Sendo a marca que a recorrente pretende registar susceptível de causar no consumidor confusão e associação com marca anteriormente registada pela recorrida, por assinalarem produtos idênticos e afins e haver coincidência parcial na grafia e na fonética e figuração que não afasta tal confusão, existe fundamento para a recusa de registo da marca impugnada com base em imitação de marca.
(Sumário elaborado pelo relator)
Proc. 11/16.4YHLSB.L1 6ª Secção
Desembargadores: Maria Teresa Mendes Pardal - Carlos Marinho - -
Sumário elaborado por Margarida Fernandes
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Apelação n°11/16.4 YHLSB.L1
(Processo n°11/16.4 YHLSB do 1° Juízo do Tribunal da Propriedade Intelectual)
SUMÁRIO.
Sendo a marca que a recorrente pretende registar susceptível de causar no consumidor confusão e associação com marca anteriormente registada pela recorrida, por assinalarem produtos idênticos e afins e haver coincidência parcial na grafia e na fonética e figuração que não afasta tal confusão, existe fundamento para a recusa de registo da marca impugnada com base em imitação de marca.
Acordam na 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa:
RELATÓRIO.
No processo de registo de marca nacional do INPI em que VR... requereu o registo da marca nacional n°5... e em que foi oponente SA... titular da marca nacional n°3..., foi proferido despacho que recusou o registo, por entender que o mesmo reproduz elemento verbal que caracteriza a marca oponente, susceptível de induzir o consumidor em confusão e, deste despacho, foi interposto recurso pelo requerente, alegando que não estão preenchidos os pressupostos cumulativos de que depende a recusa do registo da marca registanda e pedindo a revogação do despacho recorrido e a sua substituição por decisão que conceda o registo da marca nacional n°5....
A recorrida não apresentou resposta.
Oportunamente foi proferida sentença que julgou o recurso improcedente e manteve o despacho do INPI, com a recusa de registo da marca nacional n°5....
Inconformado, o recorrente VR... interpôs recurso
de apelação e alegou, formulando conclusões com os seguintes fundamentos:
- É pacificamente aceite pela doutrina e pela jurisprudência que a identidade e afinidade de produtos e serviços deve ser aferida face à sua utilidade e fim ou à sua natureza e origem, não necessariamente ao facto de integrarem a mesma classe, mas sim de se destinarem a assinalar produtos ou serviços idênticos, substituíveis entre si e situados no mesmo mercado relevante.
- Para se aferir da existência de confusão no consumidor, terá de se atender àquele a que o produto ou serviço se destina e ao estrato ou estratos populacionais a que são destinados, que, no caso dos autos, são bem distintos.
- No presente caso, quer para os serviços assinalados pela marca registanda, quer para os serviços assinalados pelas marcas obstativas, o consumidor é um consumidor médio de cada tipo de serviço específico, um é um consumidor de terra, a seco, da serra ou campo, o outro é da água, do mar, da praia, de um meio sócio cultural inserido na cultura do surfing e um e outro não se confundem.
- Apesar de a marca registanda e a marca obstativa n°3... integrarem a mesma classe de Nice, os serviços prestados por cada uma delas são distintos, não são concorrentes no mesmo mercado, não são substituíveis, não sendo distribuídos, vendidos ou prestados através dos mesmos circuitos e hábitos comerciais, não tendo a mesma natureza, origem, nem sendo prestados no mesmo meio/ambiente.
- A marca registanda é uma marca mista composta por elemento verbal compreendido na expressão …, envolvida pela figura a preto e branco, destinada a assinalar actividades relacionadas com a prática de surfing, da classe 41, enquanto a marca obstativa n°3..., inserida na mesma classe 41, é nominativa, composta apenas pela palavra S…, destinada a assinalar passeios pedestres, cruzeiros fluviais, eventos e festas e educação ambiental e a marca obstativa n°5..., destinada a assinalar serviços das classes 39 e 42, é figurativa, composta apenas pela palavra S... inserida numa figura oval verde e amarela, em nada se confundindo com a marca registanda.
- Os sinais devem ser analisados pelo seu conjunto e não através da sua decomposição, pois é a imagem do seu conjunto que fica retida na memória do consumidor médio.
