas que importa dilucidar:
Assunto: Acção Inibitória. Validade de cláusulas contratuais gerais à luz do Decreto-lei n° 446/85, de 25 de Outubro e alterações legislativas subsequentes. Contrato de manutenção e assistência a elevadores, na modalidade de Manutenção Completa. Cláusula penal. Limitação de responsabilidade da empresa. Sanção para a intervenção não autorizada no equipamento. Foro convencional. Publicação da sentença condenatória.
Passemos à sua análise:
No âmbito do conhecimento do presente recurso de apelação, está em causa a apreciação da validade das seguintes cláusulas contratuais que foram declaradas nulas pelo tribunal a quo, à luz do Decreto-lei n° 446/85, de 25 de Outubro e alterações legislativas subsequentes:
Cláusula 5.5.2., relativamente ao último segmento: Independentemente do direito à indemnização por mora estipulado em 5.5.1, sempre que haja incumprimento do presente contrato por parte do cliente, e nomeadamente quando se verifique mora no pagamento de quaisquer quantias devidas à OT... por mais de 30 dias, poderá esta resolver o presente contrato, sendo-lhe devida uma indemnização por danos, no valor da totalidade das prestações do preço previstos até ao termo do prazo contratado para contratos com duração até cinco anos, no valor de 50/prct. das prestações do preço para contratos com a duração de 5 a 10 anos e no valor de 25/prct. do peço para contratos com a duração entre 10 a 20 anos,
Cláusula 5.6.: Na situação de eventual incumprimento imputável à OT... é expressamente aceite que a OT... apenas responderá até à concorrência do valor de três meses de faturação OT... do presente contrato, como máximo de indemnização a pagar ao cliente..
Cláusula 5.7.4. : Uma vez que a natureza, âmbito e duração dos serviços contratados é elemento conformante da dimensão da estrutura empresarial OT..., em caso de denúncia antecipada do presente contrato pelo CLIENTE, a OT... terá direito a uma indemnização por danos, que será imediatamente faturada, no valor da totalidade das prestações do preço previstas até ao termo do prazo contratado para contratos com duração até cinco anos, no valor de 50/prct. das prestações do preço para contratos com a duração de 5 a 10 anos e no valor de 25/prct. do preço para contratos com a duração entre 10 a 20 anos..
O segmento da parte final da cláusula 5.1.2 que refere A OT... não se responsabiliza pelo funcionamento dos elevadores quando verificar que quaisquer estranhos intervieram, tentativamente ou não, na resolução do equipamento. Sempre que tal se verifique, a OT... poderá cancelar de imediato as suas responsabilidades contratuais, ficando o CLIENTE obrigado ao pagamento da totalidade das prestações do preço previstas até ao final do contrato.
A cláusula 5.9., onde se dispõe: Para todas as questões eventualmente emergentes da aplicação e/ou interpretação do presente Contrato, serão competentes os foros da Comarca de Lisboa ou de Sintra, com expressa renúncia a quaisquer outros.
Passemos à sua análise:
Cumpre, antes de mais, assentar, em consonância com o entendimento jurisprudencial há muito firmado e com o qual se concorda inteiramente, que o presente contrato, junto a fls. 17 a 21, pré-elaborado pela Ré, enquanto proposta negocial dirigida a um número indiferenciado de possíveis interessados, encontra-se efectivamente subordinado ao regime respeitante às cláusulas contratuais gerais previsto no Decreto-lei 446/85, de 25 de Outubro, com as alterações legislativas subsequentes, que inteiramente o contempla.
É o que liminarmente resulta do disposto nos artigos 1°, n° 2, e 2° do Decreto-lei n° 446/85, de 25 de Outubro.
Tal como, com inteira clarividência e absoluta pertinência, se consignou no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14 de Dezembro de 2016 (relator Fonseca Ramos), publicado in www.dgsi.pt: não é pelo facto de os consumidores dos produtos ou serviços oferecidos, correspondendo o conteúdo contratual, ser dirigido a um universo de potenciais contratantes poder ser por estes influenciado, que arreda a qualificação de um certo contrato como contrato de adesão. (...) O facto de o contraente que propõe contratos cujas cláusulas são predispostas por si, consentir na negociação de algumas, não exclui que se trate de contrato de adesão: o que importa é saber se o aderente pode negociar as que lhes aprouver, pois se, desde logo, a sua margem de negociação está balizada, condicionada, pelo predisponente, estamos perante um quadro impositivo em que as cláusulas individuais só são contempladas pela opção do predisponente. Além disso, sempre importará considerar o contrato como um todo, atendendo ao quadro negocial padronizado, onde certamente existem cláusulas mais importantes e outras nem tanto, para saber quais as que consentem negociação individual. (...) Tudo vale por dizer que, constituindo o conteúdo essencial do contrato cláusulas fixas, de formulário, pré-elaboradas pela parte que as predispõe para negociação por adesão, mesmo que não exista impossibilidade absoluta de negociação, ainda aí se está perante um contrato de adesão, que não é descaracterizado pelo quantum que nele possa ingressar para acolher interesses próprios do contraente.
Corroborando este entendimento, sendo dispensáveis por supérfluos qualquer outro tipo de considerações ou justificativos adicionais, cumpre concluir que não assiste razão algum à recorrente quanto pretende excluir o presente contrato denominado Manutenção OM da sua inevitável e devida subordinação ao regime legal das cláusulas contratuais gerais que lhe é, indiscutivelmente, aplicável.
Com efeito, ainda que possa existir alguma abertura da predisponente para a eventual cedência pontual numa circunstância contratual qualquer, tal não afasta a constatação de que o núcleo essencial do negócio se encontra efectivamente pré-elaborado por esta e que, no contexto comercial específico da dita negociação em massa, verifica-se nele a inegável predominância da estipulação das cláusulas gerais que salvaguardam antecipadamente o exclusivo interesse de quem as elaborou, com o seu premeditado sentido e alcance.
Passemos, portanto e de seguida, no âmbito desse enquadramento jurídico, à análise da validade das cláusulas contratuais gerais ora em discussão.
1 - Cláusula 5.5.2: Independentemente do direito à indemnização por mora estipulado em 5.5.1, sempre que haja incumprimento do presente contrato por parte do cliente, e nomeadamente quando se verifique mora no pagamento de quaisquer quantias devidas à OT... por mais de 30 dias, poderá esta resolver o presente contrato, sendo-lhe devida uma indemnização por danos, no valor da totalidade das prestações do preço previstos até ao termo do prazo contratado para contratos com duração até cinco anos, no valor de 50/prct. das prestações do preço para contratos com a duração de 5 a 10 anos e no valor de 25/prct. do peço para contratos com a duração entre 10 a 20 anos. e cláusula 5.7.4 que Uma vez que a natureza, âmbito e duração dos serviços contratados é elemento conformante da dimensão da estrutura empresarial OT..., em caso de denúncia antecipada do presente contrato pelo CLIENTE, a OT... terá direito a uma indemnização por danos, que será imediatamente faturada, no valor da totalidade das prestações do preço previstas até ao termo do prazo contratado para contratos com duração até cinco anos, no valor de 50/prct. das prestações do preço para contratos com a duração de 5 a 10 anos e no valor de 25/prct. do preço para contratos com a duração entre 10 a 20 anos., consideradas inválidas essencialmente pela mesma ordem de razões jurídicas, o que implicará a sua apreciação conjunta no presente acórdão.
