I-O art° 1906 n°1 do C.C., estabelece como regra o princípio do exercício conjunto das responsabilidades parentais por ambos os progenitores da criança, em questões de particular importância, estendendo-se este princípio mesmo aos casos de menores nascidos de famílias em que não existiu casamento ou união de facto.
II-No entanto, este exercício conjunto das responsabilidades parentais, não implica por si só, a fixação de um regime de guarda conjunta e alternada da criança com ambos os progenitores e distingue-se dele.
III- Os critérios normativos que continuam a nortear a escolha do regime de guarda do menor são sempre e em primeiro lugar, o superior interesse da criança, tendo em conta nomeadamente a disponibilidade manifestada por cada um dos pais para promover relações habituais do filho com o outro, a manutenção de uma relação de grande proximidade com os dois progenitores e a partilha de responsabilidades entre os pais, de forma a que a fixação de residência do menor junto de um dos progenitores, ou junto de cada um deles alternadamente, se afigure como a opção que melhor contribui para o bem estar da criança.
IV-0 regime de guarda alternada da criança depende assim, de um compromisso dos pais e do entendimento entre eles no que à educação, manutenção e afectos da criança respeita, não devendo ser decretado quando tal não se verifica.
V-Não decorre do disposto no art° 1906 n°1 e 7 do C.C., que a guarda partilhada ou alternada da criança é o regime regra, equivalendo a decisão que decrete a residência do menor com um dos progenitores, a decisão de retirada/separação do menor do progenitor que não tem a guarda e assim admissível apenas em casos excepcionais, não sendo assim contrária ao artigo 13.° e no n.° 6 do artigo 36.° da Constituição da República Portuguesa e aos n.° 1 e 3 do artigo 9° da Convenção sobre os Direito da Criança.
Proc. 3136/18.8T8PDL-A.L1 6ª Secção
Desembargadores: Cristina Neves - Manuel Rodrigues - -
Sumário elaborado por Margarida Fernandes
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Sumário elaborado e da responsabilidade do Relator (art° 663 n07 do C.P.C.)
1-O art° 1906 n°1 do C.C., estabelece como regra o princípio do exercício conjunto das responsabilidades parentais por ambos os progenitores da criança, em questões de particular importância, estendendo-se este princípio mesmo aos casos de menores nascidos de famílias em que não existiu casamento ou união de facto.
II-No entanto, este exercício conjunto das responsabilidades parentais, não implica por si só, a fixação de um regime de guarda conjunta e alternada da criança com ambos os progenitores e distingue-se dele.
III- Os critérios normativos que continuam a nortear a escolha do regime de guarda do menor são sempre e em primeiro lugar, o superior interesse da criança, tendo em conta nomeadamente a disponibilidade manifestada por cada um dos pais para promover relações habituais do filho com o outro, a manutenção de uma relação de grande proximidade com os dois progenitores e a partilha de responsabilidades entre os pais, de forma a que a fixação de residência do menor junto de um dos progenitores, ou junto de cada um deles alternadamente, se afigure como a opção que melhor contribui para o bem estar da criança.
IV-0 regime de guarda alternada da criança depende assim, de um compromisso dos pais e do entendimento entre eles no que à educação, manutenção e afectos da criança respeita, não devendo ser decretado quando tal não se verifica.
V-Não decorre do disposto no art° 1906 n°1 e 7 do C.C., que a guarda partilhada ou alternada da criança é o regime regra, equivalendo a decisão que decrete a residência do menor com um dos progenitores, a decisão de retirada/separação do menor do progenitor que não tem a guarda e assim admissível apenas em casos excepcionais, não sendo assim contrária ao artigo 13.° e no n.° 6 do artigo 36.° da Constituição da República Portuguesa e aos n.° 1 e 3 do artigo 9° da Convenção sobre os Direito da Criança.
Proc. IV' 3136/18.8T8PDL-A.L1- Apelaçáo
Tribunal Recorrido: Tribunal Judicial da Comarca dos Açores- Ponta Delgada- Juízo de
Família e Menores-J2
Recorrente: PMC...
Recorrida: SBM...
Juiz Desembargador Relator: Cristina Neves
Juizes Desembargadores Adjuntos: Manuel Rodrigues
Ana Paula A.A. Carvalho
ACORDAM OS JUÍZES NA 6ª SECÇÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA:
RELATÓRIO
Em 19/12/18, SBM..., veio requerer a regulação das responsabilidades parentais da menor MFB..., nascida em 1..., contra PMC..., alegando que a menor nasceu do seu relacionamento com o requerido, iniciado no ano de 2016 e cessado no início de Dezembro de 2018, não estando os progenitores da menor de acordo quanto à regulação do poder paternal desta.
Com data de 31/12/18, veio a requerente requerer a fixação de um regime provisório relativo ao exercício das responsabilidades parentais da menor, alegando que o requerente, após a separação, passou a exigir visitas frequentes à menor, no que a requerente acedeu, tendo numa dessas visitas exigido que a menor pernoitasse consigo, o que a requerente recusou pelo facto de a menor ter apenas 15 meses, pelo que, em 28/12/18, o requerido deslocou-se a casa da requerente, tendo levado à força a menor consigo, recusando-se a entrega-la à requerente e apenas permitindo a visita desta, se acompanhada da PSP.
Designada data para conferência de pais, realizou-se esta em 14/01/19, com audição de ambos os progenitores e da educadora do Colégio S..., onde a menor fora inscrita, após o que, foi proferido o seguinte despacho:
Os progenitores da menor MFB... cessaram a convivência em comum a 18 de dezembro de 2…, altura que em que a menor ficou a viver com a mãe na casa de morada de família, com o acordo do pai.
Apesar da separação do casal, a mãe proporcionou ao pai, sem rigidez de horários, convívios diários com a menina.
Não obstante, o progenitor no dia 28 de dezembro de 2018, fazendo-se acompanhar dos avós paternos da criança, dirigiu-se à casa de morada de família, de onde retirou, nas suas palavras, à força, ou seja, contra a vontade expressa da progenitora e mediante o afastamento pela força física da avó materna da menor, que se colocou nas escadas da habitação para bloquear a saída da criança, o que o fez sem sequer previamente saber se a criança estava a tomar medicação, e sem reunir os objetos da criança e peças básicas desta como sejam os biberões e o vestuário.
Na posse da criança o progenitor, mediante a solicitação da mãe de convívios com a criança, condicionou convívios da criança com a progenitora no fim de semana de 5 e 6 de Janeiro, com recolha prevista no dia 4, à assinatura por esta de uma proposta provisória de regulação do exercício das responsabilidades parentais, nos termos unilaterais impostos pelo mesmo e referentes apenas àquele fim de semana.
Ainda durante o período de tempo em que manteve a criança consigo o progenitor não fez comparecer a criança na creche, que frequentava desde o final de novembro, por decisão de ambos os pais (apesar de aí ter permanecido apenas por período curto por motivo de doença), tendo o progenitor inclusivamente comunicado à diretora pedagógica do colégioS... que a filha jamais regressaria à creche, decisão esta também unilateral, que não obteve a concordância da mãe da criança.
Foi nesta sequência de acontecimentos que a progenitora, sendo autorizada pelo progenitor apenas a conviver com a filha num curto período de tempo no dia 7 de janeiro, por não ter assinado a proposta de acordo (o que determinou que o pai vedasse os convívios com a criança nos dias 4, 5 e 6 de janeiro), não devolveu a criança ao pai no dia 7, fazendo com que a mesma retomasse a frequência da creche nos dias 9, 10 e 11 do corrente mês, tendo inclusivamente nesta data, dia 14 de janeiro, procedido novamente à entrega da criança na creche, de manhã.
Novamente neste dia 14, por volta das 10:00 horas, o progenitor foi recolher a criança ao colégio por decisão unilateral (que justificou em tribunal estar fundada em motivo de doença da menor, o que foi infirmado pela educadora recolheu a criança nesse dia), e, numa atitude claramente impensada e impulsiva, subtraiu do livro de presenças dos menores que frequentam a creche, a ficha de registo de presenças da menor MFB... relativa ao mês de janeiro de 2…, que levou consigo, afirmando ao tribunal que gravou a conversa que manteve com a funcionária do colégio naquele dia, sem o conhecimento ou consentimento desta.
