Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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 - ACRL de 27-11-2018   Dano corporal. Danos patrimoniais e danos não patrimoniais.
I. Dano corporal (ou dano biológico) consiste numa lesão na integridade do sujeito enquanto pessoa, na sua globalidade psicofísica; trata-se de dano real ou dano-evento do qual podem decorrer danos patrimoniais e/ou danos não patrimoniais, podendo os primeiros assumir feição de danos emergentes ou de lucros cessantes.
II. Quando, por causa do dano corporal, o lesado tem de desenvolver esforços suplementares para a realização das tarefas profissionais, apesar de o dano ser compatível com o exercício da atividade profissional habitual e não lhe ter determinado diminuição do salário, estamos em presença de uma decorrência danosa com valor patrimonial: a hora de um empregado que produz menos, porque carece de um esforço acrescido para produzir o mesmo, é mais barata que a de um que produz mais na mesma unidade de tempo; ainda que no presente não haja uma diminuição de salário, o dano corporal poderá ter influência na futura progressão no emprego bem como na obtenção de novos empregos. Estas circunstâncias constituem um dano presente e sobretudo futuro, com valor pecuniário.
III. O mesmo dano corporal pode gerar, e normalmente gera, danos de caráter não patrimonial merecedores de indemnização, entre os quais se contam o sofrimento físico e psíquico (angústia, tristeza, apreensão) por se ver impedido de andar e por andar com dificuldade e dor.
IV. Sendo os danos não patrimoniais insuscetíveis de quantificação, o seu ressarcimento tem uma função essencialmente compensatória: permitir ao lesado dispor de uma soma de dinheiro que lhe permita adquirir bens ou serviços que lhe deem alguma satisfação, compensando-o, ainda que sofrivelmente, pelo mal padecido, pelo que o seu quantitativo não pode ser meramente simbólico.
Proc. 932/13.6TBALQ.L1 7ª Secção
Desembargadores:  Higina Castelo - José Capacete - -
Sumário elaborado por Margarida Fernandes
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CONCLUSÃO - 27-11-2018
932/16.6TBALQ.L1
=CLS=
SUMÁRIO (ART. 663, N.º 7, DO CPC)
I. Dano corporal (ou dano biológico) consiste numa lesão na integridade do sujeito enquanto pessoa, na sua globalidade psicofísica; trata-se de dano real ou dano-evento do qual podem decorrer danos patrimoniais e/ou danos não patrimoniais, podendo os primeiros assumir feição de danos emergentes ou de lucros cessantes.
II. Quando, por causa do dano corporal, o lesado tem de desenvolver esforços suplementares para a realização das tarefas profissionais, apesar de o dano ser compatível com o exercício da atividade profissional habitual e não lhe ter determinado diminuição do salário, estamos em presença de uma decorrência danosa com valor patrimonial: a hora de um empregado que produz menos, porque carece de um esforço acrescido para produzir o mesmo, é mais barata que a de um que produz mais na mesma unidade de tempo; ainda que no presente não haja uma diminuição de salário, o dano corporal poderá ter influência na futura progressão no emprego bem como na obtenção de novos empregos. Estas circunstâncias constituem um dano presente e sobretudo futuro, com valor pecuniário.
III. O mesmo dano corporal pode gerar, e normalmente gera, danos de caráter não patrimonial merecedores de indemnização, entre os quais se contam o sofrimento físico e psíquico (angústia, tristeza, apreensão) por se ver impedido de andar e por andar com dificuldade e dor.
IV. Sendo os danos não patrimoniais insuscetíveis de quantificação, o seu ressarcimento tem uma função essencialmente compensatória: permitir ao lesado dispor de uma soma de dinheiro que lhe permita adquirir bens ou serviços que lhe deem alguma satisfação, compensando-o, ainda que sofrivelmente, pelo mal padecido, pelo que o seu quantitativo não pode ser meramente simbólico.
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa:
I. RELATÓRIO
J..., autor no processo identificado à margem, em que é ré A..., notificado da sentença proferida no dia 3 de junho de 2018 e com ela não concordando, interpôs o presente recurso.
O autor intentou a presente ação declarativa de condenação contra as rés AX..., redenominada A..., e Z..., pedindo a condenação da 1.ª Ré, ou, em alternativa, da 2.ª Ré, a pagar-lhe a quantia de € 30.000 (trinta mil euros), acrescida de juros de mora vincendos até integral e efetivo pagamento, correspondente aos danos patrimoniais e não patrimoniais, que computa, respetivamente, no montante de € 1.000 (mil euros) e de € 29.000 (vinte e nove mil euros), que alega ter sofrido na sequência do atropelamento de que foi vítima por um empilhador pertencente a AN..., segurada da 1.ª Ré, que assumiu os riscos inerentes à exploração da sua atividade pela apólice n.º 0..., e cujo condutor trabalhava por conta e sob a direção de P..., que transferiu a responsabilidade emergente de acidentes para a 2.ª Ré pela apólice n.º 00....