Apreciando:
Entendeu o juiz a quo que o sentido e alcance destas cláusulas, que estabelecem sanções indemnizatórias (cláusulas penais) para o caso de incumprimento definitivo do contrato, por motivos exclusivamente imputáveis ao cliente da Ré, configura um manifesto desequilíbrio e uma inequívoca desproporção em detrimento do aderente por, no seu dizer, não se atender ao momento em que ocorre o facto que faz cessar o contrato e bem assim às causas que podem determinar a denúncia antecipada do contrato, o que se traduzira num manifesto benefício para a Ré que, nada tendo a despender com o contrato, receberia de uma só vez a indemnização contratualmente prevista, o que é desproporcional e lesivo da boa fé.
Tais cláusulas contratuais gerais foram assim declaradas nulas por violação do artigo 19°, alínea c) do Decreto-lei n° 446/85, de 25 de Outubro, segundo o qual: são proibidas, consoante o quadro negociai padronizado, designadamente as cláusulas contratuais gerais que consagrem cláusulas penais desproporcionadas aos danos a ressarcir e em conformidade com o preceituado no artigo 12° do mesmo diploma legal.
Sobre esta mesma temática pronunciaram-se, entre outros, os seguintes arestos:
O acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14 de Dezembro de 2016 (relator Fonseca Ramos), publicado in www.dgsi.pt, proferido em sede de revista excepcional, com fundamento na relevância jurídica no sentido da melhor aplicação do direito, tal como se consigna no artigo 672°, n° 1, alínea a), do Código de Processo Civil, que analisou uma cláusula contratual com a mesma estrutura essencial da ora em discussão, diferenciando-se não obstante por aí se prever simplesmente que a indemnização devida à predisponente se reportava à totalidade das prestações do preço devidas até ao termo do prazo contratado.
Concluiu o Supremo Tribunal de Justiça que ...ao equiparar-se o cumprimento pontual à cessação do contrato em desrespeito pelo ali estabelecido, seja no caso de mora, seja no caso de denúncia antecipada, não se atende à vantagem económica que advém para o predisponente da cessação antecipada do contrato, introduzindo na equação económica do negócio uma injustificada acentuação da posição de supremacia do predisponente, sobretudo, por não atender ao momento, na vida do contrato, em que ocorre o facto que o faz cessar.
Afirmou-se, nessa medida, a nulidade da cláusula por violadora do artigo 19°, alínea c) da Lei das Cláusulas Contratuais Gerais e nos termos do disposto no artigo 12° do mesmo diploma legal.
O acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 9 de Novembro de 2017 (relatora Rosa Tching), publicado in www.dgsi.pt, debruçou-se sobre a validade de uma cláusula contratual geral com o exacto teor da ora em discussão.
Aí se deixou consignado:
...apesar de se aceitar que a denúncia antecipada do contrato de manutenção completa de elevadores da ré implica, seguramente, um dano é indiscutível que esse dano não se traduz, em regra, num prejuízo equivalente a 25/prct. do valor de todas as prestações devidas até ao final do contrato, tanto mais que existem gastos associados à contraprestação do disponente que nunca serão realizados.
E, sendo assim, dúvidas não restam que a aplicação da cláusula 5.7.4. conduzirá sempre a uma superioridade manifesta da indemnização em relação ao montante dos danos normalmente previsíveis.
Conclui-se, portanto, pela nulidade da cláusula por violação do disposto no artigo 19°, alínea c), do Decreto-lei n° 446/85, de 25 de Outubro.
O acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 9 de Dezembro de 2014 (relator Martins de Sousa), publicitado in www.dgsi.pt, apreciou a validade de uma cláusula contratual geral (8.2.) que previa que: Este contrato pressupõe a existência de uma estrutura de meios humanos e stock de peças dedicados à sua execução durante o seu período de vigência, a rescisão antecipada por parte do cliente obrigará o mesmo ao pagamento imediato dos meses em falta até ao seu termo, multiplicados pelo valor mensal do serviço de manutenção em vigor à data da rescisão.
O aresto considerou que tal cláusula violava o artigo 19°, alínea c), do Decreto-lei n° 446/85, de 25 de Outubro, uma vez que: da sua aplicação resultaria o pagamento pelo cliente/aderente da totalidade das prestações correspondentes aos meses do contrato em que este já cessou, sem a contraprestação do serviço pela ré que, para além disso, também ficaria beneficiada por receber de uma só vez e em antecipação ao que estava previsto.
O acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20 de Dezembro de 2017 (relator Olindo Geraldes), publicitado in www.jusnet.pt, versando uma cláusula contratual de teor exactamente idêntico à que está agora em discussão, decidiu a este propósito:
...a cláusula 7.4. estabelece uma cláusula penal, em caso de denúncia antecipada do contrato.
Não obstante o valor nela fixado, a recorrida apenas pediu o correspondente a 25/prct., nomeadamente a quantia de € 6.466,24 (cfr. 298), como se refere no acórdão recorrido.
Face ao valor concreto do pedido, a título de cláusula penal, é manifesto que a cláusula 7.4. do contrato acaba por não se mostrar desproporcionada, tendo em consideração a razão de ser da fixação do prazo para a denúncia do contrato, já anteriormente explicitada.
Com esta perspectiva, é manifesto que tal cláusula, não se revelando demasiado elevada ou excessivamente onerosa, podia ser utilizada, sem ofensa do disposto na alínea m) do n° 1 do artigo 22° do regime jurídico das Cláusulas Contratuais Gerais previsto no referido Decreto-lei n° 446/85.
Neste último aresto, porém, não se considerou nula a cláusula penal constante da cláusula contratual geral em referência que vinculava reciprocamente ambas as partes.
Ao invés, aceitou-se implicitamente a respectiva conformidade com o ordenamento jurídico.
Sobre esta mesma questão, e afirmando a invalidade das cláusulas contratuais em análise, basicamente pelas mesmas razões de fundo assinaladas, vide ainda:
O acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 24 de Novembro de 2015 (relator Tomé Ramião), publicitado in www.jusnet.pt.
O acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 19 de Janeiro de 2016 (relator Rui Vouga), publicado in www.dgsi.pt.
O acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 29 de Novembro de 2016 (relator Gouveia Barros), publicitado in www.jusnet,pt.
O acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 9 de Dezembro de 2015 (relator Ilídio Sacarrão Martins), publicitado in www.jusnet.pt.
O acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 27 de Maio de 2014 (relatora Maria Adelaide Domingos), publicado in www.dgdi.pt.
Cumpre agora tomar posição:
Já tivemos a oportunidade de assumir, em momento anterior, posição sobre esta matéria, em acórdão subscrito pelo ora relator e a ora desembargadora 1ª adjunta, com o voto de vencida da desembargadora 2a adjunta.
Concluímos, nessa ocasião, pela validade de uma cláusula contratual geral com características essencialmente semelhantes à que se encontra ora em apreciação.
É claro que tal circunstância não nos impediria de, reponderando a questão jurídica em análise e sendo sensível à corrente jurisprudencial entretanto firmada e respectivas consequências práticas, optar por inverter o nosso veredicto neste tocante.