A atitude do progenitor revela claramente uma postura não facilitadora das relações habituais da criança com a sua mãe, manifestando ainda nas insinuações que fez atinentes a alegado desequilíbrio psiquiátrico da progenitora, seja perante a Comissão de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo a 20 de dezembro de 2018, seja nesta data no tribunal, sem concretização de episódios concretos (apesar de ter sido instado a fazê-lo várias vezes), estar disposto a recorrer a quaisquer meios para obter o fim alvejado, a saber a guarda da filha.
Por outro lado, denota o tribunal face às declarações da progenitora e proposta concreta que fez de reduzir os convívios da criança com o pai a dois curtos períodos durante a semana e aos sábados, sem qualquer pernoita, não ter esta consciência que a criança, é certo que por força do comportamento reprovável do pai, já se habituou a estar aos cuidados dele e com ele pernoitar, não havendo por isso objeções a este nível.
Sucede que o comportamento do pai neste último mês, atrás descrito, com a adoção de ações concretas que visaram a subtração da criança à mãe, expondo-a inclusivamente a situações traumáticas de separação, evidenciam a necessidade do tribunal proteger a menor destas situações, assegurando que as trocas da criança acorram sempre em contexto supervisionado.
Propôs o pai uma residência alternada da criança, com trocas de dois em dois dias e uma vez por semana de três em três dias, partilha dos tempos da criança que é no entender do tribunal desadequada por não permitir que de forma percetível pela criança sejam estabelecidas rotinas certas, indispensáveis à estabilidade da mesma, no caso concreto com apenas um ano e quatro meses de idade.
Em face do exposto o tribunal procede à regulação provisória do exercício das responsabilidades parentais em referência à menor MFB..., nascida a ..., nos seguintes termos:
1.- A menor MFB..., nascida em …, ficará à guarda e cuidados de sua mãe, SBM..., e com ela residente, a qual exercerá as responsabilidades parentais nas questões do quotidiano, sendo a sua encarregada de educação.
2.- Nas questões de particular importância da vida da menor, designadamente em matéria de intervenções médico-cirúrgicas não urgentes, tratamentos médicos com perigo grave para a integridade física ou perigo para a vida, viagens para fora do espaço Schengen (europeu), representação patrimonial e judiciária, educação religiosa, e escolha de estabelecimento de ensino, as responsabilidades parentais serão exercidas em conjunto por ambos os progenitores.
3.- A menor terá convívios com o pai entre as 15h30 de sexta-feira e as 18h30 de sábado (ou antes se for anterior o horário de fecho do PEF) e ainda às quartas-feiras entre as 15h30 e as 18h30 (ou antes se for anterior o horário de fecho do PEF), sendo recolhida no ColégioS... que frequenta pelo pai e entregue por este no Ponto de Encontro Familiar.
4.- A título de prestação de alimentos à menor, considerando os rendimentos declarados pelo progenitor e os rendimentos da progenitora, assistente administrativa, o pai pagará à mãe o valor mensal de 300.00€, com o qual a mãe providenciará também pelo pagamento da mensalidade da creche frequentada pela menor, quantia que será paga através de depósito ou transferência bancária para conta da mãe com o IBAN PT50 ..., da Caixa Geral Depósitos; até ao dia 8 de cada mês, com efeitos imediatos. Tal montante será automaticamente atualizado todos os anos, em janeiro, segundo o índice de inflação mais baixo apurado pelos serviços oficiais de estatística para a Região Autónoma dos Açores, por referência ao ano anterior.
Neste momento e dado que se manteve o dissídio dos pais quanto à regulação do exercício das responsabilidades parentais suspende-se a conferência de pais remetendo-se as partes para audição técnica especializada, pelo período de dois meses.
Notifique.
Notificado da decisão proferida e não se conformando com a mesma, veio o requerido
interpor recurso, formulando no final das suas alegações, as seguintes
CONCLUSÕES:
A. O recurso ora interposto pelo Recorrente versa sobre o despacho proferido pelo Tribunal a quo, que fixou provisoriamente um regime de regulação das responsabilidades parentais da menor MFB... e, em consequência, decidiu que a criança ficaria a residir exclusivamente com a mãe.
B. O Tribunal a quo decidiu ainda que a criança terá convívios com o pai entre as 15h30 de sexta-feira e as 18h30 de sábado (ou antes se for anterior o horário de fecho do PEF) e ainda às quartas-feiras entre as 15h30 e as 18h30 (ou antes se for anterior o horário de fecho do PEF), sendo recolhida no ColégioS... que frequenta pelo pai e entregue por este no Ponto de Encontro Familiar;
C. A prova gravada não foi devidamente valorada, pelo que o presente recurso tem como objeto a matéria de facto do despacho proferido nos presentes autos, com reapreciação da prova gravada, bem como a matéria de direito.
D. O Tribunal a quo fez uma errada interpretação da prova produzida em sede de conferência de pais e não julgou corretamente parte da matéria de facto e de direito que as partes submeteram à consideração, fazendo uma errada aplicação da lei, pois diante das provas produzidas, e ainda daquelas que não foram produzidas, impunha-se um decisão diferente da ora recorrida.
E. Desde o seu nascimento, dia 13 de setembro de 2017, e até ao dia 18 de dezembro de 2018, a MFB... sempre viveu com ambos os pais.
F. Durante estes quinze meses, o Recorrente sempre proporcionou à MFB... todas as condições para uma vida saudável, equilibrada e alegre, cumprindo com todas as suas obrigações enquanto pai.
G. É notório o carinho e o afeto que une e sempre uniu esta filha e este pai.
H. De facto, o pai, e aqui Recorrente, apresenta um grande envolvimento e afetividade com a criança, bem como apresenta uma ampla capacidade para o exercício da parentalidade, nomeadamente para executar todos os necessários cuidados parentais e assegurar a melhor vigilância e proteção à criança, bem como uma total motivação para prestar à MFB... todos os cuidados, não só a nível emocional, como para seu o desenvolvimento e saúde.
I. A verdade é que, convívios de apenas 30 horas semanais entre pai e filha terão uma única e devastadora consequência: uma irreversível quebra afetiva com prejuízo notório para o vínculo emocional que une pai e filha.
J. Um regime de residência parental alternada é o regime que, na verdade, melhor acautela o superior interesse da pequena MFB....
K. E é o único que permite manter uma relação de grande proximidade com ambos os progenitores.
L. Não sendo nenhum dos progenitores banido ou imiscuído da infância e da vida da pequena MFB....
M. E, além de ser o regime que melhor defende os interesses desta criança é o regime que é expressamente acolhido na legislação nacional e em convenções internacionais:
N. A criança tem o direito de viver com os seus pais a menos que tal seja considerado incompatível com o seu interesse superior. A criança tem também o direito de manter contacto com ambos os pais se estiver separada de um ou de ambos — n.° 1 e n.° 3 do artigo 9.° da Convenção sobre os Direitos da Criança.
O. Os filhos não podem ser separados dos pais, salvo quando estes não cumpram os seus deveres fundamentais para com eles e sempre mediante decisão judicial — n.° 6 do artigo 36.° da Constituição da República Portuguesa.
P. O Tribunal decidirá sempre de harmonia com o interesse do menor, incluindo o de manter uma relação de grande proximidade com os dois progenitores, promovendo e aceitando acordos ou tomando decisões que favoreçam amplas oportunidades de contacto com ambos e de partilha de responsabilidades entre eles — n.° 7 do artigo 1906.° do Código Civil.
Q. O regime de residência parental alternada é também defendido pela jurisprudência nacional:
R. Tal como considerou o , no acórdão de 24/01/2017, Ainda que, por virtude da idade da F......, se tivesse como demonstrada a existência de uma maior ligação e dependência da menor em relação à mãe, a apontar para a preferência da fixação da sua residência exclusivamente com a progenitora [...I e Ainda que a casa da mãe tenha sido a sua primeira referência espacial, a menor está naturalmente apta a criar muitas outras ao longo da sua vida [...].