Citada, a 1.ª Ré apresentou contestação, sem colocar em crise a ocorrência do sinistro e a responsabilidade do condutor do empilhador pela sua eclosão, precisou ter-se tratado simultaneamente de acidente de viação e de trabalho, assim como que à data dos factos vigorava um contrato de seguro do ramo responsabilidade civil empresarial titulado pela apólice indicada que incluía, entre outros, os riscos de exploração, celebrado com AN... com o capital máximo garantido relativamente ao risco em referência de € 250.000 sujeito a uma franquia de 10/prct. com o mínimo de € 250, impugnando, por desconhecimento, os danos patrimoniais e considerando excessivo o montante peticionado a título de danos não patrimoniais, concluindo pela improcedência parcial da ação.
A 2.ª Ré, por seu turno, na contestação apresentada, negou que a referida P... fosse sua segurada ou que o empilhador estivesse por si seguro.
Invocou, todavia, que por contrato de seguro celebrado com o autor, titulado pela apólice n.º 00... do ramo de acidentes de trabalho para trabalhadores independentes, este transferiu para si a responsabilidade pelos encargos obrigatórios decorrentes de acidente de trabalho em consequência do exercício da sua atividade profissional por conta própria, que a ré satisfez, na sequência da participação do sinistro em causa e do processo especial de acidente de trabalho que correu termos, estando excluídos os danos ora reclamados do âmbito das garantias conferidas pelo aludido contrato, e mesmo que assim não fosse teriam de ser reclamadas no referido processo, concluindo dever ser absolvida do pedido.
Mais deduziu a fls. a 2.ª Ré incidente de intervenção espontânea contra a 1.ª Ré, pretendendo fazer valer um direito próprio, paralelo ao do autor, pedindo a condenação da referida ré no reembolso das quantias despendidas que satisfez ao seu segurado, autor na ação, ao abrigo do contrato de seguro de acidentes de trabalho mencionado, em consequência dos prejuízos sofridos por aquele subsequentes ao evento em discussão nos autos que imputa a culpa exclusiva do condutor do empilhador seguro na 1.ª Ré.
O incidente de intervenção foi rejeitado.
O processo seguiu os habituais termos e, após audiência final, foi proferida sentença com o seguinte dispositivo:
«Pelo exposto e decidindo, julgo a ação parcialmente procedente, por parcialmente provada, e, em consequência, condeno a 1.ª Ré A..., a pagar ao autor, J..., a título de indemnização por danos patrimoniais, a quantia de €4.500,00 (quatro mil e quinhentos euros), acrescida de juros de mora, à taxa legal anual, desde a data da citação até integral pagamento.
Mais condeno a 1.ª Ré a pagar ao autor, a título de indemnização por danos não patrimoniais, a quantia de €3.500,00 (três mil e quinhentos euros), acrescida de juros de mora, à taxa legal anual, a contar do trânsito em julgado da sentença.
No mais peticionado, vai a 1.ª Ré absolvida.
Absolvo a 2.ª Ré, Z..., do pedido formulado pelo autor.»
Com o valor da indemnização por danos de natureza não patrimonial não se conforma o autor que recorre, concluindo:
«1.ª - Tendo em conta o estado em que o Autor se encontra e tudo pelo que passou, a condenação da Ré a título de danos não patrimoniais afigura-se demasiado baixa.
2.ª - Ficou provado em sede de perícia médico-legal singular realizada no processo referido em 20 que o autor-sinistrado ficou afetado de uma IPP de 16,5/prct., grau de incapacidade.
3.ª - O autor ficou a padecer das sequelas anátomo-funcionais que causam sofrimento físico, apresentando um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica com o coeficiente de desvalorização de 3 (três) pontos, configurando a cicatriz descrita um dano estético permanente, que se cifra no grau 2 (dois) numa escala de sete graus de gravidade crescente.
4.ª - O quantum doloris, tal como definido no relatório de exame pericial de avaliação do dano corporal de fls. 306 e segs. na tabela nacional para avaliação de incapacidades permanentes em Direito Civil constante do anexo II do D.L n.º 352/2007, de 23 de Outubro, sofridos pelo autor, se cifra no grau 3 (três) numa escala de sete graus de gravidade crescente.
5.ª - Como resultou provado o acidente e o que com ele adveio, provocou angústia, tristeza, inquietude e nervosismo no autor, vivenciando um estado de nervos e de agastamento após o sucedido.
6.ª - Na apreciação, em sede de recurso, a indemnização peticionada por danos não patrimoniais, estando em causa um critério de equidade, esta mais próxima de realidade em que vivemos.
7.ª - Concluindo, não concordando com o valor atribuído, pensamos que a indemnização por danos não patrimoniais, face à gravidade do caso, deve ser elevada para o valor peticionado, acabando-se de uma vez com as indemnizações miserabilistas atribuídas na grande maioria dos casos.»