Seria perfeitamente normal.
Não nos parece, contudo, que tal deva acontecer, face à discordância que mantemos relativamente ao argumentário sistematicamente explanado em sentido adverso.
Com efeito, não obstante o elevado respeito e consideração que nos merecem as decisões do Supremo Tribunal de Justiça, bem como dos Tribunais da Relação, e a corrente jurisprudencial majoritária que no seu seio se vai paulatinamente formando, não vislumbramos razões substantivas bastantes para alterar o nosso (convicto) entendimento, especialmente perante os contornos específicos e singulares revelados pela factualidade apurada nos presentes autos.
Vejamos:
Está em causa, neste ponto, a pretensa invalidade, por preenchimento da previsão do artigo 19°, alínea c), do Decreto-lei n° 446/85, de 25 de Outubro, da cláusulas 5.5.2 e 5.7.4, ínsitas no contrato sub judice.
Poder-se-á referir genericamente, em termos de enquadramento desta temática, que o regime (longinquamente) introduzido no sistema jurídico português pelo Decreto-Lei n° 446/85, de 25 de Outubro, com as alterações através de diplomas subsequentes - Decreto-Lei n.° 220/95, de 31 de Agosto, 249/99, de 7 de Junho e 323/2001, de 17 de Dezembros - (Regime Jurídico das Cláusulas Contratuais Gerais, vulgo RJCCG ), teve como principal objectivo a protecção e defesa do aderente nos contratos integrados por cláusulas negociais gerais, prosseguindo um princípio acentuadamente tutelador que tomou por referência a entidade categorial do sujeito do consumo”, contraente em princípio mais fraco e vulnerável no comércio dos denominados negócios em massa, em contraponto com o unilateral e tendencialmente impressivo poder de estipulação contratual da entidade que define os termos oferecidos a uma generalidade de possíveis e indeterminados interessados.
Essa tutela justificou-se na medida em que nos encontraríamos perante instrumentos negociais que revestem a natureza de contratos de adesão, traduzindo uma disciplina minuciosamente gizada, em bloco e em série, que foi elaborada de antemão pela proponente, com o carácter de alguma imutabilidade e rigidez, tendendo, no seu essencial, a não ser objecto de modificação relevante ou significativa.
Este tipo de negociação, pela sua natureza e características, surgia como restritivas da liberdade de negociação e estipulação do destinatário, colocando sistematicamente em confronto, por um lado, empresas de grande envergadura (bancos, seguradoras, financiadoras, prestadoras de serviços de considerável dimensão empresarial, etc.) e, por outro, o cidadão comum, consumidor de bens e serviços, fortemente enredado pela necessidade quotidiana de os obter e facilmente seduzido pela facilidades/ comodidades tão habilidosamente propagandeadas numa sociedade de mercado de cariz vincadamente consumista.
De salientar ainda que o eixo fulcral de todo este sistema assentava e assenta basicamente no princípio da boa fé, enquanto reitor do controlo do conteúdo, em íntima articulação com o escopo que com este se intenta alcançar .
Ora, a conformação com o princípio geral da boa fé exige, neste âmbito, a tentativa de reposição possível da igualdade entre os contraentes, afastando, desde logo, o clausulado que constitua um significativo entorse para o equilíbrio contratual, que sistematicamente desfavorecia, penalizando, o incauto aderentelo.
Relativamente à análise das cláusulas contratuais gerais a sindicar, como se refere no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 9 de Setembro de 2014 (relator Gabriel Catarino), publicado inwww.dgsi.pt: a interpretação a fazer há-de pautar-se e orientar-se por critérios objectivos e distanciados, o invés do que deveria acontecer se o controlo da cláusula decorresse de um contrato individualizado a que se tivessem aposto cláusulas predispostas.
A este mesmo propósito, cumpre atentar em que o controlo a exercer sobre o conteúdo das cláusulas contratuais gerais parte da premissa fundamental de que há que distinguir, cindindo-as claramente, as circunstâncias que envolvem a concretização de um acordo negocial pessoalizado, encetado entre sujeitos situados no mesmo plano, com igual liberdade para discutir e impor os seus interesses particulares, e em que os respectivos termos são devidamente caracterizados, escalpelizados e explicados aos destinatários, relativamente ao que acontece nas cláusulas não negociadas, traduzidas na densa inserção de estipulações abstractas -prosseguidas exclusivamente a favor e em benefício do proponente -, no âmbito dos denominados contratos de adesão, propagandeados em massa e pré-elaborados de maneira a gerarem notórias dificuldades quanto ao completo e esclarecido entendimento do seu verdadeiro alcance por parte do aliciado consumidor.
É isso que faz, no fundo, toda a diferença.
A validade das cláusulas em referência terá que ser aferida perante o contexto específico e global deste tipo de contrato, tendo em conta natureza da actividade da proponente e as especificidades do negócio.
Conforme se salienta no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21 de Março de 2006 (relator Alves Velho), publicado in Colectânea de Jurisprudência/STJ, Ano XIV, tomo I, pags. 145 a 147 :
O juízo valorativo sobre a proibição das cláusulas tem de se operar em função das cláusulas tomadas na sua globalidade e de acordo com a generalidade dos padrões considerados, na sua compatibilidade e adequação ao ramo ou sector da actividade negocial a que pertencem , excluindo-se uma justiça do caso concreto, como resulta da aludida referência ao quadro negocial padronizado (vide Pinto Monteiro, Cláusula Penal e Indemnização , 594 ).
Sobre esta matéria, e versando agora a situação que nos ocupa, não se levanta qualquer tipo de dúvida de que as cláusulas gerais vertidas no contrato sub judice foram predispostas unilateralmente pela proponente, actuando no fenómeno da negociação em massa, com inerente prejuízo ou, pelo menos, alguma afectação para a liberdade de estipulação que assiste ao consumidor aderente.
Trata-se, naturalmente, de um dos muitos contratos-tipo que a A., empresa de assistência e manutenção de elevadores, celebra com uma enorme variedade de interessados, através de um clausulado essencial pré-definido, tendencialmente rígido e inflexível naquilo que a empresa proponente considere verdadeiramente essencial para a defesa dos seus interesses e estratégias comerciais.
Debruçando-nos sobre a situação que concretamente nos ocupa, verifica-se ser sobejamente conhecida a diversa jurisprudência que considera abstractamente, praticamente em todo e qualquer circunstancialismo, a nulidade de uma cláusula contratual geral com este conteúdo essencial, enquadrando-a sem mais na previsão da alínea c) do artigo 19.°, do decreto-lei n.° 446/85, de 25 de Outubro.
(neste sentido, e para além dos arestos citados supra, vide ainda acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 5 de Maio de 2016 (relator Salazar Casanova), publicado in www.dgsi.pt; acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 30 de Junho de 2015 (relatora Anabela Luna da Carvalho), publicado in www.dgsi.pt; acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 30 de Junho de 2011 (relatora Fátima Galante), publicado in www.dgsi.pt; acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 6 de Fevereiro de 2008 (relatora Fátima Galante), publicado in www.dgsi.pt).