S. Acrescentando que, V..] a estabilidade e rotinas necessárias ao seu equilibrado desenvolvimento também poderão ser alcançadas vivendo ela com o pai e com a mãe em semanas alternadas, facilmente se habituando, até pela sua tenra idade, a ter duas casas, dois quartos de dormir, duas coleções de brinquedos, sendo que os seus sentimentos de estabilidade e segurança sairão reforçadas com o convívio e partilha de afeto, de forma assídua e paritária, com ambos os progenitores.
T. Também na doutrina este é o entendimento maioritário:
U. Joaquim Manuel Silva, Juiz de Direito da Secção de Família e Menores de Lisboa-Oeste, apresenta-se como acérrimo defensor da residência parental alternada: A guarda compartilhada assume-se hoje na nossa prática jurisprudencial como central na consagração do direito da criança a ter pai e mãe e até importante na tarefa de afastar o conflito e de manter ou construir a sua família. A guarda compartilhada mantém os pais implicados na vida dos filhos, desenvolvendo, em regra, plataformas de funcionamento conjunto que criam novas emoções positivas, que depois contribuem para ultrapassar as memórias emocionais negativas advindas, em regra, da 'separação conjugal'. — A Família das Crianças na Separação dos Pais, A Guarda Compartilhada, p. 135.
V. Acrescenta ainda Jorge Duarte Pinheiro que a regra deve ser a concessão a cada um dos progenitores de igual tempo de contacto ou residência com o filho, e a atribuição da titularidade do exercício de todas as responsabilidades parentais a cada um dos progenitores que estiver, e enquanto estiver, com o filho. — Estudos de Direito das Famílias e das Crianças, AAFDL Editora, 2015, p. 338-339.
W. Ainda assim, apoiando-se no depoimento frágil e deficitário prestado pela Sra. D. F..., educadora de infância da MFB... durante, pasme-se, 11 dias, aceita o douto Tribunal como normal e bom para o desenvolvimento afetivo e cognitivo da MFB..., que esta viva exclusivamente com a mãe.
X. Ora, não se compreende como pode a Sra. D. F... tecer considerações e juízos de valor relativamente ao Recorrente e Recorrida, e à própria MFB... como se já convivesse com os progenitores e a criança há largos anos quando, na prática, apenas esteve com a criança poucas horas durante 11 dias interpolados.
Y. É de pasmar como pôde o douto Tribunal valorar da forma que valorou o depoimento de uma educadora de infância que contactou com a criança durante meia dúzia de dias.
Z. Que a educadora de infância se atreva a tirar ilações, ainda se poderá compreender, mas que o douto Tribunal as acolha cegamente, é preocupante.
AA. De facto, nada justifica a pena aplicada pelo Tribunal a quo à MFB..., ao seu pai e à relação de proximidade e afeto entre ambos.
BB. Uma decisão altamente fraturante na vida desta criança, que sempre conviveu com ambos os progenitores.
CC. Salvo o devido respeito, o Tribunal a quo não tinha conhecimentos nem fundamentos para tomar a decisão de tirar tempo de pai à MFB....
DD. E, não tendo conhecimentos, devia ter decidido pelo regime que melhor assegura o superior interesse desta criança: a residência parental alternada.
EE. Acresce que, durante toda a conferência de pais é notória a dualidade de critérios de tratamento entre progenitores.
FF. Numa clara violação do princípio constitucional consagrado no artigo 13.° da Constituição da República Portuguesa, este pai é tratado como se de um criminoso se tratasse, apenas por ser pai e não mãe.
GG. O princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.° da Constituição da República Portuguesa, e tão caro ao Estado Português, determina no seu n.° 1 que todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei e no n.° 2 que ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual.
HH. Este princípio basilar da nossa sociedade, tantas vezes esquecido, não pode ser renegado ou esvaziado, como aqui aconteceu, deve ser aplicado, deve ser tido em consideração, em linha de conta no momento da ponderação do caso concreto.
II. Este pai tem o DIREITO E O DEVER de ser pai, e tal direito/dever não lhe deve, nem lhe pode ser tirado, pelo simples facto de ser homem e não mulher, de ser pai e não mãe!
JJ. E, mais importante, a MFB... tem o direito de ter o pai presente na sua vida, como sempre teve, até ao momento em que o douto Tribunal lhe tirou tempo de pai!
KK. O regime de residência parental alternada é o único que permite à MFB... ter um relacionamento de proximidade com ambos os progenitores.
LL. Pois é o único que assegura as condições necessárias para a conservação da ligação afetiva e emocional da criança com ambos os pais,
MM. E é o único que proporciona à criança a tranquilidade indispensável ao desenvolvimento integral e harmonioso da sua personalidade.
NN. O regime de residência exclusiva com a mãe provocará danos irreversíveis na MFB... e na relação que mantém com o pai e restante família paterna, com quem sempre conviveu diariamente.
00. Assim, entendemos, e salvo respeito por opinião diversa, que o Tribunal a quo valorou mal a prova apresentada, e decidiu de forma injusta, injustificada e contra, inclusive, o superior interesse da MFB....
PP. Concluímos portanto, que violando o disposto no n.° 7 do artigo 1906.° do Código Civil, no artigo 13.° e no n.° 6 do artigo 36.° da Constituição da República Portuguesa e nos n.° 1 e 3 do artigo 9-° da Convenção sobre os Direito da Criança, deve o presente recurso ser julgado procedente e o douto despacho recorrido ser revogado e substituído por outro que institua um regime de residência parental alternada, com alternância semanal.
Nos termos do disposto no n.° 1 do artigo 646.° do Código de Processo Civil, requer-se a V. Exa. a extração de certidões das seguintes peças processuais, que devem acompanhar as alegações de recurso do Recorrente:
- petição inicial da Recorrida (ref.a 31043639);
- requerimento da Recorrida (ref.a 31096645);
- ata da conferência de pais de 14.01.2019 (ref.a 47562730);
- ata da conferência de pais de 14.01.2019 (ref.a 47574002).
Nestes termos e nos melhores de direito, que V. Exas. mui doutamente suprirão, deverá ser dado inteiro provimento ao presente recurso, revogando-se, em consequência, o douto despacho recorrido, sendo o mesmo substituído por outro que fixe um regime provisório de residência parental alternada com alternância semanal, por ser o que melhor assegura o superior interesse da MFB..., fazendo-se, assim, sã e costumeira JUSTIÇA!
A requerente apresentou contra alegações a este recurso, delas constando as seguintes conclusões:
1. Salvo o devido respeito, não assiste qualquer razão ao Recorrente, limitando-se o mesmo a discordar da decisão proferida pelo Tribunal a quo,
2. Aliás, o Recorrente prestou declarações perante a Meritíssima Juiz de Direito do Tribunal a quo, que foram devidamente valoradas.
3. Com efeito, a Meritíssima Juiz de Direito inquiriu longamente ambos progenitores, ora Recorrente e Recorrida, formando solidamente a sua convicção no sentido de apurar qual a melhor solução que serviria o superior interesse da menor MFB...,
4. tudo conforme se alcança do registo de gravação das respectivas inquirições que aqui se dão integralmente por reproduzidas.
5. Por isso, é errado alegar, como alega o Recorrente, que a Meritíssima Juiz de Direito do Tribunal a quo não dispunha de elementos que permitissem sustentar a sua decisão de fixar provisoriamente a regulação das responsabilidades parentais, nos termos em que o fez.
6. Importa referir que, devidamente inquirido pela Meritíssima Juiz do Tribunal a quo o Recorrente confirmou a prática dos factos constantes dos requerimentos apresentados pela Recorrida, nos dias 31 de Dezembro de 2018 e 4 de Janeiro de 2019, nos presentes autos, que aqui se dão por reproduzidos,
7. bem como, confessou a prática de um outro conjunto de factos que o Tribunal a quo, considerou como provados, conforme se alcança do registo áudio das suas declarações, constantes da douta decisão recorrida, designadamente, que aqui se dão integralmente por reproduzidos para os devidos efeitos.
