Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Jurisprudência da Relação Cível
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 - ACRL de 08-11-2018   Reprodução ou imitação de marca . Princípio da especialidade da marca.Protecção extensiva das marcas de grande prestígio.
I - Só há reprodução ou imitação, no todo ou em parte, de marca anteriormente registada por outrem para produtos ou serviços idênticos ou afins, quando possa induzir em erro ou confusão o consumidor ou compreenda um risco de associação com a marca registada.
II - A imitação refere-se a situações em que o infractor concebeu um sinal semelhante à marca para os mesmos produtos ou serviços similares ou então utiliza a mesma marca para produtos ou serviços similares, dando causa, em qualquer dos casos, a um risco de confusão.
III - O exclusivo da marca que o artigo 258.° do CPI pretende assegurar não se estende a todo o tipo de actividades económicas, mas apenas àquelas que envolverem um risco de confusão. É o chamado princípio da especialidade da marca.
IV — Não obstante a tutela efectiva das marcas que atingiram fama ou notoriedade no mercado possa ser mais extensa do que aquela que uma marca (não famosa ou não notória) normalmente alcançaria, ela encontra-se condicionada à existência de um risco de confusão [art.° 241.0, n.° 1, do CPI].
V - Ao contrário do que sucede com a protecção extensiva das marcas notórias [art.° 241.° do CPI], a protecção extensiva das marcas de grande prestígio [art.° 242.° do CPI] dispensa qualquer risco de confusão, porém, estabelece um requisito adicional (inexistente no conceito tradicional de imitação): que o uso da marca posterior procure tirar partido indevido do carácter distintivo ou do prestígio da marca, ou possa prejudicá-los.
Proc. 227/17.6YHLSB.L1 6ª Secção
Desembargadores:  Manuel Rodrigues - Ana Paula Carvalho - -
Sumário elaborado por Margarida Fernandes
_______
Processo n.° 227/17.6YHLSB.L1 (Recurso de apelação)
Tribunal recorrido - Tribunal da Propriedade Industrial —1.° Juízo
Recorrente: O...
Recorrida: A...
Relator: Juiz Desembargador Manuel Rodrigues
1.a Adjunta: Juíza Desembargadora Ana Paula A. A. Carvalho
2.° Adjunto: Juiz Desembargador Gilberto Jorge
1 - Só há reprodução ou imitação, no todo ou em parte, de marca anteriormente registada por outrem para produtos ou serviços idênticos ou afins, quando possa induzir em erro ou confusão o consumidor ou compreenda um risco de associação com a marca registada.
II - A imitação refere-se a situações em que o infractor concebeu um sinal semelhante à marca para os mesmos produtos ou serviços similares ou então utiliza a mesma marca para produtos ou serviços similares, dando causa, em qualquer dos casos, a um risco de confusão.
III - O exclusivo da marca que o artigo 258.° do CPI pretende assegurar não se estende a todo o tipo de actividades económicas, mas apenas àquelas que envolverem um risco de confusão. É o chamado princípio da especialidade da marca.
IV — Não obstante a tutela efectiva das marcas que atingiram fama ou notoriedade no mercado possa ser mais extensa do que aquela que uma marca (não famosa ou não notória) normalmente alcançaria, ela encontra-se condicionada à existência de um risco de confusão [art.° 241.0, n.° 1, do CPI].
V - Ao contrário do que sucede com a protecção extensiva das marcas notórias [art.° 241.° do CPI], a protecção extensiva das marcas de grande prestígio [art.° 242.° do CPI] dispensa qualquer risco de confusão, porém, estabelece um requisito adicional (inexistente no conceito tradicional de imitação): que o uso da marca posterior procure tirar partido indevido do carácter distintivo ou do prestígio da marca, ou possa prejudicá-los.
(Sumário elaborado pelo Relator).
Acordam na 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa:
I — Relatório
1.1. O..., sociedade comercial com sede em ..., ... Munique, Alemanha (adiante também designada Recorrente), veio ao abrigo do artigo 39° e seguintes do Código da Propriedade Industrial (CPI) interpor recurso da decisão do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) que concedeu o registo
da marca nacional n.° 569591, requerido por A..., contribuinte n° 2..., residente na Rua ..., n° …, … Quinta do Anjo (adiante também designada Recorrida), pedindo que seja revogado o despacho do INPI de 30.03.2017 publicado no Boletim da Propriedade Industrial (BPI) de 4.04.2017.
Alegou, em síntese, existir afinidade e até identidade entre os produtos e serviços assinalados pela marca em questão e os produtos visados pela marca da União Europeia (UE) prioritária n° … O..., que lhe foi oposta em sede de reclamação perante o I N PI e que o elemento verbal distintivo da marca registanda parcialmente reproduz, pelo que se verifica imitação e inerente risco de confusão, agravado pelo facto de tal elemento verbal também fazer parte da denominação social da recorrente, que goza de notoriedade e prestígio, possibilitando-se, igualmente, situações de concorrência desleal, devendo por isso o respectivo registo ter sido recusado, contrariamente ao entendimento sufragado no despacho recorrido.
1.2. Citada a Recorrida, nos termos e para os efeitos do artigo 44° do CPI, respondeu, invocando a falta de afinidade entre os produtos e serviços assinalados, respectivamente, pelas marcas registanda e prioritária, bem como dissemelhanças entre os sinais em confronto que permitem distinguir os mesmos, inexistindo imitação que possa motivar a requerida recusa de registo.
Cumprido o artigo 43° do CPI, o INPI remeteu, a título devolutivo, os processos administrativos.
1.3. Na sequência, em 22/03/2018 [ref.ª Citius 329536] foi proferida sentença, cujo segmento dispositivo, no que para aqui releva, tem o seguinte teor:
Pelo exposto, e nos termos das disposições citadas, nega-se provimento ao recurso interposto por O... e, em consequência, mantem-se a decisão do INPI de 30.03.2017, publicada no BPI de 4.04.2017, que concedeu o registo da marca nacional n°569591.
Custas pela recorrente (artigo 527°, n° 1 do CPC).
1.4. Inconformada, apelou a Recorrente para esta Relação, rematando a alegação de recurso com as seguintes Conclusões:
«a) O objecto do recurso apresentado pela Apelante subsume-se às seguintes questões que foram erradamente apreciadas, interpretadas e aplicadas pelo Tribunal a quo:
- Da imitação das marcas da aqui Apelante (art.° 245.° n.° 1, alíneas b) e c) e art.° 239.°, n.° 1, alínea a), do CPI);
II - Da imitação das marcas notórias da Apelante e do beneficio indevido do carácter distintivo e do prestígio das marcas da Apelante (art.°s 241.° e 242.° do CPI);
III — Da concorrência desleal /art.° 317.°, n.° 1, alínea a), do CPI).
b) A sentença recorrida, deu como assente a verificação do requisito da prioridade das marcas da Apelante e bem assim a verificação do requisito da afinidade com relação aos produtos tubos luminosos para a publicidade [néon] que a marca registanda visa assinalar na classe 9ª; não obstante ter concluído, portanto, pela verificação dos requisitos previstos nas alíneas a) e b) — este parcialmente - do n.° 1 do art.° 245.°, a sentença recorrida entendeu não se verificar o requisito previsto na alínea b) quanto aos demais produtos e serviços e bem assim o requisito a que se refere a alínea c) do citado artigo, ou seja, entendeu não se verificar o requisito da semelhança entre os sinais em confronto susceptível de induzir em erro o consumidor.
c) Ora atentando nos produtos descritos na classe 6ª de ambos os sinais, parece resultar claro, pela própria descrição, que sempre terá que se admitir existir afinidade entre os mesmos, sendo que os produtos assinalados pela marca registanda podem considerar-se incluídos latu sensu nos produtos protegidos pela marca prioritária; de resto, a marca prioritária assinala nesta classe os produtos genéricos que correspondem, ao fim e ao cabo, ao título ou heading da referida classe nos termos da 7ª classificação de Nice, classificação vigente à data em que a marca foi pedida a registo disponível para consulta pública em … e estes, porque mais gerais, incluem no seu âmbito os produtos mais específicos que a marca registanda visa assinalar.
