Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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 - ACRL de 08-11-2018   Alimentos a filhos maiores ou emancipados. Pensão de alimentos. 25 anos de idade.
I. Para efeitos do disposto no art° 1880° do CC, relativo a alimentos a filhos maiores ou emancipados, face às alterações introduzidas pela Lei 122/2015 passou a entender-se que a pensão de alimentos fixada na menoridade se mantém até à idade de 25 anos.
II. Essas mesmas alterações produzidas pela Lei 122/2015 vieram ainda conferir legitimidade ao progenitor convivente com filho maior para exigir do outro, progenitor inadimplente, as quantias que se vencerem de alimentos fixadas durante a menoridade do filho de ambos, até ele atingir 25 anos de idade.
III. Tendo em consideração as interpretações divergentes que a jurisprudência fazia da norma do art° 1880° do CC, atendendo à intenção expressa pelo legislador, conclui-se que a Lei 122/2015 de 1 de Setembro, que aditou o n° 2 ao art° 1905° do CC é uma lei interpretativa e, como tal, integra-se na lei interpretada e aplica-se retroactivamente.
Proc. 18203/17.7T8LSB-C.L1 6ª Secção
Desembargadores:  Adeodato Brotas - Gilberto Cunha - -
Sumário elaborado por Margarida Fernandes
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Proc. 18203/17.7T8LSB-C.L1
Sumário (elaborado pelo relator)
1- Para efeitos do disposto no art° 1880° do CC, relativo a alimentos a filhos maiores ou emancipados, face às alterações introduzidas pela Lei 122/2015 passou a entender-se que a pensão de alimentos fixada na menoridade se mantém até à idade de 25 anos.
2- Essas mesmas alterações produzidas pela Lei 122/2015 vieram ainda conferir legitimidade ao progenitor convivente com filho maior para exigir do outro, progenitor inadimplente, as quantias que se vencerem de alimentos fixadas durante a menoridade do filho de ambos, até ele atingir 25 anos de idade.
3- Tendo em consideração as interpretações divergentes que a jurisprudência fazia da norma do art° 1880° do CC, atendendo à intenção expressa pelo legislador, conclui-se que a Lei 122/2015 de 1 de Setembro, que aditou o n° 2 ao art° 1905° do CC é uma lei interpretativa e, como tal, integra-se na lei interpretada e aplica-se retroactivamente.

Proc. 18203/17.7T8LSB-C.L1 — (vindo do J6 do juízo de Família e Menores da comarca de Lisboa).
Espécie: Apelação em separado.
Recorrente: P...
Recorrido: A...
Relator: Desembargador Adeodato Brotas.
1° Adjunto: Desembargador Gilberto Jorge.
2ª Adjunta: Desembargadora Maria de Deus Correia.
Acordam nesta 6ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa,
1-Relatório.
1-P..., instaurou execução especial por alimentos contra A..., visando obter o pagamento coercivo das prestações em dívida a título de alimentos aos filhos comuns, R..., nascido a 27/06/1997 e, T... nascido a 14/11/1999.
Como título executivo apresentou o Acordo Sobre o Exercício do Poder Paternal dos filhos de ambos, homologado pela Conservadora do Registo Civil de Moscavide, no âmbito do divórcio por mútuo consentimento, nos termos do qual o executado se obrigou a pagar o valor total dos colégios dos menores, bem como a quantia fixa de 150€ mensais e ainda o valor de 3 000€, uma vez por ano, quando recebesse da sua entidade patronal o prémio anual.
A juíza indeferiu parcialmente o requerimento executivo relativamente aos 3 000€ anuais entre 2009 e 2017.
Na audiência prévia dos embargos à execução, a juiza a quo indeferiu ainda parcialmente a execução quanto às quantias devidas a titulo de prestações de alimentos vencidas após a maioridade de cada um dos filhos de ambos, proferindo o seguinte despacho:
Da Legitimidade da Requente
A exequente P... instaurou execução especial para cobrança de alimentos no dia 05 de Agosto de 2017, na qualidade de progenitora de R..., nascido a 27 de Junho de 1997, e de T..., nascido a 14 de Novembro de 1999.
Infere-se da mera leitura do requerimento executivo que, no tocante ao filho mais velho, R..., o mesmo atingiu a maioridade em 27 de Junho de 2015 e o filho mais novo, T..., no passado dia 14 de Novembro de 2017.
A primeira questão que é colocada à consideração do tribunal é a da legitimidade da exequente para vir reclamar as prestações de alimentos devidas pelo executado aos dois filhos de ambos.
A este propósito, importa distinguir a sua legitimidade no tocante às prestações alimentares vencidas no período da menoridade dos dois jovens, daquela que a mesma se arroga no tocante às que só se venceram depois da respectiva maioridade.
Quanto às primeiras (i. e. às prestações vencidas durante a menoridade dos dois jovens), a sua legitimidade resultou, durante esse período, directamente do estatuído nos artigos 15.°, 16.° e 30.° do Código de Processo Civil, dos artigos 122.° e 124° do Código Civil e do artigo 41.° do Regime Geral do Processo Tutelar Cível.
A partir do momento em que os jovens completaram 18 (dezoito) anos de idade, deverá entender-se que a sua progenitora, ora exequente, mantém legitimidade para reclamar as prestações vencidas durante a sua menoridade, mas não já nessa qualidade de legal representante dos dois jovens, na medida em que perdeu, entretanto, os seus poderes/deveres de representação dos filhos enquanto progenitora guardiã.
Mantém legitimidade quanto a essas quantias devidas a título de prestações de alimentos vencidas durante a menoridade dos filhos porque, como refere na contestação que apresentou, se substituiu ao progenitor no pagamento que as pensões em causa tinham em vista salvaguardar, ou seja, ao abrigo da figura da sub-rogação, por via do disposto no artigo 592°, n° I do Código Civil.