8. Os factos relevantes para a decisão da causa acabaram por ser confessados pelo próprio Recorrente no âmbito da sua inquirição perante a Meritíssima Juiz do Tribunal a quo que os teve de considerar naturalmente como provados e que revelaram uma postura agressiva e violenta por parte do Recorrente, que não hesitou em praticar acções concretas, em conluio com os seus próprios pais, que visaram a subtracção da criança à mãe, expondo-a inclusivamente a situações traumáticas de separação,
9. Tendo, posteriormente, impedido a Recorrida de ver a sua filha menor nos dias subsequentes.
10. Assim, ficou mais do que assente perante o Tribunal a quo, que o Recorrente sempre assumiu uma postura profundamente reprovável, não só com a Recorrida, mas sobretudo com a filha menor do casal, MFB...,
11. uma vez que não facilitou as relações habituais da menor com a progenitora; insinuou desequilíbrios psiquiátricos da progenitora quer na Comissão de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo a 20 de Dezembro de 2018, quer no decorrer da sua inquirição no Tribunal a quo, e revelou estar disposto a recorrer a quaisquer meios para obter o fim alvejado, a saber, a guarda da filha,
12. Assim, perante tais factos, bem como todos os demais elementos de prova constantes dos presentes autos, entre outros, a tenra idade da MFB..., de apenas 15 meses de idade, entendeu - e bem o Tribunal a quo fixar a residência da menor com a Mãe, estando devidamente acautelados os contactos da menor com o Pai.
13. Acresce que, extravasando a âmbito do recurso de apelação interposto, o Recorrente tece um conjunto de considerações em relação à Sra. Dra. F..., ao choro dos avós paternos e à integração da menor no ColégioS... - dos melhores a nível nacional, escolhido pelo Recorrente que, inclusive, o frequentou - que, pela sua impertinência, não merecem qualquer comentário por parte da Recorrida.
14. Sempre se refira que a Recorrida repudia veementemente a postura do Recorrente ao considerar de absurdas as considerações que o Tribunal a quo teceu sobre a conduta dele, Recorrente, que aliás foram confirmadas pelo próprio...
15. sendo absolutamente falso, e por isso inaceitáveis pela Recorrida, o alegado pelo Recorrente nos artigos 79° a 83°. das alegações de recurso apresentadas.
16. Pelo exposto, a decisão proferida pelo Tribunal a quo não merece qualquer censura, uma vez que não violou o n°.7 do artigo 1906°. do Código Civil; o artigo 13°. e no n°.6 do artigo 36° 'da Constituição da República Portuguesa e os n.1 e 3 do artigo 9°. da Convenção sobre os Direitos da Criança.
Termos em que, deve o Recurso apresentado pelo Recorrente ser julgado improcedente, mantendo-se na íntegra a douta decisão proferida pelo Tribunal a quo que fixou o regime provisório relativo ao exercício das responsabilidades parentais em referência à menor MFB..., por assim ser de Direito e JUSTIÇA!
O Digno Magistrado do M.P. junto do tribunal recorrido, pronunciou-se pelo indeferimento do recurso, elencando as seguintes razões:
Concluindo:
A apreciação probatória efectuada pelo Tribunal a quo foi devidamente valorada e não padece de erro de interpretação ou de apreciação da prova produzida nem dos factos que firmaram a decisão recorrida.
Afigura-se-nos, salvo o devido respeito por opinião contrária, que os fundamentos do recurso não permitem abalar os fundamentos constantes da decisão, ora recorrida, com a qual concordamos integralmente.
Nesta conformidade, a decisão recorrida não merece censura, e as alegações do recorrente não abalam as considerações aí consignadas, não devendo proceder as pretensões formuladas quanto à revogação ou modificação da mesma, seja em matéria de facto, seja em relação às questões de Direito.
Termos em que a decisão recorrida deverá ser confirmada, por ser justa, correcta e equilibrada, e por isso, é de manter nos seus precisos termos.
Pelo exposto, deverão V.as Ex.as negar provimento ao recurso confirmando a decisão recorrida.
QUESTÓES A DECIDIR
Nos termos do disposto nos Artigos 635°, n°4 e 639°, n°1, do Código de Processo Civil, as conclusões delimitam a esfera de atuação do tribunal ad quem, exercendo uma função semelhante à do pedido na petição inicial. Esta limitação objetiva da atuação do Tribunal da Relação não ocorre em sede da qualificação jurídica dos factos ou relativamente a questões de conhecimento oficioso, desde que o processo contenha os elementos suficientes a tal conhecimento (cf. Artigo 5°, n°3, do Código de Processo Civil). Também não pode este Tribunal conhecer de questões novas que não tenham sido anteriormente apreciadas porquanto, por natureza, os recursos destinam-se apenas a reapreciar decisões proferidas.
Quer isto dizer que qualquer questão invocada em sede de recurso e não levada ao corpo das alegações, não é passível de decisão por este tribunal.
Assim sendo, as questões a decidir subsumem-se ao seguinte:
a) Se estão verificados os requisitos para reapreciação da prova gravada, conforme impetra o recorrente;
b) Se o regime paternal fixado à menor MFB..., deve ser alterado, devendo ser fixada a residência alternada entre os progenitores e com periodicidade semanal;
c) Se a atribuição de guarda da menor a sua mãe, viola o disposto no n.° 7 do artigo 1906.° do Código Civil, no artigo 13.° e no n.° 6 do artigo 36.° da Constituição da República Portuguesa e nos n.° 1 e 3 do artigo 9-° da Convenção sobre os Direito da Criança;
FUNDAMENTAÇÀO DE FACTO
A matéria de facto a considerar é a descrita no relatório acima elaborado.
FUNDAMENTAÇÀO DE DIREITO
Insurge-se o recorrente contra a decisão provisória proferida pelo tribunal recorrido, alegando pretender a reapreciação da prova gravada e a reapreciação de direito, por entender que o regime mais favorável à manutenção de laços da menor com seu pai, é o da residência alternada com cada progenitor, alegando ainda estarem a ser violados os normativos constantes do n.° 7 do artigo 1906.° do Código Civil, no artigo 13.° e no n.° 6 do artigo 36.° da Constituição da República Portuguesa e nos n.° 1 e 3 do artigo 9° da Convenção sobre os Direitos da Criança, sendo a decisão provisória discriminatória dos seus direitos como pai.
Passemos pois a apreciar este primeiro fundamento da apelação, mormente decidindo se estão verificados os requisitos para a pretendida reapreciação da prova gravada conforme refere o recorrente.
a) Se estão verificados os requisitos para reapreciação da prova gravada;
A possibilidade de reapreciação da matéria de facto pela segunda instância dependente de requisitos de admissibilidade explanados no art° 640 do C.P.C., o qual dispõe que: «Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de ,facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
No que toca à especificação dos meios probatórios, «Quando os meios probatórios invocados tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes (Artigo 640°, n° 2, al. a) do Código de Processo Civil).
No que respeita à observância dos requisitos constantes deste preceito legal, após posições divergentes na nossa jurisprudência, o Supremo Tribunal de Justiça tem vindo a pronunciar-se no sentido de que «(...) enquanto a especificação dos concretos pontos de facto deve constar das conclusões recursórias, já não se afigura que a especificação dos meios de prova nem, muito menos, a indicação das passagens das gravações devam constar da síntese conclusiva, bastando que figurem no corpo das alegações, posto que estas não têm por função delimitar o objeto do recurso nessa parte, constituindo antes elementos de apoio à argumentação probatória.»
Assim, O que verdadeiramente importa ao exercício do ónus de impugnação em sede de matéria de facto é que as alegações, na sua globalidade, e as conclusões, contenham todos os requisitos que constam do art. 640° do Novo CPC.
A saber:
- A concretização dos pontos de facto incorrectamente julgados;
- A especificação dos meios probatórios que no entender do Recorrente imponham uma solução diversa;
- E a decisão alternativa que é pretendida.
Por último, no que toca à possibilidade e limites da reapreciação da matéria de facto, não obstante se garantir um duplo grau de jurisdição, tem este de ser enquadrado com o princípio da livre apreciação da prova pelo julgador, previsto no art° 607 n° 5 do C. P. Civil, sendo certo que decorrendo a produção de prova perante o juiz de P instância, este beneficia dos princípios da oralidade e da mediação, a que o tribunal de recurso não pode já recorrer.