Vejamos:
Na situação sub judice, existe desde logo a importante particularidade de nos encontrarmos perante uma acção inibitória intentada pelo Ministério Público, nos termos e ao abrigo do artigo 26°, n° 1, alínea c), do Decreto-lei n° 446/85, de 25 de Outubro, que tem por única referência e base exclusiva a mera apresentação e leitura da proposta negocial, sem haver concreta notícia da verificação de qualquer efectiva exigência abusiva por parte da Ré, na posição de credora das prestações devidas pelo incumprimento contratual do seu cliente.
Ou seja, não estamos perante um caso de concreta aplicação pela Ré, nos termos contratuais firmados, da sanção indemnizatória consubstanciada na dita cláusula penal, mas antes no plano puramente teórico, genérico e hipotético do eventual perigo para os interesses do consumidor/aderente que a mesma é susceptível, à partida e potencialmente, de revelar.
Curiosamente, não foi feito uso pelo Ministério Público do expediente previsto no n° 2 do artigo 27°, do mesmo diploma legal, como seria mister, de molde a prevenir que, procedendo a presente acção de inibição contra esta única empresa, não exista a possibilidade desta Ré vir a ser colocada, no contexto de uma ramo de actividade fortemente concorrencial e competitivo, em situação objectiva de irrecusável desfavor relativamente às empresas congéneres que pratiquem e se aproveitem exactamente do mesmo tipo de clausulado (não abrangido pelo efeitos de uma eventual decisão condenatória proferida nestes autos).
Neste sentido e pressuposto, umas empresas poderão (até ver) aplicar tal tipo de clausulado; a Ré, considerada individualmente, é que não.
Por outro lado, a procedência do pedido nesta acção inibitória tem como pressuposto fundamental que o funcionamento da cláusula em análise, tomado abstractamente, redunde forçosamente, por via da sua natureza e estrutura típica, no sacrifício injusto e juridicamente intolerável dos interesses atendíveis dos clientes da Ré, em toda e qualquer situação.
Ou seja, existirá sempre, em termos abstractamente configurados, uma penalização do aderente incumpridor para além do razoável e, por isso mesmo, abusiva e inaceitável pelo ordenamento jurídico.
É isso que está intrinsecamente na base da presente acção inibitória, justificando-a e obrigando processualmente o peticionante (Ministério Público) a realizar positivamente tal demonstração, fora de qualquer dúvida ou hesitação.
Ora, entendemos não ser legítimo retirar, para a globalidade de toda e qualquer hipotética situação, o carácter forçosamente desproporcionado da cláusula penal em referência relativamente danos que importará, através dela, ressarcir.
Ao invés, tal valoração, perante as cláusulas contratuais descritas, deverá ser realizada em concreto, individualmente, caso a caso, concluindo-se, ou não, que na situação particular analisada, se verifica efectivamente um desequilíbrio sensível entre os danos previsíveis e expectáveis sofridos pela prestadora de serviços e o valor pecuniário, resultante do funcionamento da cláusula penal, que os deverá razoavelmente cobrir.
Com fundamento na simples leitura das cláusulas 5.5.2 e 5.7.4., tal como as mesmas se encontram estruturadas, constitui, a nosso ver, um exercício de algum pré-convencimento ou pressuposição desacompanhada de factos justificadores, a afirmação peremptória e conclusiva de que a indemnização resultante do seu funcionamento é, em qualquer situação, manifestamente desproporcionada ao ressarcimento dos prejuízos sofridos pela contraente fiel.
Por outro lado, o entendimento contrário ao que ora se propugna parece não tomar em consideração e fazer relevar - como é suposto - a verdadeira natureza e função associadas à figura da cláusula penal (artigo 810° do Código Civil), instituto absolutamente corrente e aceite sem qualquer rebuço pelo ordenamento jurídico.
Cumpre não olvidar que a empresa R., contando legitimamente com a duração do contrato a que ambos os celebrantes se vincularam, teve necessariamente que fazer os necessários e inerentes investimentos em pessoal, organização e disponibilização meios, o que implicou evidentemente uma gestão programada da sua agenda de clientes (recusando porventura outras propostas que entretanto lhe surgissem), a qual pressupunha naturalmente a vigência contratual livremente aceite por ambos os contraentes.
Note-se ademais, neste caso particular e com particular relevo para a decisão final a proferir, que o contrato sub judice é um contrato denominado OM, ou seja, de Manutenção Completa, o que significa que a ora Ré se obriga perante o cliente, além do mais, a:
- assegurar que todos os trabalhos serão realizados por técnicos seus, devidamente formados e apoiados por auditores nacionais e internacionais;
- à realização de uma calendarização de inspecções, com a efectuação de todos os trabalhos de conservação, ajustes e substituição de cada componente, com base nas suas características técnicas e o seu uso.
- à realização de uma visita especial de dois em dois anos, a fim de proceder a um exame periódico e completo do equipamento, com especial atenção para os aspectos de segurança e qualidade.
- à realização de visitas especiais, a fim de prestar a assistência que seja requerida pela Câmara Municipal, ao abrigo do Decreto-lei n° 320/ 2002.
- à assunção da responsabilidade de reparações originadas pelo uso normal do equipamento, incluindo a substituição de uma grande variedade de equipamentos, com a garantia da utilização de equipamentos genuínos e de qualidade.
De notar outrossim que o elenco das obrigações colocadas sobre a empresa de prestação deste tipo de serviços encontra-se legal e imperativamente definido no Decreto-lei n° 320/2002, de 28 de Dezembro, com a última alteração legislativa operada através da Lei n° 65/2013, de 27 de Agosto, referindo no respectivo artigo 5°, n° 1, alínea b), que se destina a: manter a instalação em boas condições de segurança e funcionamento, incluindo a substituição ou reparação de compoentes, sempre que se justificar.
No Anexo II - B, números 5 a 8, do citado diploma encontram-se discriminados todos os serviços que devem ou podem fazer parte do contrato de manutenção completa.
O que significa, como se compreende, que não podem restar dúvidas de que a Ré terá que proceder a um avultado esforço na manutenção e reforço de stocks, bem como de formação de pessoal, para se encontrar tecnicamente apta a dar resposta, pronta e eficaz, às diversas exigências que o contrato lhe impõe perante o seu cliente, sendo certo que, atendendo à natureza dos serviços em causa, relacionados com o funcionamento, em segurança, de elevadores, designadamente em prédios destinados à habitação, as mesmas, não se compadecem, de forma alguma, com delongas ou protelamentos para além do estritamente indispensável.
Neste sentido, a quebra imprevista e injustificada do contrato, constituindo uma frontal violação do princípio pacta sund servanda (cfr. artigo 406°, n° 1, do Código Civil), gerará sempre óbvios, objectivos e indiscutíveis prejuízos patrimoniais para a empresa cumpridora, com imediatos e reais reflexos para a sua esfera jurídica, como aliás não pode deixar de ser.
Olvidar esta evidência - ou pretender desvalorizar ou minimizar a expressão pecuniária desses forçosos e reais prejuízos - é contradizer a realidade dos factos, tendo em especial consideração que nos encontramos perante um contrato do tipo Manutenção Completa.
A natural imprevisibilidade e a indefinição do montante indemnizatório exacto e adequado ao ressarcimento devido, que competiria à lesada provar, podem ser efectivamente salvaguardadas, através da prévia e antecipada fixação de uma cláusula penal que a dispensa desse ónus - nem sempre fácil de satisfazer.