A recorrida A... contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso.
Foram colhidos os vistos e nada obsta ao conhecimento do mérito.
OBJETO DO RECURSO
Sem prejuízo da apreciação de eventuais questões de conhecimento oficioso, são as conclusões das alegações de recurso que delimitam o âmbito da apelação (arts. 635, 637, n.º 2, e 639, n.ºs 1 e 2, do CPC).
Tendo em conta o teor daquelas, a questão que se coloca é a de saber se deve ser aumentado o valor da indemnização por danos de natureza não patrimonial.
II. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
A 1.ª instância considerou na sua decisão os seguintes factos (que o recorrente não discute):
1. No dia 17 de julho de 2012, pelas 12h00, nas instalações fabris de AN... sitas em Cabanas do Chão, no âmbito da atividade de inspetor de qualidade externo que desenvolvia por conta própria para B...
quando inspecionava sacos de farinha e ração para animais a fim de os mesmos serem carregados para um contentor marítimo e ao proceder à selagem deste último, o autor foi atropelado por um empilhador que recuava, pertencente a AN... e conduzido por P..., sem cuidar de se certificar que o podia fazer em segurança.
2. A 1.ª Ré e AN... celebraram o contrato de seguro do Ramo Responsabilidade Civil Empresarial titulado pela apólice n.º 0..., junta a fls. 69, cujo teor se tem por integralmente reproduzido, em vigor à data do evento mencionado, incluindo, entre outros, os riscos de Exploração, com o capital máximo garantido relativamente ao risco em referência de € 250.000 (duzentos e cinquenta mil euros), sujeito a uma franquia Tipo 33 de 10/prct. do valor dos danos resultantes de lesões materiais, no mínimo de € 250 (duzentos e cinquenta euros).
3. A 2.ª Ré, Z... e o autor celebraram o contrato de seguro do ramo acidentes de trabalho para trabalhadores independentes mediante o qual o autor transferiu a responsabilidade pelos encargos obrigatórios decorrentes de acidente de trabalho ocorridos com o próprio autor em consequência do exercício da sua atividade profissional por conta própria, titulado pela apólice n.º 00..., junta a fls. 37 e segs. cujo teor se tem por integralmente reproduzido.
4. O evento descrito em 1 foi participado pelo autor à ré Z... nos termos constantes do escrito de fls. 54 e que, no âmbito da apólice referida em 3, assumiu os encargos com o tratamento e a recuperação do autor.
5. O autor sofreu traumatismo do pé direito decorrente do evento referido em 1, com fratura da diáfise do 2.º metatársico à direita, pequena ferida do 3.º e 4.º espaços, pequeno desvio e ligeiro edema.
6. O autor foi transportado pelos bombeiros para o Hospital de Vila Franca de Xira onde foi assistido no Serviço de Urgência tendo sido submetido a exame radiológico ao pé direito e efetuada imobilização com tala gessada do pé direito, com alta na mesma data e indicação para deambular com apoio de duas canadianas, efetuar repouso com pé elevado e mobilizar dedos, medicado com anti-inflamatórios e referenciado para os serviços clínicos da 2.ª ré e Centro de Saúde.
7. O autor foi seguido nos serviços clínicos da 2.ª ré.
8. Na sequência das lesões decorrentes do evento referido em 1, o autor:
8.1. A 18-7-2012 foi observado no Centro de Saúde de Artemisa e referenciado para os serviços clínicos da 2.ª Ré;
8.2. A 20-7-2012 foi observado nos serviços clínicos da 2.ª Ré e dada indicação para cirurgia e referenciado para a Clínica M…;
8.3. A 23-7-2012 foi submetido a intervenção cirúrgica na ClínicaT… por fratura diafisária do 2.º metatársico direito, com posterior imobilização e indicação para descarga do referido membro;
8.4. A 24-8-2012 foi reavaliado apresentando radiograma de controlo com sinais de consolidação e melhoria clínica, foi retirado o fio tutor da fratura e removida a imobilização, apresentando melhores condições de pele, com escara em cicatrização na zona de flictena;
8.5. A 14-9-2012 apresentava escara da região dorsal do pé na zona onde se formou a flictena dorsal, apresentando ainda escara em cicatrização embora de forma muito retardada dadas as condições deficitárias de microcirculação periférica;
8.6. A 3-10-2012 foi dada indicação para início de treino da marcha com apoio parcial do pé direito, mantendo pensos;
8.7. A 19-10-2012 apresentava escara da região dorsal do pé com melhor evolução;