d) O mesmo se diga de resto dos produtos assinalados na classe 9ª de ambos os sinais pois que, repare-se, dirigindo-se a marca prioritária a assinalar nessa classe os produtos genéricos que correspondem ao fim e ao cabo ao título ou heading da mesma nos termos da 7ª classificação de Nice, estes incluem os produtos mais específicos que a marca registanda visa assinalar.
e) Por outro lado, os produtos que a marca registanda visa assinalar na classe 9ª e 19ª encontram-se em relação de manifesta afinidade e complementaridade com os produtos que a marca prioritária assinala nas classes 4.ª, 7.ª, 9.ª e 11.ª.
f) Por fim os serviços assinalados pela marca prioritária na classe 42ª encontram-se numa relação de complementaridade com aqueles outros que a marca registanda pretende proteger quer na classe 37ª como na classe 42ª.
g) Conforme de resto foi já referido em sede de recurso de marca oportunamente apresentado, é inegável que toda a actividade e serviços de planeamento e consultadoria na área da tecnologia de iluminação; concepção de instalações de iluminação desempenha um papel importante para captar a atenção dos consumidores, e nomeadamente em tudo quanto tenha fins publicitários, desempenhando um papel chave na área da sinaléctica, conforme aliás se pode constatar no website da Apelante disponível em …
h) Por outro lado, em concreto, os sinais em confronto coincidem em 3 letras, sendo que as letras coincidentes estão posicionadas pela mesma ordem e sequência; na verdade, temos que do ponto de vista visual os sinais diferem apenas numa consoante, colocada na mesma exacta posição no meio da palavra, conforme a seguir se evidencia:

i) Sucede que o consumidor, que como se sabe não é especialmente atento nem circunspecto, percebe mais facilmente as semelhanças existentes e que ressaltam no conjunto dos sinais, do que aqueles pormenores que os separam, até porque percebe o sinal no seu conjunto e não nos seus isolados elementos.
j) Efectivamente há que frisar que as palavras FUNCHAL, LISBOA, LUANDA, S. PAULO, PRAIA não conferem qualquer distintividade ao sinal que a Apelada pretende ver registado, e não podem como tal ser incluídas no juízo de confundibilidade dos sinais em comparação. Mesmo que assim não fosse, sempre teria que se considerar que tais elementos FUNCHAL, LISBOA, LUANDA, S. PAULO, PRAIA são despiciendos, já que aparecem em segundo plano, com muito menor relevo atendendo à dimensão reduzida da fonte em que estão escritos, e ao facto de estarem por baixo do termo principal e evidenciado ….
k) Ora in casu na marca prioritária o elemento dominante porque único é a palavra O..., e na marca registanda o elemento principal da marca registanda é claramente a palavra … na medida em que esta se apresenta num tamanho muito superior, em claro e evidente destaque sobre as palavras Funchal. Lisboa. Luanda. S. Paulo. Praia
1) Também não se pode aceitar que o elemento figurativo da marca em análise seja sequer impressivo, quanto mais ao ponto de ficar retido pelo consumidor médio que não tem os sinais lado a lado para os comparara! Note-se que tal elemento figurativo consiste na mera utilização de determinado lettering em cor cinza claro (cor não reivindicada, aliás), sendo que nem mesmo o tipo de fonte em que está redigida a palavra … possui uma impressão forte por ser banal e corrente. Assim, no caso presente, tal elemento figurativo é claramente desprezível.
m) Deverá ainda ter-se em conta que mesmo que tal entendimento não fosse suficiente (o que não se admite mas se verte por mera hipótese académica), é pacífico entre as melhores Doutrina e Jurisprudência, a predominância do elemento verbal nas marcas complexas, formadas por elementos nominativos e figurativos.
n) Refere ainda a sentença recorrida que: Foneticamente, a semelhança é ainda menor, (...). Ora al diferença não é suficiente para afastar as elevadas semelhanças visuais que os sinais apresentam pois que quando o consumidor se deparar com o produto assinalado pelo sinal registando, sem que tenha lado a lado para poder confrontar o produto assinalado pelo sinal prioritário, é o aspecto visual do sinal que ressalta e não a forma como este se pronuncia.
o) Não obstante o referido, a verdade é que os sinais não são totalmente dissemelhantes do ponto de vista fonético como pretende fazer crer a sentença recorrida pois que, de facto, sendo o início e termo dos sinais iguais, estes pronunciam-se da mesma forma no seu início e termo, pelo menos.
p) Assim, a sentença não aplicou nem interpretou correctamente a lei, pois da comparação entre os sinais em confronto resulta que os mesmos oferecem um aspecto global ou de conjunto semelhante e inegavelmente confundível, sendo susceptível de confundir o consumidor ou, pelo menos de provocar o risco de associação do sinal registando com as marcas prioritárias reputadas da Apelante.
q) Ou seja, não há dúvidas que as marcas em confronto apresentam elementos não semelhantes, porém a questão que importa decidir é se as diferenças existentes são suficientes para afastar as semelhanças existentes, e não são, como se viu já.
r) Na decisão relativa ao processo de oposição n.° B …, datada de
02/07/2015, disponível em
https://euipo.europa.eu/eSearchC LWfibasi c////number/2 13 8967, considerou-se a marca … confundível com a marca O... .
s) Já no que respeita à decisão n.° 2442/2003, datada de 10/11/2003, disponível em https://euipo.europa.eu/eSearchCLW/#basic////name/osiam, e proferida no âmbito do processo de oposição n.° B …, o mesmo Instituto considerou confundíveis as marcas … e O....
t) Por outro lado, no caso, e pese embora a sentença recorrida tenha reconhecido o carácter notório da marca prioritária, daí não retirou as conclusões que se impunham nos termos supra explanados.
u) De facto, ao invés de ter concluído que, por se tratarem de marcas de prestígio, a marca da Apelante sempre beneficiaria de um regime de protecção alargado, concluiu que tal facto levará a que o consumidor não confundirá as marcas.
v) Ora, considerando quer o elevado prestígio da marca prioritária atentas as provas oportunamente juntas aos autos pela ora Apelante, e que de resto a sentença recorrida reconhece, quer a semelhança que os sinais apresentam pelo menos do ponto de vista visual, será não só mais tentador para a Apelada tentar beneficiar do valor daquelas, como também mais fácil haver uma associação daquelas com o sinal pedido a registo, pois quanto mais semelhantes as marcas, mais fácil e mais provável é, que a última marca traga à memória do público relevante a marca prioritária conhecida.
w) Consequentemente, o pedido de registo sub judice é susceptível de poder dispersar o carácter distintivo do sinal prioritário, enfraquecendo-o. Na verdade, a requerente da marca retiraria, entre outras, vantagem desleal do carácter distintivo e da reputação das marcas da Apelante, pretendendo seguir na esteira da marca de renome para poder beneficiar do seu poder de atracção, da sua reputação e do seu prestígio, e para poder explorar sem contrapartidas financeiras o esforço publicitário de promoção no qual o titular da marca investiu de forma a criar e manter a imagem da marca. (Cfr. Decisão do Tribunal de Justiça Europeu de 18 de Junho de 2009, Processo C-487/07, L'ORÉAL/BELLURE, n.° 50).
x) Pelo que, in casu, também se aplica o disposto no art.° 242.° do CPI, pelo que o registo deveria ter sido recusado para todos os produtos e serviços que a marca registanda visa assinalar, ainda que considerados diferentes daqueles assinalados pela marca prioritária.
y) Também aqui a douta sentença enferma de erro na aplicação da referida norma do artigo 242° pois que esta norma não exige a existência de risco de confusão do consumidor (ao inverso do disposto na alínea c) do n.° 1 do art.° 245.° do CPI) pelo que verificados os requisitos do art.° 242° - os quais se verificam como supra se analisou —não há de cuidar de saber se existe ou não risco de confusão bastando a existência de semelhança entre os sinais e carácter distintivo e reputação dos sinais prioritários.
z) Efectivamente, considerando a existência de semelhança entre os sinais pelo menos ao nível da comparação visual e a reputação e prestigio das marcas prioritárias tem de se concluir ser provável de acordo com as regras normais da experiencia que a marca posterior procure tirar partido indevido do carácter distintivo ou do prestígio da marca, ou que possa vir a prejudicá-los pelo menos.
aa) As normas e princípios a que se aludiu não foram atendidos pela sentença recorrida que, assim, não interpretou nem aplicou bem a lei ao caso concreto.
bb) Ora, in casu, ponderados todos os factos descritos supra neste articulado e que aqui se dão por reproduzidos, é crível que concessão da marca registanda posa levar à existência de situações de concorrência desleal no sentido de actos susceptíveis de criar confusão com a empresa, o estabelecimento, os produtos ...dos concorrentes ... a que alude a alínea a) do n° 1 do artigo 317° do C.P.I. na medida em que a mesma não só constitui uma imitação da marca prioritária da Apelante como também da própria denominação social desta, daqui decorrendo logicamente que existe a possibilidade de ocorrerem situações de concorrência desleal. Pelo que se impunha e impõe à recusa do registo de acordo com a previsão da alínea e) do n.° 1 do art.° 239.° do CPI.
cc) Pelo que a decisão recorrido julgou mal o caso, devendo ser revogada e substituída por outra que reco registo da marca n° ….