Ao invés, no tocante às prestações de alimentos vencidas após a maioridade dos jovens, só os mesmos - porque únicos credores de tais quantias - podem diligenciar pela respectiva cobrança e porque assim é, no tocante a essas quantias, deverá o executado, A..., ser absolvido da instância, por falta de legitimidade da exequente, P..., de harmonia com o disposto nos artigos 576.°, 577. ° alínea e) e 578. ° do Código de Processo Civil, o que decido, extinguindo-se a execução no que tange às quantias devidas a título de prestações de alimentos vencidas após a maioridade de cada um dos filhos de ambos.
Quedará à progenitora (que continue a prover ao respectivo sustento) prevalecer-se do preceituado no artigo 889.0, números 3 e 4, do Código de Processo Civil, caso se verifiquem os respectivos pressupostos.
Mesmo quanto às prestações de alimentos vencidas na menoridade dos jovens, só mesmo com recurso à figura da sub-rogação é que podemos reconhecer legitimidade à exequente, P..., para vir a juízo, em face da inércia dos filhos, reclamar das quantias que aos mesmos eram devidas, no pressuposto ¬repita-se - de que, sendo a progenitora guardião dos menores, se terá visto na contingência de se substituir só progenitor, alegadamente, faltoso.
Improcedendo, nessa parte, a excepção arguida.

2-Inconformada, a exequente interpôs recurso dessa decisão, apresentando as seguintes
Conclusões:
1. A Recorrente, a 28 de Julho de 2017, interpôs execução especial de alimentos contra o Recorrido/Executado, por forma a obter o pagamento coercivo das quantias em dívida por parte do Executado a título de alimentos aos dois filhos comuns de ambos.
2. A Mma. Juiz a quo aceitou o requerimento executivo intentado pela Recorrente, tendo o Recorrido deduzido embargos que forma contestados pela aqui Recorrente.
3. Em sede de audiência prévia, foi proferido despacho saneador que, quanto à questão da legitimidade da Exequente entendeu que na parte que respeita aos alimentos vencidos após a maioridade dos filhos a mãe carece de legitimidade para a acção executiva, por ter perdido os seus poderes/deveres de representação dos filhos enquanto progenitora guardiã.
4. Admitindo a figura da sub-rogação quanto aos alimentos vencidos durante a menoridade por via do disposto no artigo 592°, n° 1 do Código Civil.
5. Concluindo pela absolvido da instância, do pai, por falta de legitimidade da Exequente, de harmonia com o disposto nos artigos 576.°, 577.° alínea e) e 578.° do Código de Processo Civil, extinguindo-se a execução no que tange às quantias devidas a título de prestações de alimentos vencidas após a maioridade de cada um dos filhos de ambos.
6. Ora, a Recorrente, não pode conformar-se com o teor da decisão proferida, por entender que a mesma contende expressamente com aquilo que decorre da legislação em vigor violando a Douta Decisão, concretamente, o disposto nos artigos 1880° e 1905°, n° 2 do Código Civil.
7. Na linha de entendimento da Recorrente cumpre citar o doutamente decidido pelo Supremo Tribunal de Justiça, no Acórdão proferido a 15/04/2015 (relator: Conselheiro Granja da Fonseca), in ITIJ e que conclui que I- Em sede de acção executiva comum (e sendo certo que as normas que disciplinam a execução especial por alimentos nada dispõem a este respeito), o pressuposto processual da legitimidade adjectiva afere-se exclusivamente pelo título executivo, pelo que apenas tem legitimidade para promover e fazer seguir a execução, como exequente, quem no título figure como credor e só nela deve intervir como executado quem, à luz do título, seja devedor da obrigação exequenda.
II - Face ao cariz formal da noção de legitimidade processual em sede de execução, torna-se irrelevante a efectiva titularidade (do lado activo ou passivo) do direito de crédito contido no mesmo, o que se explica pelo facto de o título executivo, em virtude de oferecer um nível de segurança tido por lei como suficiente quanto à existência daquele, tornar dispensável qualquer indagação prévia sobre a subsistência daquele direito.
III - Ocorrendo a ruptura da vida familiar (mormente, por divórcio) e em decorrência da inerente necessidade de regular, por acordo ou com recurso ao tribunal, o exercício das responsabilidades parentais (cfr. art. 1905.° do CC), a obrigação de alimentos autonomiza-se do dever de assistência dos pais para com os filhos, passando a caber ao progenitor não convivente com o menor o dever dc entregar as correspondentes prestações pecuniárias, em que aquela se concretiza, ao outro progenitor.
IV - Figurando a recorrida no título dado à execução como credora das prestações alimentícias devidas pelo recorrente, tal basta para encerrar a discussão sobre a legitimidade adjectiva, mesmo que se possa considerar que os alimentos são prestados a beneficio dos descendentes das partes e que estes devam ser tidos como os seus credores da prestação alimentícia.
V - A dissonância entre a legitimidade formal e a titularidade efectiva do crédito em causa não assume, em face do critério que se contém no n.° 1 do art. 53.° do NCPC (2013), qualquer relevância, sendo certo que tal incoerência constitui uma ressonância das particularidades do modo como se efectiva o direito a alimentos a menores na sequência da ruptura da vida em família.
VI - Tendo sido a progenitora quem, a expensas exclusivamente suas, prestou aos seus filhos os alimentos necessários ao longo do lapso de tempo em que perdurou o incumprimento do recorrente, é de considerar que, ao exercitar a cobrança coerciva das prestações pecuniárias alimentícias junto deste, a recorrida propõe-se efectivar um crédito próprio, sendo iníquo não lhe reconhecer esse direito.
VII - Daí que, estando somente em causa prestações alimentícias vencidas e não pagas durante a menoridade de um dos filhos, o facto de este ter completado 18 anos antes de a sua progenitora ter instaurado a correspondente execução não interfere com a legitimidade processual da mesma, tanto mais que essa qualidade não é uma forma de suprir a incapacidade judiciária que afectava aquele seu filho até esse momento.
VIII - Ainda que se devesse fazer apelo ao regime da sub-rogação legal para alcançar a conclusão referida em VII, o certo é que a falta de alegação dos pertinentes factos no requerimento executivo não conduziria imediatamente à ilegitimidade adjectiva da recorrida, na medida em que caberia ao tribunal, em homenagem ao princípio do aproveitamento do esforço processual que se acha ínsito no n.° 2 do art. 6.° do NCPC e porque se está perante uma excepção dilatória sanável, proferir o competente despacho de aperfeiçoamento (n.° 4 do art. 726.° e art. 734.°, ambos daquele diploma), de modo a instar a exequente a alegar factos dos quais se pudesse extrair o fundamento na sucessão da obrigação exequenda.