De acordo com Miguel Teixeira de Sousa, in Estudos Sobre o Novo Processo Civil, pág. 347, Algumas das provas que permitem o julgamento da matéria de facto controvertida e a generalidade daquelas que são produzidas na audiência final (...) estão sujeitas à livre apreciação do Tribunal (...) Esta apreciação baseia-se na prudente convicção do Tribunal sobre a prova produzida (art.° 655.°, n.°1), ou seja, as regras da ciência e do raciocínio e em máximas da experiência.
Assim, para que a decisão da ia instância seja alterada haverá que averiguar se algo de anormal se passou na formação dessa apontada convicção, ou seja, ter-se-á que demonstrar que na formação da convicção do julgador de 1a instância, retratada nas respostas que se deram aos factos, foram violadas regras que lhe deviam ter estado subjacentes, nomeadamente face às regras da experiência, da ciência e da lógica, da sua conformidade com os meios probatórios produzidos, ou com outros factos que deu como assentes.
Posto isto, o recorrente nas suas alegações, apesar de afirmar pretender a reapreciação da prova gravada, não indica quais os pontos incorrectamente julgados, nem os factos que, a seu ver, ainda que provisoriamente, o tribunal deveria ter considerado e não considerou.
Também não resulta a indicação concreta relativamente a cada ponto e com exatidão das passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes (art° 640 n°2 a) do C.P.C.), limitando-se
o recorrente a efectuar uma transcrição de partes das suas declarações, sem indicar nem a passagem das gravações a que aludia esta parte do depoimento, nem os factos que terão sido incorrectamente considerados ou que deveriam ter merecido outra apreciação.
É certo que se trata esta de uma decisão provisória, proferida no âmbito de acção de regulação de responsabilidades parentais, nos termos previstos no art° 38 n°1 do RGPTC (Lei 141/2015 de 08/09), o qual determina que Se ambos os pais estiverem presentes ou representados na conferência, mas não chegarem a acordo que seja homologado, o juiz decide provisoriamente sobre o pedido em função dos elementos já obtidos.
Sendo uma decisão provisória, é passível de alteração a qualquer momento, consoante os elementos que forem apurados nos autos, quer quanto ao regime de guarda e visitas (decorrente mormente dos resultados da audição técnica especializada), quer quanto ao regime de alimentos decorrente do apuramento quer das despesas incorridas com a menor, quer da situação económica dos seus progenitores.
Ora, -Uma decisão meramente provisória, passível de alteração a todo o tempo, conforme as novas informações e outras vicissitudes conhecidas nos autos, não comporta um nível de exigência de fundamentação idêntico ao das decisões definitivas sobre o fundo da causa5
Está no entanto esta decisão fundamentada, quanto aos factos que o tribunal considerou pertinentes e resultantes da audição, quer do recorrente quer da recorrida, quer da educadora do Colégio S..., onde a menor se encontra inscrita, de acordo com
o disposto no art° 154 do C.P.C., com assento constitucional nos termos do disposto nos art°s 205 n°1 e 20 n°4 da C.R.P., a qual exige actualmente a indicação do processo lógico —racional que conduziu à formação da convicção do julgador, relativamente aos factos que considerou provados, ainda que de forma muito sumária resultante do carácter urgente e provisório desta decisão, não compatível nem com diligências de prova aturadas, nem com exigências de fundamentação que se impõem na decisão definitiva.
Constando desta decisão, embora de forma sumária, os fundamentos de facto que o tribunal considerou na sua tomada de decisão, querendo reverter estes fundamentos de facto, incumbia ao recorrente cumprir os requisitos constantes do art° 640 do C.P.C.
Não cumprindo as alegações e conclusões do recorrente este ónus, não é esta omissão passível de despacho de aperfeiçoamento.
Conforme refere Abrantes Geraldes in Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 4a ed., pág. 157, A comparação que necessariamente tem que ser feita com o disposto no art° 639° e, além disso, a observação dos antecedentes legislativos levam-me a concluir que não existe, quanto ao recurso da decisão da matéria de facto, despacho de aperfeiçoamento. Resultado que é comprovado pelo teor do art. 652°, n°1, al. A), na medida em que limita os poderes do relator ao despacho de aperfeiçoamento das conclusões das alegações, nos termos do n°3 do art° 639.
Efectivamente, pretendeu-se com este regime legal, ao possibilitar a ampliação dos poderes da relação relativamente à impugnação da decisão sobre a matéria de facto, a imposição de regras muito precisas, sem a observância das quais o recurso deve ser liminarmente rejeitado.
Assim sendo, rejeito o recurso nesta parte, no que se reporta à pretendida reapreciação da prova gravada, uma vez que esta se impõe apenas quando, existindo gravação e tendo sido objecto de apreciação para fundamento _Táctico da decisão, o recorrente pretenda ver alterada matéria _Táctica considerada (ou omitida) pelo tribunal recorrido.
Questão diversa é se esta decisão provisória no que se reporta ao regime de guarda e visitas fixado à menor é de manter ou se deve ser alterada conforme requer o recorrente, que é questão que passaremos a apreciar.
b) Se o regime paternal fixado à menor MFB..., deve ser alterado, devendo ser fixada a residência parental alternada, semanalmente;
Insurge-se o recorrente contra a decisão do tribunal recorrido de fixar a guarda da menor junto de sua mãe alegando que o regime que melhor salvaguarda a manutenção de laços afectivos entre a menor e seu pai é o da guarda partilhada, invocando o disposto no art° 1906 n° 7 do C.P.C., bem como o princípio da igualdade entre progenitores que consta deste preceito e o idêntico direito de ambos os pais exercerem as responsabilidades parentais e terem consigo a menor.
Efectivamente, conforme refere o requerente, com a entrada em vigor da Lei 61/2008 de 31 de Outubro, ao substituir-se a anterior expressão de poder paternal pela de regulação de responsabilidades parentais, pretendeu-se expressar idênticos deveres de cuidado e responsabilidade na promoção do desenvolvimento, educação e protecção dos filhos menores não emancipados, por parte de ambos os progenitores, sem conotações de sexo ou preponderância de um progenitor face ao outro, mas tendo sempre em conta o superior interesse da criança (e não o interesse dos seus pais, quando conflituantes).
Decorre esta intenção do Projecto-Lei 509/X que antecedeu este diploma, ao referir que O projecto que se apresenta propõe o desaparecimento da designação poder paternal substituindo-a de forma sistemática pelo conceito de responsabilidades parentais. Na mudança de designação está obviamente implícita uma mudança conceptual que se considera relevante. Ao substituir uma designação por outra muda-se o centro da atenção: ele passa a estar não naquele que detém o poder — o adulto, neste caso — mas naqueles cujos direitos se querem salvaguardar, ou seja, as crianças. Esta mudança pareceu essencial por vários motivos. Em primeiro lugar, a designação anterior supõe um modelo implícito que aponta para o sentido de posse, manifestamente desadequado num tempo em que se reconhece cada vez mais a criança como sujeito de direitos. É certo que em direito de família o poder paternal sempre foi considerado um poder/dever, mas esta é uma especificação técnica que desaparece no uso quotidiano, permitindo-se assim que na linguagem comum se façam entendimentos e conotações antigas e desajustadas. Em segundo lugar, é vital que seja do ponto de vista das crianças e dos seus interesses, e portanto a partir da responsabilidade dos adultos, que se definam as consequências do divórcio. Também assim se evidencia a separação entre relação conjugal e relação parental, assumindo-se que o fim da primeira não pode ser pretexto para a ruptura da segunda. Por outras palavras, o divórcio dos pais não é o divórcio dos filhos e estes devem ser poupados a litígios que ferem os seus interesses, nomeadamente, se forem impedidos de manter as relações afectivas e as lealdades tanto com as suas mães como com os seus pais.
Concretizando estes princípios, o art° 1906 n°1 do C.C., estabelece como regra o princípio do exercício conjunto das responsabilidades parentais por ambos os progenitores da criança, em questões de particular importância, estendendo-se este princípio mesmo aos casos de menores nascidos de famílias em que não existiu casamento ou união de facto, de forma a que, conforme decorre do supra mencionado Projecto-Lei 509/X a criança possa manter relações afectivas profundas com o pai e com a mãe, bem como ser o alvo de cuidados e protecção por parte de ambos em ordem à salvaguarda do seu superior interesse. (...)