Termos em que (...) se requer:
(i) seja o presente recurso de apelação julgado totalmente procedente, revogando-se a decisão proferida em sede de primeira instância, assim se recusando o registo da marca nacional n.° … para assinalar todos os produtos e serviços nomeadamente em face da reputação e prestígio mundial da marca prioritária;
(ii) se assim se não entender, hipótese que se coloca por mera cautela, então subsidiariamente se requer que seja o presente recurso de apelação julgado parcialmente procedente, revogando-se a decisão proferida em sede de primeira instância, assim se recusando o registo da marca nacional n.° … para assinalar todos os produtos solicitados nas classes 6.ª, 9.ª e 19.ª e os serviços solicitados nas classes 37.ª e. 42.ª;
(iii) ou, subsidiariamente se assim não se entender, seja o presente recurso de apelação julgado parcialmente procedente, assim se recusando, pelo menos, o registo da marca nacional n.° .. para assinalar os produtos tubos luminosos para a publicidade [neons] assinalados na classe 9.°».
1.5. A Recorrida apresentou contra-alegações a pugnar pela improcedência do recurso e confirmação da sentença recorrida.
1.6. Foram colhidos os vistos legais.
II — Delimitação do objecto do recurso
De acordo com o disposto nos artigos 635°, n.° 4 e 639°, n.° 1, do Código de Processo Civil (CPC), é pelas conclusões da alegação do recorrente que se define o objecto e se delimita o âmbito do recurso, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, estando esta Relação adstrita à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso (art.° 130° do CPC). Esta limitação objectiva da actuação do Tribunal da Relação não ocorre em sede da qualificação jurídica dos factos ou relativamente a questões de conhecimento oficioso, contanto que o processo contenha os elementos suficientes a tal conhecimento (cf. artigo 5º, n.° 3, do Código de Processo Civil). Também não pode este Tribunal conhecer de questões novas que não tenham sido anteriormente apreciadas porquanto, por natureza, os recursos destinam-se apenas a reapreciar decisões proferidas.
No caso, atendendo às conclusões do recurso as questões a apreciar e decidir são as seguintes:
1.ª Da imitação da marca da aqui Recorrente [artigos 245.°, n.° 1, alíneas b) e c) e 239.°, n.° 1, alínea a), do CPI];
2.ª Do beneficio indevido do carácter distintivo e do prestígio das marcas da Recorrente [artigos 241.° e 242.° do CPI] e da concorrência desleal [artigo 317.°, n.° 1, alínea a), do CPI]
III — Fundamentação
A) Motivação de Facto:
A 1.ª instância considerou provados os seguintes factos, com interesse para a decisão da causa:
1. A recorrente é titular do registo de marca da UE (nominativa) n° … O..., solicitado em 1.04.1996 e concedido em 17.04.1998 para assinalar os seguintes produtos e serviços nas classes 1, 4, 6, 7, 9, 10, 11, 14, 17, 21, 28 e 42 da Classificação de Nice, cf. doc. 3 junto a fls. 19v-21v dos autos que se dá por reproduzido:
1 Produtos químicos para uso industrial, científico e fotográfico. 4 Matérias iluminantes fluorescentes e fosforescentes.
6 Metais comuns e respectivas ligas; cabos e fios metálicos (sem ser para uso eléctrico).
7. Máquinas e partes de máquinas para a indústria de iluminação.
9 Aparelhos e instrumentos científicos , de navegação, geodésicos, eléctricos, fotográficos, de filmagem, ópticos, de pesagem, de medida, de sinalização, de controle e de ensino; cabos e fios para uso eléctrico; aparelhos para a gravação, transmissão e reprodução de som e imagem; aparelhos para o tratamento da informação e computadores.
10 Aparelhos de raios X para uso medicinal; lâmpadas para uso cirúrgico, médico, dentário e veterinário.
11 Aparelhos de iluminação, de aquecimento, de produção de vapor, utensílios de cozedura, dispositivos de arrefecimento, aparelhos secadores e de ventilação; Aparelhos de raios X para uso cosmético e técnico.
14 Metais preciosos e respectivas ligas.
17 Mástique e mástique em pó para colocar portalâmpadas.
21 Vidro em bruto ou semi-trabalhado [com excepção do vidro de construção] .
28 Decorações para árvores de Natal.
42 Planeamento e consultadoria na área da tecnologia de iluminação; concepção de instalações de iluminação.
2. Em 26.08.2016, a recorrida solicitou junto do INPI o registo da marca
nacional (mista) n.° … para assinalar os seguintes
produtos e serviços nas classes 6, 9, 12, 19, 20, 35, 37, 38, 41 e 42 da Classificação de Nice, cf.doc. 5 junto a fls. 24v29v dos autos, que aqui se dá por reproduzido:
6 Letreiros metálicos para publicidade; suportes metálicos para afixação de publicidade
9 Expositores eletrónicos de publicidade; software para publicidade; tubos luminosos para a publicidade [neons] ; tubos luminosos para publicidade [néons]
12 Punhos com publicidade e concebidos para carrinhos
19 Colunas de publicidade [estruturas não metálicas] ; letreiros para
publicidade não metálicos; suportes [colunas] para afixação de publicidade [não metálicos] ; suportes para afixação de publicidade não metálicos
20 Balões de publicidade insufláveis; expositores portáteis para afixar publicidade; objetos de publicidade insufláveis; painéis para publicidade [não luminosos e não mecânicos] ; placas de afixação de publicidade, em matérias plásticas [não luminosas]
35 Aconselhamento em matéria de gestão de marketing; aconselhamento na área de gestão de negócios e marketing; administração relacionada com marketing; agências de informação comercial que prestam informação de negócios, por exemplo, dados de marketing ou demográficos; aluguer de todos os materiais de apresentação de publicidade e marketing; análise relacionada com marketing; assessoria de empresas relacionada com consultas de gestão de marketing; assessoria de empreses relacionada com marketing estratégico; assessoria de negócios comerciais relacionada com marketing; assessoria em gestão de marketing; assessoria em marketing; assessoria no domínio da gestão de negócios comerciais e de marketing; assessoria relativa a gestão de marketing; assessoria sobre marketing de produtos químicos; assistência em marketing; assistência em matéria de marketing; avaliações estatísticas de dados de marketing; consultadoria de marketing; consultadoria profissional em matéria de marketing; consultadoria relacionada com marketing; consultoria de negócios e gestão de atividades de marketing; consultoria em publicidade e marketing; desenvolvimento de estratégias e conceitos de marketing; desenvolvimento e implementação de estratégias de marketing para outros; difusão de material promocional, públicitário e de marketing; distribuição de material publicitário, de marketing e promocional; elaboração de relatórios de marketing; estimativas para efeitos de marketing; estudos de marketing; execução de estudos de marketing; fornecimento de informações sobre marketing; fornecimento de relatórios de marketing; gestão de recursos humanos relacionado com pessoal de marketing; informações ou consultas sobre negócios e marketing; informações sobre marketing; investigações de estratégias de marketing; marketing; marketing comercial [sem ser venda]; marketing de bases de dados; marketing de produtos; marketing de produtos e serviços de terceiros; marketing direto; marketing financeiro; marketing portelefone; marketing promocional; marketing sob a forma de eventos; organização e direção de eventos promocionais de marketing para terceiros; pesquisa de marketing no domínio da cosmética, perfumaria e produtos de beleza; pesquisas de mercado e estudos de marketing; planeamento de estratégias de marketing; preparação de planos de marketing; prestação de consultadoria de marketing no domínio dos meios de comunicação social; prestação de informações relacionadas com marketing; prestação de serviços de assessoria em marketing para fabricantes; previsões em matéria de marketing; produção de gravações de som para fins de marketing; produção de gravações de vídeo para fins de marketing; promoção, publicidade e marketing em websiles; promoção, publicidade e marketing de páginas online; publicidade e marketing; publicidade por marketing direto; serviços de agências de marketing; serviços de análises de marketing; serviços de assessoria em