8. Ora, no caso em apreço no Acórdão supra citado, existindo fixação de alimentos no processo de regulação das responsabilidades parentais, a Exequente agiu após a maioridade do filho.
9. Com a publicação da Lei n.° 122/2015, de 1 de Setembro, esta legitimidade processual do progenitor que provém ao sustento dos filhos em substituição do progenitor que incumpriu foi estendida até ao filho perfazer os 25 anos de idade.
10. Na verdade, de acordo com o disposto no art. 1880° do Código Civil (doravante
CC), Se, no momento em que atingir a maioridade ou for emancipado o filho não houver completado a sua formação profissional, manter-se-á a obrigação a que se refere o artigo anterior (despesas com o sustento, segurança e saúde dos filhos) na medida em que seja razoável exigir aos pais o seu cumprimento e pelo tempo normalmente requerido para que aquela formação se complete
11. A Lei n.° 122/2015, de 01 de Setembro, veio alterar o n.° 2 do artigo 1905.° do Código Civil, passando o mesmo a prever o seguinte:
2 - Para efeitos do disposto no artigo 1880°, entende-se que se mantém, para depois da maioridade, e até que o filho complete 25 anos de idade, a pensão fixada em seu beneficio durante a menoridade, salvo se o respectivo processo de educação ou formação profissional estiver concluído antes daquela data, se tiver sido livremente interrompido ou ainda se, em qualquer caso, o obrigado à prestação de alimentos fizer prova da irrazoabilidade da sua exigência.
12. Foi igualmente alterado o disposto no art.° 989 do CPC, passando o mesmo a ter a seguinte redacção:
1 - Quando surja a necessidade de se providenciar sobre alimentos a filhos maiores ou emancipados, nos termos dos artigos 1880.° e 1905.° do Código Civil, segue-se, com as necessárias adaptações, o regime previsto para os menores.
2 - Tendo havido decisão sobre alimentos a menores ou estando a correr o respetivo processo, a maioridade ou a emancipação não impedem que o mesmo se conclua e que os incidentes de alteração ou de cessação dos alimentos corram por apenso.
3 - O progenitor que assume a título principal o encargo de pagar as despesas dos filhos maiores que não podem sustentar-se a si mesmos pode exigir ao outro progenitor o pagamento de uma contribuição para o sustento e educação dos filhos, nos termos dos números anteriores.
4 - O juiz pode decidir, ou os pais acordarem, que essa contribuição é entregue, no todo ou em parte, aos filhos maiores ou emancipados.
13. É inegável que daquele dispositivo legal, decorrem inequivocamente duas consequências:
A pensão fixada durante a menoridade mantém-se até que o filho complete 25 anos de idade (salvo se o respectivo processo de educação ou formação profissional estiver concluído antes daquela data ou se tiver sido livremente interrompido); e é ao obrigado à prestação que cabe o ónus da prova de que a manutenção da pensão é irrazoável.
14. Nas circunstâncias in casu, o filho mais velho atingiu a maioridade antes da entrada em vigor da Lei n.° 122/2015 de 1/09, a execução foi interposta após a publicação daquela lei, e entretanto o filho mais novo atingiu também ele a maioridade.
15. Conforme consta do Projecto de Lei 975/XII, que deu origem à Lei 141/2015 de 8 de Setembro:
É hoje comum que, mesmo depois de perfazerem 18 anos, os filhos continuem a residir em casa do progenitor com quem viveram toda a sua infância e adolescência e que, na esmagadora maioria dos casos, é a mãe.
Tem vindo a verificar-se, com especial incidência, que a obrigação de alimentos aos filhos menores cessa, na prática, com a sua maioridade e que cabe a estes, para obviar a tal, intentar contra o pai uma acção especial.
Esse procedimento especial deve provar que não foi ainda completada a educação e formação profissional e que é razoável exigir o cumprimento daquela obrigação pelo tempo normalmente requerido para que essa formação se complete.
Como os filhos residem com as mães, de facto são elas que assumem os encargos do sustento e da formação requerida.
A experiência demonstra uma realidade à qual não podemos virar as costas: o temor fundado dos filhos maiores, sobretudo quando ocorreu ou ocorre violência doméstica, leva a que estes não intentem a acção de alimentos. Mesmo quando o fazem, a decretação dos processos implica, por força da demora da justiça, a privação do direito à educação e à formação profissional.
Há, também, por consequência do descrito, uma desigualdade evidente entre filhos de pais casados ou unidos de facto e os filhos de casais divorciados ou separados.
16. Sendo admissível o Incidente de Incumprimento interposto pelo progenitor do filho maior em causa, não poderá deixar de se considerar também admissível a possibilidade de recurso directo à execução dos alimentos.
17. Havendo incumprimento de decisão transitada em julgado na menoridade, quem tem a legitimidade para agir é quem teve que suportar a expensas suas o sustento do filho, independentemente deste ter entretanto atingido a maioridade.
18. Não se aceitando que o progenitor que continuou a suportar as despesas para o sustento do filho depois da maioridade, não tendo cessado a obrigação de alimentos por parte do outro progenitor e sendo aquele a suprir integralmente pelas necessidades do filho que continua a beneficiar desse direito a alimentos, não possa ele próprio e com propor um incidente de incumprimento ou a apresentar em juízo acção executiva por alimentos, sendo assim violado o princípio da igualdade das partes, que implica a paridade simétrica das suas posições perante o tribunal (art. 4° do C.P.C.).
19. Relevante é, ainda, a consequência directa do que decorre do Douto Despacho recorrido, concretamente, a violação do princípio da economia processual previsto no art. 130° do C.P.C., princípio que consagra que o resultado processual deve ser atingido com a maior economia de meios.