Em contrapartida - e equilibrando a posição relativa de ambos os contraentes -, a mesma cláusula penal serve para definir, balizando, o valor indemnizatório que o lesante poderia ter que suportar, assegurando-o e garantindo-o relativamente a uma quantificação que poderia não prever, nem antever objectivamente, no momento em que decidiu, por sua iniciativa, incumprir o contrato.
O lesante não será chamado a pagar mais, no plano indemnizatório, do que resultará do funcionamento da cláusula penal vigente.
A este propósito convém não olvidar que, conforme argutamente se evidencia no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12 de Junho de 2007 (relator João Camilo), publicado in www.dgsi.pt: ...o valor da cláusula (penal) deve ser, em regra, de valor superior aos danos a ressarcir, sob pena de frustrar a finalidade compulsória referida.
No mesmo sentido, se assinalou no acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 27 de Novembro de 2014 (relator Tomé Ramião), publicado in www.dgsi.pt: ...a citada alínea c) do artigo 19° do LCCG exige que a cláusula seja desproporcionada aos danos a ressarcir, ou seja, tem que existir uma desproporção sensível e flagrante entre o montante da pena convencionada e o montante dos danos a reparar, sendo insuficiente a mera superioridade face aos danos a reparar que, provavelmente, em face das circunstâncias típicas e segundo o normal decurso das coisas, o predisponente venha a sofrer.
De resto, ao interromper, sem a alegação de qualquer motivo justificativo, o contrato vigente entre os contraentes, não pode ignorar o aderente estar a infringir, com culpa, o estabelecido contratualmente e que daí decorrem necessariamente prejuízos para a empresa A.
É, portanto, objectiva, insofismável e inegável essa obrigação de indemnizar.
Ora, a fulminante invalidade destas cláusulas contratuais gerais, tendo apenas por referência o seu teor literal e abstracto e porventura o pré-convencimento do seu carácter excessivo e desproporcionado - ignorando as singularidades e particularidades do caso concreto -, teria por surpreendente e nefasto efeito, relativamente aos contratos vigentes, deixar um incumprimento contratual deliberado, frontal e assumido, sem qualquer tipo de sanção ou compensação a atribuir ao contraente fiel, com inegável benefício do infractor, empurrando-se aquele, inesperadamente, para a sempre complicada prova de prejuízos que a cláusula penal pretendeu, precisa e avisadamente, dispensar.
O resultado real prático decorrente da decisão judicial de obstar à validade deste tipo de cláusula contratual (que prevê avisadamente um regime diferenciado consoante o momento temporal em que se dá a rotura injustificada do relacionamento contratual) - numa postura porventura hiperprotectora, como se os adquirentes de um serviço de assistência e manutenção de elevadores, legalmente regulado através do Decreto-lei n° 320/2002, de 28 de Dezembro, com a sua última alteração operada através da Lei n° 65/2013, de 27 de Agosto, e nos dias de hoje em que a informação ao público reveste um carácter de ampla e pormenorizada difusão, com enorme facilidade de acesso, não dispusessem de condições psicológicas mínimas e naturais para alcançarem razoavelmente o significado e consequência da sua assumida e deliberada vinculação - é o de aniquilação prática do direito do credor a exigir uma cláusula penal estabelecida no contexto contratual em apreço, relativamente aos contratos já celebrados, designadamente há largos anos.
Ou seja, em vez de se permitir a fixação de um critério claro e objectivo que torne fácil e previsível a quantificação dos prejuízos, constituindo um importante factor eficazmente persuasivo contra a quebra injustificada dos vínculos contratuais, deixa-se o credor lesado - a empresa de fornecimento de serviços de assistência e manutenção de elevadores - a zeros em termos de definição dos prejuízos sofridos.
Uma vez abandonado o contrato por parte do cliente, sem nenhuma razão justificativa, seria sempre a empresa em causa obrigada a fazer valer os seus direitos através de acção judicial, suportando os riscos da prova da quantificação dos prejuízos - objectivos e inegáveis - que sofreu com o acto de desvinculação ilícita com que se viu inesperadamente confrontada.
Não se alcança, finalmente, como seja possível assegurar intelectualmente, em todas as situações e no plano puramente abstracto, que o montante resultante do funcionamento desta concreta cláusula penal não se aproximará, na prática do caso concreto real, dos prejuízos efectivamente sofridos pela empresa Ré, levando por isso a concluir que se trata de um caso de sensível e injusta desproporção prevenida na alínea c) do artigo 19° do Decreto-lei n° 446/85, de 25 de Outubro.
É fácil afirmá-lo com a segurança de quem se dispensa, para toda e qualquer situação, de o justificar devidamente, como se tratasse de uma evidência - que afinal não se evidencia através de factos.
Salvo o devido respeito por entendimento contrário, tal solução não se nos afigura curial do ponto de vista jurídico.
Acrescente-se que, a nosso ver, não devem merecer acolhimento os habituais argumentos de que a Ré afinal ainda sai beneficiada por deixar de suportar gastos futuros com o cumprimento do contrato abrupta e injustificadamente interrompido pelo seu cliente, contra a sua vontade e contra os ditames gerais que presidem à boa fé no cumprimento dos negócios jurídicos, e de que, afortunadamente, acaba, através do funcionamento da cláusula penal, por receber imediatamente a totalidade do montante indemnizatório em causa.
Este último argumento não resiste à constatação de que nos encontramos perante a figura de uma verdadeira e própria cláusula penal.
Logo, a verba fixada a este título só pode mesmo ser exigida imediatamente e de uma só vez, como é lógico.
Não se trata de qualquer privilégio ou benefício extravagante.
Em qualquer caso comum e vulgar de funcionamento de cláusula penal é o que sucede, sem que tal circunstância possa causar a menor estranheza ao jurista com ela minimamente familiarizado.
Quanto ao primeiro argumento: o facto de a Ré passar a não ter de prestar assistência técnica em favor do incumpridor contratual é o resultado directo e imediato do incumprimento exclusivamente imputável a este e não desejado por aquela.
Não pode ser visto, sob qualquer perspectiva, e em termos logicamente contraditórios, como um surpreendente benefício para o contraente interessado no cumprimento do prazo contratualmente definido.
Trata-se, antes e simplesmente, de uma frustração de um ganho projectado e legitimamente acalentado pela parte que se dispõe a respeitar, como deve, escrupulosamente, os termos contratuais.
E nessa medida, esse mesmo prejuízo (dano contratual negativo) é igualmente protegido pelo âmbito da própria cláusula penal previamente definida, sem que contribua para a tornar inadequada ou indigna da tutela jurídica que normalmente se associa a qualquer cláusula desta mesma natureza.
Por tudo isto, concluímos pela validade destas cláusulas contratuais. A apelação procede neste tocante.
Acrescente-se, ainda e finalmente, que é claro e insofismável que, caso a caso, ponderados os contornos singulares da situação em análise, poderá sempre vir a ser suscitada a manifesta desproporção da cláusula penal perante os prejuízos efectivamente sofridos pela contraente fiel, a apreciar nos termos gerais do artigos 811° e 812° do Código Civil.