marketing; serviços de assessoria relacionados com marketing; serviços de consultadoria em matéria de marketing; serviços de consultadoria de marketing de negócios comerciais; serviços de consultadoria comercial em matéria de marca nacional n° … página 3 marketing; serviços de consultadoria de empresas relacionados com marketing; serviços de consultadoria de marketing; serviços de consultadoria de negócios, relacionados com o marketing de campanhas de angariação de fundos; serviços de consultoria, aconselhamento e assistência em publicidade, marketing e promoção; serviços de marketing; serviços de marketing de negócios comerciais; serviços de marketing direto; serviços de marketing em motores de busca; serviços de marketing empresarial; serviços de marketing no âmbito da odontologia; serviços de marketing no âmbito de viagens; serviços de marketing no âmbito de restaurantes; serviços de marketing telefónico [sem ser venda]; serviços de planeamento para estudos de marketing; serviços de publicidade, de promoção e de marketing; serviços de publicidade, de marketing epromocionais; serviços de publicidade, de marketing e de promoção; serviços de publicidade e • marketing; serviços de recrutamento para pessoal de vendas e de marketing; agências de publicidade; aluguer de painéis de afixação de publicidade; aluguer de painéis de publicidade; aluguer de painéis para publicidade; aluguer de tempo para publicidade nos meios de comunicação; análise da reação à publicidade; análise da sensibilização pública para a publicidade; análises de publicidade; assessoria comercial relacionada com publicidade; assistência para a gestão em empresas comerciais no que respeita a publicidade; colocação de publicidade; compilação de estatísticas relacionadas com publicidade
37 Serviços de consultoria relacionados com a instalação de equipamento audiovisual
38 Serviços de comunicação audiovisual; transmissão de informações no domínio audiovisual
41 Cursos de formação em planeamento estratégico relacionado com publicidade, promoção, marketing e empresas; serviços de formação relacionados com ações de marketing para o comércio a retalho
42 Design de gráficos de vídeo assistido por computador; design de gráficos e conceção de fardas para a identidade de empresas; design e design gráfico para a criação de websites; design e design gráfico para a criação de páginas web na internet; design gráfico; design gráfico de material de impressão; serviços de design gráfico
3. Em 7.12.2016, a recorrente apresentou junto do INPI reclamação contra o requerido registo de marca nacional (ponto 2 do presente enunciado de factos), invocando nomeadamente imitação da sua marca da UE n° … O..., e possibilidade de concorrência desleal, nos termos constantes do documento junto a fls. 94-101 dos autos, que aqui se dão por reproduzidos.
4. De acordo com a página web da recorrente identificada pelo localizador
… esta desenvolve, no âmbito da sua actividade, retroiluminação LED para caixas de luz, ai descritas como espaços de publicidade populares em todos os tamanhos e variantes. Também facultam informação e orientação. Os letreiros de publicidade e painéis de informação com iluminação de fundo LED destacam-se do ambiente e chamam a atenção. As caixas de luz podem ser usadas em muitas aplicações diferentes: em paragens de autocarro, estações ferroviárias, armazéns de vendas, cinemas ou aeroportos. Adicionalmente, são usadas para retroiluminação LED de logotipos e nomes de marca'.
5. De acordo com a página web da recorrente identificada pelo localizador
…, esta fornece igualmente aplicações de retroiluminação LED para letras de perfil, aí descritas como 'texto e letras retroiluminados com lâmpadas LED, são mais do que a apresentação da própria marca, actualmente caracterizam a imagem de toda a cidade. A iluminação LED que chama a atenção dos clientes e convidados e cria confiança pelos seus altos níveis de reconhecimento da marca ou empresa. Quase não existem limites para a utilização das letras de perfil. Lojas e restaurantes beneficiam disto e até casinos, postos de combustíveis e áreas de produção usam letras iluminadas com LED'.
5. A recorrente, com a sua marca O..., foi parceira oficial do Festival Eurovisão da Canção 2017, onde a canção representante de Portugal venceu e que foi visto por 180 milhões de pessoas, dos quais 1,4 milhões em Portugal, cf. resulta das
páginas web identificadas, respectivamente, pelos localizadores

e do website …
B) Motivação de Direito
Primeira Questão: Da imitação das marcas da Recorrente.
1. Insurge-se a Recorrente O... contra a sentença em crise, que negou provimento ao recurso por si interposto e, em consequência, manteve a decisão do INPI, de 30-03-2017 publicada no BPI de 04-04-2017, que concedeu o registo da marca nacional n.° .. …, por considerar, em substância, que aquela sentença não aplicou nem interpretou correctamente a lei, pois da comparação entre os sinais em confronto resulta que os mesmos oferecem um aspecto global ou de conjunto semelhante e inegavelmente confundível, sendo susceptível de confundir o consumidor, ou pelo menos de provocar o risco de associação do sinal registando com as marcas prioritárias reputadas da Apelante [conclusão p)], acrescentando ainda que pese embora a sentença recorrida tenha reconhecido o carácter notório da marca prioritária daí não retirou as conclusões que se impunham ... [conclusão t)].
O artigo 222.° do CPI, no seu n.° 1, dispõe que a marca pode ser constituída por um sinal ou conjunto de sinais susceptíveis de representação gráfica, nomeadamente palavras, incluindo nomes de pessoas, desenhos, letras números, sons, a forma do produto ou da respectiva embalagem, desde que sejam adequados a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras.
E nos termos do n.° 2 da citada disposição legal a marca pode. Igualmente, ser constituída por frases publicitárias para os produtos ou serviços a que respeitem, desde que possuam carácter distintivo, independentemente da protecção que lhe seja reconhecida pelos direitos de autor.
Segundo a definição legal, a marca, enquanto objecto de direitos, deve ser composta por um sinal representável graficamente, com capacidade distintiva de modo a poder desempenhar uma função essencial: a Função Distintiva (distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas).
Além desta função essencial, têm sido reconhecidas à marca, pela Doutrina e Jurisprudência, uma Função de Garantia da Qualidade dos Produtos e Serviços [função derivada], através da qual a marca garante, indirectamente, a qualidade dos produtos ou serviços marcados por referência dos produtos ou serviços a uma origem não enganosa, e uma Função Publicitária [função complementar], pela qual, em complemento da função distintiva, pode cumprir, nalguns casos, a função de contribuir, por si mesma, para a promoção dos produtos ou serviços que assinala.
Nos termos da alínea a) do n.° 1 do artigo 239.° do CPI, constitui fundamento de recusa do registo dc marca, a reprodução ou imitação, no todo ou em parte, de marca anteriormente registada por outrem para produtos ou serviços idênticos ou afins, que possa induzir em erro ou confusão o consumidor ou que compreenda o risco de associação com a marca registada.
A definição do conceito de imitação ou de usurpação, tal como se ponderou na sentença recorrida, é a que consta do artigo 245.° do mencionado diploma legal, que dispõe:
1 - A marca registada considera-se imitada ou usurpada por outra, no todo ou em parte, quando, cumulativamente:
a) A marca registada tiver prioridade;
b) Sejam ambas destinadas a assinalar produtos ou serviços idênticos ou afins;
c) Tenham tal semelhança gráfica, figurativa, fonética ou outra que induza facilmente o consumidor em erro ou confusão, ou que compreenda um risco de associação com marca anteriormente registada, de forma que o consumidor não as possa distinguir senão depois de exame atento ou confronto.
2 - Para os efeitos da alínea b) do n.° 1:
a) Produtos e serviços que estejam inseridos na mesma classe da classificação de Nice podem não ser considerados afins;
b) Produtos e serviços que não estejam inseridos na mesma classe da classificação de Nice podem ser considerados afins.