8.8. A 30-11-2012 foi dada indicação para reiniciar atividade profissional, em regime de ITP de 30/prct. [parâmetro laboral];
8.9. A 14-12-2012 foi referido que iniciou ITP com alguma dificuldade, apresentando úlcera do dorso do pé a necessitar manutenção do tratamento;
8.10. A 4-1-2013 a ITP passou a 20/prct. [parâmetro laboral], mantendo tratamento com pensos;
8.11. A 25-1-2013 ocorreu a consulta de Alta apresentando pequena ulceração residual que não cicatriza em consequência de se encontrar em zona de pele prejudicada por deficit vascular associada à sua patologia metabólica de base – diabetes;
8.12. A 5-2-2013 foi observado no Centro de Saúde por diabético com fratura do pé enviado pelo Ortopedista para análises por descompensação da diabetes e dificuldade em cicatrizar úlcera na perna;
8.13. A 11-2-2013 foi dada Alta dos serviços clínicos da 2.ª Ré com valoração proposta de 4/prct. pelo Cap. II 1.5 b) do Anexo I da Tabela Nacional de Incapacidades (TNI), multiplicada pelo fator de bonificação 1,5 perfazendo uma IPP total de 6/prct.;
8.14. A 25-6-2013 foi submetido a Junta Médica no Tribunal do Trabalho apresentando cicatriz com aspeto distrófico e observado pé cavo e hallux desviado em valgo, apresentando subjetivos dolorosos ao nível das metatarsofalângicas do pé direito;
8.15. A 13-7-2014 foi observado em consulta no Centro de Saúde de que consta ter efetuado fisioterapia por trinta dias tendo melhorado;
8.16. A 13-8-2014 foi observado em Consulta no Centro de Saúde apresentando ferida no 5.º dedo do pé esquerdo dolorosa que agrava com repouso e perna alta, mas também como movimento. Dor tipo queimadura, dor neuropática – úlcera crónica da pele – 5.º dedo pé esquerdo.
9. Em consequência das lesões descritas em 5., decorrentes do evento mencionado em 1., o autor apresentou no pé direito:
9.1. Cicatriz atrofiada condicionando retração, hipopigmentada, grosseiramente curvilínea com convexidade virada para o 1.º dedo, medindo 4,5 cm de comprimento, na face dorsal entre o 2.º e 3.º metatarsos;
9.2. Agravamento sintomático da metatarsalgia por consolidação viciosa do 2.º metatársico com desvio de 10º em varus.
10. O autor apresentou um défice funcional temporário total situado em 17-7-2012 e entre 23-7-2012 e 24-7-2012, fixável em 3 (três) dias.
11. O autor apresentou um défice funcional temporário parcial situado entre 18-7-2012 e 22-7-2012 e entre 25-7-2012 e 11-2-2013, fixável num período de 207 (duzentos e sete) dias.
12. O défice funcional temporário mencionado em 11, apresentou repercussão temporária na atividade profissional total no período situado entre 177-2012 e 30-11-2012, num total de 137 (cento e trinta e sete dias) e apresentou repercussão temporária na atividade profissional parcial entre 1-12-2012 e 11-22013, num total de 73 (setenta e três) dias.
13. O autor sofre de dores físicas intermitentes, sendo o quantum doloris, tal como definido no relatório de exame pericial de avaliação do dano corporal de fls. 306 e segs. e na Tabela Nacional para Avaliação de Incapacidades Permanentes em Direito Civil constante do anexo II do D.L. n.º 352/2007, de 23 de outubro, sofrido pelo autor, se cifra no grau 3 (três) numa escala de sete graus de gravidade crescente.
14. Como consequência do descrito em 5, o autor ficou a padecer das sequelas anátomo-funcionais referidas em 9, que causam sofrimento físico, apresentando um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica com o coeficiente de desvalorização de 3 (três) pontos, configurando a cicatriz descrita um dano estético permanente, que se cifra no grau 2 (dois) numa escala de sete graus de gravidade crescente.
15. Do relatório preliminar do exame pericial de avaliação do dano corporal em direito civil do serviço de clínica forense da Delegação do Sul do Instituto Nacional de Medicina Legal (INML) de 28-7-2015 junto a fls. 199, extrai-se, além do referido em 9.1., em sede de ‘exame objetivo’: «(...) apresenta marcha normal, sem apoio nem claudicação»; «membro inferior direito: pé cavo bilateralmente; (...) Mobilidades da articulação tibiotársica e ante pé mantidas e simétricas; Rigidez das articulações metatarsicofalângicas e interfalângicas de todos os dedos do pé direito e do pé esquerdo, mais marcadas no pé direito; calosidade marcada na cabeça do 5.º metatarso do pé direito; consegue andar em bicos de pés e calcanhares; com o pé apoiado no chão, os dedos dos pés não apoiam no chão».