A imposição do exercício conjunto das responsabilidades parentais para as decisões de grande relevância da vida dos filhos decorre ainda do respeito pelo princípio do interesse da criança. Também aqui se acompanha a experiência da jurisprudência e a legislação vigente em países que, por se terem há mais tempo confrontado com o aumento do divórcio, mudaram o regime de exercício das responsabilidades parentais da guarda única para a guarda conjunta. Isso aconteceu por terem sido verificados os efeitos perversos da guarda única, nomeadamente pela tendência de maior afastamento dos pais homens do exercício das suas responsabilidades parentais e correlativa fragilização do relacionamento afectivo com os seus filhos.
Visou-se assim com esta proposta, promover a ideia da igualdade de género, contrapondo ao anterior sistema, introduzido pela Reforma ao C.Civil de 1977, de guarda única e de exercício exclusivo do poder paternal atribuído apenas a um dos progenitores, com supremacia, em especial em relação a menores de tenra idade, da mãe, a ideia do exercício conjunto das responsabilidades parentais, atribuindo ao pai (até então, considerado o elo menor, mais ausente da vida e educação da criança) maiores responsabilidades e deveres, como forma de assegurar que o divórcio, separação ou ruptura da relação amorosa dos progenitores da criança, não significassem, na prática, o divórcio, separação ou ruptura dos laços afectivos, com a própria criança.
No entanto, este exercício conjunto das responsabilidades parentais, não implica por si só, a fixação de um regime de guarda conjunta e alternada da criança com ambos os progenitores e distingue-se dele.
A este respeito, refere Maria Clara Sottomayor que O exercício conjunto das responsabilidades parentais inclui apenas uma partilha, no plano jurídico das grandes decisões a tomar, acompanhada da fixação da residência da criança junto de um dos pais, distinguindo-se da chamada guarda conjunta ou guarda alternada. Estes conceitos não pressupõem a fixação de uma residência habitual da criança, vivendo esta, respectivamente, períodos duradouros com cada um dos pais ou alternadamente, de acordo com um determinado ritmo semanal, quinzenal ou mensal considerando que do teor do art° 1906 n°5, decorre que a guarda conjunta e a guarda alternada, não estão abrangidas pela lei que as não admite. e que, apesar de o art° 1906 n°7 do C.C. prever uma maior abertura quando existe acordo dos pais9 ainda assim deve ficar determinada na decisão judicial a residência da criança para efeitos de incidência fiscal, relativa á dedução dos encargos com a educação da criança, da incidência sobre prestações sociais como o abono de família e para efeito de vinculação dos pais à obrigação de alimentos., embora aceite que esta solução potencia o risco de colocar a criança no centro do conflito entre os pais e o risco de cada progenitor tomar sozinho as decisões de particular importância relativamente ao menor, no período em que se encontre a residir consigo, minando a autoridade do outro progenitor.
Por sua vez, Guilherme de Oliveira, defende que, «Vale a pena acentuar que o regime da Lei n.° 61/2008 não altera quase nada do que se refere à guarda física dos filhos. Tal como dantes, o tribunal pondera os acordos dos pais e o interesse dos filhos, e acabará por decidir com quem o filho vai viver, qual a distribuição do tempo que ele passará com cada um dos progenitores e com outras pessoas relevantes para o menor. Concretamente, a imposição do exercício conjunto das responsabilidades parentais não tem nada a ver com as ideias conhecidas da guarda física conjunta, alternada, etc. A pequena alteração que a lei introduziu consta do art. 1906.°, n.° 5, e resume-se à adição de um factor de ponderação que o tribunal deve tomar em conta quando determina a residência do menor: a disponibilidade manifestada por cada um dos pais para promover relações habituais do filho com o outro progenitor.»
Não sendo consensual, conforme acima se expôs, este regime de guarda alternada da criança é, no entanto, defendido de forma dominante pela doutrina e jurisprudência, embora, na sua maioria, restringindo-a aos casos em que exista acordo de ambos os progenitores.
Expostas estas considerações jurisprudenciais e doutrinárias, o artigo 1906 do C.C., na sua redacção actual, não prevê expressamente, nem proíbe, o regime de guarda alternada da criança.
Os critérios normativos que continuam a nortear a escolha do regime de guarda do menor são sempre e em primeiro lugar, o superior interesse da criança, tendo em conta nomeadamente a disponibilidade manifestada por cada um dos pais para promover relações habituais do filho com o outro, a manutenção de uma relação de grande proximidade com os dois progenitores e a partilha de responsabilidades entre os pais, de forma a que, a fixação de residência do menor junto de um dos progenitores, ou junto de cada um deles alternadamente, se afigure como a opção que melhor contribui para o bem estar da criança, de forma a minorar os efeitos adversos que decorrem da separação, ou da ruptura de laços entre os seus progenitores.
É o que decorre do disposto no n° 5 do art° 1906 do C.C., ao determinar que a residência do menor seja fixada de acordo com o interesse deste, tendo em atenção todas as circunstâncias relevantes, designadamente o eventual acordo dos pais e a disponibilidade manifestada por cada um deles para promover relações habituais do filho com o outro, o que pode passar ou não pela guarda alternada da mesma, se verificados os demais requisitos acima referidos.
Conforme refere António José Fialho, A guarda ou residência alternada constitui uma modalidade singular de coparentalidade e caracteriza-se pela possibilidade de cada um dos pais de uma criança ter o filho a residir consigo, alternadamente, segundo um ritmo de tempo que pode ser de um ano escolar, um mês, uma quinzena ou uma semana, uma parte da semana, ou uma repartição organizada dia a dia (divisão rotativa e tendencialmente paritária dos tempos de residência, dos cuidados e da educação da criança) em que, durante esse período de tempo, um dos progenitores exerce, de forma exclusiva os cuidados que integram o exercício das responsabilidades parentais. (...) a residência alternada consiste
numa divisão rotativa e tendencialmente simétrica dos tempos da criança com os progenitores por forma a possibilitar a produção de um quotidiano familiar e social com o filho durante os períodos em que se encontra com cada um deles.
Acrescenta ainda que O verdadeiro e principal farol que deve nortear o julgador é o do superior interesse da criança, aferindo-o em concreto, sopesando devidamente todos os factores que um conceito indeterminado desta natureza envolve, sendo esse o grande desafio que se coloca aos tribunais.
É pois necessário ter em conta que o regime de residência do menor tem de ser fixado casuisticamente, de acordo com os elementos constantes dos autos em relação à sua vivência, às suas necessidades (em especial em crianças lactentes/de tenra idade, cuja ligação à mãe é em princípio superior nestas idades), às possibilidades dos pais de lhes proporcionarem as condições necessárias ao seu são desenvolvimento, à manutenção de contactos com o outro progenitor, à capacidade de diálogo, entendimento e partilha de responsabilidades entre os progenitores e atendendo ainda à vontade da criança em causa (se capaz de a expressar), sem afastar automaticamente o regime de guarda compartilhada ou alternada, mas também sem estabelecer uma defesa cega deste regime, na óptica, não do interesse da criança, mas da defesa do interesse dos pais em ter a criança a seu cargo.
Denote-se que a residência alternada entre os progenitores, envolve sempre um factor de destabilização na vida da criança pela frequente mudança de residência e do seu espaço pessoal, que pode ser minorado ou até assumir uma expressão meramente residual se, em contraponto, os progenitores lhe proporcionarem um ambiente estável e seguro, sem comportamentos fracturantes, sem modos de vida e educações distintas, consoante o progenitor com que se encontre a residir, diminuindo ou procurando diminuir desta forma o trauma da separação dos pais.
Ou seja, depende este regime e o seu sucesso, de um compromisso dos pais e do entendimento entre eles no que à educação, manutenção e afectos da criança respeita, de forma a manterem um ambiente estável e de respeito mútuo, sem procurarem impor de forma unilateral, o seu próprio modelo e sem procurar minar a autoridade e a imagem do outro, perante a criança.
Volvendo à situação concreta, no caso em apreço tomou o tribunal recorrido em conta os seguintes elementos fácticos:
Os progenitores da menor MFB... cessaram a convivência em comum a 18 de dezembro de 2018, altura que em que a menor ficou a viver com a mãe na casa de morada de família, com o acordo do pai.