3 - Considera-se imitação ou usurpação parcial de marca o uso de certa denominação de fantasia que faça parte de marca alheia anteriormente registada.
Da prova documental patente nos autos resulta manifesto que o requisito da prioridade da marca se encontra preenchido, na medida em que o registo da marca europeia O... já se encontrava em vigor aquando do pedido de registo da marca nacional ….
A própria sentença dá os respectivos factos como assentes e sobre os mesmos não existe qualquer controvérsia (pontos 1 e 2 dos factos provados).
Importa, assim, tal como se fez na sentença recorrida, focar a nossa atenção no preenchimento, ou não, dos requisitos enunciados nas alíneas b) e c) do artigo 245.° do CPI acima transcrito.
1.1. Da semelhança ou afinidade entre produtos ou serviços que as marcas em confronto se destinam a assinalar
As marcas O... e …, ora em litígio, reclamam ambas produtos ou serviços assinalados nas classes 6.ª, 9.ª e 42.ª da Tabela de Nice, sustentando a Recorrente a existência de um forte elo de afinidade: (i) entre os produtos que a marca registanda visa assinalar na classe 9 e 19, por se encontrarem em relação de manifesta afinidade e complementaridade com os produtos que a marca registanda assinala nas classes 4, 7, 9 e 11; (ii) entre os serviços assinalados pela marca prioritária na classe 42 e aqueles que a marca registanda pretende proteger quer na classe 37 como na classe 42, por estarem entre si numa relação de manifesta complementaridade.
Para justificar a existência do invocado elo de afinidade, acessoriedade e/ou complementaridade em relação aos produtos nas classes 6, 9 e 19 e aos serviços que a marca registanda pretende assinalar nas classes 37 e 42, acrescenta a Recorrente que toda a actividade e serviços de planeamento e contadoria na área de tecnologia de iluminação e concepção de instalações de iluminação desempenha um papel importante para captar a atenção dos consumidores, e nomeadamente em tudo quanto tenha fins publicitários, desempenhando um papel chave na área da sinalética.
É sabido que está reservado ao titular a exploração económica da marca para os produtos ou serviços que a mesma se reporta. O artigo 258.° do CPI estabelece que o registo da marca confere ao seu titular o direito de impedir terceiros de usar, no exercício de actividades económicas, qualquer sinal igual ou semelhante, em produtos ou serviços idênticos ou afins daqueles para os quais a marca foi registada, e que, em consequência da semelhança entre os sinais e da afinidade dos produtos ou serviços, possa causar um risco de confusão, ou associação, no espírito do consumidor.
O exclusivo da marca que o preceito legal pretende assegurar não se estende a todo o tipo de actividades económicas, mas apenas àquelas que envolverem um risco de confusão. Dito de oura forma, o conteúdo do direito à marca não se reconduz à tutela de um sinal abstractamente considerado, mas sim dum sinal em correlação com determinados produtos ou serviços concretos. É o chamado princípio da especialidade da marca, em decorrência do qual, sobre um mesmo sinal distintivo podem recair dois ou mais direitos de marca pertencentes a titulares desde que cada uma das marcas se destine a produtos ou serviços diferentes, ou seja, desde que esteja afastado qualquer risco de confusão.
Distinguem-se habitualmente dois tipos de actuações susceptíveis de conduzir ao risco de confusão: a contrafacção e a imitação. A contrafacção respeita a situações de simples reprodução da marca para os mesmos produtos ou serviços, em que o risco de confusão é um dado adquirido. Por sua vez, a imitação refere-se a situações em que o infractor concebeu um sinal semelhante à marca para os mesmos produtos ou serviços similares ou então utiliza a mesma marca para produtos ou serviços similares, dando causa, em qualquer dos casos, a um risco de confusão.
Nem sempre é fácil estabelecer as relações de não identidade entre as marcas ou entre os produtos ou serviços em confronto.
Nessa tarefa é fundamental atender ao conceito legal de imitação estabelecido no artigo 245° do CPI supra citado, nos termos do qual o risco de associação ou de confusão estabelece, em princípio, os limites materiais fundamentais da: reserva do titular da marca.
No Acórdão do TJCE, de 29.09.98, proc. n.° C-39/97, esclareceu-se, à luz da disposições da DM [Primeira Directiva do Conselho de 21-12-1988, que harmoniza as legislações dos Estados-membros em matéria de marcas (JOCE n.° L40, de 11-02-89], que o risco de confusão, na acepção da DM, implica que o público possa crer que os produtos ou serviços em causa provêm da mesma empresa ou, eventualmente, de empresas ligadas economicamente, portanto, um risco de confusão quanto à origem empresarial dos produtos ou serviços em causa.
O uso da marca, bem como a intensidade e modalidade de exploração, designadamente o uso na publicidade, têm, naturalmente, influência, no conteúdo do respectivo direito. Assim, a notoriedade da marca tem efeitos na avaliação do risco de confusão, seja através de uma flexibilização do critério da similaridade entre produtos ou serviços, ou do grau de proximidade entre marcas, seja através da distinção que de facto é feita entre marcas fracas e marcas fortes.
Todavia, como refere, igualmente, ANTÓNIO CORTE-REAL CRUZ (trabalho citado na nota 6, p. 104) embora a tutela efectiva das marcas que atingiram fama ou notoriedade no mercado possa ser mais extensa do que aquela que uma marca (não famosa ou não notória) normalmente alcançaria a verdade é que (...) se encontra condicionada à existência de um risco de confusão, ainda que mais ou menos ténue. Esse risco não se verificará caso não haja similaridade entre os produtos ou serviços considerados, pelo que é perfeitamente possível, e corresponde à normalidade social, a coexistência no mercado de marcas idênticas de titulares diversos.
Os pressupostos (limites incluídos) dessa protecção extensiva das marcas notórias e das marcas de prestígio, para além dos limites resultantes do princípio da especialidade, estão enunciados nos artigos 241.° e 242.° do CPI, respectivamente.
No caso vertente, atendendo aos factos considerados provados sob os pontos 1 e
5 [antiguidade do registo da marca prioritária e manifesta notoriedade da Recorrente no sector da iluminação, em especial pela sua presença em eventos com forte impacto mediático em Portugal e na
Europa] podemos concluir que a marca prioritária O... goza de notoriedade em Portugal e na Comunidade Europeia.
Indaguemos, então, se à luz do quadro legal descrito, existe, ou não, a apontada semelhança ou afinidade entre produtos ou serviços que as marcas em confronto se destinam a assinalar.
--Na sentença recorrida, sobre esta temática, ponderou-se:
«Na decisão recorrida deu-se, sem mais, por assente a existência de afinidade entre alguns dos produtos e serviços que os sinais litigantes indicam.
Mas será que essa afinidade existe realmente, para além da inserção dos produtos ou serviços na mesma classe, o que, aliás, nos termos do artigo 245°, n° 2, alínea b), do CPI, não implica necessariamente que entre eles exista afinidade?
Vejamos. Os sinais em confronto visam assinalar, respectivamente:
Constata-se que, enquanto a marca registanda assinala produtos e serviços centrados na publicidade, marketing e promoção, a marca prioritária visa identificar produtos ou serviços centrados na iluminação e respectivas tecnologias, materiais, equipamentos e aplicações.
É certo que ambas as marcas assinalam produtos nas mesmas classes 6 e 9, bem como serviços na mesma classe 42.
Mas, os 'letreiros metálicos para publicidade' e 'suportes metálicos para afixação de publicidade', assinalados pela marca registanda na classe 6, nada têm que ver com 'metais comuns e respectivas ligas' ou 'cabos e fios metálicos, assinalados pela marca prioritária na mesma classe. Pela sua especifica finalidade, adequada a servir de suporte ou expressão de publicidade, os produtos registandos não se confundem com a matéria-prima 'metais e respectivas ligas' ou os 'cabos e fios metálicos', sem finalidade específica, assinalados pelo sinal prioritário, nem visam o mesmo público-alvo ou partilham dos mesmos circuitos de distribuição; tão pouco se verificando relação de complementaridade, acessoriedade ou substituição entre eles.