16. Do Relatório de exame pericial complementar de Ortopedia da Delegação do Sul do INML de 15-10-2015 junto a fls. 221-221 verso extrai-se, além do referido em 9.2.: «(...) Sem claudicação da marcha. Apresenta pé calvo bilateralmente com calosidades plantares sob as cabeças dos 1.º, 2.º, 3.º e 5.º metatársicos direitos e 1.º, 2.º e 5.º à esquerda. Cicatriz estrelada, tretráctil no 1.º espaço interdigital direito (face dorsal), não facilmente ulcerável. Garra em todos os dedos do pé direito e no 5.º dedo do pé esquerdo. Palpação indolor do dorso do pé direito. Alterações tróficas com hiperpigmentação e rarefação pilosa nos membros inferiores. Considerando que os dedos em garra e a calosidade plantar com metatarsalgia fazem parte da história natural de um pé cavo, apenas se considera como sequela do foro ortopédico um ligeiro agravamento sintomático da metatarsalgia por consolidação viciosa do 2.º metatársico com desvio de 10º em varus. (...)».
17. Do Relatório de exame pericial de avaliação do dano corporal em direito civil do serviço de clínica forense da Delegação do Sul do Instituto Nacional de Medicina Legal (INML) de 7¬9-2017, junto a fls. 306 e segs. Extrai-se, ainda, em sede de ‘antecedentes’: «Pessoais. Antecedentes patológicos e/ou traumáticos relevantes para a situação em apreço: - AVC aos 55 anos, com sequelas de diminuição da acuidade visual bilateral (maior à direita) e epilepsia; - Diabetes mellitus tipo II; - Hipertensão arterial; - Hérnia discal lombar, operada em 1990; - Patologia arterial, referenciado por médico de família para consulta de Cirurgia Vascular do Hospital Egas Moniz. Última consulta em março de 2017 e a próxima amanhã (06-09-2017). Internamentos em Cirurgia Vascular em janeiro e em fevereiro de 2017, tendo sido submetido a 4 intervenções cirúrgicas, entre as quais amputação transmetatársica do pé direito em fevereiro. Em julho de 2017 iniciou fisioterapia ao membro inferior direito, pelo SNS, no Hospital da Cruz Vermelha; - Medicação habitual atual: Metformina, Ácido Valpróico, Perindropil + Amlopidina, Esomeprazol, Glicazida, Gabapentina, Tromalyt, Atorvastatina, Xarelto».
18. Do relatório indicado em 17, em sede de ‘exame objetivo’, extrai-se o seguinte: «(...) apresenta-se a exame usando calçado do pé direito adaptado com palmilha de preenchimento com enchimento da parte anterior do sapato. Marcha descalço sem apoio, com claudicação. Membro inferior direito: «Status pós intervenções por Cirurgia Vascular com: Cicatriz com vestígios de sutura, vertical, violácea, com área de retração e ligeiramente aderente aos planos moles no seu terço superior, na região inguinal, com 9,5 cm de comprimento; Cicatriz linear, com vestígios de sutura, no terço superior da face anterior da coxa, com 2 cm de comprimento; Quatro cicatrizes lineares, com vestígios de sutura, distribuídas no mesmo plano vertical, na face medial do membro, localizadas do terço superior da coxa ao terço superior da perna, que medem, de cima para baixo, 6,5 cm, 6,5 cm, 7,5 cm e 5,5 cm de comprimentos; Cicatriz com vestígios de sutura, vertical, no terço inferior da face medial da coxa, localizada à frente das anteriormente descritas, com 9 cm de comprimento;
«Status pós amputação transmetatársica do pé direito, com coto bem almofadado, com cicatriz linear terminal, com 13 cm de comprimento; Cicatriz linear, hipocrómica, com vestígios de sutura, no dorso do pé, perpendicular à anteriormente descrita e em continuidade com mesma no seu terço medial, com 1,5 cm;
«Cicatriz vestigial, hipocrómica, irregular, no dorso do pé, sobre o 2.º metatársico, de eixo maior sagital, com 3,5 cm de comprimento;
«Queixas disestésicas no coto de amputação, que refere serem mais evidentes nas extremidades medial e lateral do mesmo;
«Mobilidade dos joelhos simétrica, dentro das amplitudes normais;
«Limitação na mobilidade do tornozelo, efetuando 10º de flexão dorsal (18º à esquerda) e 20º de extensão plantar (30º à esquerda)».
19. Mais se extrai do referido relatório pericial no âmbito da discussão e conclusões ao nível dos danos permanentes que: «- O examinando foi submetido a cirurgia com amputação transmetatársica do pé direito, consequente a complicação de patologia natural vascular arterial, não relacionável com o evento em apreço. – O procedimento cirúrgico recaiu sobre a região das sequelas resultantes do acidente em apreço, não sendo possível avaliar as mesmas atualmente, exceto por dados documentais. – Em condições normais, não fosse a referida intercorrência clínica, as sequelas decorrentes do evento estariam ainda presentes. (...)»