20. A alteração legislativa visou, e bem, garantir que o sustento dos filhos menores se prolongue até aos 25 anos de idade, cabendo ao progenitor que presta esses alimentos alegar e provar a desnecessidade dos mesmos;
21. Assim se superando a inércia habitual dos filhos que, compreensivelmente, não queriam demandar os progenitores; não podemos assim, permitir deixar entrar pela janela o que o legislador não quis que continuasse a entrar pela porta,
22. Decisões como as que ora se recorre tornam letra morta a lei nova e totalmente vazia de conteúdo e dos princípios que lhe estão subjacentes.

3- O apelado contra-alegou, apresentando as seguintes
Conclusões:
I) O Despacho recorrido não merece qualquer censura ou reparo, contrariamente ao alegado pela Recorrente.
II) Apesar de não estar devidamente concretizada a questão sobre a qual recai o Recurso que ora se responde, a mesma é a de aferir se a Recorrente tem legitimidade para demandar em sede de acção executiva alimentos devidos a filhos maiores, vencidos e vincendos na maioridade daqueles, utilizando para o efeito como título executivo, o Acordo de Regulação das Responsabilidades Parentais fixado na menoridade daqueles.
III) O Acórdão do STJ utlizado pela Recorrente no seu Recurso para fundamentar a sua legitimidade, foi proferido em data anterior à entrada em vigor da Lei 122/2015 de 1 de Setembro, e refere-se a questão diversa da que se discute nos presentes autos, ou seja, pronuncia-se sobre a legitimidade em sede de acção executiva para demandar o pagamento dos alimentos vencidos na menoridade dos filhos maiores.
IV) A questão acabada de referir não se coloca nos presentes autos, na medida em que os mesmos prosseguem para aferir se os mesmos já foram liquidados ou não.
V) Assim, e conforme se demonstrou nas presentes Alegações, a resposta à legitimidade da Recorrente para demandar o Recorrido terá de ser negativa, dado que a Recorrente, não pode lançar mão do Acordo de Regulação das Responsabilidades Parentais fixados na menoridade dos filhos, para executar o Executado e aqui Recorrido nos termos do disposto no art.° 933.° do CPC, quanto aos alimentos vencidos e os vincendos já maioridade dos mesmos, por não ser o meio processual próprio para o fazer.
VI) Relativamente ao filho cuja maioridade foi atingida em momento anterior à entrada em vigor da Lei n.° 122/2015 de 1 de Setembro, face ao regime de aplicação da lei o tempo, estabelecido no art.° 12.° do Código Civil, não pode a acção executiva prosseguir no que respeita aos alimentos vencidos e vincendos quanto ao mesmo, dado que a mesma não prevê a sua aplicação retroactiva, e o filho em questão atingiu a maioridade em data anterior à da vigência da lei, 01.10.2015.
VII) A este propósito são elucidativos os Acórdãos, do Tribunal da Relação de Lisboa, de 27-10-2016, no âmbito do Proc. 552/03.3TMLSB-A e o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 30-06-2016, no âmbito do Proc. 6692/05.7TBSXL-C.L1.-2 http ://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/-/C3A22C5514741DBB80257FFD00393F1 C
VIII) Pelo que, o Recorrido teria de necessariamente ser absolvido da instância — o que ocorreu.
IX) Relativamente ao filho cuja maioridade foi atingida na pendência da acção executiva, terá de se pugnar igualmente pela falta de legitimidade da Recorrente no que respeita aos alimentos vencidos e vincendos na maioridade daquele, para demandar em sede de acção executiva, com base no Acordo de Regulação das Responsabilidades Parentais fixado e homologado aquando da menoridade daqueles.
X) O meio processual próprio para a Recorrente demandar o Recorrido é o que se encontra fixado nos termos e para os efeitos do disposto no art.° 989.° do CPC, pode a Recorrente, ex vi arts. 1880 e 1095.° do Código Civil — Alimentos a filhos maiores ou emancipados.
XI) No mesmo sentido, o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, em 09.03.2017, no âmbitodoProc.26/12.1TBPTGD.Elttp://www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579 bf005f080b/132eb4b379f945f2802580ec00578661?OpenDocument
XII) Pelo que, bem andou Tribunal recorrido, ao ter proferido o Despacho nos termos em que o fez, sendo por isso de manter, conforme ficou amplamente demonstrado.

II- Questões a Decidir.
É sabido que o objecto do recurso é balizado pelas conclusões do apelante, nos termos preceituados pelos artigos 635°, n° 4, e 639°, n° 1, do CPC/13.
Assim, face às conclusões apresentadas, é a seguinte a questão que importa analisar e decidir:
-Saber se a progenitora convivente tem legitimidade para executar quantias devidas a título de prestações de alimentos vencidas após a maioridade de cada um dos filhos.

III-Factualidade relevante.
A factualidade relevante para a decisão da questão em causa no recurso é a que consta do Relatório, com especial incidência da mencionada no despacho da juíza a quo.

IV- Questão Jurídica.
A recorrente fundamenta a sua pretensão de revogação da decisão sob recurso defendendo uma interpretação dos art°s 1905° do CC e 989° do CPC/13, na redacção dada pela Lei 122/2015, de 1/09 que, segundo ela, permite concluir pela sua legitimidade, enquanto progenitora convivente, para executar quantias devidas a título de prestações de alimentos vencidas mesmo após a maioridade de cada um dos filhos.
Já o recorrido, louvando-se em jurisprudência que indica, pugna pela bondade da decisão sobre recurso; defendendo ainda, relativamente ao filho cuja maioridade foi atingida em momento anterior à entrada em vigor da Lei n.° 122/2015 de 1 de Setembro, face ao regime de aplicação da lei o tempo do art° 12° do CC, não poder a acção executiva prosseguir, no que respeita aos alimentos vencidos e vincendos quanto ao mesmo, dado que aquela lei não prevê a sua aplicação retroactiva.
Vejamos a questão.
1-A letra dos art°s 1905° do CC e 989° do CPC/13, dada pela Lei 122/2015.