O mesmo se diga quanto aos 'expositores electrónicos de publicidade', 'software para publicidade' e 'tubos luminosos para publicidade [neons]' , assinalados pela marca registanda na classe 9, que nada têm que ver com 'aparelhos e instrumentos científicos, de navegação, geodésicos, eléctricos, fotográficos, de filmagem, ópticos, de pesagem, de medida, de sinalização, de controlo e de ensino', 'cabos e fios para uso eléctrico', 'aparelhos para a gravação e reprodução de som e imagem' ou 'aparelhos para o tratamento da informação e computadores', assinalados pela marca prioritária na mesma classe 9. Tão-pouco estes produtos visam satisfazer as mesma necessidades ou o mesmo público-alvo ou partilham os mesmos circuitos de distribuição, não se constatando relação de complementaridade, acessoriedade ou substituição entre eles.
De igual modo, os serviços prioritários de 'planeamento c consultadoria na área da tecnologia de iluminação, concepção de instalações de iluminação não visam satisfazer as mesmas necessidades ou público-alvo, nem partilham os mesmos canais de distribuição que os serviços registandos de `design de gráficos de vídeo assistido por computador', `design de gráficos e conceção de fardas para a identidade de empresas' ,`design e design gráfico para a criação de websites' ou páginas web na internet ou 'Design gráfico de material de impressão', assinalados pelos sinais em confronto na mesma classe 42.
Tão pouco se constata qualquer afinidade entre 'produtos químicos para uso industrial, científico e fotográfico', 'máquinas e partes de máquinas para a indústria da iluminação', `aparelhos de raios X para uso medicinal, cosmético ou técnico', 'lâmpadas para uso cirúrgico, médico, dentário ou veterinário', 'aparelhos de iluminação, de aquecimento, de produção de vapor', 'utensílios de cozedura', 'dispositivos de arrefecimento', 'aparelhos secadores e de ventilação', 'metais preciosos e respectivas ligas', `mástique e mástique em pó paru colocar portalâmpadas' , 'vidro em bruto ou semi-trabalhado' e 'decorações para árvores de Natal' ¬assinalados pela marca prioritária nas classes 1, 4, 7, 10, 11, 14, 17, 21 e 28 - e os produtos e serviços assinalados pela marca registanda nas 12, 19, 20, 35, 37, 38 e 41, tais como 'punhos com publicidade concebidos para carrinhos', 'colunas ou balões de publicidade', `marketing financeiro', 'serviços de comunicação audiovisual', 'cursos de formação em planeamento estratégico' ou concepção de fardas para a identidade de empresas'.
Na realidade, da descrição dos produtos e serviços assinalados pelos sinais em confronto, constata-se que a marca prioritária se move mais na área de produtos industriais relacionados com a iluminação e suas diversas aplicações, e por isso é sobretudo conhecida, só acessoriamente abrangendo serviços, de consultadoria e concepção na dita área (classe 42, única classe de serviços assinalada, contra 11 classes de produtos), enquanto a marca registanda se move mais na área dos serviços de marketing, promoção, publicidade, comunicação, design e formação, só acessoriamente abrangendo produtos que servem de suporte ou instrumento às ditas actividades de marketing/publicidade (mais de 100 serviços assinalados em 5 das 11 classes de serviços, contra cerca de uma dúzia de produtos assinalados em 5 das 34 classes de produtos da Classificação de Nice.
Não se verifica, pois, sobreposição ou concorrência entre os produtos e serviços assinalados pelas marcas prioritária e registanda, sendo os respectivos mercados distintos e específicos, visando satisfazer necessidades diversas, de uma clientela também diferente embora em ambos casos predominantemente profissional, em distintas áreas de actividade económica.
Não se constata, deste modo, afinidade entre os produtos ou serviços registandos e os produtos e serviços prioritários, excepto no que toca aos 'tubos luminosos para a. publicidade [néon]' , assinalados pela marca registanda na classe 9, os quais são afins das 'matérias iluminantes fluorescentes e fosforescentes', dos 'aparelhos de iluminação' e da 'concepção de instalações de iluminação', assinalados pela marca prioritária nas classes 4, 11 e 42, respectivamente.
Assim, com excepção dos ditos 'tubos luminosos para a publicidade [néon]', assinalados pela marca registanda na classe 9, não se constata a existência de afinidade entre os demais produtos e serviços assinalados por esta nas classes 6, 9, 12, 19, 20, 35, 37, 38, 41 e 42, e os produtos e serviços assinalados pelo sinal prioritário nas classes 1, 4, 6, 7, 9, 10, 11, 14, 17, 21, 28 e 42
[...]» (Fim de citação).
Ora, o que se constada é que a sentença em crise, ao contrário do que é afirmado pela Recorrente, fez uma análise extensiva, rigorosa e irrepreensível da questão em apreço, tendo concluído - e bem - que, com excepção dos ditos tubos luminosos para a publicidade [néon] , assinalados pela marca registanda na classe 9, não se constata a existência de afinidade entre os demais produtos e serviços assinalados por esta nas classes 6, 9, 12, 19, 20, 35, 37, 38, 41 e 42, e os produtos e serviços assinalados pelo sinal prioritário nas classes 1, 4, 6, 7, 9, 10, 11, 14, 17, 21, 28 e 42.
Assim como concluiu, e bem, que no caso concreto não se verifica sobreposição ou concorrência entre os produtos e serviços assinalados pelas marcas prioritária e registanda, sendo os respectivos mercados distintos e específicos, visando satisfazer necessidades diversas, de uma clientela também diferente embora em ambos casos predominantemente profissional, cm distintas áreas de actividade económica.
Na verdade, apesar da multiplicidade de produtos e serviços assinalados por cada uma das marcas em litígio, apenas se verifica o requisito da afinidade com relação aos produtos tubos luminosos para a publicidade [néon] , que a marca registanda visa assinalar na classe 9, de per si insuficiente para fundamentar a recusa do registo da marca registanda, por não resultar demonstrado o risco de associação ou de confusão entre produtos ou serviços assinalados pelas marcas prioritária e registanda, quanto à origem empresarial dos produtos ou serviços em causa, por ser patente que não disputam entre si — no que concerne aos produto afins tubos luminosos para a publicidade [néon], os mesmos consumidores, porquanto se movem em mercados distintos e específicos, visando satisfazer necessidades diversas c distintas, de uma clientela diferente, ainda que de âmbito predominantemente profissional[ ], em distintas áreas de actividade económica.
A reserva do titular da marca não se estende a todo o tipo de actividade económica, independentemente do sector económico em causa. Se a reserva do titular da marca se estendesse a todo o tipo de actos de exploração económica, como pretende a Recorrente, ficaria comprometida a liberdade económica consagrada no Tratado que instituiu a União Europeia e na Constituição da República Portuguesa.
E só podemos acompanhar, pelo seu acerto, a referida fundamentação e o sentido decisório alcançado, que aqui sufragamos.
Nesta conformidade, bem andou o M.mo. Juiz a quo em considerar não verificado o requisito constante da alínea b) do artigo 245° do CPI.
1.2. Da semelhança dos sinais:
Defende a Recorrente que os sinais em causa - O... e
- oferecem um aspecto global ou de conjunto semelhante e inegavelmente confundível, sendo susceptível de confundir o consumidor ou, pelo menos, de provocar o risco de associação do sinal registando com as marcas prioritárias reputadas da Recorrente.
Sobre esta temática, ponderou-se na sentença recorrida:
((Enquanto a marca prioritária é nominativa, a marca registanda é mista, combinando o elemento verbal … Funchal. Lisboa. Luanda. S.Paulo. Praia com um elemento figurativo caracterizado pela estilização das letras sobredimensionadas do vocábulo dominante `…, inscrito sobre os restantes vocábulos 'Funchal. Lisboa. Luanda. S. Paulo. Praia', visíveis em caracteres de muito menor dimensão, tom esbatido e não estilizados, num plano inferior e como que esmagados pelo dito vocábulo estilizado …, que claramente sobressai no conjunto da marca Mista como particularmente distintivo, quer pela dimensão, quer pelo característico estilo gráfico utilizado, numa combinação original de letras maiúsculas e minúsculas (`g', 'a') integradas no mesmo vocábulo com igual
dimensão e grafismo, distinto do das simples letras de imprensa maiúsculas que exclusivamente compõem a marca verbal prioritária O....