Apesar da separação do casal, a mãe proporcionou ao pai, sem rigidez de horários, convívios diários com a menina.
Não obstante, o progenitor no dia 28 de dezembro de 2018, fazendo-se acompanhar dos avós paternos da criança, dirigiu-se à casa de morada de família, de onde retirou, (...) à força, ou seja, contra a vontade expressa da progenitora e mediante o afastamento pela força física da avó materna da menor, que se colocou nas escadas da habitação para bloquear a saída da criança, o que o fez sem sequer previamente saber se a criança estava a tomar medicação, e sem reunir os objetos da criança e peças básicas desta como sejam os biberões e o vestuário.
Na posse da criança o progenitor, mediante a solicitação da mãe de convívios com a criança, condicionou convívios da criança com a progenitora no fim de semana de 5 e 6 de Janeiro, com recolha prevista no dia 4, à assinatura por esta de uma proposta provisória de regulação do exercício das responsabilidades parentais, nos termos unilaterais impostos pelo mesmo e referentes apenas àquele fim de semana.
Ainda durante o período de tempo em que manteve a criança consigo o progenitor não fez comparecer a criança na creche, que frequentava desde o final de novembro, por decisão de ambos os pais (...) tendo o progenitor inclusivamente comunicado à diretora pedagógica do colégioS... que a filha jamais regressaria à creche, decisão esta também unilateral, que não obteve a concordância da mãe da criança.
A progenitora, sendo autorizada pelo progenitor apenas a conviver com a filha num curto período de tempo no dia 7 de janeiro, por não ter assinado a proposta de acordo (o que determinou que o pai vedasse os convívios com a criança nos dias 4, 5 e 6 de janeiro), não devolveu a criança ao pai no dia 7, fazendo com que a mesma retomasse a frequência da creche nos dias 9, 10 e 11 do corrente mês, tendo inclusivamente nesta data, dia 14 de janeiro, procedido novamente à entrega da criança na creche, de manhã.
Novamente neste dia 14, por volta das 10:00 horas, o progenitor foi recolher a criança ao colégio por decisão unilateral (que justificou em tribunal estar fundada em motivo de doença da menor, o que foi infirmado pela educadora recolheu a criança nesse dia), e (...) subtraiu do livro de presenças dos menores que frequentam a creche, a ficha de registo de presenças da menor MFB... relativa ao mês de janeiro de 2019, que levou consigo, afirmando ao tribunal que gravou a conversa que manteve com a funcionária do colégio naquele dia, sem o conhecimento ou consentimento desta.
O progenitor compareceu perante a Comissão de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo a 20 de dezembro de 2018, alegando desequilíbrio psiquiátrico da progenitora.
Face a estes factos, adquiridos provisoriamente nos autos, não estão reunidos os requisitos para o tribunal optar pela guarda partilhada, ou alternada entre os progenitores, uma vez que o superior interesse da criança o desaconselha, sendo este regime, se implementado, totalmente inoperante e gravoso para os interesses da menor.
Repare-se que o pai após ter retirado a menor pela força de casa de morada da família, passou a vedar os contactos da mãe com a menor, o que não acontecia quando esta se encontrava a residir com a mãe, em que o pai a podia ver quando quisesse.
Obviamente que se poderá considerar que um regime de guarda alternada da menor, teria como desiderato estabelecer períodos de residência com cada progenitor, potenciando os contactos desta com um e com outro e, desta forma, minorando os conflitos inerentes à guarda e convívio da menor com cada um dos progenitores, que seria tendencialmente equalitário.
No entanto, outros pontos de conflito subsistem que desaconselham a guarda partilhada desta menor, de que é sintomático a questão relativa à frequência da Creche (sendo esta uma questão de particular importância e estando já decidida esta frequência previamente à separação do casal conforme decorre dos factos considerados).
Na prática, a menor frequenta e frequentaria a creche quando se encontra com a mãe e não a frequentou no período em que esteve com o pai, manifestando este que não pretende que a menor a frequente (apesar de ter sido esta uma decisão conjunta).
Trata-se esta, conforme referido, de uma questão de particular importância, previamente decidida e cuja manutenção o progenitor não pretende e que é sintomático da falta de entendimento dos pais que levariam à falência de um regime de guarda partilhada, pois o que se denota é que, no período de tempo que estivesse com a mãe, a menor teria determinadas rotinas, incluindo a frequência da creche e, no período de tempo que estivesse com o pai, teria outras totalmente distintas, o que não é salutar para qualquer criança, ainda para mais de tenra idade.
O regime de guarda alternada da criança opera e salvaguarda o superior interesse da criança, em casos em que os pais conseguem e percebem o exercício de responsabilidades compartilhadas, em que conseguem estabelecer um diálogo e chegar a compromissos tendo em vista o superior interesse da criança (em detrimento do seu próprio interesse ou dos seus conflitos pessoais), não quando têm projectos individuais para a criança.
Por outro lado, a menor em causa tem 15 meses, sendo recente e exarcebado o litígio entre os seus progenitores, conforme decorre dos autos, pelo que não estão verificados os condicionalismos que possibilitariam a guarda partilhada da criança, pelo menos nesta fase ainda provisória dos autos.
Nem a atribuição de residência desta menor com a sua mãe, viola o princípio da igualdade previsto no artigo 13.° e no n.° 6 do artigo 36.° da Constituição da República Portuguesa e nos n.° 1 e 3 do artigo 9° da Convenção sobre os Direito da Criança, conforme alega o progenitor, questão que se ponderará de seguida.
c) Se a atribuição de guarda da menor a sua mãe, viola o disposto no artigo 13.° e no n.° 6 do artigo 36.° da Constituição da República Portuguesa e nos n.° 1 e 3 do artigo 9° da Convenção sobre os Direitos da Criança;
Conforme acima referido, este princípio da igualdade de exercício das responsabilidades parentais, afastando o primado da mãe (constante do anterior art° 1911 n°1 e 2, do C.C., nos casos em que não existisse matrimónio), é sempre norteado pelo superior interesse da criança.
E o superior interesse da criança pode, em alguns casos (violência doméstica, abusos e agressões ao menor), afastar mesmo o exercício das responsabilidades parentais de um ou de ambos os progenitores.
São no entanto casos patológicos no relacionamento entre pais e filhos, priveligiando-se sempre, após a dissolução do matrimónio ou a falência dos laços afectivos que ligavam os seus progenitores, a manutenção de laços afectivos entre os menores e os seus progenitores e entre os menores e irmãos ou avós, de forma a que, a dissolução de laços entre os seus progenitores seja o menos fracturante possível para a criança.
Neste âmbito, tendo sempre em conta os direitos e interesses da criança que aqui urge salvaguardar, estabelece a Declaração Universal dos Direitos da Criança (Proclamada pela Resolução da Assembleia Geral das Nações Unidas n.° 1386 (XIV), de 20 de Novembro de 1959) no seu
princípio VI que A criança precisa de amor e compreensão para o pleno e harmonioso desenvolvimento da sua personalidade. Na medida do possível, deverá crescer com os cuidados e sob a responsabilidade dos seus pais e, em qualquer caso, num ambiente de afecto e segurança moral e material; salvo em circunstâncias excepcionais, a criança de tenra idade não deve ser separada da sua mãe. A sociedade e as autoridades públicas têm o dever de cuidar especialmente das crianças sem família e das que careçam de meios de subsistência. Para a manutenção dos filhos de famílias numerosas é conveniente a atribuição de subsídios estatais ou outra assistência.
Mais consagra no seu princípio VII que O interesse superior da criança deve ser o princípio directivo de quem tem a responsabilidade da sua educação e orientação, responsabilidade essa que cabe, em primeiro lugar, aos seus pais.
Por sua vez, a Convenção Sobre os Direitos da Criança (Adoptada pela Assembleia Geral nas Nações Unidas em 20 de Novembro de 1989 e ratificada por Portugal pela Resolução da Assembleia da República n.° 20/90, de 08.06.990, e pelo Decreto do Presidente da República n.° 49/90, de 12.09),
norteia-se pela defesa do Interesse superior da criança, impondo que Todas as decisões que digam respeito à criança devem ter plenamente em conta o seu interesse superior. O Estado deve garantir à criança cuidados adequados quando os pais, ou outras pessoas responsáveis por ela não tenham capacidade para o fazer.