Estabelece o art° 1905° do CC, com a epígrafe Alimentos devidos ao filho em caso de divórcio, separação judicial de pessoas e bens, declaração de nulidade ou anulação do casamento:
1 — Nos casos de divórcio, separação judicial de pessoas e bens, declaração de nulidade ou anulação de casamento, os alimentos devidos ao filho e a forma de os prestar são regulados por acordo dos pais, sujeito a homologação; a homologação é recusada se o acordo não corresponder ao interesse do menor.
2 — Para efeitos do disposto no artigo 1880.°, entende-se que se mantém para depois da maioridade, e até que o filho complete 25 anos de idade, a pensão fixada em seu beneficio durante a menoridade, salvo se o respectivo processo de educação ou formação profissional estiver concluído antes daquela data, se tiver sido livremente interrompido ou ainda se, em qualquer caso, o obrigado à prestação de alimentos fizer prova da irrazoabilidade da sua exigência.
O art° 989° do CPC/13, com epígrafe Alimentos a filhos maiores e emancipados:
1 — Quando surja a necessidade de se providenciar sobre alimentos a filhos maiores ou emancipados, nos termos dos artigos 1880° e 1905° do Código Civil, segue-se, com as necessárias adaptações, o regime previsto para os menores.
2 — Tendo havido decisão sobre alimentos a menores ou estando a correr o respectivo processo, a maioridade ou a emancipação não impede que o mesmo se conclua e que os incidentes de alteração ou de cessação dos alimentos corram por apenso.
3 — O progenitor que assume a título principal o encargo de pagar as despesas os filhos maiores que não podem sustentar -se a si mesmos pode exigir ao outro progenitor o pagamento de uma contribuição para o sustento e educação dos filhos, nos termos dos números anteriores.
4 — O juiz pode decidir, ou os pais acordarem, que essa contribuição é entregue, no todo ou em parte, aos filhos maiores ou emancipados.
Anteriormente, o art° 1905° do CC dizia:
Nos casos de divórcio, separação judicial de pessoas e bens, declaração de nulidade ou anulação do casamento, os alimentos devidos ao filho e forma de os prestar serão regulados por acordo dos pais, sujeito a homologação; a homologação será recusada se o acordo não corresponder ao interesse do menor.
E, do art° 989° do CPC/13, constava:
1-Quando surja a necessidade de se providenciar sobre alimentos a filhos maiores ou emancipados, nos termos do art° 1880° do código Civil, seque-se, com as necessárias adaptações, o regime previsto para os menores.
2-Tendo havido decisão sobre alimentos a menores ou estando a correr o respectivo processo, a maioridade ou a emancipação não impede que o mesmo se conclua e que os incidentes de alteração ou de cessação dos alimentos corram por apenso.
2- As alterações legislativas introduzidas pela Lei 122/2015.
2.1- A Exposição de Motivos do Projecto de Lei.
Na exposição de motivos do projecto de lei que esteve na base da alteração legislativa —Projecto de Lei n° 975/XII (4h) — constava:
Como bem assinala a Associação Portuguesa de Mulheres Juristas, numa sugestão de alteração legislativa que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista acolhe, urge dar resposta a uma questão particular relativa ao atual regime de exercício das responsabilidades parentais. Essa questão particular respeita ao regime que penaliza de forma desproporcionada as mulheres que são mães de filhos ou filhas maiores e que estão divorciadas ou separadas dos respetivos pais. É hoje comum que, mesmo depois de perfazerem 18 anos, os filhos continuem a residir em casa do progenitor com quem viveram toda a sua infância e adolescência e que, na esmagadora maioria dos casos, é a mãe. Tem vindo a verificar-se, com especial incidência, que a obrigação de alimentos aos filhos menores cessa, na prática, com a sua maioridade e que cabe a estes, para obviar a tal. intentar contra o pai uma ação especial. Esse procedimento especial deve provar que não foi ainda completada a educação e formação profissional e que é razoável exigir o cumprimento daquela obrigação pelo tempo normalmente requerido para que essa formação se complete. Como os filhos residem com as mães, de facto são elas que assumem os encargos do sustento e da formação requerida. A experiência demonstra uma realidade à qual não podemos virar as costas: o temor fundado dos filhos maiores, sobretudo quando ocorreu ou ocorre violência doméstica, leva a que estes não intentem a ação de alimentos. Mesmo quando o fazem, a decretação dos processos implica, por 'bisa da demora da justiça, a privação do direito à educação e à firmação profissional. (...) A alteração legislativa proposta vai ao encontro da solução acolhida em França, confrontada, exatamente, com a mesma situação, salvaguardando no âmbito do regime do acordo dos pais relativo a alimentos em caso de divórcio, separação ou anulação do casamento, a situação dos filhos maiores ou emancipados que continuam a prosseguir os seus estudos e formação profissional e, por outro lado, conferindo legitimidade processual ativa ao progenitor a quem cabe o encargo de pagar as principais despesas de filho maior para promover judicialmente a partilha dessas mesmas despesas com o outro progenitor. (sublinhado nosso).
2.2- O ambiente na Jurisprudência.
Para se compreender esta alteração legislativa e a razão que esteve na sua base, importa lembrar que a jurisprudência maioritária entendia que a obrigação de alimentos fixada por sentença se extinguia automaticamente com a maioridade e, por isso, teria de ser o filho, já maior, a pedir a manutenção da pensão ou uma pensão de alimentos nova, carecendo de alegar e provar os requisitos mencionados pelo art° 1880° do CC — Cf., entre outros, Ac. TRL 7/12/2011; Ac. STJ 2/10/2008; Ac. STJ 31/5/2007; Ac. STJ 22/4/2008; Ac. TRL 10/9/2009; Ac. TRL 6/5/2008; Ac. TRP 26/2/2009; Ac. TRP 21/2/2008; Ac. TRP 26/1/2004 (www.dgsi.pt) (referidos por Maria Inês Pereira da Costa, Obrigação de Alimentos Devida a Filhos/as Maiores que Ainda Não Completaram a Sua Formação
— Uma Visão Comparada de Crítica ao Critério da Razoabilidade, dissertação de mestrado, 2013,
Universidade Católica Portuguesa, Faculdade de Direito, Escola do Porto, pág. 29, nota 143, edição on-line).