Graficamente, constata-se que os elementos verbais característicos de ambas, O... e .. partilham, pela mesma ordem, a primeira letra …. e as duas últimas …, das cinco e quatro letras que respectivamente os compõem, nada tendo em comum o remanescente de ambos os ditos elementos verbais característicos, letras centrais … no caso da marca prioritária, segunda letra …' no caso da marca registanda.
Foneticamente, a semelhança é ainda menor, já que com a particular sonoridade do s seguido de consoante r na língua lusa, nenhuma das duas sílabas que compõem qualquer dos ditos vocábulos característicos se pronuncia da mesma maneira, pronunciando-se o sinal prioritário … e o sinal registando … .
Conceptualmente, nada se constata de comum, pois nenhuma tem significado particular, tratando-se qualquer deles de expressão de fantasia.
E se é certo que o primeiro vocábulo é o que primeiro chama a atenção do consumidor, tratando-se em ambos os casos de mono vocábulos, é a impressão de conjunto que deve prevalecer para aquilatar do risco de confusão entre as duas palavras em confronto, sem tentar artificialmente isolar algumas das letras, sílabas ou partes que as compõem.
Ora, no conjunto dos sinais, as diferenças, designadamente gráficas, figurativas, fonéticas e conceptuais superam largamente a única semelhança resultante da coincidência, gráfica mais que fonética, das primeira e duas últimas letras dos correspondentes elementos verbais característicos, nada mais havendo que as aproxime ou relacione, sendo a impressão de conjunto que emana dos sinais em confronto, claramente distinta e como tal facilmente perceptível pelo consumidor medianamente atento, independentemente de exame atento ou confronto.
Não se constata, deste modo, o invocado risco de confusão entre a marca prioritária da recorrente O... e a marca registanda , não sendo as semelhanças tais que possam facilmente induzir o consumidor em erro ou confusão sobre a identidade ou origem dos produtos ou serviços por elas respectivamente assinalados, ou de os associar, julgando provirem da mesma entidade ou entidades de algum modo entre si relacionadas» (Fim de citação).
Também neste conspecto não poderíamos estar mais de acordo com a decisão recorrida, que fez uma avaliação completa, exaustiva e rigorosa dos sinais distintivos, isto é, das dissemelhanças existentes entre os sinais de cada uma das marcas em litígio, segundo critérios de apreciação comuns relativamente consensuais na doutrina.
A sentença em crise apreciou as marcas em litígio no seu conjunto e analiticamente, dissecando as diversas componentes, efectuando um exame comparativo e contextual dos sinais entre si, para concluir — e bem — que, no conjunto dos sinais as diferenças, designadamente gráficas, figurativas, fonéticas e conceptuais superam largamente a única semelhança resultante da coincidência, gráfica mais que fonética, das primeira e duas últimas letras dos correspondentes elementos verbais característicos, nada mais havendo que as aproxime ou relacione, sendo a impressão de conjunto que emana dos sinais em confronto, claramente distinta e como tal facilmente perceptível pelo consumidor medianamente atento, independentemente de exame atento ou confronto.
É que, além do mais referido e ao contrário do que defende a Recorrente, as palavras FUNCHAL, LISBOA, LUANDA, S. PAULO, PRAIA conferem distintividade ao sinal que a Recorrida pretende ver registado e têm, como tal, de ser incluídas no juízo de confundibilidade dos sinais em comparação.
Na verdade, entendemos, tal como a sentença recorrida, que o elemento figurativo da marca registanda, caracterizado pela estilização das letras sobredimensionadas do vocábulo dominante …, inscrito sobre os restantes vocábulos FUNCHAL, LISBOA, LUANDA, S. PAULO, PRAIA é de tal modo impressivo que não é susceptível de gerar confusão com a marca prioritária O... junto do consumidor médio.
No caso, sobressai a imagem do conjunto, o plano visual, sendo irrelevante a reprodução parcial [das vogais … e … e da consoante …] do único elemento do sinal da Recorrente, não se vislumbrando semelhanças tais que possam induzir em erro ou confusão o consumidor médio dos produtos ou serviços assinalados pelas marcas em confronto, sem olvidar, que os produtos ou serviços assinalados por ambas as marcas visam destinatários distintos e predominantemente profissionais, com aptidões técnicas médias, menos propícias a confusão quando à proveniência dos produtos ou serviços em causa.
Por outro lado, face às apontadas dissemelhanças, o facto de a denominação da Recorrente incluir a marca prioritária também não tem a virtualidade de agravar o risco de confusão ou associação entre marcas, posto que, como saliente a sentença recorrida, a denominação O... nada tem que ver, nem sugere qualquer ligação ao sinal
Em conclusão, este segmento da sentença recorrida também não nos merece qualquer reparo.
2. Segunda Questão: - Do beneficio indevido do carácter distintivo e do prestígio das marcas da Recorrente [artigos 241.° e 242.° do CPI] e da concorrência desleal [artigo 317.°, n.° 1, alínea a), do CPI]
Argumenta a Recorrente que pese embora a sentença recorrida tenha reconhecido a carácter notório da marca prioritária, daí não retirou as conclusões que se impunha, porquanto, por se tratar de marca de prestígio sempre beneficiaria de um regime de protecção alargado.
Salvo o devido respeito, não concordamos com o expendido, pois a sentença recorrida apreciou — e com acerto, antecipamos - a questão da extensão da protecção da marca prioritária enquanto marca notória e de prestígio, concluindo pela não verificação dos pressupostos dessa protecção extensiva, previstos nos artigos 241.° e 242.° do CPI.
Vejamos o seguinte excerto da sentença recorrida:
«Não se constata, deste modo, o invocado risco de confusão entre a marca prioritária da recorrente O... e a marca registanda , não sendo as semelhanças tais que possam facilmente induzir o consumidor em erro ou confusão sobre a identidade ou origem dos produtos ou serviços por elas respectivamente assinalados, ou de os associar, julgando provirem da mesma entidade ou entidades de algum modo entre si relacionadas.
E nem o facto de a denominação social da recorrente incluir a marca prioritária tem a virtualidade de agravar um risco de confusão que, à partida, se não demonstra existir. É que O... nada tem que ver, nem sugere qualquer ligação a ...
Não se encontra assim preenchido o último dos requisitos cumulativamente previsto no artigo 245° do CPI, para que se considere haver imitação de marca registada.
E tão pouco se demonstra qualquer possibilidade de a recorrida fazer concorrência desleal à recorrente através do sinal registando, já que se não confundem os sinais em causa, nem se constata sobreposição ou concorrência dos correspondentes mercados ou áreas de actividade.
Finalmente, não obstante a clara notoriedade da recorrente no sector da iluminação, atenta a provecta idade e presença em eventos de grande impacto mediático como o Festival Eurovisão da Canção, não vem demonstrado risco de confusão ou associação entre os sinais, nem tão pouco que o uso do sinal registando procure tirar partido indevido do caracter distintivo ou prestígio da marca prioritária, ou possa prejudica-los.
Improcede, pois, o fundamento que, a esse título e nos termos dos artigos 241° e 242° do CPI, igualmente invocou a recorrente» (Fim de citação).
Ao contrário do que sucede com a protecção extensiva da marca notória [art.° 241.° do CPI], a protecção extensiva da marca de grande prestígio [art.° 242.° do CPI] dispensa qualquer risco de confusão, porém, estabelece um requisito adicional (inexistente no conceito tradicional de imitação): que o uso da marca posterior procure tirar partido indevido do carácter distintivo ou do prestígio da marca, ou possa prejudicá-los.
Ora, no caso concreto, não se pode concluir, pelos fundamentos aduzidos, pela imitação da marca prioritária pela marca registanda, nem pela susceptibilidade de a Recorrida fazer concorrência sequer parasitária ou desleal à Recorrente através do sinal registando, por não serem confundíveis e visarem diferentes mercados e clientela, inexistindo sobreposição de actividades.
Por isso, bem andou a sentença recorrida em concluir, como concluiu, pelo não preenchimento do terceiro e último dos requisitos cumulativos, constitutivos do fundamento de recuso do registo, previsto no art.° 245.°, n.° 1, alínea c), do CPI.