20. Por sentença de 12-7-2013, junta a fls. 55 e segs., cujo teor se tem por integralmente reproduzido, proferida na ação especial emergente de acidente de trabalho que correu termos pelo Tribunal do Trabalho de Vila Franca de Xira sob o n.º 117/… instaurada pelo autor contra a ré Z..., foi fixada ao autor uma Incapacidade Permanente Parcial para o trabalho em 6/prct. e a ré condenada a pagar-lhe o capital de remição de uma pensão anual e vitalícia de € 661,48 (seiscentos e sessenta e um euros e quarenta e oito cêntimos), devida desde 12 de fevereiro de 2013, acrescido de juros de mora sobre o capital de remição, à taxa legal desde aquela data até efetivo pagamento, sem prejuízo de serem consideradas as quantias já pagas ao sinistrado, e a quantia de € 50,00 (cinquenta euros) por deslocações suportadas pelo sinistrado.
21. Em sede de perícia médico-legal singular realizada no processo referido em 20, foi considerado que o autor-sinistrado ficou afetado de uma IPP de 16,5/prct., grau de incapacidade que teve em consideração o fator de bonificação de 1,5 previsto no ponto 5 al. a) das instruções gerais da TNI, nos termos do relatório junto a fls. 19 e segs. e do capítulo I da sentença mencionada em 20.
22. Do capítulo I da sentença mencionada em 20., extrai-se, ainda que: «Foi requerida a realização de perícia por junta médica, nos termos dos arts. 117.º, n.º 1, al. b) e 138.º, n.º 2 do CPT, que atribuiu, por unanimidade, ao autor sinistrado, uma IPP de 6/prct.».
23. A ré Z..., nesse âmbito, ao abrigo da apólice indicada em 3, satisfez ao autor:
23.1. Indemnizações por incapacidade temporária para o trabalho, no período compreendido entre 18-7-2012 e 11-2-2013, de acordo com os valores de retribuição declarados por este;
23.2. Despesas de transporte e alimentação nas deslocações necessárias para tratamentos e recuperação do autor por este reclamadas;
23.3. Despesas médicas, medicamentosas e hospitalares necessárias para tratamentos e recuperação do autor.
24. O descrito provocou angústia, tristeza, inquietude e nervosismo no autor, vivenciando um estado de nervos e de agastamento após o sucedido.
III. APRECIAÇÃO DO MÉRITO DO RECURSO
A situação litigiosa inicia-se com o atropelamento do lesado por uma máquina empilhadora conduzida ao serviço de entidade que tinha transferido para a 1.ª ré a responsabilidade civil emergente da sua atividade.
O facto ilícito e culposo não está em discussão, os danos produzidos também não, nem tão-pouco o nexo causal entre o primeiro e parte dos segundos.
Penetrando mais a fundo nos factos, resumindo e reorganizando os acima provados referentes aos danos:
- Com o atropelamento, ocorrido em 17/07/2012, o autor sofreu traumatismo do pé direito, com fratura da diáfise do 2.º metatársico à direita, pequena ferida do 3.º e 4.º espaços, pequeno desvio e ligeiro edema; foi transportado para o hospital, de onde saiu no mesmo dia, com tala gessada do pé direito e indicação para deambular com apoio de duas canadianas, efetuar repouso com pé elevado e mobilizar dedos, e medicado com anti-inflamatórios.
- Três dias depois, em 20/07/2012, foi observado nos serviços clínicos da 2.ª Ré e dada indicação para cirurgia.
- Mais três dias após, em 23/07/2012, foi submetido a intervenção cirúrgica pela fratura diafisária do 2.º metatársico direito, com posterior imobilização e indicação para descarga do referido membro.
- A partir daí, o autor ficou com uma escara, úlcera, ferida que não sarou devido a deficit vascular associado a doença prévia de diabetes.
- Apenas em 03/10/2012, teve indicação para iniciar o treino da marcha; e só em 30/11/2012 teve indicação para retomar a atividade profissional com ITP de 30/prct., que a 04/01/2013 passou a 20/prct.; em 11/02/2013 teve alta dos serviços clínicos da 2.ª Ré com valoração proposta de IPP total de 6/prct.; 6/prct. foi também a IPP que acabou por ser atribuída em junta médica no âmbito do processo por acidente de trabalho (apesar de em perícia singular no âmbito do mesmo processo lhe ter sido atribuída IPP de 16,5/prct., como refere).
- A ferida nunca sarou e as dores nunca passaram (quantum doloris de 3 em 7).
- Acabou por sofrer quatro cirurgias no pé direito, entre elas uma amputação transmetatársica do pé direito, em fevereiro de 2017. Sucede que, conforme relatório pericial (facto 19), a amputação transmetatársica do pé direito terá sido consequente a complicação de patologia natural vascular arterial, não relacionável com o acidente dos autos. Mas, lê-se também no mesmo relatório e facto, que o procedimento cirúrgico recaiu sobre a região das sequelas resultantes do acidente em apreço, e que, se não fosse a referida intercorrência clínica, as sequelas decorrentes do evento estariam ainda presentes.
- Provado ficou, ainda, que o descrito provocou angústia, tristeza, inquietude e nervosismo no autor, vivenciando um estado de nervos e de agastamento após o sucedido.
Estes os factos essenciais.