No entanto, alguma jurisprudência já defendia que a mãe que sempre exerceu as responsabilidades parentais, tinha legitimidade processual, em nome próprio, para exigir do outro progenitor em incumprimento, o pagamento das prestações alimentares vencidas e não pagas durante a menoridade, após a maioridade do filho, não se verificando uma situação de inutilidade superveniente da lide; entendia ainda esta jurisprudência, na sequência da doutrina preconizada por Remédio Marques (Algumas Notas Sobre Alimentos, F.D.U.C. — Centro de D.to de Família, 2, pg. 297/8), que este progenitor age em substituição processual, parcial e representativa do filho (Cf. Ac. do STJ, de 25/03/2010, relatado por Alves Velho, com um voto de vencido; vejam-se ainda TRP, de 05/03/2012, TRL de 04/03/2010, TRL de 09/12/2008, TRL de 20/04/2010 e TRL de 10/09/2009, todas em www.dgsi.pt)
2.3- A doutrina.
A doutrina, por sua vez já defendia, mesmo antes das alterações introduzidas pela Lei 122/2015, que o art° 1880º do CC consagrava urna extensão da obrigação alimentar dos pais para com os filhos e que a pensão de alimentos fixada durante a menoridade do filho devia continuar a ser devida após a maioridade, cabendo ao progenitor obrigado a
iniciativa de fazer cessar tal obrigação (Rita Lobo Xavier, apud Maria Inês Pereira da Costa, Obrigação de Alimentos Devida a Filhos/as Maiores que Ainda Não Completaram a Sua Formação — Uma Visão Comparada de Crítica ao Critério da Razoabilidade, dissertação de mestrado, 2013, Universidade Católica Portuguesa, Faculdade de Direito, Escola do Porto, pág. 29, nota 143, edição online, pág. 33).
Igualmente, Clara Sottomayor preconizava que a letra e o espírito do art° 1880° do CC permitem estabelecer uma presunção de manutenção da obrigação de alimentos fixados ao menor para depois da maioridade (Regulação do Exercício das Responsabilidades parentais nos Casos de Divórcio, 5 edição, Almedina, pág. 341).
É justamente nestas circunstâncias, de diferentes entendimentos iurisprudenciais e perante a posição já preconizada pela doutrina, que surge a Lei 122/2015, invocando as razões enunciadas na justificação de motivos atrás referida.
2.4- A jurisprudência e a doutrina após a Lei 122/2015.
Pois bem, em face das alterações introduzidas ao art° 1905° do CC, é pacífico que nos casos em que já haja sido fixado regime de alimentos na menoridade, mantêm-se os respectivos termos até que o filho complete os 25 anos de idade (art° 1905° n° 2, primeira parte) cabendo ao progenitor obrigado a suportá-los lançar mão de procedimento processual em que invoque e prove os pressupostos da cessão da obrigação, referidos no art° 1905° n° 2, 2a parte, do CC. (na doutrina, veja-se Gonçalo Oliveira Magalhães, A tutela (jurisdicional) do direito a alimentos dos filhos maiores que ainda não concluíram a sua formação profissional, Julgar online, 2018, pág. 12; Diana Gomes Rodrigues Mano, A Obrigação de Alimentos a Filhos Maiores e o Princípio da Razoabilidade, tese de mestrado, Escola de Direito da Universidade do Minho, 2016, pág. 62, edição online; Delgado de Carvalho, Acção Executiva para
Pagamento de Quantia Certa, 2ª edição, 2016, pág. 250 e seg.; Tomé D'Almeida Ramião, Regime Geral do Processo Tutelar Cível, Anotado e Comentado, 3ª edição, 2018, pág. 37; na jurisprudência, entre outros, Ac. Rel. Évora, de 09/03/2017, Albertina Pedroso, pontos II e III do sumário respectivo; Ac. Rel.
Guimarães, de 21/06/2018, Margarida Sousa, ponto Ido sumário).
Com efeito, a letra da lei é clara no art° 1905° n° 2 do CC (redacção da Lei 122/2015): nos casos do art° 1880° do CC, relativo a despesas com filhos maiores ou emancipados, ...entende-se que se mantém para depois da maioridade, a pensão fixada em seu beneficio durante a menoridade....
Com esta alteração, pretendeu-se evitar que o filho maior, necessitado de alimentos por razões de formação profissional, tenha de instaurar novo procedimento para obtenção de
alimentos assim que complete 18 anos (Cf. Parecer do Conselho Superior da Magistratura sobre o Projecto de Lei n° 975/XII/4a (PS), relatado por Carlos Castelo Branco, fls 11, disponível online; Parecer da Procuradoria Geral da República sobre o Projecto de Lei n° 975/XII/4 (PS), relatado por Helena Gonçalves, fls 5, disponível online).
Do que se expôs, pode extrair-se uma primeira conclusão:
Para efeitos do disposto no art° 1880° do CC, relativo a alimentos a filhos maiores ou emancipados, entende-se que a pensão de alimentos fixada na menoridade se mantém até à idade de 25 anos.

3- O problema da legitimidade do progenitor de filho maior.
A par da alteração substantiva, preconizada pela nova redacção do art 1905° do CC, a Lei 122/2015 levou a efeito, igualmente, uma alteração processual no que toca à legitimidade do progenitor convivente, para providenciar judicialmente sobre alimentos aos filho maiores que ainda não concluíram a sua formação.
Na verdade, no art° 989° n° 3 do CPC/13, passou a constar expressamente O progenitor que assume a título principal o encargo de pagar as despesas os filhos maiores que não podem sustentar-se a si mesmos pode exigir ao outro progenitor o pagamento de uma contribuição para o sustento e educação dos filhos, nos termos dos números anteriores..
Recorde-se que na exposição de motivos, foi referido expressamente ...conferindo legitimidade processual ativa ao progenitor a quem cabe o encargo de pagar as principais despesas de filho maior para promover judicialmente a partilha dessas mesmas despesas com o outro progenitor.