Ou seja, o aderente estará, nestas circunstâncias, sempre devidamente protegido pelo sistema jurídico contra o funcionamento de cláusulas penais manifestamente desproporcionados, caso o sejam, aquilatadas caso a caso, com a prova desse concreto desequilíbrio, nos termos da aplicação das normas substantivas do direito civil, em geral, se necessário com recurso à sua redução com base em princípios de equidade.
Encontrar-se-á, por essa via, uma solução casuisticamente adequada, equilibrada e justa.
2 - Cláusula 5.6./5.9: Na situação de eventual incumprimento imputável à OT... é expressamente aceite que a OT... apenas responderá até à concorrência do valor de três meses de faturação OT... do presente contrato, como máximo de indemnização a pagar ao cliente..
Neste ponto, afigura-se-nos assistir razão ao juiz a quo.
Esta cláusula contratual geral ofende frontalmente, e em qualquer situação, o disposto no artigo 18°, alínea b) do regime das cláusulas contratuais gerais definido pelo Decreto-lei n° 446/85, de 25 de Outubro.
Sobre este ponto, perfilha-se inteiramente o entendimento desenvolvidamente explanado no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14 de Dezembro de 2016 (relator Fonseca Ramos), publicado in www.dgsi.pt.
De resto, não se compreende a razão de ser da fixação desta limitação genérica, aplicável a todas e quaisquer situações, da responsabilidade da empresa prestadora dos serviços, que a favorece exclusivamente, tanto mais que a mesma se encontra devidamente salvaguardada pela fixação da cláusula penal por si predisposta - que é, a nosso ver e pelos motivos supra indicados, plenamente válida.
Há, portanto, neste perspectiva, uma situação de óbvio desequilíbrio a que importa pôr cobro, inclusivamente em termos preventivos e profiláticos.
É inconcebível a justificação para este insólito plafond indemnizatório que defende unilateral e discriminatoriamente a Ré, ainda que os danos em apreço, atenta a sua fonte da responsabilidade (contratual ou extracontratual) se venham a revelar de expressão monetária muitíssimo superior, em contrapondo com a salvaguarda da cláusula penal que a proponente reservou - e bem - para si própria.
Conforme se refere impressivamente no acórdão citado: A limitação da responsabilidade do predisponente, nos termos constantes da cláusula 5.6. em apreciação (que tem o contudo e alcance daquela que se encontra aqui em discussão), viola o artigo 18°, c), por limitar sem qualquer critério que permita fazer um juízo de justa proporção entre a sua conduta em termos de culpa, nas modalidades referidas (dolo e culpa grave por contraponto a culpa leve e levíssima) e os danos resultantes do seu incumprimento para o aderente: a manter-se tal estipulação, fosse qual fosse a magnitude dos danos para o aderente - danos directos e indirectos a indemnizar pela teoria da diferença nos termos do artigo 562° a 564° do Código Civil -, e a modalidade da sua actuação culposa, a indemnização a pagar não excederia, em caso algum, três meses de facturação. Se pensarmos que o evntual incumprimento do contrato pode gerar responsabilidade não apenas contratual, é patente que a cláusula não pode manter-se, também por violar, patentemente, as regras da boa fé.
Esta afirmação é por si absolutamente insofismável, impondo a concordância total com a decisão recorrida e a rejeição do argumentário exposto em sentido adverso na presente apelação.
Manter-se-á, por conseguinte, a decisão recorrida neste ponto, naufragando a apelação interposta pela Ré.
3 - O segmento da parte final da cláusula 5.1.2. que refere A OT... não se responsabiliza pelo funcionamento dos elevadores quando verificar que quaisquer estranhos intervieram, tentativamente ou não, na resolução do equipamento. Sempre que tal se verifique, a OT... poderá cancelar de imediato as suas responsabilidades contratuais, ficando o CLIENTE obrigado ao pagamento da totalidade das prestações do preço previstas até ao final do contrato.
Neste ponto, entendemos não conceder razão à recorrente.
Com efeito, a própria cláusula contratual geral, tomada abstractamente, prevê uma situação de patente e injusta onerosidade para o aderente, com o correspondente e injustificado benefício para a predisponente.
Note-se que a situação genérica e abstractamente prevista na cláusula contratual geral pode levar a que, uma situação de simples tentativa de intervenção na resolução do equipamento, ainda que obviamente censurável mas sem nenhuma consequência prática digna de registo, proporcione à OT... a possibilidade de receber todas e cada uma das prestações relativas ao cumprimento integral do contrato, deixando o cliente, nestas circunstâncias, sem acesso aos serviços de vital importância para o seu quotidiano e obrigado a suportar o sacrifício patrimonial respeitante ao pagamento do o preço previsto até ao final do contrato (que poderá acontecer a longo prazo).
Isto é, sem ter a empresa de manutenção e assistência de elevadores de suportar qualquer relevante e efectivo prejuízo e sem desenvolver qualquer outro esforço ou actividade em benefício do cliente, poderá arrecadar a predisponente todos os proveitos associados a um cumprimento integral do contrato, qualquer que fosse a sua efectiva duração.
É patente a violação dos princípios gerais de boa fé e equilíbrio contratual que rege nesta matéria.
Há aqui, em qualquer situação e sob qualquer justificação, um nítido abuso e desequilíbrio leonino, em favor da predisponente, que o ordenamento jurídico não pode manifestamente acolher e chancelar.
Diferentemente do que se verificava aquando da análise da cláusula penal prevista para o rompimento unilateral e injustificado do vínculo contratual pelo cliente da Ré, prevê-se aqui uma generalidade amplíssima de situações, inclusive de diminuta gravidade - pense-se nos casos em que não se verificou o mais pequeno prejuízo para o equipamento em causa -, em que uma culpa levíssima do aderente daria automaticamente lugar à obrigação do pagamento de todas as prestações contratuais.
Isto sem que o cliente da Ré, porventura escrupulosamente cumpridor das obrigações contratuais gerais, revelasse o menor indício em não querer cumprir todas as prestações vindouras, estando disposto a usufruir dos serviços daquela até ao termo contratual previsto.
Ou seja, um pecado meramente venial cometido pelo cliente poderia, através desta cláusula contratual geral demasiado aberta e abrangente, ser penalizado, indiscriminadamente, com uma severidade profundamente inadequada e substantivamente injusta e iníqua, unicamente segundo os comandos e interesses da predisponente, para a qual se tornaria aliás particularmente conveniente do ponto de vista de vantagem patrimonial objectiva.
Trata-se, pois, de uma cláusula abusiva, quiçá absurda, susceptível de gerar graves iniquidades.
Nada há a censurar neste particular, pelo que a decisão recorrida deverá manter-se.
Improcede, neste ponto, a apelação.
4 - A cláusula 5.9, onde se dispõe: Para todas as questões eventualmente emergentes da aplicação e/ou interpretação do presente Contrato, serão competentes os foros da Comarca de Lisboa ou de Sintra, com expressa renúncia a quaisquer outros.
Nesta matéria, entendemos pura e simplesmente subscrever o entendimento expresso no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20 de Janeiro de 2010 (relator Salazar Casanova), com remissão para o acórdão uniformizador de jurisprudência n° 12/2007, de 18 de Outubro de 2007 (relator Salvador da Costa), publicado no Diário da República n° 235, Série I, de 6 de Dezembro de 2007, e com por via dessa fundamentação essencial, concordar com o decidido em 1ª instância.