Relembramos que o autor não impugnou a decisão sobre a matéria de facto, nomeadamente não pôs em crise a falta de nexo de causalidade adequada entre a amputação de 2017 e o acidente dos autos, ocorrido em 2012 (facto 19).
O autor tinha pedido uma indemnização de € 30.000, sendo € 1.000 por danos patrimoniais (essencialmente, roupa estragada, despesas médicas e medicamentosas), e € 29.000 por danos não patrimoniais.
Em 1.ª instância foram julgados não provados os danos para os quais foi pedida indemnização de € 1.000, mas foram atribuídos € 4.500 por dano biológico ali qualificado como patrimonial. A título de danos não patrimoniais foi atribuída indemnização de € 3.500. Desta discorda o apelante.
Quid juris?
Tradicionalmente, os danos subsumem-se numa das seguintes categorias jurídicas: danos patrimoniais, ou de natureza patrimonial, e danos não patrimoniais, ou de natureza não patrimonial (também designados, danos morais, embora, de acordo com certa nomenclatura, os morais também sejam tidos apenas como uma parcela dos não patrimoniais).
Entre os danos patrimoniais distinguimos o dano emergente e o lucro cessante: o primeiro compreende o prejuízo causado nos bens ou direitos existentes na titularidade do lesado à data da lesão; o segundo, os benefícios que o lesado deixou de obter por causa do facto ilícito, mas que ainda não tinha na sua titularidade à data da lesão.
De há uns anos a esta parte tem sido trabalhada a noção de dano corporal ou dano biológico para designar lesões na integridade do sujeito enquanto pessoa, na sua globalidade psicofísica. O dano corporal ou biológico é um dano real ou dano-evento, pelo que se situa num patamar mais elevado e a montante dos danos-consequência, sendo estes últimos que são suscetíveis de se reconduzir às categorias antes referidas. A classificação que opõe danos patrimoniais e danos não patrimoniais reporta-se, portanto, apenas, aos danos-consequência. Sobre o conceito de dano biológico no direito português, nomeadamente a sua adoção pela jurisprudência, v. Maria da Graça Trigo, «Adopção do conceito de “dano biológico” pelo direito português», ROA, Ano 72, I (jan-mar de 2012), pp. 147-178. A Autora defende e conclui, com o que concordamos, que «O dano biológico, sendo um dano real ou dano-evento, não deve, em princípio, ser qualificado como dano patrimonial ou não patrimonial, mas antes como tendo consequências de um e/ou outro tipo; e também por isso, em nosso entender, o dano biológico não deve ser tido como um dano autónomo em relação à dicotomia danos patrimoniais/danos não patrimoniais» (p. 177).
Como dano-evento que é, do dano biológico podem decorrer danos patrimoniais e/ou danos não patrimoniais, podendo os primeiros assumir feição de danos emergentes ou de lucros cessantes.
O dano biológico pode refletir-se de várias maneiras na esfera patrimonial do lesado:
- Pode provocar uma diminuição efetiva da remuneração porque o lesado produzirá menos e, por via disso, receberá menos;
- Pode, alternativamente, sem provocar perda efetiva de remuneração (pelo menos imediata e face à relação laboral ou profissional vigente), impor ao lesado um esforço acrescido para manter o nível de produtividade anterior ao dano.
Para além destas duas situações, em conjunto com alguma delas ou isoladamente, o dano corporal pode causar ao lesado dificuldades acrescidas em atos correntes do dia-a-dia. É relativamente a esta decorrência que se tem colocado a questão de saber se se trata de dano patrimonial ou de dano não patrimonial.
Como quer que se entenda, o dano corporal pode ter também, e normalmente tem, (outros) reflexos não patrimoniais.
No preâmbulo do DL 352/2007, de 23 de outubro – que aprovou uma nova Tabela Nacional de Incapacidades por Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais, aprovando, ainda, a primeira Tabela de Avaliação de Incapacidades Permanentes em Direito Civil – encontramos alusão às realidades acabadas de referir:
«A avaliação médico-legal do dano corporal, isto é, de alterações na integridade psicofísica, constitui matéria de particular importância. Mas também de assinalável complexidade. Complexidade que decorre de fatores diversos, designadamente da dificuldade que pode existir na interpretação de sequelas, da subjetividade que envolve alguns dos danos a avaliar (...). Mas complexidade que resulta também da circunstância de serem necessariamente diferentes os parâmetros de dano a avaliar consoante o domínio do direito em que essa avaliação se processa (...). No Direito Laboral, por exemplo, está em causa a avaliação da incapacidade de trabalho resultante de acidente de trabalho ou doença profissional que determina perda da capacidade de ganho, enquanto que no âmbito do Direito Civil, e face ao princípio da reparação integral do dano nele vigente, se deve valorizar percentualmente a incapacidade permanente em geral, isto é, a incapacidade para os atos e gestos correntes do dia a dia, assinalando depois e suplementarmente o seu reflexo em termos da atividade profissional específica do examinando».