Por outro lado, não resultando demonstrado o risco de confusão, a tal não obsta a notoriedade da marca prioritária, pois, como se referiu supra, embora a tutela efectiva das marcas que atingiram fama ou notoriedade no mercado possa ser mais extensa do que aquela que uma marca (não famosa ou não notória) normalmente alcançaria, ela encontra-se condicionada à existência de um risco de confusão, ainda que mais ou menos ténue. Esse risco não se verificará caso não haja similaridade entre os produtos ou serviços considerados.
Por conseguinte, não pode a Recorrente beneficiar da extensão de protecção conferida pelo artigo 241.° do CPI.
Acresce que nada nos autos permite inferir que exista, por parte da Recorrida, um aproveitamento ilegítimo, parasitário sequer, ou um prejuízo do carácter distintivo ou do prestígio da marca prioritária O..., e menos ainda que a marca registanda constitua tradução, seja igual ou semelhante a esta marca prioritária, tal como exige o n.° 1 do art.° 242.° do CPI, normativo que, como tal, não tem aplicação ao caso concreto.
Ora, atendendo às manifestas dissemelhanças entre as marcas em litígio, à inexistência de afinidade entre os produtos ou serviços por ambas assinalados, com excepção dos produtos tubos luminosos para a publicidade [néon], que a marca registanda visa assinalar na classe 9, de per si insuficiente para fundamentar a recusa do registo [por não resultar demonstrado o risco de associação ou de confusão entre produtos ou serviços assinalados pelas marcas prioritária e registanda, quanto à origem empresarial dos produtos ou serviços],
e bem assim à já referida falta de identidade da clientela visada pelos produtos assinalados pelas marcas em litígio, a pressupor mercados distintos, não se antevê, salvo
o devido respeito, que a concessão da marca registanda possa levar à existência de situações de concorrência desleal ou sequer parasitária, no sentido de actos susceptíveis de criar confusão com a empresa, o estabelecimento, os produtos ou os serviços dos concorrentes... a que alude a alínea a) do n.° 1 do artigo 317.° do CPI.
Assim, face aos considerandos anteriores, isto é, à ausência de semelhança entre os sinais, às diferentes áreas de actividade em que opera cada uma das marcas em litígio
e aos diferentes públicos-alvo e canais de distribuição para que se direccionam, não se verificando qualquer relação de complementaridade, acessoriedade ou substituição entre eles, igualmente se impunha que a sentença recorrida considerasse, como considerou, que a concessão do registo da marca … não acarreta qualquer perigo para a marca prioritária O..., nomeadamente no que concerne à possibilidade de se verificarem situações de concorrência desleal.
3. Dos pedidos subsidiários
Subsidiariamente, a Recorrente peticiona:
- a revogação parcial da decisão proferida em sede de primeira instância, assim se recusando o registo da marca nacional n.° … para assinalar todos os produtos solicitados nas classes 6.ª, 9.ª e 19.ª e os serviços solicitados nas classes 37.ª e 42.ª;
- ou, c assim não se entender, seja o presente recurso de apelação julgado parcialmente procedente, assim se recusando, pelo menos, o registo da marca nacional n.° … para assinalar os produtos tubos luminosos para a publicidade [neons] assinalados na classe 9.ª».
3.1. No que concerne ao primeiro pedido subsidiário o mesmo não pode ser atendido pelos motivos anteriormente explanados, isto é, por não se mostraram preenchidos, no caso concreto, os dois dos três requisitos [cumulativos] de imitação previstos no art.° 245.° do CPI, designadamente os exigidos pelo n.° 1, alíneas b) [identidade ou afinidade dos produtos ou serviços marcados] e c) [semelhança gráfica, figurativa, fonética da marca posterior com a marca prioritária que induza facilmente o consumidor em erro ou confusão, ou que compreenda um risco de associação com marca anteriormente registada, de forma que o consumidor não as possa distinguir senão depois de exame atento ou confronto']
A única semelhança ou afinidade que se constata existir entre os produtos ou serviços assinalados pela marca registanda e os produtos ou serviços assinalados pela marca prioritária é relativa aos produtos tubos luminosos para a publicidade [néon], assinalados pela marca registanda na classe 9, os quais são afins dos produtos matérias iluminantes fluorescentes e fosforescentes e aparelhos de iluminação e dos serviços concepção de instalações de iluminação, assinalados pela marca prioritárias nas classes 4, 11 e 42, respectivamente.
Todavia, como já se referiu supra, tal semelhança ou afinidade entre estes únicos produtos/serviços, não é susceptível de induzir o consumidor em erro ou confusão ou de acarretar um risco de associação entre ambas, nos termos da alínea c) do n.° 1 do artigo 245.° do CPI, considerando as diferentes áreas de actividade em que cada uma das marcas opera, visando diferentes públicos-alvo e distintos circuitos de distribuição.
Com efeito, como se ponderou na sentença recorrida, da análise global da descrição dos produtos e serviços assinalados pelos sinais em confronto resulta que a marca prioritária centra a sua actividade na área dos produtos industriais relacionados com a iluminação (para uso doméstico e profissional) e suas diversas aplicações, actividade por que é sobretudo - e notoriamente - conhecida, só acessoriamente abrangendo serviços de consultadoria e concepção na dita área [classe 42, única classe de serviços assinalados, contra 11 classes de serviços], enquanto a marca registanda exerce a sua actividade essencialmente na área dos serviços de marketing, promoção, publicidade, comunicação, design e formação, só acessoriamente abrangendo produtos que servem de suporte ou instrumento às ditas actividades de marketing/publicidade [são assinalados mais de 100 serviços em 5 das 11 classes de serviços, contra cerca de uma dúzia de produtos assinalados em 5 das classes de produtos da Classificação de Nice).
3.2. Pelas razões expendidas anteriormente, entendemos, igualmente, que o segundo pedido subsidiário também não merece provimento
Como se antolha das conclusões recursórias, a Recorrente ancora a sua pretensão na invocação na extensão de protecção de que beneficiam as marcas de prestígio, nos termos do artigo 242.° do CPI.
É verdade que a marca de prestígio — categoria em que se inclui a Recorrente —goza de uma protecção acrescida não subordinada ao princípio da especialidade da marca.
O CPI acolheu, no essencial, a proposta comunitária (proposta da DM) e passou a conferir ao titular da marca de prestígio a possibilidade de: (i) oposição ao pedido de registo feito por terceiros de uma marca idêntica ou semelhante para produtos ou serviços não afins (art.° 242.°); (ii) anulação do registo dessa marca (art.° 266.°, n.° 1, alínea a), desde que a mesma se encontre registada previamente ou seja requerido o seu registo para os produtos ou serviços que lhe deram prestígio (art.° 242°, n.° 2); (ii) proceder criminalmente contra o usuário não autorizado da marca de prestígio desde que seja solicitado o registo desta (art.° 323.°, alínea e).
As condições de protecção da marca de prestígio, face ao pedido de registo, registo ou uso por terceiros de marca confundível para produtos ou serviços não afins, são, conjunta ou separadamente, as seguintes:
1.ª A marca registanda constituir uma tradução ou ser igual ou semelhante à marca de prestígio;
2.a O aproveitamento, sem justo motivo, do seu carácter distintivo ou prestígio.
2.a O prejuízo, sem justo motivo, do seu carácter distintivo ou prestígio.[]
Ora, no caso vertente, como já se referiu bastamente, a marca registando não é uma tradução da marca prioritária e também não é uma cópia nem se assemelha a esta marca de prestígio.
Por outro lado, dos autos não se extraem indícios de que a marca registanda … pretenda tirar proveito ou que o seu uso seja susceptível de prejudicar a marca O..., sendo que nem sequer foram invocados factos que permitissem concluir de modo diferente.
Não se verificando os requisitos anteriormente enunciados, não poderia a Recorrente beneficiar, como pretende, da protecção extensiva a que alude o art.° 242.° do CPI.
4. Termos em que se entende que a presente apelação não merece provimento. IV- Decisão:
Pelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação de Lisboa em julgar improcedente a apelação, confirmando a sentença recorrida.
Custas pela Apelante — artigo 527° do CPC.

Registe e notifique.

Lisboa, 8 de Novembro de 2018
Manuel Rodrigues
Ana Paula A. A. Carvalho
Gilberto Jorge