Nenhuma outra justificação adicional se justifica ou se impõe face à clareza dos fundamentos consignados no citado aresto.
Alega, ainda, a recorrente que:
Admitindo que esta acção era julgada procedente (ainda que no seu âmbito agora mais restrito que já tem), a sua publicidade não é obrigatória (basta o seu registo, o qual cumpre - só por si - a sua função de consulta e publicidade);
O A. sabe que, com ou sem publicidade, a OT... acata a decisão (tanto que nem requereu a proibição provisória, nem a fixação de uma sanção pecuniária compulsória, no âmbito da aplicação do RJCCG), sendo, obviamente, dispensável;
E, em todo o caso, a publicidade tem um efeito devastador para o apetecido ataque da concorrência à carteira da OT..., coisa que facilmente se depreende que vai acontecer indelevelmente (sobretudo num período de crise, em que se acena o preço e, estando os clientes da OT... livres para saírem a todo o momento sem sanção, assim o farão...);
Apreciando:
A lei prevê no artigo 30°, n° 2, do Decreto-lei n° 446/85, de 25 de Outubro, que, desde que requerido pelo A., possa a Ré vir a ser condenada a dar publicidade à proibição, pelo tempo que o tribunal determinar.
A este propósito, o A. solicitou a condenação do Réu a dar publicidade à decisão condenatória.
O juiz a quo deferiu tal pretensão, determinando a condenação do Réu a dar publicidade a esta sentença no prazo de quinze dias após o seu trânsito em julgado, mediante publicação de anúncio em dois jornais diários de maior tiragem editado em Lisboa e no Porto, em três dias consecutivos, de tamanho correspondente a metade da página, comprovando-o nos autos.
Fê-lo, alicerçado na seguinte ordem de razões:
11...a publicidade tem um fim imediato que se exprime na proibição de inclusão em contratos onde constam e em futuros contratos, dirigida ao infrator, e bem assim de protecção ao consumidor/aderente que, pela via da publicação da decisão judicial, fica informado e pode fazer a sua opção de modo a não contratar com quem predispõe cláusulas proibidas.
Invoca, para esse efeito, o acórdão do Supremo Tribunal Judicial de 14 de Dezembro de 2016 (relator Fonseca Ramos), onde se enfatiza que: a publicidade da decisão que proíbe cláusulas em acção inibitória tem uma função cívica, informativa, dirigida à protecção dos consumidores, pelo que só razões muito excepcionais (não se conhecem decisões nesse sentido) determinariam que se omitisse a publicidade.
No mesmo sentido, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 9 de Dezembro de 2014 (relator Martins de Sousa), aludiu a que a publicitação da decisão judicial condenatória funcionará como um instrumento que exercerá função dissuassora da utilização futura de cláusulas nulas, quer na vertente pedagógica, quer de informação dos sujeitos que recorrem às empresas para a satisfação das suas necessidades.
Não se vislumbra motivo algum para divergir desta posição assumida pelo Supremo Tribunal de Justiça que milita precisamente no sentido da melhor protecção dos interesses dos consumidores, contribuindo para o cabal esclarecimento destes e para uma atitude mais responsável e ponderada por parte das empresas que se dedicam à negociação em massa, as quais certamente não estarão interessadas em dar motivo a este tipo de publicidade negativa.
Não se acolhe, portanto, a argumentação expendida pela recorrente em sentido contrário.
Procede, portanto, apenas parcialmente, a presente apelação.
IV - DECISÃO:
Pelo exposto, acordam os Juizes desta Relação em julgar parcialmente procedente a apelação, alterando-se a decisão recorrida, revogando a declaração de invalidade da cláusula contratual geral relativamente às cláusula 5.5.2: Independentemente do direito à indemnização por mora estipulado em 5.5.1 sempre que haja incumprimento do presente contrato por parte do cliente, e nomeadamente quando se verifique mora no pagamento de quaisquer quantias devidas à OT... por mais de 30 dias, poderá esta resolver o presente contrato, sendo-lhe devida uma indemnização por danos, no valor da totalidade das prestações do preço previstos até ao termo do prazo contratado para contratos com duração até cinco anos, no valor de 50/prct. das prestações do preço para contratos com a duração de 5 a 10 anos e no valor de 25/prct. do peço para contratos com a duração entre 10 a 20 anos.
e
5.7.4/5.12., relativamente ao último segmento: Independentemente do direito à indemnização por mora estipulado em 5.5.1, sempre que haja incumprimento do presente contrato por parte do cliente, e nomeadamente quando se verifique mora no pagamento de quaisquer quantias devidas à OT... por mais de 30 dias, poderá esta resolver o presente contrato, sendo-lhe devida uma indemnização por danos, no valor da totalidade das prestações do preço previstos até ao termo do prazo contratado para contratos com duração até cinco anos, no valor de 50/prct. das prestações do preço para contratos com a duração de 5 a 10 anos e no valor de 25/prct. do peço para contratos com a duração entre 10 a 20 anos., confirmando no restante a decisão recorrida.
Custas, na proporção de 2/3 (dois terços) pela apelante.
Lisboa, 11 de Setembro de 2018.
Luís Espírito Santo
Conceição Saavedra
(Cristina Coelho (vencida) - Votei vencida porquanto perfilho o entendimento do tribunal recorrido, e teria confirmado a sentença recorrida na sua totalidade).
V - Sumário elaborado nos termos do artigo 663°, n° 7, do Cod. Proc. Civil.
I - Ainda que possa existir alguma abertura da predisponente para a eventual cedência pontual numa circunstância contratual qualquer, tal não afasta a constatação de que o núcleo essencial do negócio se encontra efectivamente pré-elaborado por esta e que, no contexto comercial específico da dita negociação em massa, verifica-se nele a inegável predominância da estipulação das cláusulas gerais que salvaguardam antecipadamente o exclusivo interesse de quem as elaborou, com o seu premeditado sentido e alcance, pelo que tal contrato se encontra subordinado ao regime das cláusulas contratuais gerais estabelecido pelo Decreto-Lei 446/85, de 25 de Outubro e alterações legislativas subsequentes.
II - No âmbito de uma acção inibitória intentada pelo Ministério Público, nos termos e ao abrigo do artigo 26°, n° 1, alínea c), do Decreto-lei n° 446/85, de 25 de Outubro, que tem por única referência e base exclusiva a mera apresentação e leitura da proposta negocial, sem haver concreta notícia da verificação de qualquer efectiva exigência abusiva por parte da Ré, na posição de credora das prestações devidas pelo incumprimento contratual do seu cliente, a procedência do pedido tem como pressuposto fundamental que o funcionamento da cláusula em análise, tomado abstractamente, redunde forçosamente, por via da sua natureza e estrutura típica, no sacrifício injusto e juridicamente intolerável dos interesses atendíveis dos clientes da Ré, em toda e qualquer situação.