Foi a decorrência do dano corporal enquanto dano patrimonial futuro consistente nos esforços acrescidos que o lesado tem de desenvolver nas suas atividades gerais que o tribunal a quo indemnizou com € 4.500. Este aspeto não está em discussão.
Além da indemnizada vertente, o dano biológico comporta danos de natureza não patrimonial indemnizáveis ao abrigo do disposto no art. 496, n.º 1, do CC, quando pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.
Estão aqui em causa as dores sofridas, durante muitos meses, o sofrimento moral por não poder andar durante muito tempo e, depois, por o fazer com dificuldade, o sofrimento que isso implica decorrente de não poder realizar tarefas e atividades, necessárias ou de lazer, o sofrimento pelo tempo desperdiçado em hospitais e tratamentos, o sofrimento que as dificuldades acrescidas na realização das atividades do dia-a-dia produz. Contam, ainda, a angústia, tristeza, inquietude e nervosismo, a vivência de «um estado de nervos» e de agastamento após o sucedido, como descrito no último facto. Note-se que o autor esteve cerca de dois meses e meio sem andar e mais quatro meses com incapacidade parcial inicial (início desses 4 meses após os dois e meio sem andar) de 30/prct. e final de 6/prct. aquando da alta.
A questão que se coloca é a da medida da indemnização adequada a estes danos – o tribunal a quo arbitrou € 3.500.
Não sendo os danos não patrimoniais suscetíveis de quantificação, o seu ressarcimento tem uma função essencialmente compensatória: permitir ao lesado dispor de uma soma de dinheiro que lhe permita adquirir bens ou serviços que lhe deem alguma satisfação, compensando, ainda que sofrivelmente, o mal padecido. O montante pecuniário será fixado com recurso à equidade, tendo em atenção o grau de culpabilidade do agente, a sua situação económica e a do lesado, e as demais circunstâncias do caso (art. 494, ex vi do art. 496, n.º 4, ambos do CC).
No caso dos autos a responsabilidade funda-se em mera culpa e o lesado é de mediana condição económica. Como tem sido reiteradamente dito nas decisões dos tribunais superiores, a indemnização por danos não patrimoniais não pode ser meramente simbólica, sob pena de não se mostrar adequada aos fins a que se destina – atenuação da dor sofrida pelo lesado e reprovação da conduta do agente – v. a título meramente exemplificativo, Acs. do STJ de 20/11/2003, proc. 03B3528, de 07/07/2009, proc. 1145/05.6TAMAI.C1, e de 10/10/2012, proc. 6628/04.2TVLSB.L1.S1.
Considerando todos os dados referidos – reflexos no bem-estar psíquico do défice funcional permanente, dores sofridas, grau de culpa, condição económica da lesada – julgamos adequada indemnização € 20.000 para compensação dos danos de natureza não patrimonial.
Em suma:
Dano corporal (ou dano biológico) consiste numa lesão na integridade do sujeito enquanto pessoa, na sua globalidade psicofísica; trata-se de dano real ou dano-evento do qual podem decorrer danos patrimoniais e/ou danos não patrimoniais, podendo os primeiros assumir feição de danos emergentes ou de lucros cessantes.
Quando, por causa do dano corporal, o lesado tem de desenvolver esforços suplementares para a realização das tarefas profissionais, apesar de o dano ser compatível com o exercício da atividade profissional habitual e não lhe ter determinado diminuição do salário, estamos em presença de uma decorrência danosa com valor patrimonial: a hora de um empregado que produz menos, porque carece de um esforço acrescido para produzir o mesmo, é mais barata que a de um que produz mais na mesma unidade de tempo; ainda que no presente não haja uma diminuição de salário, o dano corporal poderá ter influência na futura progressão no emprego bem como na obtenção de novos empregos. Estas circunstâncias constituem um dano presente e sobretudo futuro, com valor pecuniário.
O mesmo dano corporal pode gerar, e normalmente gera, danos de caráter não patrimonial merecedores de indemnização, entre os quais se contam o sofrimento físico e psíquico (angústia, tristeza, apreensão) por se ver impedido de andar e por andar com dificuldade e dor.
Sendo os danos não patrimoniais insuscetíveis de quantificação, o seu ressarcimento tem uma função essencialmente compensatória: permitir ao lesado dispor de uma soma de dinheiro que lhe permita adquirir bens ou serviços que lhe deem alguma satisfação, compensando-o, ainda que sofrivelmente, pelo mal padecido, pelo que o seu quantitativo não pode ser meramente simbólico.
IV. DECISÃO
Face ao exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar a apelação parcialmente procedente, alterando a sentença recorrida no que respeita ao montante da indemnização por danos de natureza não patrimonial que passa para € 20.000 (em vez dos anteriores € 3.500).
Custas pelas recorrida, na proporção do decaimento.
Lisboa, 27/11/2018
Assinado digitalmente
Relatora: Higina Castelo
Adjuntos: José Capacete
Carlos Oliveira