Perante esta nova redacção a doutrina vem defendendo que o progenitor convivente tem legitimidade processual quando se torne necessário providenciar sobre alimentos aos filhos maiores que ainda não concluíram a sua formação, designadamente se tá estava fixado, desde a menoridade, um regime de alimentos, enquadrando essa legitimidade do progenitor corno legitimidade indirecta. (Cf. Gonçalo Oliveira Magalhães, A tutela (jurisdicional) do direito a alimentos dos filhos maiores... cit., pág. 13).
Na jurisprudência, o Ac. da Rel. de Guimarães, de 21/06/2018, relatado por Margarida Sousa, reconheceu /// — O art. 989.°, n.° 3, do CPC, introduzido pela referida lei, remetendo para os termos dos n°s 1 e 2 do mesmo artigo, reconhece legitimidade ao progenitor com quem o filho maior coabita, quando se torne necessário providenciar judicialmente (seja para prosseguir, no confronto com o outro progenitor, a ação destinada à fixação da pensão iniciada durante a menoridade, seja para, depois desta, intentar ação com a mesma finalidade ou recorrer aos procedimentos necessários à efetivação do direito anteriormente acertado) sobre alimentos aos .filhos maiores que ainda não concluíram a sua formação profissional.
Relembre-se que com as alterações introduzidas ao regime relativo à necessidade de providenciar por alimentos a filhos maiores, pretendeu-se evitar a obrigatoriedade de o filho maior, que continue a carecer de alimentos já definidos, ter de instaurar novo procedimento para o efeito e obter novo título executivo com vista a efectivar o suprimento das suas necessidades.
Ora, como é sabido, o título executivo é o documento do qual resulta a exequibilidade de uma pretensão e, portanto, a possibilidade da realização coactiva da correspondente prestação através da acção executiva. Esse título incorpora o direito de execução, ou seja, o direito a executar o património do devedor (Cf. Teixeira de Sousa, A Acção Executiva Singular, pág. 63).
Já anteriormente às alterações do regime de alimentos a filhos maiores pela lei 122/2015, o Ac. da Rel. de Guimarães, Ana Cristina Duarte (www.dgsi.pt) decidiu que A sentença que fixou alimentos devidos a menores, vale como título executivo após a sua maioridade, considerando que aquela prestação alimentar se mantém nos casos previstos no artigo 1880.° do Código Civil, sem que tal assuma a natureza de uma nova obrigação.
Portanto, não havendo alteração da situação de carência de alimentos de filho maior, continua a constituir título executivo a decisão de alimentos fixados na menoridade.
E, continuando a valer como título executivo a decisão que fixou alimentos na menoridade, nada obsta a que o progenitor convivente possa executar essa decisão por prestações de alimentos não pagos mesmo após a maioridade.
Na verdade, o incumprimento da prestação de alimentos já fixada desde a menoridade, autoriza o progenitor convivente a recorrer aos meios de cobrança coerciva, podendo optar pela execução especial por alimentos (Cf. Gonçalo Oliveira Magalhães, A tutela (jurisdicional) do direito a alimentos dos filhos maiores... cit., pág. 14).
Efectivamente, as alterações introduzidas pela Lei 122/2005, ao art° 989° do CPC/13, vieram permitir que o progenitor convivente que tem assumido o encargo de pagar as despesas de filhos maiores que não podem sustentar-se, pode exigir ao outro progenitor a contribuição que lhe competia realizar para o sustento e educação dos filhos maiores (n° 3 do art° 989°) lançando mão, com as necessárias adaptações, dos meios processuais previstos para os filhos menores (n° 1 do art° 989° CPC), portanto, incluindo a execução por alimentos.
Assim, em jeito de segunda conclusão:
Tendo em consideração a letra da lei que vigorava anteriormente às alterações introduzidas pela Lei 122/2015 e as interpretações divergentes que dela faziam as diferentes correntes jurisprudenciais, atendendo ainda à intenção expressa pelo legislador com as alterações que levou a cabo no regime relativo à necessidade de providenciar por alimentos devidos a filhos maiores, somos a concluir que o progenitor convivente com filho maior tem legitimidade para exigir do outro, progenitor inadimplente, as quantias que se vencerem de alimentos, fixadas durante a menoridade do filho de ambos, até ele atingir 25 anos de idade.
4- A natureza interpretativa do art° 1905° n° 2 do CC na redacção da Lei 122/2015.
Aqui chegados, coloca-se a questão de saber como lidar com a circunstância de, quando entraram em vigor as alterações levadas a cabo pelo Lei 122/2015, um dos menores já ter atingido a maioridade.
O recorrido defende que as alterações introduzidas não têm natureza retroactiva. Louva-se do Ac. da Relação de Lisboa, de 30/06/16 (Ezagüy Martins) que decidiu: /— O n. ° 2 do artigo 1905°, do Código Civil, aditado pela Lei n.° 122/2015, de 01/09, não é aplicável aos casos em que, fixada pensão de alimentos para o então menor, este haja atingido a maioridade antes da entrada em vigor daquela Lei, baseando-se na opinião de J. H. Delgado de Carvalho, no artigo O novo regime de alimentos devidos a filho maior ou emancipado; contributo para a interpretação da Lei n.° 122/2015, de 1/9, edição online.
Será assim?
Desde já se refira que existe jurisprudência em sentido contrário, que defende a natureza de norma interpretativa à nova redacção do art° 1905° n° 2 do CC. Na verdade, veja-se o acórdão da Relação de Évora, de 09/03/2017 (Albertina Pedroso) sustenta que II - Atenta a redacção introduzida pela Lei n.° 122/2015, de 1 de Setembro, que acrescentou o n.° 2 no artigo 1905.° do CC, considerando a referida divergência de entendimentos, e o teor do segmento inicial da alteração introduzida, sublinhando o legislador que, para efeitos do disposto no artigo 1880.0, entende-se que se mantém para depois da maioridade, deve concluir-se que estamos perante lei que é interpretativa do artigo 1880.° do CC, quanto à extensão da obrigação de alimentos a cargo dos progenitores durante a menoridade, e até que o filho complete 25 anos..