Mais resulta do seu art° 9 que Os Estados Partes garantem que a criança não é separada de seus pais contra a vontade destes, salvo se as autoridades competentes decidirem, sem prejuízo de revisão judicial e de harmonia com a legislação e o processo aplicáveis, que essa separação é necessária no interesse superior da criança. Tal decisão pode mostrar-se necessária no caso de, por exemplo, os pais maltratarem ou negligenciarem a criança ou no caso de os pais viverem separados e uma decisão sobre o lugar da residência da criança tiver de ser tomada. (...) Os Estados Partes respeitam o direito da criança separada de um ou de ambos os seus pais de manter regularmente relações pessoais e contactos directos com ambos, salvo se tal se mostrar contrário ao interesse superior da criança.
Mais dispõe no n.° 2 do artigo 27.°, que compete primacialmente aos pais a responsabilidade de assegurar, dentro das suas possibilidades e disponibilidades económicas, as condições de vida necessárias ao desenvolvimento da criança ( Principio IV).
Quer da declaração Universal dos Direitos da Criança, quer da Convenção dos Direitos da Criança decorre o seguinte:
-aos pais incumbe em primeiro lugar a responsabilidade pela educação, manutenção e desenvolvimento dos seus filhos menores, incumbindo ao Estado a adopção de medidas que o possibilitem;
-os menores não podem ser separados dos seus pais, excepto em casos excepcionais; -as crianças de tenra idade não podem ser separadas das suas mães (com quem mantém nesta fase uma ligação mais forte), excepto em casos excepcionais;
-o exercício das responsabilidades parentais e a adopção de qualquer medida judicial deve nortear-se sempre pelo interesse superior da criança;
Estes direitos da criança encontram igualmente assento constitucional, mormente nos art°s 36 (direito a alimentos), 63° (direito à segurança social), 64°, 67° e 73° e seguintes (direito à educação), 65° (direito a uma habitação condigna), adoptando o Estado medidas que assegurem o apoio à maternidade e paternidade (art° 68 da constituição).
Incumbindo aos pais o exercício das responsabilidades parentais, decorre do art° 36 n°5 da Constituição que 5. Os pais têm o direito e o dever de educação e manutenção dos filhos., o que conforme já acima apreciado, encontra expressão prática no art° 1906 do C.C.
Mais dispõe este preceito legal que 6. Os filhos não podem ser separados dos pais, salvo quando estes não cumpram os seus deveres fundamentais para com eles e sempre mediante decisão judicial., em consonância aliás com os preceitos acima citados quer da Declaração Universal dos Direitos da Criança, quer da Convenção dos Direitos da Criança.
Não quer isto dizer, nem decorre destes preceitos legais, que a guarda partilhada ou alternada da criança é o regime regra, equivalendo a decisão que decrete a residência do menor com um dos progenitores, a uma retirada/separação do menor do progenitor que não tem a guarda e assim, admissível apenas em casos excepcionais.
Muito menos que a decisão que fixe a residência da criança com um dos progenitores, viole direitos constitucionais do outro progenitor ou sequer que viole o princípio da igualdade com consagração constitucional no art° 13 da CRP, e enunciação no art° 1906 do CC., como um direito/dever de ambos os progenitores de exercerem as responsabilidades parentais.
O princípio da igualdade, conforme defendem Gomes Canotilho e Vital Moreira, é um dos princípios estruturantes do sistema constitucional global, conjugando dialecticamente as dimensões liberais, democráticas e sociais inerentes ao conceito de Estado de direito democrático e social (art.° 2°). Na sua dimensão liberal, consubstancia a ideia da igual posição de todas as pessoas, independentemente do seu nascimento e do seu status, perante a lei, geral e abstracta, considerada subjectivamente universal em virtude da sua impessoalidade e da indefinida repetibilidade na aplicação, acrescentando que O princípio da igualdade tem a ver fundamentalmente com igual posiçao em matéria de direitos e os deveres (daí a sua colocação sistemática nesta sede de princípios gerais dos direitos e deveres fundamentais). Essencialmente ele consiste em duas coisas: proibição de privilégios ou benefícios no gozo de qualquer direito ou na isenção de qualquer dever; proibição de prejuízo ou detrimento na privação de qualquer direito ou na imposição de qualquer dever (n°2);. No fundo, o princípio da igualdade traduz-se na regra da generalidade na atribuição de direitos e na imposição de deveres. Em princípio, os direitos e vantagens a todos devem beneficiar os deveres e encargos sobre todos devem impender.
No entanto, a proibiçao de descriminaçôes (n°2) não significa uma exigência de igualdade absoluta em todas as situações, nem proíbe diferenciações de tratamento. A Constituição indica ela mesma um conjunto de factores de descriminação ilegítimos (...) O que se exige é que as medidas de diferenciação sejam materialmente fundadas do ponto de vista da segurança jurídica, da proporcionalidade, da justiça e da solidariedade e não se baseiem em qualquer motivo, constitucionalmente impróprio.
Também Jorge Miranda e Rui Medeiros defendem que o sentido primário da fórmula constitucional é negativo; consiste na vedação de privilégios e discriminações, sendo os primeiros situações de vantagem não fundadas, e as segundas situações de desvantagem., sendo o seu sentido positivo o de impor Tratamento igual de situações iguais (ou tratamento semelhante de situações semelhantes, e tratamento desigual de situações desiguais, mas substancial e objectivamente desiguais e não criadas ou mantidas artificialmente pelo legislador.
Ao lado deste princípio geral de igualdade, a nossa constituição, reconhece direitos fundamentais de igualdade, entre os quais, o direito de igualdade dos cônjuges, dos filhos e dos pais em relação aos filhos, enunciados, no art° 36 n°3, 4 e 5 da CRP.
Com efeito, o direito e o dever dos pais de educação e manutenção dos filhos, constitui um verdadeiro direito/dever subjectivo e não uma simples norma programática, sendo um encargo a cargo de ambos os pais.
O que, não quer dizer que, em caso de divórcio ou separação dos progenitores, a fixação de residência junto de um destes, viole este direito/dever dos pais, pois que não significa que aquele que não reside com a criança fique afastado do exercício das suas responsabilidades ou deixe de ter os direitos e deveres inerentes à sua condição de pai ou de mãe.
Muito menos constitui uma decisão que determine a privação de um dos progenitores do seu filho.
Conforme refere Vital Moreira e Gomes Canotilho (in Obra citada a págs. 223), A garantia de não privação dos filhos (n°6) é também um direito subjectivo a favor dos pais. As restrições a esse direito estão sob reserva da lei (pois compete a esta estabelecer os casos em que os filhos poderão ser separados dos pais quando estes não cumpram os seus deveres fundamentais) e sob reserva de decisão judicial. É o Código Civil (...) que determina os casos em que o tribunal pode confiar os filhos a terceira pessoa ou a estabelecimentos de educação ou assistência
Posto isto, a decisão de atribuição da guarda ou fixação de residência do menor junto de um dos seus progenitores não equivale nem a uma decisão que determina a separação do menor do progenitor que não detêm a guarda, nem a fixação de residência junto da mãe (ou do pai), implica a violação do direito de igualdade ou dos direitos de ambos os progenitores de exercício das responsabilidades parentais.
A fixação de residência de uma bebé de 15 meses junto de sua mãe, tendo em conta o circunstancionalismo acima referido, não constitui qualquer descriminação do pai (que não está privado dos contactos e convívios com esta menor) e justifica-se tendo em conta a sua tenra idade e os demais factos que acima foram referidos.
Denote-se que a própria Declaração Universal dos Direitos da Criança prevê que salvo em circunstâncias excepcionais, a criança de tenra idade não deve ser separada da sua mãe.
Improcede assim o recurso interposto nos autos pelo requerido.
DECISÁO
Pelo exposto, acordam os Juízes desta relação em julgar improcedente a apelação.
Custas pelo apelante.
Lisboa 28/03/19
(Cristina Neves)
(Man el Rodrigues)
(Ana Paula A.A. Carvalho)