- Comparando as marcas envolvidas, conclui-se que não estão preenchidos os pressupostos cumulativos de que depende a recusa do registo da marca registanda, inexistindo qualquer semelhança gráfica ou figurativa e, quanto à semelhança fonética, também não existe, uma vez que a marca registanda compreende a composição de três vocábulos, não se reconduzindo a um único vocábulo.
- Por outro lado, excluindo-se a parte figurativa e a expressão S… School, o vocábulo S... é um tipo de produto não passível de apropriação como marca distintiva.
- Deverá a sentença recorrida ser revogada e substituída por decisão que conceda o registo da marca nacional n°5....
A recorrida não apresentou contra-alegações.
A questão a decidir é a de saber se se verificam os pressupostos para a concessão do registo da marca registanda.
FACTOS.
A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:
1. A recorrida é titular dos seguintes registos de marca:
- marca nacional (verbal) n° 3... S..., solicitada em 2.05.2000 e concedida em 27.06.2001 para assinalar Educação, formação, divertimento, actividades desportivas, actividades culturais na classe 41 da Classificação de Nice;
- marca nacional (mista) n° 5...,
www.S...pt
solicitada em 29.08.2012 e concedida em 26.02.2013 para assinalar diversos serviços nas classes 39 e 42 da Classificação de Nice.
2. Em 2.04.2015, a recorrente requereu junto do INPI o registo da marca nacional (mista) n° 5...,
para assinalar aluguer de equipamento de desporto, excepto veículos; actividades recreativas e desportivas; organização e realização de actividades recreativas, desportivas e culturais na classe 41 da Classificação de Nice, nos termos constantes de fls. 6-8 do processo administrativo apenso, que aqui se dão por reproduzidos.
3. Em 11.05.2015, a recorrida apresentou junto do INPI reclamação contra o pedido de marca acima mencionado (ponto 2 do presente enunciado de factos) com fundamento, nomeadamente, na prioridade das suas referidas marcas nacionais (ponto 1 do presente enunciado de factos), risco de confusão em virtude da semelhança entre os sinais e afinidade dos produtos respectivamente assinalados, nos termos constantes de fls. 13-14 do processo administrativo apenso, que aqui se dão por reproduzidos.
4. Em 24.07.2015, a recorrente respondeu à dita reclamação da recorrida (ponto 3 do presente enunciado de factos), impugnando nomeadamente a semelhança entre os sinais prioritários e registando ou afinidade entre os produtos respectivamente assinalados ou consequente risco de confusão, nos termos constantes de fls. 19-29 do processo administrativo apenso, que aqui se dá por reproduzido.
5. Entre os serviços anunciados pela recorrida na sua página web www.S....pt contam-se passeios pedestres, passeios fluviais, eventos e festas e educação ambiental cf. impressão da mesma junta como doc. n° 1 a fls. 2731 do processo administrativo apenso, que aqui se dá por reproduzido.
6. Por decisão de 11.11.2015, publicada no BPI de 23.11.2015, o INPI recusou o registo da marca n° 5..., por considerar existir imitação da marca prioritária n° 3... da recorrida, nos termos constantes de fls. 1-5 do processo administrativo apenso, que aqui se dão por reproduzidos.
ENQUADRAMENTO JURÍDICO.
Nos termos do artigo 1° do Código da Propriedade Industrial (CPI aprovado pelo DL 36/2003 de 5/3, em vigor à data do pedido de registo), a propriedade industrial desempenha a função de garantir a lealdade da concorrência, pela atribuição de direitos privativos sobre os diversos processos técnicos de produção e desenvolvimento da riqueza.
A marca é um dos direitos atribuídos para garantir a lealdade da concorrência e vem definida no artigo 222° do CPI como ... um sinal ou conjunto de sinais susceptíveis de representação gráfica, nomeadamente palavras, incluindo nomes de pessoas, desenhos, letras, números, sons, a forma do produto ou da respectiva embalagem, desde que sejam adequados a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas, estabelecendo o artigo 224° n°1 que o seu registo confere ao seu titular o direito de propriedade e do exclusivo da marca para os produtos e serviços a que esta se destina e o artigo 258° que o registo da marca confere ao seu titular o direito de impedir terceiros, sem o seu consentimento, de usar, no exercício de actividades económicas, qualquer sinal igual ou semelhante, em produtos ou serviços idênticos ou afins daqueles para os quais a marca foi registada, e que, em consequência da semelhança entre os sinais e da afinidade dos produtos ou serviços, possa causar um risco de confusão, ou associação, no espírito do consumidor.