Também o acórdão da Rel. de Coimbra, de 15/11/2016 (Jorge Arcanjo) que decidiu: II ¬A Lei n° 122/2015, de 1/9, que alterou o Código Civil (art.1905°) e o Código de Processo Civil quanto ao regime dos alimentos aos filhos maiores ou emancipados (com entrada em vigor em 1 de Outubro de 2015), é lei interpretativa do art. 1880°, como parece resultar do próprio texto (para efeitos do disposto no art. 1880 entende-se (...), procurando superar-se a controvérsia jurisprudencial sobre a tese de cessação automática.
E ainda o acórdão da Rel. do Porto, 06/03/2017 (Miguel Baldaia de Morais) que determinou: VI - A Lei n° 122/2015, de 1 de setembro, que aditou o n° 2 ao artigo 1905° do Código Civil, é uma lei interpretativa, integrando-se como tal na lei interpretada, sendo, por isso, aplicável retroativamente às relações jurídicas anteriormente constituídas e que subsistam à data da sua entrada em vigor.
Mencione-se ainda que na doutrina, foi defendido no Parecer do Conselho Consultivo do Instituto dos Registo e Notariado, homologado em 29/10/2016, (edição online) que A Lei 122/2015 de 1 de Setembro, que aditou o n° 2 ao art° 1905° do CC é uma lei interpretativa e como tal integra-se na lei interpretada e aplica-se retroactivamente (art° 13° do CC).
Vejamos então.
Em termos de facto, é pacífico que a recorrente instaurou acção executiva a 05 de Agosto de 2017, como progenitora de R..., nascido a 27 de Junho de 1997, e de T..., nascido a 14 de Novembro de 1999.
A lei 122/2015, entrou em vigor no dia 01 de Outubro de 2015, por força do art° 4° dessa lei. Nessa altura, já o R... era maior desde 27/06/2015 (e o Tomás alcançou, entretanto, a maioridade em 14/11/2017).
Poderá a nova solução legislativa levada a efeito pela Lei 122/2015 ser aplicada à carência de alimentos do filho R...?
Isso implicaria uma aplicação retroactiva dessa Lei.
Pois bem, o art° 13° n° 1 do CC, relativo às leis interpretativas, estabelece, na parte que interessa:
1-A lei interpretativa integra-se na lei interpretada...
Como é sabido, este artigo consagra a doutrina tradicional de que as leis interpretativas têm eficácia retroactiva, reportada ao momento do início da vigência da lei interpretada (C. Freitas do Amaral, CC Anotado, coordenação de Ana Prata, AAVV, Vol. I, pág. 35).
Quando o legislador elabora uma lei para resolver dificuldades de interpretação que tenham sido suscitadas, nos tribunais, pelo primitivo texto, esta lei interpretativa, integrando-se na lei interpretada tem a mesma esfera de aplicação do que esta; ela aplicar-se-á, portanto, normalmente aos factos anteriores à sua entrada em vigor. Mas para que uma lei seja verdadeiramente interpretativa é preciso que haja matéria a interpretar, que tenha havido uma controvérsia a resolver (Cf. Rodrigues Bastos, Notas ao CC, vol. I, 1987, pág. 50).
Deve considerar-se lei interpretativa aquela que intervém para decidir uma questão de direito cuja solução é controvertida ou incerta, consagrando um entendimento a que a jurisprudência, pelos seus próprios meios, poderia ter chegado (Batista Machado, apud Pires de Lima e Antunes Varela, CC anotado, vol. I, pág. 62).
São, pois, requisitos para se poder considerar uma lei como interpretativa de outra: (i) tempo: a lei interpretativa deve ser posterior à lei interpretada; (ii) a finalidade: a lei interpretativa deve interpretar a lei anterior, cuja solução, que oferece, se apresenta controvertida ou incerta; (iii) fonte: a lei interpretativa não deve ser hierarquicamente inferior à lei interpretada. (Cf. Santos Justo, Introdução ao Estudo do Direito, 9ª edição, 2018, pág. 392; veja-se ainda Miguel Nogueira de Brito, Introdução ao Estudo do Direito, 2ª edição, 2018, pág. 389).
Pois bem, no caso dos autos, verificámos que existia divergência na jurisprudência quanto à interpretação do artü 1880° do CC: a maioria da jurisprudência entendia que a obrigação de alimentos fixada por sentença se extinguia automaticamente com a maioridade e, por isso, teria de ser o filho, já maior, a pedir a manutenção da pensão ou uma pensão de alimentos nova, carecendo de alegar e provar os requisitos mencionados pelo art° 1880° do CC.
Vimos igualmente que com a solução dada pela Lei 122/2015, o legislador pretendeu por cobro a esse entendimento de cessação automática da pensão de alimentos aos 18 anos, consagrando expressamente a solução de, nos casos em que havia sido fixado regime de alimentos na menoridade, manterem-se os respectivos termos até que o filho complete os 25 anos de idade (art° 1905° n° 2, primeira parte) cabendo ao progenitor obrigado a suportá-los lançar mão de procedimento processual em que invoque e prove os pressupostos da cessão da obrigação (art° 1905° n° 2, 2a parte, do CC).
Portanto, nestas circunstâncias, à luz dos pressupostos enunciados, relativos ao momento de surgimento da lei 122/2005, à finalidade da lei e à hierarquia das normas, entendemos que a lei em causa tem-natureza interpretativa.
E assim, chegamos à terceira conclusão:
A Lei 122/2015 de 1 de Setembro, que aditou o n° 2 ao art° 1905° do CC é uma lei interpretativa e, como tal, integra-se na lei interpretada e aplica-se retroactivamente.
E perante as três conclusões enunciadas entendemos que a apelação procede.

IV-Decisão.
Em face do exposto, acordam nesta 6ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar o recurso procedente e, em consequência, revogam a decisão recorrida e reconhecem legitimidade à apelante para instaurar execução quanto às quantias devidas a título de prestações de alimentos vencidas após a maioridade de cada um dos filhos.
Custas: pelo apelado.
TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA
Lisboa, 08/11/2018
Adeodato Brotas (relator)
Gilberto Jorge (1° Adjunto)
Maria de Deus Correia (2ª Adjunta)