III - A empresa prestadora de serviços de manutenção e assistência de elevadores, contando legitimamente com a duração do contrato a que ambos os celebrantes se vincularam, teve necessariamente que fazer os necessários e inerentes investimentos em pessoal, organização e disponibilização meios, o que implicou evidentemente uma gestão programada da sua agenda de clientes (recusando porventura outras propostas que entretanto lhe surgissem), a qual pressupunha naturalmente a vigência contratual livremente aceite por ambos os contraentes, especialmente quando se trata de um contrato denominado OM, ou seja, de Manutenção Completa, o que significa que a ora Ré se obriga perante o cliente, além do mais, a: assegurar que todos os trabalhos serão realizados por técnicos seus, devidamente formados e apoiados por auditores nacionais e internacionais; à realização de uma calendarização de inspecções, com a efectuação de todos os trabalhos de conservação, ajustes e substituição de cada componente, com base nas suas características técnicas e o seu uso; à realização de uma visita especial de dois em dois anos, a fim de proceder a um exame periódico e completo do equipamento, com especial atenção para os aspectos de segurança e qualidade; à realização de visitas especiais, a fim de prestar a assistência que seja requerida pela Câmara Municipal, ao abrigo do Decreto-lei n° 320/2002; à assunção da responsabilidade de reparações originadas pelo uso normal do equipamento, incluindo a substituição de uma grande variedade de equipamentos, com a garantia da utilização de equipamentos genuínos e de qualidade.
IV - Assim, num contrato denominado de Manutenção Completa, são válidas as cláusulas contratuais gerais que dispõem: 5.5.2: Independentemente do direito à indemnização por mora estipulado em 5.5.1, sempre que haja incumprimento do presente contrato por parte do cliente, e nomeadamente quando se verifique mora no pagamento de quaisquer quantias devidas à OT... por mais de 30 dias, poderá esta resolver o presente contrato, sendo-lhe devida uma indemnização por danos, no valor da totalidade das prestações do preço previstos até ao termo do prazo contratado para contratos com duração até cinco anos, no valor de 50/prct. das prestações do preço para contratos com a duração de 5 a 10 anos e no valor de 25/prct. do peço para contratos com a duração entre IO a 20 anos e 5.7.4/5.12., relativamente ao último segmento: Independentemente do direito à indemnização por mora estipulado em 5.5.1, sempre que haja incumprimento do presente contrato por parte do cliente, e nomeadamente quando se verifique mora no pagamento de quaisquer quantias devidas à OT… por mais de 30 dias, poderá esta resolver o presente contrato, sendo-lhe devida uma indemnizarão por danos, no valor da totalidade das prestações do preço previstos até ao termo do prazo contratado para contratos com duração até cinco anos, no valor de 50/prct. das prestações do preço para contratos com a duração de 5 a 10 anos e no valor de 25/prct. do peço para contratos com a duração entre 10 a 20 anos.,
V - A fulminante invalidade destas cláusulas contratuais gerais, tendo apenas por referência o seu teor literal e abstracto e porventura o pré-convencimento do seu carácter excessivo e desproporcionado - ignorando as singularidades e particularidades do caso concreto -, teria por surpreendente e nefasto efeito, relativamente aos contratos vigentes, deixar um incumprimento contratual deliberado, frontal e assumido, sem qualquer tipo de sanção ou compensação a atribuir ao contraente fiel, com inegável benefício do infractor, empurrando-se aquele, inesperadamente, para a sempre complicada prova de prejuízos que a cláusula penal pretendeu, precisa e avisadamente, dispensar.
VI - Não se alcança como seja possível assegurar intelectualmente, em todas as situações e no plano puramente abstracto, que o montante resultante do funcionamento desta concreta cláusula penal não se aproximará, na prática do caso concreto real, dos prejuízos efectivamente sofridos pela empresa Ré, levando por isso a concluir que se trata de um caso de sensível e injusta desproporção prevenida na alínea c) do artigo 19° do Decreto-lei n° 446/85, de 25 de Outubro.
VII - Ponderados os contornos singulares da situação em análise, poderá sempre vir a ser suscitada a manifesta desproporção da cláusula penal perante os prejuízos efectivamente sofridos pela contraente fiel, a apreciar nos termos gerais do artigos 811° e 812° do Código Civil, estando o aderente estará, nestas circunstâncias, sempre devidamente protegido pelo sistema jurídico contra o funcionamento de cláusulas penais manifestamente desproporcionados, caso o sejam, aquilatadas caso a caso, com a prova desse concreto desequilíbrio, nos termos da aplicação das normas substantivas do direito civil, em geral, se necessário com recurso à sua redução com base em princípios de equidade, encontrando-se, por essa via, uma solução casuisticamente adequada, equilibrada e justa.
VIII - É inválida a cláusula contratual geral onde se prevê: Na situação de eventual incumprimento imputável à OT... é expressamente aceite que a OT... apenas responderá até à concorrência do valor de três meses de faturação OT... do presente contrato, como máximo de indemnização a pagar ao cliente., na medida em que ofende frontalmente o disposto no artigo 18°, alínea b) do regime das cláusulas contratuais gerais definido pelo Decreto-lei n° 446/85, de 25 de Outubro, não sendo compreensível a razão de ser deste insólito plafond indemnizatório que defende unilateral e discriminatoriamente a Ré, ainda que os danos em apreço, atenta a sua fonte da responsabilidade (contratual ou extracontratual) se venham a revelar de expressão monetária muitíssimo superior, em contrapondo com a salvaguarda da cláusula penal que a proponente reservou - e bem - para si própria.
IX - É inválida a cláusula contratual geral onde se prevê: A OT... não se responsabiliza pelo funcionamento dos elevadores quando verificar que quaisquer estranhos intervieram, tentativamente ou não, na resolução do equipamento. Sempre que tal se verifique, a OT... poderá cancelar de imediato as suas responsabilidades contratuais, ficando o CLIENTE obrigado ao pagamento da totalidade das prestações do preço previstas até ao final do contrato, que, tomada abstractamente, prevê uma situação de patente e injusta onerosidade para o aderente, com o correspondente e injustificado benefício para a predisponente, podendo levar a que, uma situação de simples tentativa de intervenção na resolução do equipamento, ainda que obviamente censurável mas sem nenhuma consequência prática digna de registo, proporcione à OT... a possibilidade de receber todas e cada uma das prestações relativas ao cumprimento integral do contrato, deixando o cliente, nestas circunstâncias, sem acesso aos serviços de vital importância para o seu quotidiano e obrigados a suportar o sacrifício patrimonial respeitante ao pagamento do o preço previsto até ao final do contrato (que poderá ser longo), sem ter de suportar qualquer relevante e efectivo prejuízo e sem desenvolver qualquer outro esforço ou actividade em benefício do cliente, arrecadando a predisponente todos os proveitos associados a um cumprimento integral do contrato, qualquer que fosse a sua efectiva duração.
X - É inválida a cláusula contratual geral que prevê: Para todas as questões eventualmente emergentes da aplicação e/ou interpretação do presente Contrato, serão competentes os foros da Comarca de Lisboa ou de Sintra, com expressa renúncia a quaisquer outros.
XI - Justifica-se a condenção da Ré na publicação da sentença condenatória na acção inibitória que milita precisamente no sentido da melhor protecção dos interesses dos consumidores, contribuindo para um melhor esclarecimento destes e para uma atitude mais responsável e ponderada por parte das empresas que se dedicam à negociação em massa, as quais certamente não estarão interessadas em dar motivo a este tipo de publicidade negativa.