O artigo 239° prevê fundamentos de recusa do registo de marca, entre os quais o da alínea a) do seu n°1, ou seja, a reprodução ou imitação, no todo ou em parte, de marca anteriormente registada por outrem para produtos ou serviços idênticos ou afins, que possa induzir em erro ou confusão o consumidor ou que compreenda o risco de associação com a marca registada.
E o conceito de imitação encontra-se no artigo 245° n°1, que considera haver imitação quando, cumulativamente, a marca registada tiver prioridade (alínea a)), sejam ambas destinadas a assinalar produtos ou serviços idênticos ou afins (alínea b)) e tenham tal semelhança gráfica, figurativa, fonética ou outra que induza facilmente o consumidor em erro ou confusão, ou que compreenda um risco de associação com marca anteriormente registada, de .forma que o consumidor não as possa distinguir senão depois de exame atento ou confronto (alínea c)).
No caso dos autos, as marcas da recorrida têm prioridade relativamente à marca registanda recusada pelo INPI, tendo sido registadas, respectivamente em 2001 e em 2013 (artigo 11° do CPI), sendo a mais antiga a marca n°3....
A referida marca prioritária da recorrida, n°3..., assinala serviços idênticos aos assinalados pela marca registanda, da classe 41 de Nice, ou seja, actividades desportivas e culturais (as duas marcas), actividades recreativas (marca registanda), divertimento (marca n°3...), apenas diferindo em educação, formação (marca n°3...) e em aluguer de artigos de desporto (marca registanda), serviços estes manifestamente relacionados com os restantes.
Quanto à gráfica e fonética da marca da recorrente e da marca da recorrida n°3..., as mesmas apresentam semelhanças susceptíveis de confundir o consumidor.
Com efeito, a marca registanda só difere da marca n°3... porque, à palavra S..., acrescenta as palavras S… School e tal diferença não é suficiente evitar confusão, tendo em atenção que é a palavra S... que confere a distinção da marca, já que, embora exista esta palavra no vocabulário como designando um produto, não representa qualquer produto comercializado pelas empresas em causa e não integrando as excepções previstas no artigo 223° do CPI).
Sendo assim, a expressão S… Shool não só não afasta a confusão, como a aumenta, pois ambas as marcas assinalam actividades desportivas e a marca n°3... assinala também educação e formação, do que resulta poder o consumidor pressupor que S… School constitui uma das actividades de formação desportiva da marca S... da recorrida.
No que respeita à figuração, a marca registanda é mista, estando inserida num círculo escuro em que a palavra S... aparece em destaque e a expressão S… School mal se vê, inserida em letras muito pequenas; por seu lado, a marca n°3... é exclusivamente verbal.
Porém, também esta diferença não obsta à confusão entre ambas, pelas razões acima apontadas, uma vez que, ao ver a marca figurativa da recorrente, o consumidor poderá ser levado a pensar que se trata de uma marca figurativa de uma mesma empresa que se dedica a actividades desportivas e formação, entre as quais o ensino de surf.
Acresce que a outra marca da recorrida, n°5..., embora não assinale os serviços da classe 41, é uma marca mista que se caracteriza por apresentar a palavra S... dentro de um círculo, o que, apesar das cores do círculo serem diferentes, contribui para a confusão gerada com a marca mista da recorrente.
Conclui-se, portanto, que existe imitação, tal como ela vem definida no artigo 245°, devendo o registo ser recusado ao abrigo do artigo 239° n°1 a) e improcedendo as alegações da apelante.
DECISÃO.
Pelo exposto, acorda-se em julgar improcedente a apelação e confirma-se a sentença
recorrida e a recusa de registo da marca nacional n°5....
Custas pela apelante.
2019-01-24
Maria Teresa Pardal
Carlos Marinho
Anabela Calafate